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Contracheque de ativo x contracheque de inativo: o que o sobra na aposentadoria do servidor?

Agenda 13/07/2016 às 15:28

Com as constantes mudanças da regras de aposentadoria do servidor público, há diversas parcelas que fazem diferença no valor total do contracheque do inativo em frente ao do ativo.

Chegou o momento de se aposentar. A ansiedade e a angústia, infelizmente, são os sentimentos que predominam nesta época. Há diversos servidores que já se aposentaram e estão muito insatisfeitos com os proventos. Basta comparar o seu contracheque de ativo com o de inativo. Perde-se muito com a aposentadoria. É fato que a renda cai bastante. A cada reforma que se planta, mais intranquilidade se colhe.     

Por esta razão, o tema aqui proposto é extremamente importante e, cada vez mais, de imenso interesse dos servidores públicos.

Evidentemente, cada ente federativo remunera seus servidores de forma diferente. Por lei, são criadas parcelas remuneratórias das mais diversas ordens que, juntas, compõem a remuneração do servidor público. Cada ente possui peculiaridades e normas próprias, que contemplam vencimentos, gratificações e adicionais típicas de cada carreira e cargos.

Entretanto, no que pese a existência de diversas formas de composição remuneratória, há alguns traços característicos estabelecidos na lei e na construção doutrinária e jurisprudencial que são comuns e gerais, possibilitando uma adequada análise uniforme, independente do ente federativo a que se refira.

Neste contexto, a nomenclatura da parcela remuneratória é o que menos importa. O que realmente importa e é a chave para solucionar a problemática apresentada, é saber encontrar e entender a natureza jurídica de cada parcela. Eis o ponto nevrálgico: a natureza jurídica.

Toda parcela remuneratória, em regra, deve nascer da lei. E é a lei que a criou que deve oferecer as condições para o conhecimento e detalhamento de sua natureza jurídica.

Entretanto, é de conhecimento público que grande parte das leis que tratam do assunto são carentes de boa técnica legislativa e até mesmo de boa redação. Não raras vezes, encontramos textos confusos, contraditórios e que confrontam a Norma Maior. De fato, não é uma tarefa das mais fáceis. Saber a natureza jurídica de uma determinada parcela remuneratória é uma tarefa bem complexas e espinhosa.

E, a final de contas, qual é a importância de se saber a natureza jurídica das parcelas que compõem a remuneração do servidor no cargo efetivo? Qual a relação disso com a aposentadoria?

Ora, é a natureza jurídica que informa se determinada parcela é perene, isto é, se é uma vantagem pecuniária permanente estabelecida em lei (própria do cargo efetivo ou de caráter pessoal do servidor). Também é a natureza jurídica que informa se a parcela é precária (percebida em razão de fatos e condições que não tem relação com o cargo efetivo do servidor). Em linhas gerais, a natureza jurídica nos oferece as respostas para estes questionamentos. Inexiste uma única fórmula. Existem as diretrizes que são comuns. A natureza jurídica deve ser descortinada no caso concreto, analisando todas informações presentes, a começar da lei que criou a parcela.

Desta forma, considerando as assertivas acima apresentadas e a problemática da aposentadoria do servidor público, podemos estabelecer algumas premissas básicas:

a) em regra, a contribuição previdenciária deve recair sobre parcelas remuneratórias perenes.

b) em regra, só se contribui sobre o que se leva para a aposentadoria. Só se leva para a aposentadoria sobre o que se contribuiu. É uma via de mão dupla.

c) em regra, a remuneração do servidor ativo pode ser composta por parcelas perenes e precárias. Entretanto, seus proventos de aposentadoria devem ser compostos por parcelas perenes.

Vamos adiante.

É muito comum o servidor perceber em atividade, além de seu vencimento e gratificações próprias do cargo, determinadas parcelas que possuem natureza indenizatória, compensatória, provisória, inerentes a condições especiais de trabalho, ou vinculadas a critérios de produtividade e desempenho. Há, portanto, a percepção conjunto, no mesmo holerite, de parcelas perenes e precárias. Muitas vezes, estas mais do que aquelas. Todas, somadas, fazem parte dos vencimentos do servidor ativo. Ali está o seu padrão remuneratório atual. Dali, o servidor vive.

Na verdade, tal situação é fruto de uma política remuneratória perversa que é adotada pelos entes federativos brasileiros que preferem rechear os contracheques dos servidores de parcelas precárias que não migram para a aposentadoria, do que oferecer um real ganho remuneratório sobre as parcelas perenes que podem compor os proventos de aposentadoria.

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Desta forma, há várias verbas que orbitam no contracheque de um servidor em atividade, que estão ali pelos mais diversos motivos: a) algumas existem para compensar as condições desfavoráveis a que estão submetidos no exercício de suas funções; b) outras para remunerar funções de maior responsabilidade que tenham assumido c) outras são pagas sob a condição de se alcançar determinadas metas de produtividade ou desempenho, estabelecidas na lei. Tais parcelas, em regra não são típicas do cargo efetivo. São alienígenas, são precárias. Pagas com o objetivo de se compensar o esforço ou o rigor a que estão submetidos os servidores. Cessadas as condições fáticas que as legitimaram, cessam o seu pagamento. Destarte, o estado de inatividade é incompatível com a sua percepção. 

