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Conceituação e fundamentação legal da desaposentação

Agenda 26/07/2016 às 00:21

Desaposentação: entenda!

A Previdência Social pode ser entendida como uma poupança forçada, imposta ao cidadão para garantir no futuro, após perda de sua capacidade laboral, uma renda que lhe proporcione condições para viver. Para ter direito aos benefícios da Previdência Social, deve-se estar em dia com as contribuições.

Nesse sentido, são diversas as formas que levam à concessão de benefícios pela Previdência Social. A aposentadoria é provavelmente a mais importante e conhecida delas; pode ser concedida em diferentes situações: em função da idade, do tempo de contribuição exercido pelo segurado, podendo ser na forma comum (por tempo de contribuição ou idade) ou na especial ou em função da incapacidade de exercer suas atividades laborativas. O objetivo da aposentadoria, em princípio, é substituir permanentemente os rendimentos do segurado que não tem mais condições de trabalhar.

No entanto, o segurado poderá retornar as suas atividades laborativas após a aposentadoria, voltando a verter contribuições junto à Previdência Social, entretanto caso haja interesse do segurado poderá requerer a desaposentação. Este instituto consiste na renúncia do primeiro benefício para obter outro mais vantajoso, por meio de novo cálculo do tempo de contribuição.

Nesse sentido, entende-se que os segurados aposentados do Regime Geral da Previdência Social continuam trabalhando e consequentemente vertendo contribuições para a Previdência. Após anos trabalhados, os aposentados desejam “revisar” suas aposentadorias, visto que efetuaram contribuições pós aposentação. Dessa forma, requerem a majoração de seus benefícios por meio da inclusão das contribuições subseqüentes no cálculo do benefício. Esse Instituto passou a ser chamado de desaposentação. Isso ocorre, conforme Ibrahim (2014, p. 728), “com o objetivo exclusivo de possibilitar a aquisição de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário”.

Observa-se ainda, que tal situação é frequente, frente às dificuldades enfrentadas pelos aposentados em relação aos valores do benefício. Neste prisma, verifica-se que a desaposentação não possui previsão legal expressa, o que traz a possibilidade do indivíduo em demandar a renúncia da atual aposentadoria para computar, juntamente com o tempo da aposentadoria anterior, o tempo subsequente a aposentação. Para Ibrahim (2014, p. 728), “a desaposentação não contraria os citados preceitos constitucionais que visam a proteção individual, e não podem ser utilizados em desvantagem para os indivíduo e a sociedade”. Como já mencionado, não há na Constituição Federal qualquer vedação legal quanto à desaposentação, da mesma forma ocorre na legislação específica, inexistindo dispositivo que veda a renuncia aos direitos do benefício.

As doutrinadoras Ladenthin e Masotti (2010, p. 60) conceituam a desaposentação como “renúncia ao benefício concedido para que o tempo de contribuição vinculado a este ato de concessão possa ser liberado, permitindo seu cômputo em novo benefício, mais vantajoso”. Nesse sentido, entende Pereira de Castro e Batista Lazzari , que a desaposentação se trata de

[...] desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário, em regra por ter permanecido em atividade laborativa (e contribuindo obrigatoriamente, portanto) após a concessão daquela primeira aposentadoria. (PEREIRA DE CASTRO E BATISTA LAZZARI, 2014, P.671)

Prosseguindo a análise, conforme Ibrahim (2014, p. 729), “não se pode negar a existência da desaposentação com base no bem-estar do segurado, pois não se está buscando o desfazimento puro e simples de seu benefício, mas sim a obtenção de nova prestação, mais vantajosa.” Entende-se então, que a desaposentação se traduz na vontade do segurado em renunciar aposentadoria anterior com o intuito de obter benefício mais vantajoso, utilizando seu tempo de contribuição.

Além disso, percebe-se que, às vezes, os segurados acabam por confundir o Instituto da desaposentação com a revisão de aposentadoria, no entanto, conforme Ladenthin e Masotti (2010, p. 73), “a revisão de aposentadoria busca reformar, consertar, uma situação jurídica existente. A desaposentação busca desconstituir esta situação jurídica para constituir uma nova, autônoma”. Ainda, para Ladenthin e Masotti (2010, p. 73), o objeto da pretensão na revisão “pode recair sobre qualquer elemento componente do benefício, que não afete o reconhecimento do direito, mas sim suas condições de concessão ou manutenção de valor real”. Na desaposentação a motivação para a pretensão é ter continuado a contribuir após a aposentadoria, com intuito de requerer benefício financeiramente mais vantajoso. Verifica-se assim, que o escopo da revisão é majorar o valor do benefício recebido, por meio de retificação de algum erro material ou de direito. Já a desaposentação objetiva a renuncia de um benefício para que outro seja concedido.

