Segundo autorizada doutrina, a regra da sucumbência foi acolhida pelo sistema processual vigente, mas não exaure a disciplina acerca da responsabilidade pelos encargos do processo, o que se revela a partir da “relação causal entre o dano e a atividade de uma pessoa.”[1]. Ou seja, a responsabilidade pelo custo do processo é revelada pela causalidade, impondo-se àquele que restar vencido (considerado como o responsável pela instauração do processo) suportar o pagamento das despesas e honorários advocatícios à parte contrária.
De decisões do STJ extraímos o firme posicionamento de que “a condenação em honorários advocatícios pauta-se pelo princípio da causalidade, ou seja, somente aquele que deu causa à demanda ou ao incidente processual é que deve arcar com as despesas deles decorrentes.” [2]
A parte sucumbente, portanto, é aquela que irá responder pelo ressarcimento das despesas e pelo pagamento dos honorários advocatícios já que deu causa ao processo, tornou-o necessário, independentemente de se aferir o elemento culpa já que a responsabilidade, no caso, é objetiva.
A afirmação da regra processual está contida no art. 20 do CPC que dispõe sobre a responsabilidade pelo custo do processo, merecendo o comentário de que aqueles honorários advocatícios não correspondem aos honorários convencionados entre as partes (previstos contratualmente para a hipótese de inadimplemento de obrigação) que integrarão a reparação dos danos [3]. Também não guardam relação com custo de contratação de advogado pela parte vencedora. A previsão do art. 20 do CPC diz respeito aos honorários de sucumbência, de caráter processual, cujo credor é o advogado, segundo expressamente dispõe o art. 23 da Lei nº 8.906/94 e também o art. 85 do novo CPC, cujo caput tem a seguinte redação: “A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”.
Assim, mantida pelo novo CPC a regra da sucumbência orientada pelo princípio da causalidade, com clareza quanto a titularidade do advogado sobre os honorários.
E o NCPC também veio pôr fim a discussões que dizem respeito à titularidade sobre os honorários decorrentes de sentença que atribua a causa do processo a ambas as partes, esclarecendo que:
Art. 85. [...]
[...]
§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.
Portanto, o NCPC supera o embate que se trava entre os argumentos, de um lado, no sentido de serem distintos os credores e devedores das obrigações a serem compensadas (já que os honorários consistem em crédito dos advogados não havendo conexão subjetiva entre crédito e débito) e, de outro, que a compensação referida no art. 21 do CPC implica mútua condenação ao pagamento de honorários advocatícios uma vez que ambas deram causa ao processo. [4]
A discussão acima referida, gerada pela redação do art. 21 do atual CPC, levou à edição da Sumula 306 do STJ [5], Tribunal que também reconheceu, sob a sistemática dos recursos repetitivos, o cabimento da compensação dos honorários na hipótese de sucumbência recíproca, remanescendo ao advogado eventual saldo que reste do encontro entre as sucumbências, isto é, que ultrapasse a compensação. Neste sentido:
[...]
Configurada a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC) as custas e honorários advocatícios deverão ser suportados na proporção do decaimento das partes, devidamente compensados, apurados os valores em liquidação.” [6]
Certamente a avaliação há de levar em conta circunstâncias do caso concreto, como, por exemplo, a compensação entre honorários fixados na ação de conhecimento e aqueles fixados na execução. A Primeira Seção do STJ firmou posicionamento pela “inviabilidade de compensação de verba honorária fixada na ação de conhecimento com aquela decorrente da procedência de embargos à execução, porquanto além de as verbas em questão possuírem naturezas distintas, inexiste identidade entre credor e devedor, pois os honorários pertencem ao advogado, mas a responsabilidade pelo pagamento dessa verba é da parte sucumbente e não do causídico. Assim, em se tratando de ação de conhecimento e de execução, não há de se falar em sucumbência recíproca.”[7]
Há, por outro lado, decisão do STJ entendendo possível a compensação dos honorários advocatícios (decorrente da sucumbência recíproca) na fase de cumprimento de sentença “desde que tal possibilidade não tenha sido expressamente vedada pelo título judicial”. [8]
De qualquer forma, a orientação acerca do tema já está delimitada a partir da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil: os honorários advocatícios sucumbenciais têm natureza alimentar não comportando, portanto, compensação nos casos de sucumbência recíproca [9]. Oportuno o registro de que o NCPC utiliza a expressão “sucumbência parcial” para a situação de litigantes parcialmente vencedores e vencidos em suas pretensões, não havendo referência à reciprocidade como há na redação do art. 21. A respeito da terminologia utilizada pelo legislador do atual CPC, esclarece a doutrina que “[...] se, na prática, insiste-se no emprego da expressão sucumbência parcial, ela o é tão apenas no sentido de sucumbência parcial recíproca.” [10]
Candido Dinamarco pondera que “não conduz a resultado prático algum a discussão sobre se é mais correto dizer sucumbência parcial ou sucumbência recíproca. Ambas as locuções são inteligíveis e razoáveis e, portanto, fungíveis.” [11]
Retornando ao NCPC, outro aspecto de destaque sobre o tema diz respeito ao tratamento diferenciado dos honorários advocatícios e das despesas, ao deixar expresso que “se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas” (art. 86), ao contrário da atual norma (art. 21) que aplica a regra de compensação tanto em relação às despesas como honorários.
