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A sucessão de empregadores na visão da doutrina e da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho

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Agenda 02/09/2016 às 11:20

A sucessão de empregadores é um instituto de grande relevância na proteção dos direitos dos trabalhadores, em virtude da pulverização na responsabilização trabalhista das empresas, que realizam grandes transformações estruturais de forma muito voraz.

INTRODUÇÃO

Hodiernamente, a sucessão de empregadores apresenta-se como um instituto de grande relevância na proteção dos direitos dos trabalhadores, em virtude da pulverização na responsabilização trabalhista das empresas, que realizam grandes transformações estruturais de forma muito voraz.

A presente pesquisa se propõe a estudar o instituto da sucessão no âmbito do direito do trabalho, baseando-se, em linhas gerais, na definição de conceitos, requisitos, natureza jurídica, efeitos e sua assimilação pela jurisprudência do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.

Nessa perspectiva, serão analisadas as vertentes tradicional e moderna da sucessão de empregadores, procurando-se demonstrar que o requisito mais primaz à sua incidência é o que faz referência a afetação, de alguma forma, dos direitos adquiridos pelos trabalhadores com as operações inter ou intraempresariais.

Listaremos, também, uma série de situações referentes à sucessão trabalhista, abordando a evolução da jurisprudência pátria, sem, evidentemente, descurarmo-nos das premissas doutrinárias acerca da matéria.


2.CONCEITO

A sucessão de empregadores tem origem na operação de transferência, total ou parcial, seja a título oneroso ou gratuito, público ou particular, provisório ou definitivo, da unidade econômico-produtiva, de um titular a outro, sem que esse trespasse implique alterações prejudiciais na esfera jurídica dos contratos de trabalho dos empregados.

Tradicionalmente, esse é o conceito que nos dá a literatura jurídica sobre o instituto. Sem muitas discrepâncias da concepção acima mencionada, assevera Maurício Godinho Delgado (2012, p. 414) que a sucessão de empregadores consiste num instituto justrabalhista em virtude do qual se opera, no contexto da transferência de titularidade de empresa ou estabelecimento, uma completa transmissão de créditos e assunção de dividas trabalhistas entre alienante e adquirente envolvidos.

A fonte normativa para a imputação dessa responsabilidade ao sucessor encontra-se nos arts. 10 e 448, da CLT, que, como preceitos imperativos, impõem que a alteração na estrutura jurídica da empresa ou na sua propriedade não terão o condão de afetar os direitos decorrentes dos contratos de trabalho dos empregados a ela vinculados.

De início, cumpre esclarecer que o fundamento para tal previsão normativa, já conhecida pela ordem jurídico-laboral, pois outrora inscrita no art. 3°, da Lei n° 62/1935, está ligada ao princípio protetivo que rege as relações trabalhistas. Isso porque o legislador entendeu que sujeitar os contratos de trabalho não às pessoas titulares da empresa, mas à própria empresa, reforçaria a segurança que os trabalhadores teriam, eis que estariam os seus créditos assegurados de forma mais expedita.

Esse comando, em outras palavras, fez com que surgisse o denominado princípio da despersonalização do empregador, também chamado princípio da impessoalidade do empregador. Ora, a empresa conquanto não detenha personalidade jurídica, o que, a priori, lhe fustigaria a aptidão para contrair obrigações e ser titular de direitos tem, no âmbito trabalhista, flexibilizada essa sua limitação obrigacional.

Interpretando esses dispositivos da codificação celetista, os doutrinadores apontam para dois referenciais distintos no tocante à sucessão de empregadores, um no qual não há, em verdade, qualquer sucessão, e outro, em que se verifica a transferência legal de responsabilidades.