Para tanto, sabe-se que os benefícios previdenciários têm evidente caráter alimentar, pois em regra, têm o objetivo de substituir a renda salarial e atender às necessidades básicas do segurado e de sua família (alimentação, habitação, vestuário, educação e saúde). Pode-se afirmar que a natureza alimentar destas prestações está acoplada à hipossuficiência do segurado ou de seus dependentes.

Observa-se ainda, conforme Horvath Júnior (2012, p. 147), que os benefícios fornecidos pela Previdência, por possuírem o propósito de diminuir ou eliminar o estado de necessidade social, revestem-se de natureza alimentar.            

A Constituição Federal de 1988, no artigo 6º, é clara ao considerar como direitos sociais a moradia, a educação, a alimentação, a proteção à maternidade e a infância, a assistência aos necessitados entre outros, destacando a Previdência Social. Junior &Almeida Apud Martinez

nos mostra que os benefícios previdenciários possuem caráter alimentar, uma vez que se prestam a custear as necessidades vitais básicas do beneficiário e de sua família, constituindo expressão da fundamentabilidade dos direitos sociais, invocando o princípio da dignidade humana do plano abstrato para o plano concreto, uma vez que os alimentos se apresentam como condições de possibilidade da dignidade humana. (JUNIOR &ALMEIDA APUD MARTINEZ, 2011)

Ademais, benefícios são direitos subjetivos do segurado e seus dependentes, quando ocorre o fato gerador, como são fundamentais, os direitos previdenciários exigem aplicabilidade imediata, de modo a tornarem-se concretos com o escopo principal de dignificar a pessoa humana, pois são de natureza alimentar.

Ainda, quanto ao caráter alimentar, o benefício previdenciário possui finalidade de proporcionar a subsistência ao beneficiário e à sua família, sendo que, para Balera

Prestações devidas pela previdência social a pessoas por ela protegidas, destinada a prover-lhes a subsistência, nas eventualidades que as impossibilitem de, por seu esforço, auferir recursos para isto, ou a reforçar-lhes os ganhos para enfrentar encargos com a família, ou amparar, em caso de morte, os que dependiam economicamente. (BALERA, 2009, p. 289)

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O sistema de proteção Social que garante o amparo ao trabalhador e à sua família, isto é, esse caráter alimentar, quando ele não pode trabalhar por causa de doença, acidente, gravidez, prisão, morte ou velhice, é proveniente destes benefícios previdenciários. Assim, percebe-se que as verbas percebidas à título dos referidos benefícios são destinadas a prover a subsistência do beneficiário, restando clara sua natureza alimentar.Diante disso, a devolução dos valores referentes aos benefícios, como requer a Autarquia Previdenciária, não pode ocorrer, visto que estão protegidos pelo princípio da irrepetibilidade dos valores recebidos à guisa de alimentos. Com isso, entende-se que não há descrição desta obrigatoriedade na legislação previdenciária, tratando-se de construção doutrinária e jurisprudencial, que objetiva garantir a vida, destinando-se a assegurar sobrevivência dos beneficiários.

Nesse mesmo entendimento, os ensinamentos de Cahali

(...) a impossibilidade de restituição dos alimentos já pagos emerge com clareza e segurança da doutrina, como se constata, v. g., das lições de Pontes de Miranda: “Os alimentos recebidos não se restituem, ainda que o alimentário venha decair da ação na mesma instância, ou em grau de recurso. (CAHALI, 2009, p. 188)

Demais disso, seguindo esta linha de raciocínio, a redação do Decreto Lei 66/66 previa que os aposentados que voltassem a exercer atividade profissional, quando desligados do emprego, fariam jus ao benefício de pecúlio, que consistia na devolução das contribuições efetuadas após a aposentadoria. Esse pagamento era efetuado quando o segurado se afastasse da atividade laboral, ingressando de forma definitiva na inatividade. Ladenthin e Masotti (2010, p.76) lecionam que era chamado de pecúlio, “o montante em espécie devolvido ao aposentado que tenha contribuído ao RGPS, por força da obrigatoriedade de filiação pelo exercício de atividade remunerada, quando este se desligasse do trabalho.” Dessa forma, os efeitos financeiros das contribuições posteriores a aposentadoria, eram praticamente anulados reconstituindo a isonomia entre essas pessoas e os demais trabalhadores vinculados ao Regime Geral. Esse benefício foi extinto pela Lei nº 9.032/95.

