III – DESCUMPRIMENTO DE SENTENÇAS CONDENATÓRIAS E CONSTITUTIVAS
As sentenças condenatórias e as constitutivas não são dotadas de mandamentalidade. O descumprimento voluntário das primeiras importa em mera continuação de um inadimplemento que já vinha desde antes, dando azo apenas ao processo executivo. As segundas, por sua vez, têm força própria e, para o cumprimento dos preceitos que elas contém nenhuma conduta ativa do vencido é necessária.
No entanto, elas também estão albergadas pelo art. 14, V e parágrafo único, na medida em que é vedada a "criação de embaraços à efetivação dos provimentos", abrangendo a conduta tanto das partes quanto de terceiros que, de qualquer forma, lancem obstáculos à realização dos mandados judiciais. Assim, incorrerá também em ato atentatório ao exercício da jurisdição aquele que, por exemplo, subtrai ou oculta os autos do processo, recusa-se a registrar a sentença de separação judicial ou de divórcio.
IV – EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. NÃO SATISFAÇÃO DO CRÉDITO DO EXEQUENTE. NOVA EXECUÇÃO SOBRE O MESMO TÍTULO. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO
O processo de execução, como todo e qualquer processo, só termina quando uma sentença judicial lhe põe termo, consoante dispõe o Código de Processo Civil:
"Art. 162. (...)
§ 1º Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não ao mérito da causa".
"Art. 794. Extingue-se a execução quando:
I - o devedor satisfaz a obrigação;
II - o devedor obtém, por transação ou por qualquer outro meio, a remissão total da dívida;
III - o credor renunciar ao crédito.
Art. 795. A extinção só produz efeito quando declarada por sentença".
Tratando-se de sentença, o recurso cabível contra tal ato é o de apelação, observadas as regras comuns previstas no art. 513 daquele diploma legal, devendo, assim, ser interposto no prazo de 15 dias, contado da intimação.
A sentença que declara a extinção da execução não faz "coisa julgada material", efeito do qual encontra-se desprovida. Seu único efeito é o de "extinguir a relação processual executiva", operando-se apenas a coisa julgada formal após o trânsito em julgado.
A possibilidade de, extinta a execução acerca de determinado título executivo, judicial ou extrajudicial, ser intentada nova execução depende da verificação da "causa da extinção do processo executivo anterior".
Assim, não será possível nova execução quando a causa da extinção da execução anterior tiver sido:
a) Uma das previstas no art. 794 do CPC: Pois, ali, ou houve satisfação do crédito do exequente (I), autocomposição (II) ou renúncia àquele crédito, gerando um acertamento definitivo sobre o mesmo.
"Art. 794. Extingue-se a execução quando:
I - o devedor satisfaz a obrigação;
II - o devedor obtém, por transação ou por qualquer outro meio, a remissão total da dívida;
III - o credor renunciar ao crédito".
Dessa maneira, havendo acertamento definitivo em torno da obrigação exequenda, impossível a retomada da execução, ainda que motivada por fato superveniente:
STF: "AGRAVO REGIMENTAL – RECLAMAÇÃO – PENSÃO – IPERGS – EXECUÇÃO EXTINTA – REABERTURA – IMPOSSIBILIDADE – FATO SUPERVENIENTE NÃO CONTEMPLADO NO OBJETO DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA – 1. Reconhecido o direito ao benefício previdenciário pleiteado, a sua implantação em folha de pagamento e a expedição de precatório destinado ao pagamento das parcelas vencidas implicam na extinção do processo de execução. Reabertura do procedimento visando debater questões supervenientes não contempladas no objeto da liquidação de sentença. Inadmissibilidade. 2. Eventuais vantagens devidas à pensionista pela suspensão do benefício em momento posterior à conclusão da execução devem ser requeridas em ação própria. Agravo regimental a que se nega provimento". (Rcl-AgR 1680 – RS – 2ª T. – Rel. Min. Maurício Corrêa – DJU 31.05.2002 – p. 45)
