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Contratos bancários

Agenda 05/07/2015 às 11:20

O artigo analisa os contratos bancários. Primeiro seu conceito, que é assunto árduo e que encontra dificuldades na doutrina. Depois as classificações normalmente apresentadas dos contratos bancários, com relevo para a que os divide em típicos e atípicos.

O artigo à seguir analisa os contratos bancários, conceito este que reflete dificuldades na doutrina. A doutrina reconhece que a pretensão de conceituar contrato bancário enfrenta dificuldades iguais às existentes para se fazer a diferença entre contratos comerciais dos civis. Crescem esses obstáculos quando concentram-se as investigações em assentar a distinção entre contratos bancários e os contratos civis e comerciais. Em seguida suas principais classificações e características.

1 – CONCEITO DOS CONTRATOS BANCÁRIOS

Por atividade bancária entende-se, juridicamente, a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros em moeda nacional ou estrangeira. Este conceito, que se conclui da definição legal de instituições financeiras (LRB, art.17), abarca uma gama considerável de operações econômicas, ligadas direta ou indiretamente à concessão, circulação ou administração do crédito. Estabelecendo-se um paralelo com a atividade industrial, poder-se-ia dizer que a matéria-prima do banco e o produto por ele oferecido ao mercado é o crédito. O conceito de atividade bancária apresenta algumas dificuldades na sua aplicação a situações-limite, o que tem gerado dúvidas quanto à natureza bancária de determinados contratos.

Para se exercer atividade bancária , é necessária a autorização governamental. O órgão competente para expedi-la é o Banco Central do Brasil, autarquia da União integrante do Sistema Financeiro Nacional, a quem a lei atribuiu, entre outras, as funções de emitir a moeda, executar os serviços do meio circulante, controlar o capital estrangeiro e realizar as operações de redesconto e empréstimo a instituições financeiras. Para os estrangeiros, a autorização é dada por decreto do Presidente da República. A lei estabelece pena de reclusão de um a quatro anos para o exercício de atividade bancária sem autorização (Lei n. 7.492/86, art.16).

As instituições financeiras adotam sempre a forma de uma sociedade anônima. A sua administração, no entanto, submete-se a regras específicas e é controlada pelo Banco Central. Esse controle compreende, entre outros mecanismos, a aprovação do nome dos administradores eleitos pelos órgãos societários, a fiscalização das operações realizadas, a autorização para a alienação do controle acionário ou para a transformação, fusão, cisão ou incorporação, bem como a decretação do regime de administração especial temporária, intervenção ou liquidação extrajudicial, se presentes os seus pressupostos.

Contratos bancários são aqueles em que uma das partes é, necessariamente, um banco. Isto é, se a função econômica do contrato está relacionada ao exercício da atividade bancária, ou seja, se o contrato configura ato de coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, então somente uma instituição financeira devidamente autorizada pelo governo poderá praticá-lo. Neste caso, o contrato será definido como bancário.

Não basta a presença do banco em um dos polos da relação contratual para que o contrato seja bancário. Uma instituição financeira se envolve em muitos negócios jurídicos, tais como a locação, a compra e venda de imóveis, a aquisição de logiciário etc., mas a sua participação não é suficiente para configurar natureza bancária ao contrato. Esta decorre da indispensabilidade da participação do banco na relação contratual. São bancários aqueles contratos que somente podem ser praticados com um banco, ou seja, aqueles que configurariam infração à lei caso fossem praticados com pessoa física ou jurídica não autorizada a funcionar como instituição financeira.

2 – CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS BANCÁRIOS

As operações bancárias são costumeiramente divididas pela doutrina em típicas e atípicas. São típicas as relacionadas com o crédito e atípicas as prestações de serviços acessórios aos clientes, como a locação de cofres ou a custódia de valores.

As operações típicas, por sua vez, se subdividem em passivas (em que o banco assume a posição de devedor da obrigação principal) e ativas (em que o banco assume a posição de credor da obrigação principal).