Tais parcelas não podem fazer parte da base de contribuição previdenciária, pois não são típicas da remuneração do cargo efetivo. A Lei nº 10.887/04, em seu art. 4º, elenca algumas dessas parcelas que não são típicas da remuneração do cargo efetivo. São elas: diárias para viagens; ajuda de custo em razão de mudança de sede; indenização de transporte; salário-família;  auxílio-alimentação; auxílio-creche; parcelas remuneratórias pagas em decorrência de local de trabalho; parcela percebida em decorrência do exercício de cargo em comissão ou de função comissionada ou gratificada; o abono de permanência; adicional de férias; adicional noturno; adicional por serviço extraordinário; parcela paga a título de assistência à saúde suplementar; a parcela paga a título de assistência pré-escolar; parcela paga a servidor público indicado para integrar conselho ou órgão deliberativo, na condição de representante do governo, de órgão ou de entidade da administração pública do qual é servidor; auxílio-moradia, etc. O servidor, embora eventualmente recebendo-as, não as leva para a aposentadoria.

Destarte, embora percebidas em atividade, sobre elas, evidentemente, não pode recair a contribuição previdenciária. Elas devem estar fora da base de cálculo sobre a qual incidirá a alíquota de contribuição previdenciária. O §2º do art. 40 da CF/88, veda que os proventos de aposentadoria excedam a remuneração do servidor no cargo efetivo. Assim, é certo que, em regra, o servidor só pode se aposentar com aquilo que faz parte de sua remuneração.

Exatamente por isso, o servidor não está obrigado a contribuir sobre parcelas que não migrarão para seus proventos de aposentadoria. Se a Administração assim proceder, estará se locupletando às custas do servidor, pois não pode prometer o que não pode cumprir. Excepcionalmente, esta exação será permitida, nos casos em que o servidor opte por fazer incidir a contribuição sobre parcelas precárias para incrementar o resultado final do cálculo da média. Mas, a regra, é a não incidência da contribuição.

Conclui-se, portanto, que o contracheque do servidor ativo é bem mais gordo do que o do inativo. Como visto acima, há parcelas que, embora presentes no holerite do servidor, não se cogita sua presença nos proventos de aposentadoria, dada sua natureza precária. Há, inclusive, situações em que as parcelas remuneratórias precárias representam 60%, 70% da totalidade dos ganhos do servidor em atividade. Percebam o quanto isso é cruel com o servidor.

E mesmo aquelas que são perenes, que são próprias do cargo, como o vencimento, eventuais quinquênios, e demais parcelas permanentes estabelecidas em lei, dependendo da regra de aposentadoria escolhida, pode resultar em uma aposentadoria cujo valor seja bem inferior ao somatório das mesmas. Há regras, por exemplo, em que o cálculo se dá pela média. Há uma, de transição, que além da média, há a previsão de aplicação de um redutor. Desta forma, contribuir sobre as parcelas perenes não lhe garante uma aposentadoria igual ao somatório destas parcelas. O valor final dos proventos resultará do cálculo da média da vida contributiva do servidor, salvo, evidentemente, se a aposentadoria se der com base em alguma regra de transição que garanta integralidade.

Como podemos ver, em certos casos, pode haver uma boa distância de valores entre o contracheque de ativo e o de inativo de um mesmo servidor público.

E como se não bastasse o que foi apresentado até agora, com a aposentadoria, ainda ocorrerão dois fatos que podemos denominar de as duas cerejas estragadas neste bolo azedo: a) os servidores perdem o direito ao abono de permanência e b) podem voltar a contribuir, desde que o valor dos seus proventos ultrapasse o teto de benefícios do RGPS.

Em resumo, na atual fase da aposentadoria do servidor, ele perde todas as parcelas precárias que, ordinariamente, não iriam mesmo para a aposentadoria, mas que compunham seu padrão remuneratório; perde no cálculo da média, pelo menos na maioria das vezes; perde na extinção do abono de permanência e perde se tiver que voltar a contribuir sobre a parte dos proventos que ultrapassa o teto do RGPS. E se estiver inserido no regime de previdência complementar, o valor dos proventos estará limitado ao teto de benefícios do RGPS.

Por estes motivos, muitos servidores não se aposentam mesmo já tendo reunido os requisitos para a inativação. Preferem continuar percebendo o abono, percebendo as parcelas de natureza precária e adiando a aposentadoria e o dever de contribuir, pelo menos até a novel idade da aposentadoria compulsória, 75 anos.

Mas, mais reformas estão por vir. O que mais podemos esperar?

Sobre o autor
Alex Sertão

Professor de RPPS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. Contracheque de ativo x contracheque de inativo: o que o sobra na aposentadoria do servidor?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4760, 13 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47844. Acesso em: 22 nov. 2024.

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