TRF da 1ª Reg.: "PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO – EXTINÇÃO – CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO – REABERTURA – INCLUSÃO DE EXPURGOS INFLACIONÁIROS – IMPOSSIBILIDADE – OFENSA À COISA JULGADA – 1. A extinção da execução, pelo cumprimento da obrigação (art. 794, I, do CPC), impede a reabertura do processo com o objetivo de rediscutir os valores executados, ainda que para inclusão dos expurgos inflacionários, por ofensa à coisa julgada (art. 467 do CPC). Precedentes. 2. Agravo de instrumento improvido". (AG 01000073663 – BA – 1ª T. – Rel. Juiz Conv. Reynaldo Soares da Fonseca – DJU 30.07.2002 – p. 35) JCPC.794 JCPC.794.I JCPC.467
TRT da 12ª Reg.: "REABERTURA DA EXECUÇÃO. DIFERENÇAS DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. PRECLUSÃO. Resta fulminado pela preclusão o pedido de reabertura do processo executório para fins de atualização monetária do depósito judicial porque formulado pelo autor um ano após o recebimento do alvará e com os autos já arquivados". (Ac. 2ª T. 11665/02, 24.09.02. Proc. AG-PET 00586-1990-014-12-00-5. Unânime. Rel.: Juiz Jorge Luiz Volpato. Publ. DJ/SC 11.10.02 - P. 181. (TRT 12ª)
TRT da 12ª Reg.: "AGRAVO DE PETIÇÃO. PEDIDO DE REABERTURA DA EXECUÇÃO. PRECLUSÃO. As insurgências referentes aos valores que integram a conta de liquidação devem ser suscitadas na primeira oportunidade para impugnar o cálculo, e não após o arquivamento do feito. Tendo o exeqüente recebido o alvará judicial e se manifestado nos autos em diversas oportunidades antes do arquivamento do processo, impõe-se declarar a preclusão da matéria abordada no agravo, negando provimento ao apelo". (Ac. 3ª T. 07580/02, Proc. 06205-1993-037-12-00-8. Unânime. Rel. Juíza Maria de Lourdes Leiria. Publ. DJ/SC 17.07.02 - P. 166).
b) Procedência dos embargos que desconstituiu o título executivo: Pois, não havendo mais título executivo, não há que se falar em nova execução.
Por outro lado, poderá ser ajuizada nova execução sobre o mesmo título quando a causa de extinção anterior corresponder a:
a) Desistência da execução: O art. 569, caput, do CPC estabelece que "o credor tem a faculdade de desistir de toda a execução". Nesse mesmo sentido, acentuou a 4ª Turma do STJ: "O exequente tem a livre disponibilidade da execução, podendo desistir a qualquer momento, em relação a um, a alguns ou a todos os executados, mesmo porque a execução existe em proveito do credor, para a satisfação do seu crédito".
Essa desistência deve ser "homologada" mediante sentença, sendo que, mesmo após transitar em julgado, ao credor se mostra lícito renovar a demanda executória, com base na aplicação do art. 268 do CPC, de forma subsidiária, ao processo de execução. É que, como explica Mendonça Lima, "a desistência diz respeito com o processo de execução, em si mesmo, sem prejudicar a pretensão a executar".
b) Extinção da execução infrutífera: Inicialmente, a inexistência de bens penhoráveis provocará a suspensão do processo executivo.
"Art. 791. Suspende-se a execução:
III - quando o devedor não possuir bens penhoráveis".
Segundo a 3ª Turma do STJ, equipara-se à falta de bens penhoráveis sua indisponibilidade. Ademais, considera-se também infrutífera a execução quando o executado não é encontrado.
O Código de Processo Civil é omisso em disciplinar as medidas posteriores a esta suspensão. Porém, prevalece na doutrina o entendimento de que aplica-se analogicamente à hipótese o art. 40, §§ 1º, 2º e 3º, da Lei n. 6.830/80, que disciplina que passado o prazo de 1 ano, o juiz "arquivará os autos", sendo tal expressão entendida como "extinguirá a execução". De qualquer forma, localizado o executado ou os bens penhoráveis, a execução poderá, a qualquer tempo, ser novamente deduzida.
Vejamos o que reza a Lei das Execuções Fiscais:
"Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.
§ 1º Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública.
§ 2º Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos.