Expliquemos melhor. O art. 10, da CLT, segundo o qual qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados, é voltado para as mutações que a própria unidade produtiva, quer dizer, a empresa, sofrer. Ou seja, as operações empresárias, pelas quais ocorre alteração de um tipo para outro, por exemplo, de empresário individual para empresa individual de responsabilidade limitada, não repercutirão nos contratos de trabalho. Nessa linha, adverte Delgado que:

(...) as alterações jurídicas que tendem a ocorrer não se passam na estrutura jurídica da empresa (art. 10), mas, sim, na estrutura jurídica do titular da empresa, isto é, a pessoa física ou jurídica (ou até ente despersonificado) que detém o controle da empresa e seus estabelecimentos. Pretende a CLT dispor, na verdade, que, ocorrendo alteração nessa estrutura jurídica (por exemplo, transformação do tipo jurídico da sociedade, como sociedade por cotas para sociedade anônima; transformação de uma firma individual em sociedade por cotas, etc.), não se afetam os contratos de trabalho existentes. A alteração na modalidade societária preserva, pois, com a nova forma societária emergente, os antigos contratos de trabalho, com todos os seus efeitos passados, presentes e futuros. (DELGADO, 2012. p. 415).

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Lado outro, se a mudança for da própria titularidade da empresa, o permissivo legal que faz referência ao direito adquirido pelos trabalhadores, de permanecer inalterados os contratos de trabalho, é o art. 448, da CLT.

Em remate, cumpre ceder a palavra a Sergio Pinto Martins, para quem:

A CLT tem dois artigos que tratam do tema [alterações na empresa]: o art. 10 estabelece que "qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados"; e o art. 448: " a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados". O art. 10 da CLT diz respeito aos direitos do empregado, enquanto o art. 448 da CLT está ligado ao contrato de trabalho. (MARTINS, 2009, p. 194).


3. NATUREZA JURÍDICA DO INSTITUTO

Em que pese o conceito de sucessão de empregadores seja quase que consenso na doutrina, o mesmo não se pode dizer quanto à identificação de sua natureza jurídica. Muitos doutrinadores situam a natureza jurídica da sucessão de empregadores a partir de institutos originários do direito comum, quais sejam, a novação, a cessão, a sub-rogação, a estipulação em favor de terceiro, as obrigações híbridas, entre outros, que pelos limites propostos neste trabalho não vêm à baila.

Contudo, é bom ressaltar que a natureza jurídica desse instituto do direito do trabalho não pode ser buscada nos já clássicos institutos civilistas; afinal, o direito do trabalho tem foro autônomo das demais ciências jurídicas, tendo em vista a detenção, por esse ramo do direito, de metodologia, princípios e legislação próprios.

Com efeito, não se pode equiparar a sucessão de empregadores à novação, uma vez que essa modalidade extintiva de obrigação detém um elemento estranho à imperatividade dos preceitos celetistas, isto é, exige a novação a presença da intenção de novar.

Da mesma sorte padece a correlação da sucessão de empregadores à cessão civilista, pois, mais uma vez, estará em evidência a necessidade de vontade das partes, sem falar no fato de que a cessão do direito comum abrange apenas créditos, o que estrema com a  obrigação do empregado, consistente na permanência da prestação pessoal de serviços ao novo titular.  A sub-rogação, por sua vez, também depende do elemento volitivo das partes.

Há, ainda, aqueles que defendem uma similitude com a estipulação em favor de terceiros, em que os trabalhadores seriam terceiros ao negócio jurídico do qual se origina a responsabilidade do sucessor. Entretanto, essa corrente parte de um pressuposto falho; isso porque a estipulação em favor de terceiro traz como consectário,  eminentemente, um bônus àquele que não participou do negócio jurídico em que ficou acertado o benefício, ao passo que a sucessão prevista pela legislação obreira não exime os empregados de sua obrigação, de prestar serviços ao novo titular da empresa.

Também merece destaque a corrente que propunha a existência de um ônus real para a empresa, de modo que brada a aderência dos direitos trabalhistas dos empregados à empresa, independentemente de quem seja circunstancialmente o seu titular. Essa visão é mais consentânea à própria dicção normativa do instituto, pois consoante explica Vólia Bomfim Cassar:

a teoria da sucessão de empresários, nos moldes contidos nos arts. 10 e 448 da CLT. Mas, se há alguns institutos próximos no direito civil que possam ajudar a justificar nossa posição, poderíamos dizer que Talvez, o ideal fosse comparar as dívidas trabalhistas com as de ônus reais, pois neste caso a dívida é da coisa e não da pessoa e o bem (empresa) responde por suas dívidas, independentemente do titular que a esteja explorando na época do vencimento ou da cobrança.

Na verdade não existe correspondente idêntico no direito civil que fundamente as obrigações que decorrem da sucessão trabalhista se assemelham muito com as propter rem ou de ônus reais. (CASSAR, 2014, p. ).


