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A estrutura legal do Sistema Único de Saúde:

breve escorço sobre o Direito Constitucional Sanitário

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Agenda 05/07/2004 às 00:00

O artigo estuda a dimensão do Direito Sanitário brasileiro a partir de um relato de sua evolução legislativa infraconstitucional até o tratamento dado pela atual Constituição, sobremaneira no âmbito federativo.

RESUMO

O artigo procura traçar um panorama sobre a dimensão do Direito Sanitário brasileiro a partir de um relato de sua evolução legislativa infraconstitucional até o tratamento dado pela atual Constituição, sobremaneira no âmbito federativo.


ABSTRACT

The article makes an approuch on Brazil’s health Law since an historical point of view over this specific legislation until the present Constitution which gives a federalist treatment in this subject.


Conceito e evolução do sistema através das Normas Operacionais Básicas

O Sistema Único de Saúde – SUS é um modelo de ação social integrada e descentralizada de matiz constitucional como visto anteriormente. O seu perfil, como sejam os seus princípios e seus objetivos, é traçado pela Lei Fundamental no art. 194 na ampla compreensão que dá ao direito de seguridade social no título da Ordem Social. Seu conceito é obtido na legislação ordinária como sendo "o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público" (Lei 8.080/90, art. 4º ).

No plano infraconstitucional o legislador não se esquivou da tradição de compor a normatização do SUS através de uma lei orgânica que, como tal, pretende sistematizar de maneira lógica e funcional os desideratos do direito à saúde enquanto política pública em uma ordem institucional complexa, tal como o federalismo brasileiro.

É precisamente esse, a partir de uma perspectiva político-constitucional, o mais delicado desafio da legislação básica de direito sanitário no país: organizar e equilibrar coerentemente a exigência da realização do mandamento constitucional da saúde enquanto direito fundamental, e assim sendo amplo e indefectível, com o modelo tripartite de federalismo acolhido pela Constituição de 1988 em um ambiente claramente assimétrico, assinalado por desigualdades inter e intra-estaduais.

A Lei 8.080, de 19.09.1990 irá constituir a chamada Lei Orgânica da Saúde e buscará atacar o problema do equilíbrio federativo nos pontos mais estrangulados pela anterior prática de excessivo centralismo, cujo modelo paroxístico foi o INAMPS, em dois pontos: o financiamento e a gestão, de que trataremos melhor mais adiante.

A Lei 8.080/90 foi alvo de uma série de vetos que provocaram a necessidade de formulação de um novo diploma para a regulação do controle do sistema por parte da sociedade civil, como previa a Constituição de 1988 (art.194, parágrafo único, VII), com o que surge a Lei 8.142, de 28.12.1990.

A atividade normativa mais intensa, entretanto, revela uma característica idiossincrática do direito sanitário, que é o ser de natureza eminentemente regulatória, exercendo seu alcance por meio de uma significativa atividade legiferante do Executivo, destacadamente as portarias chamadas de Normas Operacionais Básicas (NOB) e, atualmente, Normas Operacionais de Assistência à Saúde (NOAS).

Esse aspecto próprio do direito sanitário é apontado pelo Professor BARROS TOJAL (1994:22) que afirma com acerto:

"A partir do momento em que se consolida o modelo do Estado Social, e a sua evidência resta absolutamente clara entre nós, especialmente à luz das considerações a propósito da ordem econômica da Constituição de 1988, o direito assume o papel de fator implementador das transformações sociais, veiculando inclusive prestações públicas. Por conseqüência, opera-se uma rematerialização da racionalidade legal".

Esse aspecto é bastante sensível no direito sanitário em função da dinâmica do seu objeto, bem como de seus particularismos, o que o torna especialmente avesso aos moldes de normatização estatutária do direito clássico, aos princípios de segurança jurídica e separação de poderes analisados sob uma ótica estreita, ponto de vista, ademais, em geral inconveniente para o cientista social.

No direito sanitário a tendência comumente apontada pelos publicistas desde LOEWENSTEIN, consoante noticia Clèmerson Clève (1993:49) quanto ao robustecimento do Poder Executivo em face da nova e volátil dinâmica da sociedade pós-moderna e pós-industrial, é destacada. O Estado passa a assumir a função de suprir demandas que antes eram resolvidas no espaço individual ou familiar. A saúde é um exemplo mais do que claro do argumento, pois se doenças menos ofensivas ainda se prestam aos preparos medicamentosos caseiros, as epidemias e a saúde preventiva apresentam espectro meta-individual e meta-familiar.