Percebe-se que a própria lei previdenciária já vinha prevendo um benefício ao segurado aposentado que continuasse ou voltasse a trabalhar e consequentemente a recolher contribuições previdenciárias.

Demais disso, o Projeto de Lei nº 2.682/2007, de autoria do Deputado Federal Cléber Verde, destinava a reconhecer o direito à desaposentação, dispensando a necessidade de restituição dos proventos percebidos. Desejava acrescer ao artigo 54 da Lei 8213/91 os parágrafos 1º e 2º, conforme dispõe o inteiro teor da apresentação do projeto

Parágrafo 1º- As aposentadorias por tempo de contribuição e especial concedidas pela Previdência Social, na forma da lei, poderão, a qualquer tempo, ser renunciadas pelo Beneficiário, ficando assegurada a contagem do tempo de contribuição que serviu de base para a concessão do benefício.

Parágrafo 2º - O segurado que renunciar ao benefício não fará restituição, de qualquer espécie, à Previdência Social do valor que recebeu durante sua aposentadoria, podendo juntar o tempo trabalhado após aposentadoria proporcional, com vistas a garantir aposentadoria integral ou aumentar o cálculo da aposentadoria proporcional.

No entanto, esse projeto de lei foi arquivado na Câmara dos Deputados, pois a Comissão de Finanças e Tributação considerou inadequado e incompatível quanto ao aspecto orçamentário e financeiro, sendo justificado no artigo 195, § 5º, da Constituição Federal, que determina que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

Dito isso, atualmente, por se tratar de benefício frequentemente requerido pelos segurados aposentados e indeferido pela Autarquia Previdenciária pela ausência de lei que regulamente o Instituto, os beneficiários recorrem ao judiciário, para que este solucione essa lacuna da lei. Dessa forma, pelo fato do assunto ter repercussão geral e possuir matéria constitucional, foram interpostos recursos extraordinários para que o guardião da Constituição Federal, o Supremo Tribunal Federal, tomasse posição frente à lide composta pelo INSS e os segurados já aposentados pelo Regime Geral. Entre estes está o Recurso Extraordinário nº 661.256 – DF, que tem como Relator o Ministro Roberto Barroso

DECISÃO: Em despacho, admiti o ingresso, na qualidade de amici curiae, do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) e da União. Posteriormente, também requereram ingresso como intervenientes especiais a Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (COBAP), o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical (SINDNAP) e a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP). Tendo em vista a relevância da matéria e a representatividade da COBAP, já reconhecida no RE 626.489, defiro seu ingresso na qualidade de amicus curiae, nos termos do art. 543-A, § 6°, do Código de Processo Civil, c/c o art. 323, § 3°, do RIS/TF. Registro que a Confederação já apresentou manifestação escrita no feito. Levando em conta o critério da representatividade, indefiro o pedido do SINDNAP, bem como o da ANFIP. À Secretaria para anotar. Publique-se. Brasília, 04 de setembro de 2014. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO Relator

(RE 661256, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 04/09/2014, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-178 DIVULG 12/09/2014 PUBLIC 15/09/2014)

Observa-se que o tema é controverso, ainda não foi julgado, apenas quatro dos ministros apresentaram seus votos, quando o tema foi posto em pauta. Em seu voto, o Ministro Barroso, afirma que

A possibilidade de renúncia a uma aposentadoria anterior para requerimento de uma nova é uma decorrência do sistema normativo em vigor, notadamente da combinação entre: (i) a imunidade dos proventos do RGPS em relação à contribuição social incidente sobre os rendimentos do trabalho; (ii) a cobrança da contribuição dos aposentados que retornam ao mercado de trabalho, sob o mesmo regime dos demais trabalhadores; e (iii) a inexistência de benefícios previdenciários específicos que justifiquem a incidência dessa tributação vinculada. Por tudo isso, se a legislação ordinária vedasse a desaposentação de forma expressa, a sua compatibilidade com o atual texto constitucional seria no mínimo duvidosa.

