1. HISTÓRICO DE FORMAÇÃO DA JUSTIÇA
As primeiras manifestações de organização da justiça militar no Brasil ocorreram no século XVII, com a formação das juntas militares. Estas tinham a função de realizar julgamentos de réus militares. Sua formação se deu principalmente devido ao fato de ocorrer demora no julgamento desses réus, que estava até então sob a competência do Conselho de Guerra de Lisboa. Essa morosidade era tida como estimuladora para a prática de novos crimes, haja vista o considerável lapso temporal entre a conduta delituosa e o proferimento da sentença condenatória. Objetivava-se, portanto, dar maior celeridade ao andamento dos processos. A primeira junta militar foi organizada na capitania hereditária do Pará, em 1758.
A justiça militar passou a ter uma estrutura mais complexa após a vinda da família real portuguesa para o Brasil. O imperador da França Napoleão Bonaparte, no seu projeto expansionista sobre toda a Europa no início do século XIX, buscava alargar as fronteiras do seu domínio. O seu maior opositor, a Inglaterra, era o principal entrave aos seus planos. Portugal, aliado histórico dos ingleses, viu-se em uma situação delicada. Não queria ser considerado um inimigo por Napoleão, assim como não queria fazer algo que prejudicasse os ingleses. Acuado, D. João, o provável herdeiro da coroa, resolveu embarcar para o Brasil, trazendo consigo a nobreza portuguesa.
Esse evento desencadeou uma série de transformações de grande impacto, e foi o propulsor para um conjunto de mudanças políticas e administrativas que passaram a ocorrer na então colônia portuguesa. D. João implantou no Brasil uma máquina pública mais complexa e sofisticada capaz de atender a nova demanda imposta pelo estabelecimento da corte portuguesa. Foram criados órgãos públicos de administração e de justiça. Assim, através do Alvará de 1º de Abril de 1808, com força de lei, foi criado o primeiro órgão colegiado de justiça do Brasil, o Conselho Supremo Militar e de Justiça.
A Coroa portuguesa viu a necessidade de criação do Conselho Supremo Militar e de Justiça principalmente devido à nova realidade que lhe era imposta ante as circunstâncias de estar longe dos Conselhos de Guerra, do Almirantado e do Ultramar. Fez-se preciso criar no território da colônia um órgão que exercesse funções equivalentes às desempenhadas por aqueles órgãos em Portugal. A ausência da atuação desses conselhos poderia, no entendimento da Coroa, prejudicar o interesse público como também os daqueles que serviam ao Exército e à Armada. O Conselho Supremo Militar e de Justiça serviria para manter a disciplina militar e o regulamento das forças armadas, consideradas de fundamental importância para a defesa dos interesses de Portugal. Sua sede ficou estabelecida no Rio de Janeiro.
1.1. Organização do Conselho Supremo Militar e de Justiça
As funções do Conselho Supremo Militar e de Justiça estavam diretamente relacionadas às desempenhadas em Lisboa pelos conselhos de Guerra, do Almirantado e do Ultramar. O Conselho de Guerra possuía competências administrativas e Jurisdicionais, funcionando como um tribunal militar. O Conselho do Almirantado funcionava como um tribunal de instância superior aos conselhos de guerra. Do Conselho Ultramarino o Conselho Supremo Militar e de Justiça absorveu somente as atribuições militares. Com a criação e implantação desse Conselho os governadores das capitanias hereditárias perderam a autoridade que até então exerciam sobre patentes.
O Alvará de 1º de Abril de 1808 estabeleceu ainda que, no desempenho de suas competências, o Conselho deveria realizar os julgamentos conforme o que se preceituava no Regimento Militar, leis e ordenanças militares da época, Alvará de 6 de Abril de 1800, Regimento Provisional aprovado por Decreto de 20 de Junho de 1796, Resoluções Régias e na Ordenança de 9 de Abril de 1805.
O Conselho Supremo Militar era composto pelo Conselho Supremo Militar e pelo Conselho de Justiça, que desempenhavam funções distintas e independentes. Estes conselhos teriam de reunir-se extraordinariamente se assim fosse solicitado.
1.1.1. Supremo Tribunal Militar
Estabelecia o Alvará de 1º de Abril de 1808, que o Conselho Supremo Militar seria regido pelo mesmo regimento do Conselho de Guerra de Lisboa, de 22 de Dezembro de 1643, e demais legislações que o disciplinavam. Este primeiro Conselho pode ser considerado como um equivalente em terras coloniais do segundo que estava estabelecido em Lisboa. O Conselho Militar foi pensado com o propósito de atuar em matérias de competência que em Portugal eram reservadas ao Conselho de Guerra. Era um órgão que desempenhava funções de natureza administrativas assim como também judiciárias, sendo a instância superior da justiça militar.
O Conselho era formado por oficiais generais do Exército e da Armada Real, assim como também por oficiais de ambos que fossem nomeados pelo Príncipe Regente. Estes últimos atuavam como vogais, mas não dispunham dos privilégios concedidos aos Conselheiros de Guerra. O Conselho Supremo Militar sofreu algumas alterações na sua composição. Inicialmente era composto por nove conselheiros, um secretário, três ministros adjuntos ao Conselho Supremo de Justiça e dois vogais. Posteriormente, passou a ter seis conselheiros, três vogais e quatro oficiais de secretaria. Em 1817 passou a contar com nove oficiais de secretaria, três vogais e dois ministros adjuntos. Em 1825 possuía oito conselheiros, três contínuos do Conselho e um da Secretaria, sete oficiais de secretaria efetivos.