Dessa maneira é que em 08.01.1991 a Secretaria Nacional de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde reúne as Portarias de 15 a 20 na forma da NOB 01/91 e a Resolução 258, do Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social - INAMPS, norma administrativa editada com vistas a regulamentar e dar cumprimento à disciplina constitucional e legal sobre a ação sanitária do Estado na forma do Sistema Único de Saúde.

Essa importante norma administrativa será a primeira de uma série de NOBs que traçarão o desenvolvimento e a implementação do ideal de proteção integrada à saúde no Brasil. A NOB 01/91 destaca-se pela criação do SISTEMA DE INFORMAÇÃO HOSPITALAR (SIH/SUS) e do SISTEMA DE INFORMAÇÃO AMBULATORIAL (SAI/SUS) que serão os mecanismos, doravante, de organização e operacionalização dos pagamentos dos serviços hospitalares e ambulatoriais.

A NOB 01/91 irá adotar alterar o critério para distribuição das AIH (autorizações de internamento hospitalar) e UCA (Unidade de Cobertura Ambulatorial), que antes era baseado na relação direta entre os serviços prestados pelos Estados e Municípios. O critério da produtividade, por assim dizer, é comutado pelo parâmetro de atendimento de 10% da população-ano. Dessa forma, a Portaria 19, de 08.01.91, que integra a NOB 01/91 definiu para o Estado do Pará, ilustrativamente, 35.945 AIH-ano por um critério populacional e não mais de volume de internações feitas anteriormente.

É de se observar que com a NOB 01/91 é clara a intenção de estruturar o serviço de saúde pública em outras bases e voltados a outros objetivos, desta vez profundamente influenciados pela política sanitária sugerida pela Constituição Federal, qual seja a da gestão descentralizada da saúde. Em insistindo na continuidade do critério produção-pagamento a relação entre a União e Estados e Municípios seria sempre a de prestadores de serviço de saúde, o que nitidamente é a intenção da Constituição de 1988, nem a da Lei 8.080/90, a qual se preocupa expressamente ao estabelecer as diretrizes do SUS em acentuar a capacidade de gestão* em cada esfera federativa, senão vejamos:

"Art. 7º. As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:

...

IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:

a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;

b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;

X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;

XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e

XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos" (Grifos nossos).

A evolução do aparato regulatório do SUS vai apresentar uma linha extremamente coerente no sentido de realizar o preceito da gestão descentralizada. A Resolução 258, de 07.01.91 que irá compor o texto da NOB 01/91, entretanto, não escapou às críticas pela marca centralista que ainda sugeria ao colocar o INAMPS como controlador do SUS. De fato, a posição do INAMPS no processo é ambígua porque por um lado representa uma estrutura centralizada, nacional, diretamente ligada ao Governo Federal e que nas reformulações pelas quais passa a Seguridade Social na década de 1990 perde completamente o significado, mais precisamente após a extinção do SINPAS e a criação do INSS. Com a Lei 8.080/90, art. 39, §5º todo patrimônio imobiliário do INAMPS passa a ser transferido para os órgãos que integram o SUS. Ademais a Constituição Federal atribui a competência para ação sanitária (art.198) ao SUS, perdendo o sentido a presença extemporânea do INAMPS na dita Resolução. Nesse diploma administrativo é reconhecida a necessidade da descentralização pelo que cabe ao INAMPS, quanto à supervisão das atividades de saúde "conceder um crédito de confiança aos Estados e Municípios, sem prejuízo do acompanhamento a ser exercido pelos mecanismos de controle e avaliação que estavam sendo desenvolvidos". Além do que a transferência dos recursos do INAMPS para as unidades federativas dar-se-ia mediante celebração de convênios. Sobre isso observa com acidez SANTOS citado por MONTEIRO DE ANDRADE (2001:37):