Além disso, o Ministro destacou que o segurado aposentado volta a laborar em igualdade de regime jurídico contributivo com os demais trabalhadores, voltando a recolher contribuições previdenciárias, mas sem igualdade quanto aos benefícios, sendo estes, considerados pelo ministro como “inexistentes ou pouco aplicáveis a realidade do aposentado”. Esse entendimento vai ao encontro do já mencionado anteriormente.

A esse respeito, compreende-se que a aposentadoria possui a finalidade de substituir os rendimentos do trabalhador, de tal forma que quando percebida de boa-fé não se pode falar em devolução de valores, pois estes são utilizados para prover o sustento do beneficiário e de sua família.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem pacificado acerca do entendimento da não devolução dos valores percebidos pelos segurados, visto que possuem caráter alimentar. Conforme julgados do STJ

PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA REPETITIVA. DESAPOSENTAÇÃO E REAPOSENTAÇÃO. RENÚNCIA À APOSENTADORIA. CONCESSÃO DE NOVO E POSTERIOR JUBILAMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE. PREQUESTIONAMENTO PARA O STF. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE.

1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.334.488/SC (Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 14/05/2013), processado nos moldes do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis, razão pela qual admitem desistência por seus titulares, destacando, ainda, a desnecessidade de devolução dos valores recebidos para a concessão de nova aposentadoria.

2. Ressalva de meu entendimento divergente quanto à devolução dos valores da aposentadoria renunciada, esposado pormenorizadamente no Recurso Especial representativo da controvérsia precitada.

3. Recurso Especial provido.

(REsp 1485564/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/02/2015, DJe 11/02/2015)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. INEXIGIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL POSTERIORMENTE MODIFICADA. INAPLICABILIDADE, NO CASO, DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.

1.  Diante do caráter social das normas previdenciárias, que primam pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais.

2.  A realidade fática demonstra que o segurado, ao obter a concessão de um benefício por força de decisão judicial, acredita que o seu recebimento é legítimo, não tendo conhecimento da provisoriedade da decisão e da possibilidade de ter que restituir esse valor, máxime se essa advertência não constou do título que o favoreceu.

3Em face da boa-fé do segurado que recebeu o aumento do valor do seu benefício por força de decisão judicial, bem como em virtude do caráter alimentar dessa verba, mostra-se inviável impor ao beneficiário a restituição das diferenças recebidas, por haver a decisão sido reformada ou por outra razão perdido a sua eficácia. Precedentes do STJ.

[...]

(REsp 1356427/PI, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/04/2013, DJe 29/04/2013)

RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DESAPOSENTAÇÃO E REAPOSENTAÇÃO. RENÚNCIA A APOSENTADORIA. CONCESSÃO DE NOVO E POSTERIOR JUBILAMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE. 1. Trata-se de Recursos Especiais com intuito, por parte do INSS, de declarar impossibilidade de renúncia a aposentadoria e, por parte do segurado, de dispensa de devolução de valores recebidos de aposentadoria a que pretende abdicar. 2. A pretensão do segurado consiste em renunciar à aposentadoria concedida para computar período contributivo utilizado, conjuntamente com os salários de contribuição da atividade em que permaneceu trabalhando, para a concessão de posterior e nova aposentação. 3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento. Precedentes do STJ. 4. Ressalva do entendimento pessoal do Relator quanto à necessidade de devolução dos valores para a reaposentação, conforme votos vencidos proferidos no REsp 1.298.391/RS; nos Agravos Regimentais nos REsps 1.321.667/PR, 1.305.351/RS, 1.321.667/PR, 1.323.464/RS, 1.324.193/PR, 1.324.603/RS, 1.325.300/SC, 1.305.738/RS; e no AgRg no AREsp 103.509/PE. 5. No caso concreto, o Tribunal de origem reconheceu o direito à desaposentação, mas condicionou posterior aposentadoria ao ressarcimento dos valores recebidos do benefício anterior, razão por que deve ser afastada a imposição de devolução. 6. Recurso Especial do INSS não provido, e Recurso Especial do segurado provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.

(REsp nº 1334488 / SC, 1ª Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje. 14/05/2013)

Dito isso, a análise da necessidade de restituição dos valores já recebidos a título de proventos, quanto à desaposentação, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que a devolução seria indevida, conforme Recurso Especial 1.334.488, do Relator Ministro Herman Benjamin que reza no término de seu voto

Diante do exposto, nego provimento ao Recurso Especial do INSS e provejo o Recurso Especial de ...... para declarar a desnecessidade de devolução dos valores da aposentadoria renunciada, e condenar a autarquia à concessão de nova aposentadoria a contar do ajuizamento da ação [...].