Os contratos típicos (de crédito) podem ser classificados em públicos ou privados. Os últimos, segundo lições de Sergio de Carlos Covello (apud DALLAGNOL: 2002), ainda se dividem em:

“a) individual, ou pessoal, quando concedido a certas pessoas que, embora não tenham grande patrimônio, têm condições de honrar o compromisso pela estabilidade da profissão, fazendo o banco uma avaliação da confiança que pode ter no indivíduo com seu "levantamento cadastral", sendo não raro este crédito (contrato de crédito, na verdade) um crédito de consumo, destinado à aquisição de bens e serviços;

b) comercial, que visa a estimular o comércio, produção e venda de bens;

c) industrial, que não difere do comercial, mas é de longo prazo normalmente, fornecido por bancos de investimentos;

d) agrícola, modalidade importante, que estimula a agricultura;

e) marítimo, estimulando a construção naval e compra e venda de navios

Atípicos - os que concentram seus objetivos para a prestação de serviços.

c) Mistos - são os que envolvem operações de créditos e de serviços.

Duas espécies de obrigações costumam permear os contratos dos bancos múltiplos: de dar e de fazer. Os contratos típicos, isto é, de crédito, armam-se em estabelecer obrigações de dar dinheiro (moeda). Já os contratos atípicos, isto é, de mera prestação de serviços, contêm obrigação de fazer que vincula o banco. E nos contratos mistos, que envolvem créditos e serviços, como intermediação bancária no pagamento (pagamento e cobrança), intermediação bancária na emissão e venda de valores mobiliários, e no crédito documentário, assume o banco obrigações de fazer (prestação de serviço no recebimento e/ou pagamento de terceiro), as quais têm inerentes obrigações de dar, sendo a obrigação primeira e principal a de fazer.


3 – Características dos contratos bancários

Principais características do contrato bancário são as seguintes:

a) comutatividade;

b) adesividade;

c) formais;

d) sigiloso;

e) ser instrumento de crédito;

f) submete-se a um sistema rígido de contabilidade;

g) tem complexidade estrutural;

h) tem caráter profissional e comercial;

i) é informal;

j) é de massa;

k) recebe interpretação específica.

3.1 Instrumento de Crédito

O contrato bancário é instrumento de operação de crédito. O contrato bancário, em sua grande maioria, é de crédito, e daí assume várias outras características, decorrentes desta, apontadas por Covello: 1) envolve confiança, pois de um lado o banco averigua a vida do cliente, e de outro deve haver rígido controle do Poder Público sobre a instituição financeira, vindo esta a inspirar a confiança da coletividade; 2) envolve prazo, que é o tempo que medeia prestação e contraprestação (esta é diferida, e não imediata); 3) envolve juro ou interesse, que é o preço de cada unidade de tempo em que se dilata o pagamento de um crédito; 4) envolve risco, inseparável da operação de crédito, seja risco particular (relativo a uma pessoa ou operação), geral (relativo a acontecimentos gerais que envolvem toda a nação ou até várias nações) ou corporativo ou profissional (relativo a um setor, uma classe ou uma profissão qualquer);

 3.2 Rígida Contabilidade

     O contrato bancário exige rígida contabilidade. Todos os contratos bancários, em função de em sua maioria lidarem com o crédito, são contabilizados rigorosamente, o que permite o controle da atividade bancária. A rígida contabilidade caracteriza a contabilização de todos os valores que entram e saem do banco, com a escrituração, de modo a não permitir margem de dúvidas quanto ao seu montante, vencimento, encargos inerentes e extinção de uma dívida.

Os assentos de contabilidade são anotações que permitem comprovação imediata da operação realizada, porque os contratos bancários não podem ficar restritos aos esquemas seguidos nas matérias civis e comerciais. Essas anotações possuem valor probatório indiscutível, dada a minuciosa contabilidade bancária e a provável imparcialidade.