4. REQUISITOS PARA A CONFIGURAÇÃO DA SUCESSÃO DE EMPREGADORES E SEUS EFEITOS

Classicamente, a sucessão de empregadores demanda a observância dos seguintes requisitos: mudança de titularidade da empresa, continuidade da mesma atividade pelo sucessor e a permanência da prestação laboral.

Nessa perspectiva tradicional, ensina Henrique Correia que na:

a) Transferência de estabelecimento: há necessidade de transferência da parte produtiva (unidade econômico-jurídica), possibilitando que o sucessor (que adquiriu o estabelecimento) continue explorando a atividade econômica do sucedido. A transferência apenas de partes separadas da sucedida (venda de equipamentos isolados para diversos compradores, um carro para determinado comprador, equipamentos eletrônicos para outro etc.), sem que proporcione a continuidade da atividade, não configura a sucessão. A transferência da unidade produtiva ocorre com a cessão do ponto comercial e da clientela, equipamentos, marca, banco de dados etc. Essa transferência poderá ser realizada mediante venda, incorporação, arrendamento, cisão, fusão, doação etc.

b) Não ocorrência da paralisação da atividade: após a sucessão, o sucessor deverá dar continuidade ao empreendimento, sem que fique paralisado por muito tempo. (CORREIA, 2013, p. 126).

No ponto específico pertinente à necessidade de permanência da mesma atividade econômica, antes explorada pelo sucedido, calha uma observação importante de Cassar (2014, p. ), segundo a qual há oscilações jurisprudenciais que, ora julgam pela suficiência do exercício de atividade similar ou conexa, ora pela obrigatoriedade de dar continuidade à mesma atividade para que restem satisfeitos os requisitos necessários à configuração da sucessão, indicando os repositórios doutrinários e dos Tribunais a predileção pela derradeira corrente.

Preenchidos esses pressupostos, tem azo o efeito principal da sucessão de empregadores, que é conferir ao sucessor responsabilidade pelos débitos trabalhistas do sucedido, sejam aqueles decorrentes dos contratos já extintos ou ainda vigentes.

Disso surge um questionamento importante, mais particularmente quanto à responsabilidade do sucedido. Na perspectiva tradicional, desenvolvida sobretudo a partir dos processos de privatização das instituições financeiras controladas pelo Poder Público, a responsabilidade seria exclusivamente do sucessor, ressalvada tão somente as situações em que houvesse fraude ou simulação, nas quais avultaria a responsabilidade subsidiária do sucedido, com espeque no art. 9°, da CLT.

Sucede que paulatinamente essa vertente tradicional do instituto cede a uma nova exegese, facilitada pelos contornos imprecisos da noção de sucessão, encartados nos arts. 10 e 448, da CLT. Com essa moderna visão é possível partilhar as responsabilidades pelo adimplemento dos créditos trabalhistas entre empregador sucedido e empregador sucessor. Clarividente, a respeito, os ensinamentos de Delgado, para quem:

[...] a jurisprudência tem ampliado as possibilidades de responsabilização subsidiária do antigo titular do empreendimento por além das situações de fraude comprovadas no contexto sucessório (art. 92, CLT; art. 159, CCB/1916, e art. 186, CCB/2003, combinados com art. 8ª, parágrafo único, CLT). Mesmo que não haja fraude, porém comprometimento das garantias empresariais deferidas aos contratos de trabalho, incidiria a responsabilidade subsidiária da empresa sucedida. (DELGADO, 2012, p. 428).

Isso decorre do preenchimento de um requisito, talvez o mais importante à caracterização do instituto em comento, previsto nos preceitos legais que consagram a responsabilidade trabalhista por sucessão de empregadores, qual seja, o de que qualquer rearranjos empresariais, seja interempresariais ou intraempresariais, que ocasione alteração nos direitos decorrentes dos contratos em curso ou já extintos, já seria suficiente para fazer incidir a regra sucessória. A jurisprudência do TST, a exemplo a doutrina de vanguarda, também começa a encampar esse novo entendimento, conforme se vê a seguir:

SUCESSÃO DE EMPREGADORES. ARTIGOS 10 E 448 DA CLT. RESPONSABILIDADE DA SUCEDIDA PELOS DÉBITOS TRABALHISTAS DOS EMPREGADOS QUE LHES PRESTARAM SERVIÇOS NOS CASOS EM QUE A SUCESSORA É PRÉVIA E MANIFESTAMENTE INADIMPLENTE. Nos termos em dispõe o artigo 10 da CLT, a alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados. O artigo 448 da CLT, por sua vez, assevera que a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados. Nessa esteira, consagrou-se o entendimento, na doutrina e na jurisprudência, de que a sociedade empresária sucessora trabalhista responde integralmente pelos débitos oriundos das relações de trabalho, ainda que referentes a período anterior à sucessão, e mesmo que o contrato de trabalho tenha cessado anteriormente a ela. Essa tese resguarda os empregados contra as incertezas das relações econômicas,preservando sempre seus direitos trabalhistas, uma vez que imputa à sucessora a responsabilidade por seus créditos trabalhistas independentemente da época em que seus direitos foram lesados, haja vista que a nova empregadora sempre deverá arcar, integralmente, com o pagamento dos débitos trabalhistas da sucedida. Isso não significa, no entanto, que a sucessão trabalhista,a exemplo do que ocorre na sucessão disciplinada pelo direito civil, implique, sempre e necessariamente, a liberação integral da empresa sucedida de sua responsabilidade pelo pagamento dos débitos trabalhistas dos empregados que lhes prestaram serviços. Com efeito, a responsabilidade da sociedade empresária sucessora foi construída pelo Direito do Trabalho com o escopo de proteger os empregados de uma eventual inadimplência de seus créditos trabalhistas. Ocorre que,muitas vezes, as partes negociantes têm transferido a propriedade da empresa para uma sociedade empresária de menor porte financeiro, ficando a sucedida com o capital resultante da alienação, mas sem a responsabilidade de arcar com os débitos trabalhistas do período de sua atuação enquanto a sucessora, que já não detinha patrimônio suficiente, fica sem ativos bastantes para solver aquelas dívidas trabalhistas. Como corolário,quem, no fim, fica prejudicado são os trabalhadores, que não conseguem ter seus créditos laborais quitados.Nesse contexto, fica claro que a regra geral acima delineada não pode ser aplicada nesses casos, porquanto criada para proteger os obreiros, e não para desampará-los. Em casos como este, em que a própria instância regional registrou expressamente no acórdão a existência de indícios deque a sucessão empresarial deu-se deforma a enfraquecer substancialmente as garantias patrimoniais de quitação dos débitos trabalhistas ao conjunto,sucessor e sucedido responderão conjuntamente pelo débito, pois não faz sentido que a sucessão empresarial acarrete prejuízos aos empregados enquanto as partes negociantes, seus sucessivos empregadores, lucram com o negócio jurídico. Esse entendimento, além de suprir a hipossuficência dos empregados e preservar seus créditos com o empregador, observa o princípio da proteção, cerne do Direito do Trabalho. Esse é o escólio de Maurício Godinho Delgado, para quem “a jurisprudência tem ampliado as possibilidades de responsabilização subsidiária do antigo titular do empreendimento por além das situações de fraude comprovadas no contexto sucessório (art. 9º, CLT; art.159, CCB/1916, e art. 186, CCB/ 2003, combinados com art. 8º, parágrafo único, CLT). Mesmo que não haja fraude, porém comprometimento das garantias empresariais deferidas aos contratos de trabalho,incidiria a responsabilidade subsidiária da empresa sucedida” (DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho. 10ª edição. São Paulo: LTr, 2011, p.419 - grifou-se). Por fim, os artigos 10 e448 da CLT não impedem a atribuição de responsabilidade solidária ou subsidiária à sociedade sucedida nas circunstâncias registradas na decisão regional, uma vez que ela apenas estabelece que a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afeta os contratos de trabalho dos respectivos empregados.Recurso de revista não conhecido. (RR 34-66.2010.5.11.0004, 2ª T., Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, DEJT 09.11.12).

Sobre a autora
Caroline Marri de Souza Albuquerque

Analista do Ministério Público da União

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALBUQUERQUE, Caroline Marri Souza. A sucessão de empregadores na visão da doutrina e da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4811, 2 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51685. Acesso em: 23 dez. 2024.

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