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"O Sistema Único de Saúde de repente passou a ser controlado pelo INAMPS, que num ‘crédito de confiança’, resolveu delegar competências ‘suas’(?) aos Estados e Municípios, o que é um absurdo jurídico!...Não podemos esquecer que o INAMPS não pode mais ser tido como o organismo nacional de assistência médica. Deve ser definido (pois ele não foi extinto)...É de se mencionar, também, que não há mais como alocar recursos para serviços de assistência à saúde no orçamento do INAMPS, uma vez que não lhe cabe mais prestar serviços (...)A União, os Estados, O Distrito Federal e os Municípios têm a sua competência determinada pela Constituição da República. Portanto, estão em pé de igualdade entre si, porque nenhuma destas esferas recebe sua competência da outra, mas da Constituição. Conseqüência disso: a) a descentralização estabelecida pela Constituição da República é essencialmente política, ou político-administrativa; b) sendo política, deve-se concretizar sem nenhum entrave, requisito ou pressuposto administrativo; c) o convênio é instrumento de descentralização administrativa; d) logo, a efetivação da descentralização política não pode depender de convênio, que é instrumento administrativo de atuação; e) não se opera a descentralização por convênio, uma vez que a descentralização é política nascida da Constituição da República; f) a Lei Orgânica da Saúde é o instrumento nacional garantidor da unicidade conceitual e operativa do sistema".

Dessa maneira cabe relativizar a presença dos Convênios como instrumentos componentes da estrutura legal do SUS durante a vigência da NOB 01/91. Hodiernamente, como veremos adiante os convênios são formulados para o financiamento de projetos e programas específicos na área de saúde.como os de qualidade do sangue, para garantia de qualidade e auto-suficiência de sangue, componentes e derivados sanguíneos com a implantação de unidades de hematologia e hemoterapia, o programa de saúde mental para atenção extra-hospitalar ao portador de transtorno mental, programa de valorização do idoso, mantidos pelo Ministério da Saúde e outros às expensas da Fundação Nacional de Saúde – FUNASA, como os sistemas de abastecimento de água, serviços de drenagem para o controle da malária, unidades de zoonoses e fatores biológicos de risco etc.

Sucedeu a NOB 01/91 a NOB 01/92 e NOB 01/93. Quanto à primeira cabe destacar que ela avançou na seara do financiamento ao alocar os recursos do INAMPS para o Fundo Nacional de Saúde, superando assim a crítica de centralismo e a aura de inconstitucionalidade do controle estabelecido pela Norma Operacional anterior, tal como exposto acima. A NOB 01/92 acena com um mecanismo bastante peculiar de incentivo e estímulo à descentralização que são os FEM e FEGE (Fator de Estímulo à Municipalização e fator de Estímulo à Gestão Estadual, respectivamente), bem como o Pró-Saúde o qual buscava a realização da gestão de referência regionalizada referida na LOS, art. 7º, IX, "b". Tal Norma, contudo, não conseguiu tornar efetivas tais previsões, mas ampliou o número de municípios credenciados para gestão municipalizada da saúde para 1.074, mais que o triplo do obtido em 1991 (321).

A NOB 01/93, criada pela Portaria 545, de 20 de maio de 1993, é sob muitos aspectos divisora de águas no plano do desenvolvimento da política sanitária brasileira desde a CF/88. Primordialmente por ter sido concebida em um amplo debate nascido na IX Conferência Nacional de Saúde, em Brasília, de 9 a 14 de agosto de 1992. Nesse momento, as avaliações dos gestores e secretários de saúde, assim como técnicos dos Estados e Municípios já permitia antever, diante da mudança de administração no Ministério da Saúde, a verticalização do processo de municipalização. Em 24 de maio de 1993 é publicado o documento A ousadia de cumprir e fazer cumprir a Lei, uma exposição de motivos que compõe a NOB 01/93, a qual nos referiremos com mais acuro adiante. Importa notar agora que a NOB 01/93 perfilou situações transacionais para o processo de municipalização plena da gestão, estabelecendo três situações distintas: a transacional incipiente, parcial e semiplena. A NOB 01/93 também acentuou a importância da implantação de uma política de formação de recursos humanos na área de saúde, o efetivo funcionamento dos Conselhos de Saúde e Conferência de Saúde criados pela Lei 8.142/90, e a implantação das Comissões Intergestores tripartite (federal) e bipartite (estadual) e, last but not least, o aporte de recursos para o Fundo Nacional de Saúde pelas três esferas de governo. Cabe observar que a NOB 01/93 resulta de um processo de convicção de que os objetivos já desenhados pelos Constituição, Lei 8.080/90 e 8.142/90 estavam corretos e provocariam as mudanças desejadas para uma situação ideal de "política sanitária cidadã" para o Brasil. Mister recordar, contudo, que apenas em novembro de 1994 com o decreto 1.232, de 30 de agosto daquele ano foi regulamentada e viabilizada operacionalmente a transferência automática e direta de recursos para os municípios em gestão semiplena.