3.3 Complexidade Estrutural e Busca de Simplificação

O contrato bancário revela uma complexidade estrutural e busca simplificação. A complexidade é, para Rizzardo, "[...] outra nota das operações bancárias, em razão do surgimento constante de novas relações econômicas entre o banco e os usuários, exigindo operações cada vez mais sofisticadas e complexas, não apenas no sentido de atualizar a escrituração, mas de acompanhar as contínuas modificações que ocorrem no mundo dos negócios."

Devido a esta complexidade grande, e a serem realizados em grande escala (em massa), coloca-se a busca por uma simplificação dessas operações, despontando isto também como característica. É neste sentido que se adotam documentos e títulos de crédito pelos quais se substitui o controle de uma situação jurídica material pelo de uma situação jurídica meramente formal.

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3.4 Profissionalidade e Comercialidade

          O contrato bancário é realizado com profissionalidade e comercialidade. Na profissionalidade o banco exerce tais contratos como profissão. E mais, é atividade comercial sendo tais contratos atos de comércio, até por cominação de lei. Sua atividade envolve intermediação, habitualidade e lucro. Esta característica permite a aplicação das normas comerciais em derrogação parcial das civis.

3.5 Informalidade

No que diz respeito a forma do contrato prevalece a informalidade.

Sabe-se que normalmente não se exige que a forma integre necessariamente a substância do ato. É o que afirma Dornelles da Luz. Para este, "Aliás, a informalidade crescente dos contratos do mercado financeiro é uma característica da atualidade, a maior parte dos quais materializam-se em fichas gráficas. A informatização e o uso do telefone têm propiciado movimentação de contas, aplicações em papéis .A agilidade do mercado financeiro e o alto grau de concorrência têm produzido essa inovação."

Arnoldo Wald afirma que o Direito Bancário contemporâneo tem por características a padronização, utilização da informática e formalismo. Mas utiliza o termo "formalismo" no sentido de "fôrmas", pois os contratos bancários são realizados padronizadamente, sendo contratos de adesão. Ressalta que os mecanismos utilizados são "rápidos, simples e seguros", destacando o importante papel que os computadores têm realizado ultimamente.

3.6 Sigilo

Ao celebrar um contrato com um banco, parte-se do pressuposto de que o cliente deposita verdadeira confiança na instituição, acreditando, entre outros termos, em que o banco guardará com sigilo todas as suas operações bancárias. Neste diapasão o artigo 1° da Lei Complementar n° 105, de 10 de janeiro de 2001, ao dispor que “As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados”. O sigilo pode ser quebrado apenas em casos excepcionais, tais como por ordem do Poder Judiciário ou por solicitação de Comissão Parlamentar de Inquérito.

3.7 Contrato de Massa

         O contrato bancário é realizado em massa. O banco realiza operações em massa, a um grande número de clientes indistintamente. São milhares de contratos firmados diariamente, o que gera uma padronização do contrato, passando a ser produzidos em série, para uma sociedade de consumo que cada vez mais faz uso das operações creditícias.

