4). Conclusão
Vigorante entre nós a presunção de inocência ou não culpabilidade, e também o favor rei, a só existência de inquérito policial ou ação penal em curso, sem solução definitiva e desfavorável ao acusado, não pode ser valorada negativamente sob o enfoque de antecedentes criminais, pena de se ver configurado inaceitável e inconstitucional contrassenso.
Como bem observou o E. Min. Marco Aurélio, é preciso ter em mente que “(...) sendo o Direito uma ciência, o meio justifica o fim, e não este, aquele, e que os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio e, diria mesmo, coerente”.[31]
Notas
[1] Rafaele Garofalo, Criminologia, tradutora Danielle Maria Gonzaga, coord. Vair Gonzaga, Campinas, Péritas Editora, 1987.
[2] Edmundo Mezger, Criminologia, 2ª ed., Madrid, Editorial Revista de Derecho Privado, trad. De José Arturo Rodrígez Muñoz, 1950.
[3] Antonio Beristain, Derecho penal y criminologia, Bogotá, Temis, 1986.
[4] Alessandro Baratta, Criminologia crítica e crítica do Direito Penal, 2ª ed., São Paulo, Freitas Bastos, 1999.
[5] Jorge Figueiredo Dias e Manuel da Costa Andrade, Criminologia – O homem delinquente e a sociedade criminógena, 2ª reimp., Coimbra, Coimbra Editora, 1997.
[6] Jeremias Bentham, Teoria das penas legais, São Paulo, Livraria e Editora Logos, s/data.
[7] Santiago Mir Puig, Funcion de la pena y teoria del delito en el Estado Social y Democratico de Derecho, 2ª ed., Barcelona, Bosch, 1982.
[8] Criminologia clínica e psicologia criminal, 3ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, p. 219.
[9] Laércio Pellegrino, Vitimologia, Rio de Janeiro, Forense, 1987.
[10] Edgard de Moura Bittencourt, Vítima, São Paulo, Leud, 1987.
[11] Enrico Ferri, Princípios de Direito Criminal, trad. de Paolo Capitanio, Campinas, Bookseller, 1996, p. 330.
[12] “A origem desse princípio ‘remonta ao art. 9º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão proclamada em Paris em 26-8-1789 e que, por sua vez, deita raízes no movimento filosófico-humanitário chamado ‘Iluminismo’, ou Século das Luzes, que teve à frente, dentre outros, o Marquês de Beccaria, Voltaire, Montesquieu, Rousseau. Foi um movimento de ruptura com a mentalidade da época, em que, além das acusações secretas e das torturas, o acusado era tido como objeto do processo e não tinha nenhuma garantia. Dizia Beccaria que ‘a perda da liberdade sendo já uma pena, esta só deve preceder a condenação na estrita medida que a necessidade o exige’ (Dos delitos e das penas, São Paulo: Atena Ed., 1954, p. 106)” (STF, HC 99.141/SP, 1ª T., rel. Min. Luiz Fux, j. 29-3-2011, DJe 071, de 14-4-2011, RT 908/448).
[13] Segundo Julio Fabbrini Mirabete: “O que se entende hoje, como diz Florian, é que existe apenas uma tendência à presunção de inocência, ou, mais precisamente, um estado de inocência, um estado jurídico no qual o acusado é inocente até que seja declarado culpado por uma sentença transitada em julgado” (Processo penal, 16. ed., São Paulo, Atlas, 2004, p. 45).
[14] Gustavo Henrique Badaró, Direito processual penal, São Paulo, Elsevier-Campus Jurídico, 2008, t. I, p. 16.
[15] Vicente Gimeno Sendra, Derecho procesal penal, Navarra, Civitas, 2012, p. 129.
[16] Julio B. J. Maier, Derecho procesal penal – Fundamentos, 2ª ed., 4ª reimp., tomo I, Buenos Aires, Editores Del Puerto, 2012, p. 490.
