Quem mora em condomínio sabe o quão corriqueiro são reclamações envolvendo condôminos, especialmente quando o assunto é barulho e uso de vaga na garagem, cujas reclamações normalmente são registradas no livro de ocorrência e pode culminar com advertência e/ou multa ao infrator, conforme a regra de cada nicho condominial.
Porém, tão certa quanto a existência de condôminos que constantemente e/ou esporadicamente infringem as regras condominiais, é a existência do condômino “reclamão”, que é aquela pessoa que reclama de tudo e de todos, que realiza reclamações constantes no livro de ocorrência, questiona – sem razão – todas as deliberações da assembleia, não aceita ser derrotada em votações e inúmeras outras características que aqueles que moram em condomínio conseguem identificar facilmente quem é o “reclamão”.
No entanto, ao analisarmos as convenções condominiais, verificamos ser perceptível mais facilmente descrição das ações que são passiveis de punição por infração, mas, ao aprofundarmos as regras condominiais, e utilizarmos como suporte o Código Civil, Constituição e em alguns casos até mesmo o Código Penal verificamos ser plenamente legal, cabível e necessário punir o “reclamão”.
E nada mais justo, pois a conduta do “reclamão” pode ser enquadrada como antissocial e consequentemente encontra o respaldo nas regras condominiais e no Código Civil, pois todos que convivem com um vizinho assim sabem o quão perturbador para o sossego, privacidade, intimidade, honra e à própria gestão condominial são os atos praticados pelo "reclamão”.
Entretanto, até pelo fato de que o “reclamão” sempre acredita ter a razão, pelo subjetivismo do que é uma conduta antissocial e pelo fato de que, salvo raras exceções, pessoas com tais características raramente mudam sua percepção, o procedimento judicial é cabível e até mesmo necessário, e podemos exemplificar:
- Condômino é a vítima.
Quando um condômino é o alvo do “reclamão”, ao analisarmos o livro de ocorrência do condomínio ou outro meio de registro de reclamação é possível identificar a existência de relatos constantes que fogem da normalidade. Ou seja, não é anormal que vez ou outra uma unidade condominial seja alvo de reclamação por barulhos em sua unidade, ocasião em que a simples ligação do porteiro consegue solucionar o problema e quando isso não resolver a advertência e/ou multa é aplicada. Porém, é normal que exista mais de um condômino reclamado do barulho e da mesma unidade e/ou a constatação da infração pelo funcionário ou síndico.
Porém, há casos em que o condômino relata que frequentemente é questionado pela administração sindical para prestar informações sobre barulho, recebe ligações constantes do porteiro e no livro de ocorrência há sempre reclamações sobre os mais diversos problemas que partem de sua unidade, porém, em todas essas situações é comum ter como reclamante vários registros do “reclamão” e inexistir qualquer infração condominial constatada pela administração. Ou seja, o condômino que enfrenta tal situação está tendo seu sossego lesado e sua honra violada, pois quem é que gosta de frequentar o livro de ocorrência sem nada fazer e que ainda precisa se defender constantemente do que não faz?
Destarte, inegável que situações análogas, desde que devidamente comprovadas, possibilitam ao lesado interpor ação judicial em face do “reclamão” em razão da violação ao direito do sossego, honra, difamação e inúmeras outras lesões que podem existir e depende da análise correta do caso em concreto.
Na ação judicial o lesado poderá pleitear indenização por danos morais e a obtenção de decisão judicial visando inibir a continuidade de reclamações, sem que esteja lastreada em justificativa real, sob pena do “reclamão” pagar multa ou outra punição, tudo realmente dependerá do procedimento judicial adotado e do caso concreto.
- Condomínio/síndico como vítima
Em outros momentos o alvo do “reclamão” pode ser o condomínio/síndico, ocasião em que analisando o livro de ocorrência é possível observar as mais diversas reclamações, sobre os mais diversos temas, em uma intensidade muito acima do socialmente aceitável, e sem qualquer analogia com apontamentos realizados por outros condôminos.
Não bastassem os registros no livro, é extremamente comum ouvir relatos de que o “reclamão” sempre que encontra com outro condômino, funcionário etc. possui o hábito de criticar; postura que fica mais evidente quando da realização das assembleias condominiais, pois o “reclamão” possui o habito de contestar tudo, rebater tudo, pedir constantemente a palavra, alegar que é possuidor das idéias mais mirabolantes e conhecedor aprofundado de todos os assuntos. E, quando a assembléia aprova deliberações opostas aos seus desejos, passa a interpor recursos em cima de recursos, questiona aprovações, solicita revisão de atas, ou seja, demonstra que não consegue conviver amistosamente com a derrota e cria um clima desarmônico constantemente.
Contudo, vale destacar que o “reclamão” não deve ser confundido com aquele condômino que, ainda que realize reclamações constantes, as mesmas são fundadas e refletem no salutar e necessário direito de participação e proteção de seus direitos.
E o “reclamão” também possui como característica a de questionar todas seus descontentamentos administrativamente, sendo raríssimos os casos em que suas reclamações são questionadas pela via judicial, postura que colide com a quantidade de relatos, afinal é pouco normal um condômino aceitar pacificamente tamanha quantidade de violações em seu direito sem questionar o assunto judicialmente.
Dessa forma, a atitude do “reclamão” pode também violar direitos do condomínio/síndico, que ao se sentir lesado poderá questionar a legalidade de tal postura judicialmente.
Portanto, é possível afirmar que, não apenas o condômino que viola as regras de garagem, uso da área comum, barulho, etc. deve ser punido, o condômino “reclamão” da mesma sorte precisa ser punido, pois seus atos também violam a tranquilidade, o sossego, a vida harmoniosa e a convivência saudável e necessária no nicho condominial.
Conclui-se, portanto que o síndico, condomínio, condômino ou qualquer outra pessoa que se sentir lesada pelos atos praticados pelo “reclamão” poderá questionar o assunto judicialmente, interpondo ações indenizatórias e/ou objetivando que o Poder Judiciário conceda ordem inibitória de atos, sob pena do “reclamão” pagar multa, procedimento que muitas vezes é necessário para garantia do sossego e tranquilidade dos lesados.