3.8 Contrato de Adesão

Um bom mecanismo definidor do contrato de adesão é que seu justo oposto, ou seja, é o contrato paritário onde as partes contraentes por estarem em iguais condições de negociação, estabelecem livremente as cláusulas contratuais, na fase de pontuação.
     Já contrato de adesão é aquele onde um dos pactuantes predetermina (ou seja, impõe) as cláusulas do negócio jurídico ao outro contratante.
     O vigente CDC (Lei 8.078/90) em seu art. 54, traz previsão específica que pode ser invocada também por analogia para as demais relações civis.
       A denominação de contrato de adesão surgiu com Saleilles, quando elaborou estudo sobre a parte geral do Código Civil alemão (BGB). Ganhou rápida aceitação aqui e no exterior, não obstante os críticos sobre a denominação do contrato. Pois a expressão contrato de adesão seria restrita ao Poder Público não englobando as estipulações particulares, que deveriam receber a denominação de contrato por adesão.
     O contrato de adesão é fenômeno típico das sociedades de consumo e da necessidade de contratação em massa. E o culto professor Pablo Stolze destaca in verbis: “O homem contratante acabou, no final do século passado e início do presente, por se deparar com uma situação inusitada, qual seja a da despersonalização das relações contratuais em função de uma preponderante manifestação voltada ao escoamento em larga escala do que se produzia nas recém-criadas indústrias”.
     A massificação dos contratos redundou num negócio jurídico standardizado, documentado em um simples formulário, em que a uma parte (a mais fraca) cabe apenas aderir ou não à vontade da outra parte (a mais forte), sem qualquer possibilidade de discussão do conteúdo contratual.
     Com o contrato de adesão o princípio de igualdade formal até então considerado como bastião absoluto, se relativiza tanto que quase desaparece! No contrato de adesão, a faculdade de aderência é a última trincheira da bilateralidade negocial, visto que em regra geral, a parte adversa criadora e arquiteta-mor da moldura contratual, detém quase sempre avassalador poder econômico ou mesmo o monopólio de um serviço considerado essencial.
     O contrato de adesão se inspirado pelo princípio da função social do contrato e, pactuado em atenção ao princípio constitucional de respeito à dignidade da pessoa humana, é sem dúvida, um instrumento socialmente necessário e economicamente útil, além de ser mais célere para pactuação.
      Apesar de ser de difícil definição, o contrato de adesão ensina o magistral Orlando Gomes que apesar da enorme controvérsia sobre seu traço distintivo, é possível identificar seis pontos de identificação, a saber:
1. uma oferta a uma coletividade;
2. uma obra exclusiva de uma das partes;
3. por ter regulamentação complexa;
4. preponderante posição de uma das partes (a ofertante);
5. não admitir a discussão da proposta.
6. instrumento próprio da prestação dos serviços privados de utilidade pública.
    Predomina o interesse da doutrina em apontar um traço que permita reconhecer o contrato de adesão, procurando descrevê-lo. .É salutar salientar que o contrato de adesão não é categoria contratual autônoma nem tipo contratual, mas somente técnica de formação de contrato, que é aplicável em qualquer categoria de contrato sempre que desejada a rapidez na conclusão do mesmo, exigência da economia em série e em larga escala.
     São praticáveis os contratos de adesão quando os interesses em jogo permitem, e impõem a pluralidade de situações uniformes, de modo que sob esse aspecto, é com efeito, uma oferta feita à coletividade.
    A uniformização das cláusulas negociais elimina a possibilidade de qualquer debate sobre a proposta, criando assim para o oblato o dilema de aceitá-lo in totum, ou rejeitá-lo sumariamente.
    A possibilidade de predeterminação do conteúdo da relação contratual negocial pelo sujeito de direito que faz a oferta ao público. Com amparo no grande mestre baiano Orlando Gomes, podemos ainda sintetizar quatro grandes traços identificadores dos contratos de adesão, diríamos jocosamente que seria o “DNA do contrato de adesão”:
a) uniformidade do conteúdo contratual com o fito de obter o maior número que possível de contratantes; aduzindo racionalidade, segurança e rapidez nas relações contratuais;
b) predeterminação unilateral das cláusulas, sem anterior discussão sobre a proposta;
      Além dessa uniformidade clausular tão-somente, não lhe imprime a essência de ser de adesão, é imprescindível que tais cláusulas uniformes sejam também unilateralmente impostas apenas por um dos contratantes ao outro.
c) a rigidez do teor contratual é sua pièceduresistance;
d) a posição de vantagem do proponente que traduz uma superioridade material de uma parte, superioridade econômica (que é a expressão mais utilizada pelos doutrinadores), pois é uma desigualdade fática que faz com que uma das partes possa ditar normas aos interessados no exercício da autonomia privada;
    O contrato de adesão, por essa razão, revela sua característica limitadora de liberdade contratual, pelo menos dentro da concepção clássica de contrato, por isso mesmo, a interpretação desse contrato, se faz de forma diferenciada dos demais, em particular das avenças paritárias. Pois se interpreta os contratos de adesão, em prol do aderente a fim de numa ultima ratio restaurar a igualdade formal entre os contratantes.
      Deve-se ainda, diferenciar com nitidez o contrato de adesão do contrato-tipo, também chamado de contrato de massa, em série ou por formulários. Apesar de bem similar ao contrato de adesão, por apresentar também cláusulas predispostas, é estruturalmente diverso pela inexistência da imposição unilateral de seu conteúdo, permitindo a discussão sobre seu conteúdo.
     Por fim, é relevante discernir a concepção de contrato de adesão da obrigatoriedade de contratação. Um dos clássicos princípios do Direito Civil é a liberdade de contratar, a faculdade de realizar ou não um contrato. Mas a intervenção estatal na seara contratual privada que há doutrinadores que classificam alguns contratos como obrigatórios ou simplesmente necessários.
     O contrato por adesão é regido pelo princípio da legitimidade controladora que se manifesta na exegese das cláusulas dúbias ou obscuras que são sempre interpretadas contra quem as estipulou conforme prevê o art. 423 do Código Civil, e, no controle direto do conteúdo, em face da nulidade das cláusulas que contiverem renúncia antecipada do aderente a algum direito oriundo da natureza contratual conforme prevê o art. 424 do Código Civil de 2002.
Já o contrato de adesão corresponde à concretização dessas cláusulas contratuais gerais, que enquanto não aceitas de forma unânime pelo aderente são abstratas e estáticas e,e, portanto,m não se configuram ainda como contrato. Assim, com o aceite adesivo do oblato, as cláusulas gerais de contratação transmutam-se em contrato de adesão ganhando dinamismo e realidade.
     Por fim, é curial distinguir a concepção do contrato de adesão da obrigatoriedade de contratação. Como observa Arnoldo Wald, apesar de ser um dos clássicos princípios. a liberdade de contratar, a intervenção estatal é tão acentuada que há quem já classifique alguns contratos como obrigatórios. É o que ocorre com o seguro obrigatório para veículos automotores. De fato, a única liberdade é de escolher a companhia seguradora e, as vezes, nem isso pois a parte mais forte quem a indica.