Caso, todavia, algum litigante sucumba em parte mínima do pedido, o outro responderá por inteiro pelas despesas e pelos honorários. Esta é a orientação tanto no atual CPC (parágrafo único do art. 21) como no novo diploma legal (parágrafo único do art. 86). Importante observar que a aferição quanto ao mínimo capaz de determinar a responsabilidade pelos encargos do processo se faz casuisticamente, conforme orientação doutrinária e jurisprudencial. [12].
Em caso de litisconsorte, determina o art. 87 do NCPC a divisão proporcional pelas despesas e honorários entre os vencidos, mantendo a atual regra contida no art. 23 que, aduza-se, não pressupõe solidariedade. Nesta linha decisão do STJ: “os litisconsortes vencidos respondem pela condenação sucumbencial em proporção. A solidariedade só se admite quando expressa em sentença exequenda por força da coisa julgada.” [13]
CONCLUSÃO
O NCPC traz o alinhamento com o disposto no art. 23 da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) deixando clara a impossibilidade de compensação na hipótese de sucumbência parcial, isto é, na hipótese de autor e réu terminarem parcialmente vencedores e vencidos em suas pretensões postas em juízo. O STF já se manifestou no sentido de que “é de caráter alimentar a natureza jurídica dos honorários advocatícios originados do ônus da sucumbência” [14] que refletem a remuneração do trabalho profissional do advogado.
NOTAS
[1] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed., São Paulo: Editora RT, 2012, p. 42
[2] STJ, Segunda Turma, AgRg no REsp 1513068/SP, Relator Min. Mauro Campbell Marques, j. 28.04.2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 17.06.2015
[3] STJ, AgRg no REsp 1312613/MG, Terceira Turma, Relator Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 23.09.2014. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 17.06.2015
[4] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed., São Paulo: Editora RT, 2012, p. 480
[5] “Os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte.”
[6] STJ, Quarta Turma, AgRg no REsp 1302552/RS, Relator Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 14.04.2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[7] STJ, Primeira Turma, AgRg no REsp 1521183/RS, Relator Min. Sérgio Kikino, j. 28.04.2015. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[8] STJ, Primeira Turma, AgRg no REsp 1321459/RS, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 18.12.2014. Disponível em: http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[9] O conceito de sucumbência recíproca extraído de dicionário jurídico vem no sentido de que “haverá sucumbência recíproca se cada litigante for em parte vencedor e vencido, pelo que serão distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas (art. 21).” In: De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico Conciso. SLAIBI FILHO, Nagib; CARVALHO, Glaucia (Atual.), Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 679
[10] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed. São Paulo: Editora RT, 2012, p. 470
[11] Candido Rangel Dinamarco. Instituições de Direito Processual Civil, 5ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2005, v.II, p. 652
[12] Yussef Said Cahali. Honorários Advocatícios, 4ª. ed. São Paulo: Editora RT, 2012, p. 483
[13] STJ, Terceira Turma, EDcl nos EDcl no REsp 1181250/SP, Relatora Min. Nancy Andrighi, j. 18.12.2012. Disponível em http://www.stj.jus.br Acesso em: 18.06.2015
[14] STF, Primeira Turma, AI 849470 AgR/DF, Relator Min. Dias Toffoli, j. 25.09.2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br Acesso em: 18.06.2015