§ 3º Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução".
c) Falta de pressupostos processuais ou condições da ação executiva: Nas hipóteses de extinção estritamente processual da execução (salvo nos casos de coisa julgada formal na execução, como visto acima), há uma sentença equiparável ao figurino da "terminativa". Ela não implica perda do direito de renovar o processo, desde que o credor arque com o pagamento das despesas processuais do processo pretérito.
Por outro lado, há casos em que o juiz do processo executivo, levando em consideração a inércia da parte exequente ou o tempo infindável que já dura o processo, simplesmente determina o "arquivamento dos autos", chegando ao ponto, por vezes, de os mesmos serem incinerados.
Em tais casos, não fica o exequente impossibilitado de requerer o prosseguimento da execução, com o desarquivamento dos autos, se estes ainda existirem, ou o ajuizamento de nova execução, desde que, em qualquer caso, se encontre o devedor ou seus bens, com base, novamente, no art. 40 e §§ da Lei n. 6.830/80. É o que explica IVAN ALEMÃO:
"O código não estabelece a extinção da execução por inanição, apenas quando se satisfaz a obrigação, o devedor obtém a remissão total ou parcial da dívida (acordo) ou o credor renuncia o crédito, como previsto no art. 794, do CPC. Não há previsão de extinção da execução por inércia da parte, como ocorre na fase de conhecimento (art. 267, do CPC), pois o mérito já foi julgado. Entretanto, é força reconhecer que é enorme o número de processos arquivados e incinerados por absenteísmo. Após anos sem qualquer manifestação das partes na execução, mesmo que provocadas para falarem, tem levado os juízes ("de ofício"), a enviarem os autos para o arquivo, onde ainda aguardam pelo menos cinco anos até sua incineração (Lei nº 7.627/87). O § 3º do art. 40 da Lei nº 6.830/80 chega a ser detalhista quando afirma que "encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução". Nem mesmo a incineração pode terminar a execução, ou seja, o fim dos autos não significa fim da ação, pois pode-se restaurar os autos invocando os espíritos em mora".
V - CONCLUSÕES
1) Segundo a sistemática atual do Código de Processo Civil, o descumprimento de provimentos judiciais mandamentais, estando incluídas nessa expressão não apenas as ordem concedidas neste tipo de ações, mas também as tutelas antecipadas ou cautelares em qualquer tipo de ação, mesmo que não possua a mandamentalidade, abre a possibilidade de aplicação ao obrigado renitente as seguintes sanções: a) incursão nos delitos de desobediência (se particular) ou prevaricação (se funcionário público); b) multa (astreinte), desde que prevista expressamente no mandado; c) multa por configuração a ato atentatório a Justiça (art. 14, V e parágrafo único); d) adoção, pelo juiz, de medidas concretas para o cumprimento do preceito (busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obra etc.), com o auxílio, se necessário, de força policial; e) possibilidade de incursão nas penas para o litigante de má-fé (arts. 16 a 18), se tipificada a conduta; f) possibilidade de responsabilização civil do renitente, em caso de dano ao credor (art. 186, CC). Tais medidas podem ser aplicadas independentemente de processo de execução ou qualquer outra ação, bastando que se verifique que o obrigado, a qualquer tempo, está descumprindo o mandado judicial.
2) A aplicação dessas medidas é possível mesmo nas execuções de obrigações de fazer, não-fazer ou entregar coisa.
3) No caso de processo de execução, o qual tenha sido extinto, e havendo interesse do credor em prosseguir no mesmo ou renová-lo, cumpre analisar a causa da extinção do processo anterior, sendo possível se a mesma se deu por: a) desistência do processo; b) execução infrutífera, por não terem sido encontrados o executado ou seus bens, ou os bens existentes serem indisponíveis; c) mero arquivamento dos autos determinado pelo juiz, em face de inércia das partes, deixando o processo sem movimentação durante excessivo tempo.
VI – BIBLIOGRAFIA
1) DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 5ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
2) MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 17ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1996.
3) BARBI, Celso Agrícola. Do mandado de segurança. 8ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
4) BUENO, Cassio Scarpinella. Liminar em mandado de segurança. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.
5) ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
6) ALEMÃO, Ivan. Execução de ofício: limites e vantagens. Síntese trabalhista n. 128, Fev/2000, Pág. 10.