3.9 Interpretação Específica

O contrato bancário se submete a específica interpretação contratual, materialmente isonômica. Em função de o contrato bancário ter natureza de contrato de adesão, as regras gerais de interpretação dos contratos civis e comerciais se tornam insuficientes, vindo a doutrina em socorro colmatar tal lacuna. Embora esta não seja propriamente uma característica intrínseca, é uma projeção do caráter adesivo do contrato bancário, dizendo respeito à sua leitura, à sua própria visualização, sendo conveniente tal análise neste momento.

O Código Civil estabelece no art. 85 que "Nas declarações de vontade, atender-se-á mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem." O Código Comercial traz, no art. 130 um princípio hermenêutico: "As palavras dos contratos e convenções mercantis devem inteiramente entender-se segundo o costume e uso recebido no comércio, e pelo mesmo modo e sentido por que os negociantes costumam explicar, posto que entendidas de outra sorte possam significar coisa diversa." E o Código Comercial ditou várias regras interpretativas das cláusulas contratuais no art. 131:

Sendo necessário interpretar as cláusulas do contrato, a interpretação, além das regras sobreditas, será regulada sobre as seguintes bases: 1. a inteligência simples e adequada, que for mais conforme à boa fé e ao verdadeiro espírito e natureza do contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e restrita significação das palavras; 2. as cláusulas duvidosas serão entendidas pelas que o não forem, e que as partes tiverem admitido; e as antecedentes e subseqüentes, que estiverem em harmonia, explicarão as ambíguas; 3. o fato dos contraentes posterior ao contrato, que não tiver relação com o objeto principal, será a melhor explicação da vontade que as partes tiveram no ato da celebração do mesmo contrato; 4. o uso e a prática geralmente observada no comércio nos casos da mesma natureza, e especialmente o costume do lugar onde o contrato deva ter execução, prevalecerá a qualquer inteligência em contrário que se pretenda dar às palavras; 5. nos casos duvidosos, que não possam resolver-se segundo as bases estabelecidas, decidir-se-á em favor do devedor.