Diante disso, percebe-se que o período que o segurado fez jus a aposentadoria e os respectivos valores percebidos, havendo boa-fé não há que se falar em restituição. Trata-se de verbas de natureza alimentar e irrepetíveis, pois se destinaram a garantir a subsistência do segurado e dos seus dependentes.

Seguindo o entendimento já exposto, Ibrahim pontua:

Em razão de tais premissas, além do evidente caráter alimentar do benefício previdenciário, não se deve falar em restituição dos valores recebidos no caso de desaposentação, sendo tal desconto somente admissível em regimes de capitalização, individual pura, o que inexiste no sistema previdenciário público brasileiro [...]

Em verdade, a restituição dos valores recebidos pelo segurado é usualmente apresentada como mais um subterfúgio dos que recusam a admitir a desaposentação, sendo mera tentativa de dissipar as pretensões dos segurados interessados no instituto ora desenvolvido. (IBRAHIM 2010, p. 66)

A esse respeito, ocorrem discussões em torno da questão econômico-financeira, fazendo lembrar o princípio do equilíbrio financeiro e atuarial que foi instituído pelo artigo 201, caput, da Constituição Federal. O referido princípio trata do equilíbrio entre as despesas e as receitas do regime de previdência. De acordo com a Portaria nº 403, de 10 de dezembro de 2008, do Ministério da Previdência Social, o equilíbrio financeiro representa a garantia de equivalência entre as receitas auferidas e as obrigações do sistema previdenciário, em cada exercício financeiro. O equilíbrio será atingido no momento em que as arrecadações se mostram o suficiente para custear os benefícios previdenciários.

Neste contexto, Ladenthim e Masotti aduz que:

Não há que se falar em desequilíbrio financeiro e atuarial com a desaposentação [...] Com a continuação da atividade laboral e, consequentemente, com o pagamento compulsório das contribuições, eles vertem ao sistema valores que não estavam previstos. (LADENTHIM E MASOTTI, 2010, p. 97)

A partir das ideias apresentadas é possível afirmar que o beneficiário ao permanecer laborando e contribuindo, fará com que essas novas contribuições gerem excedente atuarial que não estava previsto, tendo então, o segurado, faculdade de requerer novo benefício utilizando essas, somadas com o tempo de contribuição anterior. Ademais, Ladenthim e Masotti (2010, p. 98) salientam que, “as contribuições após a aposentadoria não era atuaria e financeiramente esperadas [...]”.

Destaca-se então, que a existência de contribuições sem o devido ressarcimento por meio de benefícios assegurados aos não aposentados, estaria ferindo a precedência de custeio e o princípio da isonomia.

Dito isso, comprova-se a natureza alimentar do benefício previdenciário, conforme versa o § 1º do Artigo 100 da Constituição Federal

Artigo 100.

[...]

§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo.

Portanto, o benefício previdenciário está assentado no princípio da irrepetibilidade dos alimentos, não sendo necessária a devolução dos valores percebidos em decorrência de aposentadoria anterior, conforme demonstra expressamente a Constituição Federal brasileira e o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça. Atentando também, ao já referido equilíbrio atuarial financeiro e ao princípio da isonomia, vislumbrando assim, a possibilidade da não devolução dos valores recebidos a título de aposentadoria.

            Assim, após a realização desta pesquisa, restou claro que a desaposentação é possível e, consequentemente, a inviabilidade da devolução dos valores percebidos, pois o instituto está sintonizado com os preceitos constitucionais, podendo o segurado renunciar sua aposentadoria, realizando uma nova contagem do tempo de contribuição para fins de concessão de outro benefício, este mais vantajoso, sendo indevida a restituição.

Percebe-se, portanto, que o instituto da desaposentação possui natureza alimentar, que conforme já mencionado, não há necessidade da devolução dos valores referentes às prestações mensais percebidas, considerando o princípio da irrepetibilidade dos benefícios previdenciários.

Diante disso, insta salientar, que não se pode negar que a desaposentação destina-se a proporcionar uma melhora no bem-estar do segurado, garantindo a ele uma aposentadoria mais vantajosa que a anteriormente recebida, estando de acordo com o disposto na Constituição Federal, ao garantir o direito à vida, à dignidade e ao trabalho.

Sobre os autores
Dioner Venites

Advogado e Servidor Público Estadual.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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