Por maior que tenha sido o avanço técnico proposto pela NOB 01/93, noticia MONTEIRO DE ANDRADE (2001:58):

"Pode-se constatar que, dos 4.976 municípios brasileiros, apenas 3.127 (62.84%) estavam enquadrados em algum tipo de gestão. Ressalte-se que, destes, 2.367 (47,56%) achavam-se em gestão incipiente, 616 (12,38%) na parcial e somente 144 (2,89%) em gestão semiplena. Isto demonstra que, mesmo com a NOB 01/93, a grande maioria dos municípios brasileiros, 97,7%, encontravam-se na condição de prestadores de serviço de saúde.

"Outras limitações que podem ser percebidas na NOB 01/93 seriam a ausência de definições acerca da vigilância sanitária, epidemiológica e de endemias como também quanto ao estímulo para inversão do modelo de atenção".

A NOB 01/96 editada pela Portaria MS 2.203, publicada no DOU a 6 de novembro de 1996 por sua vez amplia em consonância com a LOS a atuação da política de saúde em três áreas, quais sejam a assistência, as intervenções ambientais e as políticas externas ao setor saúde, in verbis:

"A atenção à saúde, que encerra todo o conjunto de ações levadas a efeito pelo SUS, em todos os níveis de governo, para o atendimento das demandas pessoais e das exigências ambientais, compreende três grandes campos, a saber:

a)o da assistência, em que as atividades são dirigidas às pessoas, individual ou coletivamente, e que é prestada no âmbito ambulatorial e hospitalar, bem como em outros espaços, especialmente no domiciliar;

b)o das intervenções ambientais, no seu sentido mais amplo, incluindo as relações e as condições sanitárias nos ambientes de vida e de trabalho, o controle de vetores e hospedeiros e a operação de sistemas de saneamento ambiental (mediante o pacto de interesses, as normalizações, as fiscalizações e outros); e

c)o das políticas externas ao setor saúde, que interferem nos determinantes sociais do processo saúde-doença das coletividades, de que são partes importantes questões relativas às políticas macroeconômicas, ao emprego, à habitação, à educação, ao lazer e à disponibilidade e qualidade dos alimentos."

Lembra o já aludido MONTEIRO DE ANDRADE (2001:61) que essa norma irá fazer expressamente a diferença entre a gerência e a gestão do sistema de saúde. É a própria NOB que com perspicácia pontifica:

"Assim, nesta NOB gerência é conceituada como sendo a administração de uma unidade ou órgão de saúde (ambulatório, hospital, instituto, fundação etc.), que se caracteriza como prestador de serviços ao Sistema. Por sua vez, gestão é a atividade e a responsabilidade de dirigir um sistema de saúde (municipal, estadual ou nacional), mediante o exercício de funções de coordenação, articulação, negociação, planejamento, acompanhamento, controle, avaliação e auditoria. São, portanto, gestores do SUS os Secretários Municipais e Estaduais de Saúde e o Ministro da Saúde, que representam, respectivamente, os governos municipais, estaduais e federal.

A criação e o funcionamento desse sistema municipal possibilitam uma grande responsabilização dos municípios, no que se refere à saúde de todos os residentes em seu território. No entanto, possibilitam, também, um elevado risco de atomização desordenada dessas partes do SUS, permitindo que um sistema municipal se desenvolva em detrimento de outro, ameaçando, até mesmo, a unicidade do SUS. Há que se integrar, harmonizar e modernizar, com eqüidade, os sistemas municipais."

A NOB 01/96 vai definir com maior clareza o papel dos gestores nas três esferas de governo, pela primeira vez quanto à União, ademais. Demonstra, como visto acima, uma preocupação legítima com a necessidade de integrar as ações de maneira a evitar o enfraquecimento global do SUS na assimetria dos municípios brasileiros, com a manutenção do papel das Comissões bipartite e tripartite e os Conselhos de Saúde como órgãos de programação e pactuação entre os gestores.

Deve-se assinalar a criação da proposta do cartão sus municipal que permitiria a identificação simultânea do cidadão com seu sistema municipal de saúde e o sistema nacional e o incentivo ao modelo de agentes comunitários de saúde no combate aos riscos epidemiológicos. A NOB 01/96 vai instituir o Piso Assistencial Básico – PAB que garantirá o repasse automático para ações básicas em saúde.