A doutrina também elaborou normas interpretativas para se atingir a vontade real das partes contratantes, tendo notabilizado-se as regras de Pothier.  Mas os contratos de adesão, em virtude de suas particularidades, merecem regras interpretativas específicas. Regras interpretativas legais específicas dos contratos de adesão são estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor, entre os arts. 51 e 54, mas embora se dirijam a contratos de adesão, se aplicam quando se configurar relação de consumo (a aplicação do CDC às operações bancárias será posteriormente analisada). As regras vexatórias ou de especial gravidade são nulas, e as duvidosas se interpretam em favor do aderente.

Estabelece a doutrina também regras de interpretação dos contratos de adesão, e por conseguinte dos contratos bancários. Ressalta Covello que se deve buscar a vontade comum das partes contratantes, através das regras propostas por Orlando Gomes, as quais se inspiram em uma ética cristalizada juridicamente em princípios como os da boa-fé e da confiança e lealdade recíprocas:

O professor Orlando Gomes, após enfatizar que o juiz não deve verificar a vontade das partes à luz dos critérios mais usados no plano da concepção voluntarista do negócio jurídico e sim de conceitos flexíveis que lhe abram horizonte mais dilatado no sentido de evitar abusos por parte do estipulante, refere as seguintes regras: a) interpretação contra o estipulante; b) interpretação restritiva das regras que favoreçam o predisponente; c) prevalecimento das cláusulas especiais sobre as gerais, das manuscritas sobre as impressas; d) interpretação invariável das cláusulas gerais, sem se atentar para aspectos particulares de cada caso concreto.

4 – ALGUMAS JURISPRUDENCIAS SUMULADAS PELO STJ

Súmula 288 - A Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) pode ser utilizada como indedador de correção monetária nos contratos bancários. (Obs. - “Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP foi instituída pela Medida Provisória nº 684, de 31.10.94, publicada no Diário Oficial da União em 03.11.94, sendo definida como o custo básico dos financiamentos concedidos pelo BNDES. Posteriores alterações ocorreram através das Medida Provisória nº 1.790, de 29.12.98 e da Medida Provisória nº 1.921, de 30.09.99, convertida na lei nº 10.183 de 12.02.2001. A Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP tem período de vigência de um trimestre-calendário e é calculada a partir dos seguintes parâmetros:
I - meta de inflação calculada pro rata para os doze meses seguintes ao primeiro mês de vigência da taxa, inclusive, baseada nas metas anuais fixadas pelo Conselho Monetário Nacional;
II - prêmio de risco. A TJLP é fixada pelo Conselho Monetário Nacional e divulgada até o último dia útil do trimestre imediatamente anterior ao de sua vigência. Em moedas contratuais, a TJLP, expressa em percentual ao ano, tem o código 311”). (Obs. Fundamentação da súmula: A TJLP possui as mesmas características da TR não sendo possível vedar a sua cobrança quando pactuada - Resp 337.957. Os princípios informadores da TR e da TJLP são, basicamente, os mesmos).