Estabelecia ainda o Alvará de 1º de Abril de 1808 que ficariam a cargo do Conselho Supremo Militar as matérias que em Lisboa estavam distribuídas como de competência dos Conselhos de Guerra, do Almirantado e do Ultramar. Este último somente no que fosse concernente à parte militar, uma vez que lhe eram atribuídas em Lisboa outras competências. Este Conselho seria responsável também pela concessão de todas as patentes e, principalmente, pelo julgamento de processos administrativos. Ficou estabelecido ainda que haveria de ter um Secretário. O Alvará dispunha que o Conselho Supremo Militar deveria reunir-se de forma ordinária semanalmente em todas as segundas-feiras e sábados, com exclusão dos feriados ou dias de guarda.
1.1.2. Conselho de Justiça
O segundo órgão do Conselho Supremo Militar e de Justiça instituído pelo Alvará de 1° de Abril de 1808 foi o Conselho de Justiça. O referido Conselho era regulado pelos decretos de 20 de agosto de 1777, de 5 de outubro de 1778, 13 de agosto e 13 de novembro de 1790. Sua competência incidia sobre matérias relativas a julgamento das questões judiciais. Preceituava o Alvará que ficariam a cargo desse conselho o conhecimento e julgamento dos processos criminais que tivessem como réus pessoas que gozassem de foro militar e que, em virtude das ordens régias, deveriam ser remetidos ao Conselho de Guerra sem apelação da parte. Deveram ainda ser submetidos à apreciação do Conselho de Justiça todos os Conselhos de Guerra que fossem estabelecidos nas capitanias hereditárias, com exceção das capitanias do Maranhão e do Pará e dos Domínios Ultramarinos. Tal se deu devido a grande distância destas e a dificuldade de navegação para o Rio de Janeiro.
O Alvará estabelecia que o Conselho de Justiça deveria reunir-se de forma ordinária semanalmente todas as quartas-feiras de tarde, com exceção feitas aos dias que fossem feriados ou da guarda. Deveria reunir-se extraordinariamente nas quintas-feiras quando o juiz relator do Conselho o avisasse e requeresse, com o propósito de julgar em última instância as prezas feitas por embarcações de guerra da Armada Real. Estabeleceu-se ainda que o Conselho deveria ser composto dos Conselheiros de Guerra, Conselheiros do Almirantado e mais Vogais e de três Ministros Togados nomeados pelo príncipe regente, sendo que um deles exerceria a função de Relator.
1.2. Evolução Histórica
Não ficou disposto no Alvará de 1º de Abril de 1808 quem deveria exercer a função de presidente do Conselho Supremo Militar e de Justiça. Esta função ficou então a cargo do chefe de Estado durante todo e império como também nos primeiros anos da República. Presidiram o Conselho nessa condição, sucessivamente, D. João VI, D. Pedro I, D. Pedro II e, após a proclamação da Republica, o Marechal Deodoro da Fonseca e o Marechal Floriano Peixoto. Somente a partir de 18 de julho de 1893 essa situação foi alterada através de decreto legislativo. A partir daí a presidência passou a ser exercida por um dos membros do próprio Conselho eleito entre os mesmos.
O Conselho Supremo Militar e de Justiça conservou este nome até o ano de 1893, quando passou a ser chamado de Supremo Tribunal Militar. Os seus membros passaram a ser chamados de Ministros. Através do Decreto Legislativo nº 149, de 18 de Julho de 1893 ficou estipulado que seria composto por onze ministros. Seu colegiado foi reduzido a nove ministros pelo Decreto nº 14.450, de 30 de Outubro de 2010. O Decreto nº 17.231-1 de 26 de fevereiro de 1934 fixou em dez o número de ministros. A Constituição de 1934 elevou a onze ministros a sua composição. Após esta Constituição, o Tribunal passou a ser um órgão integrante da estrutura de organização do Poder Judiciário, desvencilhando-se do Poder Executivo. Com a Constituição de 1946, O Supremo Tribunal Militar passou a ser chamado Superior Tribunal Militar. Esta ultima nomenclatura perdura até os dias atuais. Esta Constituição manteve o quantitativo de onze ministros. O Ato Institucional nº 2, de 27 de Outubro de 1965 aumentou para quinze o número de ministros, que foi mantido pela Constituição de 1988.
REFERÊNCIAS
ARLEU, Mônely. Breve Escorço Histórico, Estrutural e Funcional da Justiça Militar no Brasil. Direito Militar 1 mai. 2013. Disponível em: <http://direitocastrense.blogspot.com.br/2013/05/breve-escorco-historico-estrutural-e-funcional-da-justica-militar-no-brasil.html>. Acesso em: 17 jul. 2013.
BRASIL. Alvará de 1º de Abril de 1808. Crêa o Conselho Supremo Militar e de Justiça. Planalto.gov.br. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_22/alvara_1.4.htm>. Acesso em: 17 jul. 2013.
CABRAL, Dilma. Conselho Supremo Militar e de Justiça. Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, 2011. Disponível em: <http://linux.an.gov.br/mapa/?p=2642>. Acesso em: 17 jul. 2013.
CORRÊA, Daniel M. Aspectos Gerais da Justiça Militar. Âmbito Jurídico.com.br, Rio Grande, 2013. Disponível em:< http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9848>. Acesso em: 17 jul. 2013.