Serão definidos pela NOB 01/96 os denominados tetos financeiros, quais sejam o teto financeiro global (TFG), o teto financeiro da assistência (TFA), o teto financeiro global do Estado (TFGE), o teto financeiro de vigilância sanitária (TFVS), o teto financeiro de epidemiologia e controle de doenças (TFECD), o teto financeiro global do município (TFGM), o teto financeiro da assistência ao município (TFAM) e o teto financeiro de assistência ao Estado (TFAE), o que permitiu maior transparência e controle gerencial das transferências e repasses automáticos.

Para os municípios que adotem os programas de saúde da família e agentes comunitários ficaram garantidos acréscimos percentuais ao montante do PAB, o que revela a clara intenção do Ministério da Saúde em minimizar os obstáculos ao estabelecimento do paradigma ético-participativo na gestão sanitária em substituição ao modelo assistencial-curativo.

A NOB 01/96 propôs dois modelos de gestão aos quais habilitaram-se 99% dos municípios brasileiros conforme notícia do Ministério da Saúde. São eles a Gestão Plena da Atenção Básica e a Gestão Plena do Sistema Municipal. Sendo norma atualmente em vigor permito-me transcrever sua disciplina para cada modelo quanto às responsabilidades e prerrogativas em que importa cada qual, e os critérios para habilitação:

A Gestão Plena da Atenção Básica:

"Responsabilidades

a)Elaboração de programação municipal dos serviços básicos, inclusive domiciliares e comunitários, e da proposta de referência ambulatorial especializada e hospitalar para seus munícipes, com incorporação negociada à programação estadual.

b)Gerência de unidades ambulatoriais próprias.

c)Gerência de unidades ambulatoriais do estado ou da União, salvo se a CIB ou a CIT definir outra divisão de responsabilidades.

d)Reorganização das unidades sob gestão pública (estatais, conveniadas e contratadas), introduzindo a prática do cadastramento nacional dos usuários do SUS, com vistas à vinculação de clientela e à sistematização da oferta dos serviços.

e)Prestação dos serviços relacionados aos procedimentos cobertos pelo PAB e acompanhamento, no caso de referência interna ou externa ao município, dos demais serviços prestados aos seus munícipes, conforme a PPI, mediado pela relação gestor-gestor com a SES e as demais SMS.

f)Contratação, controle, auditoria e pagamento aos prestadores dos serviços contidos no PAB.

g)Operação do SIA/SUS quanto a serviços cobertos pelo PAB, conforme normas do MS, e alimentação, junto à SES, dos bancos de dados de interesse nacional.

h)Autorização, desde que não haja definição em contrário da CIB, das internações hospitalares e dos procedimentos ambulatoriais especializados, realizados no município, que continuam sendo pagos por produção de serviços.

i)Manutenção do cadastro atualizado das unidades assistenciais sob sua gestão, segundo normas do MS.

j)Avaliação permanente do impacto das ações do Sistema sobre as condições de saúde dos seus munícipes e sobre o seu meio ambiente.

k)Execução das ações básicas de vigilância sanitária, incluídas no PBVS.

l)Execução das ações básicas de epidemiologia, de controle de doenças e de ocorrências mórbidas, decorrentes de causas externas, como acidentes, violências e outras, incluídas no TFECD.

m) Elaboração do relatório anual de gestão e aprovação pelo CMS.

Requisitos

a)Comprovar o funcionamento do CMS.

b)Comprovar a operação do Fundo Municipal de Saúde.

c)Apresentar o Plano Municipal de Saúde e comprometer-se a participar da elaboração e da implementação da PPI do estado, bem assim da alocação de recursos expressa na programação.

d)Comprovar capacidade técnica e administrativa e condições materiais para o exercício de suas responsabilidades e prerrogativas quanto à contratação, ao pagamento, ao controle e à auditoria dos serviços sob sua gestão.

e)Comprovar a dotação orçamentária do ano e o dispêndio realizado no ano anterior, correspondente à contrapartida de recursos financeiros próprios do Tesouro Municipal, de acordo com a legislação em vigor.

f)Formalizar junto ao gestor estadual, com vistas à CIB, após aprovação pelo CMS, o pleito de habilitação, atestando o cumprimento dos requisitos relativos à condição de gestão pleiteada.

g)Dispor de médico formalmente designado como responsável pela autorização prévia, controle e auditoria dos procedimentos e serviços realizados.

h)Comprovar a capacidade para o desenvolvimento de ações de vigilância sanitária.

I)Comprovar a capacidade para o desenvolvimento de ações de vigilância epidemiológica.

j)Comprovar a disponibilidade de estrutura de recursos humanos para supervisão e auditoria da rede de unidades, dos profissionais e dos serviços realizados.