Súmula 287 - A Taxa Básica Financeira (TBF) nãopode ser utilizada como indexador de correção monetária nos contratos bancários. (OBS. T B F - “Sigla para Taxa Básica Financeira. Criada pelo Banco Central em junho/95 com o objetivo de alongar o perfil das aplicações em títulos com uma taxa de juros de remuneração superior à TR - Taxa Referencial. A TBF é utilizada exclusivamente como base de remuneração de operações realizadas no mercado financeiro, de prazo de duração igual ou superior a 60 dias. Sua metodologia de cálculo é idêntica à da TR, com a diferença fundamental de que não se aplica nela o redutor. Está baseada na amostra estatística das 30 maiores instituições financeiras escolhida em função do volume de captação de depósitos a prazo (Certificados de Depósitos Bancários - CDB e Recibos de Depósitos Bancários - RDB prefixados com prazos variando de 30 a 35 dias). Diariamente, para cada uma das instituições financeiras da Amostra, é calculada a Taxa média ponderada em valor da seguinte forma: - Multiplica-se a taxa de cada CDB/RDB emitido pelo seu valor de emissão;  - Soma-se todos os produtos anteriormente obtidos; - Divide-se o resultado pela soma de todos os valores de emissão; e  - O resultado é a taxa média ponderada em valor dos depósitos a prazo da instituição. Para compor uma amostra final mais ajustada do ponto de vista estatístico, do conjunto das 30 instituições da amostra inicial acima referida, o BACEN retira as duas instituições cm as menores taxas médias ponderadas e as duas maiores taxas. Assim, a TBF é uma taxa diária representativa da média ponderada em valor, ajustada, dos CDB/RDB emitidos pelas instituições mais ativas do mercado financeiro do país. A base de cálculo é o dia de referência, sendo calculada no dia útil imediatamente posterior. O prazo mínimo das operações ativas e passivas do mercado financeiro com remuneração pela TBF foi fixado a partir de 01/08/99, como sendo de 2 meses. Legislação básica: Medida Provisória 1053, de 30/06/95; Resoluções CMN 2171 e 2172, de 30/06/95 e 2437, de 30/10/97; Circulares do BACEN 2587, de 30/06/95 e 2588, de 05/07/95”) .

Súmula 286 - A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores.

Súmula 285 - Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do Consumidor incide a multa nele prevista.

Súmula 295 - A Taxa Referencial (TR) é indexador válido para contratos posteriores à Lei n. 8.177/91, desde que pactuada.

Súmula 296 - Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.

Súmula 297 - O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições Financeiras .

Súmula 298 - O alongamento de dívida originada de crédito rural não constitui faculdade da instituição financeira, mas, direito do devedor nos termos da lei.

Súmula 299 - É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito.

Súmula 300 - O instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial.

Súmula 322 - Para a repetição de indébito, nos contratos de abertura de crédito em conta-corrente, não se exige a prova do erro.


4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora a vontade seja essencial para a existência de um contrato bancário, outros princípios devem ser rigorosamente satisfeitos para a legitimidade do pacto.

Aludidos princípios, que coexistem juntamente com o da autonomia da vontade, estão presentes no Código de Defesa do Consumidor e no Código Civil, regendo os negócios jurídicos bancários seja nas relações de consumo, seja nas relações civis e/ou comerciais.

Pelo princípio da boa-fé, acentuadamente o banco, que é quem detém o monopólio da vontade, deve agir com boa-fé, objetiva ou subjetiva, com todos os deveres que a ela são inerentes, tais como a confiança, a lealdade, a fidelidade, o cuidado, a cooperação, a correção, a segurança e a informação. Referidos deveres devem ser rigorosamente obedecidos pré e pós-contratualmente.

Vontade sem boa-fé é nula, não gerando efeitos que sejam reconhecidos pelo ordenamento jurídico pátrio, não mais se contemplando a idéia de intangibilidade do contrato, que tantas vezes serviu à injustiça.

Já o princípio da transparência traz inúmeros deveres a serem observados pelo banco. Este deverá informar seus serviços no mercado de consumo com clareza e correção, bem como deverá ser leal à sua oferta e ao contrato. A instituição financeira não pode valer-se meramente do princípio da autonomia da vontade, uma vez que este está orientado pelo princípio da transparência, que conclama todos os deveres a que a vontade está sujeita.

Sob o primado desse princípio, a oferta feita pela instituição financeira integrará o conteúdo do contrato, mesmo que este não o faça, não podendo o banco socorrer-se da mera vontade contida no instrumento. Ademais, a publicidade não pode ser enganosa ou abusiva.

