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Desamor como causa de separação judicial

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Agenda 12/09/2003 às 00:00

CONCLUSÃO.

Analisando as causas objetivas da separação judicial, verifica-se que o desamor está presente em todas elas, extrapolando o âmbito do descumprimento da assistência mútua imaterial. É uma causa subjetiva que permeia a normatização dos deveres. Sendo assim, por que tutelar, elencar, todos esses deveres? E mais, sendo o desamor da ordem da subjetividade, como apontar um culpado? Nenhum relacionamento afetivo acaba do nada, ou por nada, ambos os cônjuges contribuem para o seu fim, por ato ou omissão, e nesse contexto, onde reside o princípio da culpa?

Nesse raciocínio critica-se, ardorosamente, a persistência no ordenamento jurídico em manter, a título de punição, a culpa. Se o Estado não alcança o objetivo máximo que pretende ao tutelar o amor, qual seja a preservação do casamento, haja vista que o descumprimento de um dever não obriga a sê-lo cumprido por vias judiciais, como pode o Estado julgar uma relação vivenciada apenas por um casal, atribuindo a pecha de culpa, se desse relacionamento nada presidiu?

Começa-se a pensar que o extremismo dos inovadores juristas do Rio Grande do Sul, de questionar a necessidade do Estado de impor deveres matrimoniais não está totalmente descabido, desamparado. É um corolário da subjetividade: desamor – o fim da culpa – por que o dever imposto?

As questões subjetivas, de afeto e amor, não cabem ao Judiciário. Na separação, o papel do Estado deve se restringir ao plano patrimonial e na preservação dos interesses dos filhos dos separandos. O positivismo exacerbado do ordenamento jurídico brasileiro prevê inúmeras soluções para todas as hipóteses da vida legal. A lei tudo prevê e tudo dispõe, tornando-se uma fonte de instabilidade que engessa o Direito de Família e tolhe os princípios constitucionais no que tange à liberdade e dignidade humana. O fato de se estatizar a relação entre o homem a mulher, na constância casamento, não gera o adimplemento dos deveres dos casamentos descumpridos.

Contudo, se o Direito se atém às causas para possibilitar a separação, que seja o desamor reconhecido na infração do dever de assistência mútua. Tendo em vista essa realidade jurídica, critica-se a necessidade do cônjuge desistente (ou seja, aquele que não mais ama), para exercer seu direito de personalidade à liberdade, de alegar sua própria torpeza para fazer valer sua vontade de se separar.

Não se pretende, com esse trabalho, concluir uma solução efetiva e arrojada, pois nem mesmo o novo Código Civil o prevê. Nas palavras de Caio Mário da Silva Pereira, ilustre doutrinador tantas vezes citado neste trabalho [64]:

o texto consolidado, que nos foi dado conhecer, pela muita timidez que revela, reflete nítido divórcio em relação ao progresso da sociedade, em troca do comodismo das soluções passadistas.

O que se quer é demonstrar uma preocupação com o respaldo da realidade subjetiva nas relações afetivas e que permeia o direito de Família, e toda a contradição que ela provoca nessa seara; atentando para a necessidade primeira de seu reconhecimento para que os cônjuges tenham assegurado os princípios ditados pela Constituição Federal, enquanto cidadãos.


NOTAS

01. José Carlos Moreira Alves. Direito Romano. Vol.II.6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p.282.

02. " Nuptiae autem sive matrimonium est viri et mulieres coniunctio individuam vitae consuetudinem continens". In José Carlos Moreira Alves, op. cit., p.282.

03. Lafayette, in Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 33.

04. Clovis Bevilaqua. Direito de Família.Campinas: Red Livros, 2001.

05. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. V. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 33.

06. Maria Helena Diniz, op. cit., p. 15.

07. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil, apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 278.

08. GOMES, Orlando. Direito de Família, apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 278.

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09. Arnaldo Rizzardo, in Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p.282.

10. Divórcio e Separação. 9ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 79.

11. Orlando Gomes, op. cit., p. 212.

12. Pedro Sampaio, in Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 284.

13. Orlando Gomes, op. cit., p. 216.

14. Arnaldo Rizzardo, op. cit., p. 296.

15. Yussef Said Cahali, in A causa petendi nas ações de separação judicial e de dissolução da união estável. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 63.

16. A causa petendi nas ações de separação judicial e de dissolução da união estável. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 65.

17. Op. cit., p. 215.

18. Curso de Direito Civil. Vol. 2. 15ªed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 208.

19. Levenhagen. Do casamento ao divórcio, apud CAHALI, Yussef Said. Divórcio e Separação. 9ª ed. São Paulo: revista dos Tribunais, 2000, p. 320.

20. Repertótio de Jurisprudência e Doutrina sobre Direito de Família. Aspectos constitucionais, civis e processuais. Vol 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 230.

21. Yussef Said Cahali, op. cit., p. 394.

22. VEIGA, Manuel Messias. Do divórcio e sua prática forense,apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família Contemporâneo.Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 350.

23. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, op. cit., p. 247.

24. In Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 355

25. Repertório de Jurisprudência e Doutrina sobre Direito de Família. Aspectos constitucionais, civis e processuais. Vol 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 236.

26. Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira. O Direito de Família e o Novo Código Civil. Ed. Única. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 66.

27. Repertório de Doutrina sobre Direito de Família. Vol 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 323.

28. Maria Berenice Dias. Separação litigiosa, na esquina do Direito com a Psicanálise in Revista Brasileira de Direito de Família. Nº 3. Doutrina. Porto Alegre: Síntese. Out-Nov-Dez/ 1999.

29. Repensando o Direito de Família. Anais do I Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 202.

30. Repertório de Doutrina sobre Direito de Família. Vol. 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 331.

31. Maria Berenice Dias in Direito de Família e o Novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 70.

32. Bem critica Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos ao mencionar que "respeito e consideração são vocábulos sinônimos, de estima, deferência ou importância dada a alguém, sentimentos devidamente resguardados pelo dever de assistência mútua imaterial. A lei deve evitar redundâncias para que não se tornar impreciso". Op. cit., p. 248.

33. Op. cit., p. 249.

34. Luiz Edson Fachin, in Direito de Família e o Novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 71.

35. Repertório de Doutrina sobre Direito de Família. Vol. 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 328.

36. Existe amante virtual? A pergunta que não quer calar! In http://www.ocaixote.com.br/caixote07/06_artigos_alexandre.htm

37. Rodrigo da Cunha Pereira. In Repertório de Doutrina sobre Direito de Família. Vol. 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 338.

38. Rolf Madaleno in Repertório de Doutrina sobre Direito de Família. Vol. IV. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 333.

39. Maria Berenice Dias. Separação: culpa ou só desamor? In http://www.mariaberenicedias.com.br.

40. Repensando o Direito de Família, in http://www.gontijo-familia.adv.br/escritorio/outros60.html

41. RAMOS, J. Saulo.Divórcio à brasileira, apud RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 1997. p. 301.

42. José Carlos Moreira Alves, op. cit., p. 317.

43. "É possível – segundo a opinião dominante – que várias fontes romanas salientem que o primeiro divórcio ocorrido em Roma foi o de Spúrio Carvílio Ruga, ocorrido mais de quinhentos anos após a fundação da cidade, em virtude do fato de que teria sido esse o primeiro divórcio cuja causa – esterilidade da mulher – não fora até então reconhecida pelos costumes". Idem, p. 318.

44. Antonio Cesar Peluso. O desamor como causa de separação e divórcio. In http://www.gontijo-familia.adv.br/escritorio/outros/html

45. César augusto de Castro Fiúza. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.35

46. Rodrigo da Cunha Pereira. In A família na travessia do milênio. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, p. 58.

47. Novos Temas do Direito Civil. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 170.

48. Maria Berenice Dias. A estatização do afeto in http//:www.mariaberenicedias.com.br

49. João Baptista Villela. Repensando o Direito de Família, in

http://www.gontijo-familia.adv.br/escritorio/outros60.html

50. César augusto de Castro Fiúza, op. cit., p.37.

51. Rodrigo da Cunha Pereira. In A família na travessia do milênio. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.56.

52. Maria Antonieta Pisano Motta. In A família na travessia do milênio. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p.42.

53. Jones Figuêredo Alves.Psicologia aplicada ao Direito de Família. In http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=2740

54. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos,op. cit., p. 237.

55. Op. cit., p. 365.

56. Henri de Page in Repertório de jurisprudência e doutrina sobre Direito de Família. Vol 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 238.

57. Maria Helena Diniz, op. cit., p. 19.

58. Divórcio e Separação. 9ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 392.

59. Instituições de Direito Civil. Vol. V. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 162.

60. A dignidade da pessoa humana e a adequação do Livro Ivdo Projeto de Código Civil a esse princípio fundamental de direito Constitucional e de Direito de Família. in http//:www.intelligentiajuridica.com.Br/artigos/artigo1-oldfev2001.html

61. Regina Beatriz Papa Tavares da Silva Papa dos Santos. A dignidade da pessoa humana e a adequação do Livro Ivdo Projeto de Código Civil a esse princípio fundamental de direito Constitucional e de Direito de Família. in http//:www.intelligentiajuridica.com.Br/artigos/artigo1-oldfev2001.html

62. Curso de Direito Constitucional Positivo. 17ªed., São Paulo: Melhoramentos, 2000, p.236.

63. Existe amante virtual? A pergunta que não quer calar! http://www.ocaixote.com.br/caixote07/06_artigos_alexandre.htm

64. In Direito de Família e o novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. V.


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Sobre a autora
Renata Flavia Maimone Rezende

acadêmica de Direito na PUC Minas, Campus de Poços de Caldas (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REZENDE, Renata Flavia Maimone. Desamor como causa de separação judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 71, 12 set. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4238. Acesso em: 23 nov. 2024.

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