[17] STF, AP 447/RS, Tribunal Pleno, rel. Min. Carlos Britto, j. 18-2-2009, DJe de 29-5-2009; STF, AP 430/RS, Tribunal Pleno, rela. Mina. Cármen Lúcia, j. 7-8-2008, DJe de 26-9-2008. “A condenação criminal não pode ser apoiada em mera presunção, desacompanhada de outros elementos de convicção” (STF, AP 330/SP, Tribunal Pleno, rel. Min. Sydney Sanches, j. 24-10-2002, DJe de 5-9-2003). “Não existindo, nos autos, prova judicializada suficiente para a condenação, nos termos do que reza o artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, impõe-se a absolvição” (STJ, REsp 1.253.537/SC, 6ª T., rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. 1º-9-2011, DJe de 19-10-2011).
[18] “O princípio processual penal do favor rei não ilide a possibilidade de utilização de presunções hominis ou facti, pelo juiz, para decidir sobre a procedência do ius puniendi, máxime porque o Código de Processo Penal prevê expressamente a prova indiciária, definindo-a no art. 239 como ‘a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias’” (STF, HC 111.666/MG, 1ª T., rel. Min. Luiz Fux, j. 8-5-2012, DJe 100, de 23-5-2012).
[19] De igual teor, conferir: Raúl Washington Ábalos, Derecho procesal penal, 2. ed., Mendoza, Ediciones Jurídicas Cuyo, 2006, t. I, p. 141.
[20] Giuseppe Bettiol, Istituzioni di diritto e procedura penale, Padova, CEDAM – Casa Editrice Dott. Antonio Milani, 1966, p. 214.
[21] Há divergência na doutrina, pois alguns afirmam que esse princípio determina que a dúvida deve ser resolvida em favor do acusado, referindo-se à prova do processo (absolvição por insuficiência de prova); e só a defesa dispõe de certas faculdades jurídicas, tais como ação rescisória e embargos infringentes; manifestando-se, ainda, na vedação à possibilidade de reformatio in pejus. Conferir a esse respeito o pensamento de Tourinho Filho (Manual de processo penal, 15. ed., São Paulo, Saraiva, 2012, p. 75) e Fernando Capez (Curso de processo penal, 19. ed., São Paulo, Saraiva, 2012, p. 84).
[22] Guilherme de Souza Nucci, Manual de processo e execução penal, 8. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2011, p. 85.
[23] STJ, REsp 1.201.828/RJ, 6ª T., rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 1º-9-2011, DJe de 5-3-2012.
[24] STF, HC 72.093/SP, 1ª T., rel. Min. Ilmar Galvão, j. 14-2-1995, DJ de 31-3-1995, p. 7.774. “Incensurável a dosimetria da pena, tendo em vista tratar-se de paciente com antecedentes desabonadores, consistentes em indiciamento em outro inquérito policial instaurado para apuração de crime da mesma natureza (contra o patrimônio)” (STF, HC 72.643/SP, 1ª T., rel. Min. Celso de Mello, rel. p/ o Acórdão Min. Ilmar Galvão, j. 6-2-1996, DJ de 17-5-1996, p. 16.323).
[25] STF, HC 68.290/DF, 2ª T., rel. Min. Carlos Velloso, j. 16-10-1990, DJ de 16-11-1990, p. 13.059. “Embora tecnicamente primária, não podem ser considerados bons os antecedentes registrados na vida pregressa da paciente que responde a mais de sessenta inquéritos policiais já instaurados e a mais de vinte ações penais, oito das quais em grau de recurso interposto pela defesa no próprio tribunal apontado como coator” (STF, HC 73.297/SP, 2ª T., rel. Min. Maurício Corrêa, j. 6-2-996, DJ de 16-8-1996, p. 28.108).
[26] STF, HC 70.871/RJ, 2ª T., rel. Min. Paulo Brossard, j. 11-10-1994, DJ de 25-11-1994, p. 32.299.
[27] Renato Marcão. Curso de Processo Penal. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 2016; Código de Processo Penal Comentado, São Paulo, Saraiva, 2016.
[28] Carlos Maximiliano, Hermenêutica e aplicação do direito, 18. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2000, p. 16.
[29] STF, RE 591.054/SC, rel. Min. Marco Aurélio, j. 17-12-2014, DJe n. 037, de 26-2-2015.
[30] STF, HC 126.315/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15-9-2015, DJe n. 246, de 7-12-2015.
[31] STF, RE 591.054/SC, rel. Min. Marco Aurélio, j. 17-12-2014, DJe n. 037, de 26-2-2015.