Ainda, caso o cliente não tenha tido conhecimento prévio das cláusulas contratuais, estas não o obrigarão, mesmo que ele tenha firmado o contrato, já que houve violação ao dever de informar, que é inerente ao princípio da transparência. E, também, se as cláusulas forem obscuras, de difícil compreensão, a mesma sorte terá o negócio: não obrigará o tomador de serviços, pois, embora tenha havido um mínimo de vontade, esta foi viciada pelo desrespeito ao princípio da transparência.

Já pelo princípio da confiança, o banco deve prestar um serviço de qualidade, consumando as legítimas expectativas que foram geradas no tomador de serviços. O serviço bancário deve atingir a finalidade que dele razoavelmente se espera, deve obedecer às exigências regulamentares e deve ser igual às condições previstas na oferta ou mensagem publicitária. Quaisquer cláusulas contratuais que firam essas exigências, consolidadas no princípio da confiança, são nulas.

Se o serviço prestado não for de qualidade, o tomador de serviços pode exigir a reexecução dos serviços, sem custo adicional; ou o ressarcimento da quantia paga monetariamente atualizada, com as eventuais perdas e danos; ou a diminuição proporcional do preço, de acordo com o vício demonstrado. Ademais, o cliente pode pedir a execução dos serviços indicados na oferta ou mensagem publicitária. Todas as cláusulas que visem a subtrair esses direitos dos consumidores serão nulas, não se podendo invocar o princípio da autonomia da vontade para conferir-lhes legalidade.

Pelo princípio da eqüidade, o contrato bancário deve conter apenas cláusulas que estabeleçam obrigações equivalentes, sendo vedadas as prestações desproporcionais, ainda que pactuadas, já que tal princípio não admite revogação pela mera vontade das partes.

Ainda pelo princípio da eqüidade, as cláusulas contratuais serão interpretadas de modo mais favorável ao tomador de serviços bancários.

Por fim, mesmo que as cláusulas contratuais desproporcionadas tenham sido redigidas de maneira inconsciente pelo banco, as mesmas deverão sujeitar-se à revisão judicial, já que o princípio da eqüidade é cogente, não admitindo convenção que lhe seja contrário.

De outra vista, o Código Civil também trouxe deveres semelhantes aos já consolidados no Código de Defesa do Consumidor. Assim, positivou-se naquele código a função social dos contratos, a probidade e boa-fé, bem como a interpretação mais favorável ao tomador de serviços bancários.

Nesse norte, sendo certo que a autonomia da vontade tem aptidão para gerar um contrato, o qual obrigará, em regra, as partes, não menos certo é o seu exercício em razão e nos limites da função social do contrato, o que é uma norma de ordem pública e de interesse social, conforme preleciona o artigo 2.035, parágrafo único, do Código Civil.

E também no Código Civil a vontade do banco, a qual se manifesta quase que de maneira unilateral, é orientada pelo princípio da boa-fé, o qual age desde o nascimento do negócio jurídico até o seu fim, sendo que o referido princípio está intrinsecamente ligado ao dever de probidade, já que uma conduta de boa-fé é uma conduta proba, honesta e leal.

A vontade que não se harmonize com a boa-fé é inválida.

Na interpretação do contrato bancário, o magistrado deverá analisar se as cláusulas contratuais compatibilizam-se com o princípio da boa-fé. Não havendo a aludida compatibilização, o magistrado deverá invalidar as cláusulas maculadas, não tendo a simplesmanifestação de vontade a aptidão para legalizá-las.

REFERÊNCIAS

DE MELO, Marco Aurélio Bezerra. Novo Código Civil Anotado, volume III, 2003, Rio de Janeiro, Editora Lúmen Juris.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 3, 21ª edição, revista e atualizada, 2005, São Paulo, Saraiva.

GAGLIANO, Pablo Stolze et Rodolfo Pamplona Filho. Novo curso de direito civil, volume IV, 2005, São Paulo, Saraiva.
GOMES, Luiz Roldão de Freitas. Ricardo Pereira Lira (coordenador), Curso de Direito Civil, 1999, Rio de Janeiro, Renovar.

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