Prerrogativas

a)Transferência, regular e automática, dos recursos correspondentes ao Piso da Atenção Básica (PAB).

b)Transferência, regular e automática, dos recursos correspondentes ao Piso Básico de Vigilância Sanitária (PBVS).

c)Transferência, regular e automática, dos recursos correspondentes às ações de epidemiologia e de controle de doenças.

d)Subordinação, à gestão municipal, de todas as unidades básicas de saúde, estatais ou privadas (lucrativas e filantrópicas), estabelecidas no território municipal."

 Gestão Plena Do Sistema Municipal :

"Responsabilidades

a)Elaboração de toda a programação municipal, contendo, inclusive, a referência ambulatorial especializada e hospitalar, com incorporação negociada à programação estadual.

b)Gerência de unidades próprias, ambulatoriais e hospitalares, inclusive as de referência.

c)Gerência de unidades ambulatoriais e hospitalares do estado e da União, salvo se a CIB ou a CIT definir outra divisão de responsabilidades.

d)Reorganização das unidades sob gestão pública (estatais, conveniadas e contratadas), introduzindo a prática do cadastramento nacional dos usuários do SUS, com vistas à vinculação da clientela e sistematização da oferta dos serviços.

e)Garantia da prestação de serviços em seu território, inclusive os serviços de referência aos não-residentes, no caso de referência interna ou externa ao município, dos demais serviços prestados aos seus munícipes, conforme a PPI, mediado pela relação gestor-gestor com a SES e as demais SMS.

f)Normalização e operação de centrais de controle de procedimentos ambulatoriais e hospitalares relativos à assistência aos seus munícipes e à referência intermunicipal.

g)Contratação, controle, auditoria e pagamento aos prestadores de serviços ambulatoriais e hospitalares, cobertos pelo TFGM.

h)Administração da oferta de procedimentos ambulatoriais de alto custo e procedimentos hospitalares de alta complexidade conforme a PPI e segundo normas federais e estaduais.

i)Operação do SIH e do SIA/SUS, conforme normas do MS, e alimentação, junto às SES, dos bancos de dados de interesse nacional.

j)Manutenção do cadastro atualizado de unidades assistenciais sob sua gestão, segundo normas do MS.

k)Avaliação permanente do impacto das ações do Sistema sobre as condições de saúde dos seus munícipes e sobre o meio ambiente.

l)Execução das ações básicas, de média e alta complexidade em vigilância sanitária, bem como, opcionalmente, as ações do PDAVS.

m)Execução de ações de epidemiologia, de controle de doenças e de ocorrências mórbidas, decorrentes de causas externas, como acidentes, violências e outras incluídas no TFECD.

 Requisitos

a)Comprovar o funcionamento do CMS.

b)Comprovar a operação do Fundo Municipal de Saúde.

c)Participar da elaboração e da implementação da PPI do estado, bem assim da alocação de recursos expressa na programação.

e)Comprovar capacidade técnica e administrativa e condições materiais para o exercício de suas responsabilidades e prerrogativas quanto à contratação, ao pagamento, ao controle e à auditoria dos serviços sob sua gestão, bem como avaliar o impacto das ações do Sistema sobre a saúde dos seus munícipes.

e)Comprovar a dotação orçamentária do ano e o dispêndio no ano anterior correspondente à contrapartida de recursos financeiros próprios do Tesouro Municipal, de acordo com a legislação em vigor.

f)Formalizar, junto ao gestor estadual com vistas à CIB, após aprovação pelo CMS, o pleito de habilitação, atestando o cumprimento dos requisitos específicos relativos à condição de gestão pleiteada.

g)Dispor de médico formalmente designado pelo gestor como responsável pela autorização prévia, controle e auditoria dos procedimentos e serviços realizados.

h)Apresentar o Plano Municipal de Saúde, aprovado pelo CMS, que deve conter as metas estabelecidas, a integração e articulação do município na rede estadual e respectivas responsabilidades na programação integrada do estado, incluindo detalhamento da programação de ações e serviços que compõem o sistema municipal, bem como os indicadores mediante dos quais será efetuado o acompanhamento.

i)Comprovar o funcionamento de serviço estruturado de vigilância sanitária e capacidade para o desenvolvimento de ações de vigilância sanitária.

j)Comprovar a estruturação de serviços e atividades de vigilância epidemiológica e de controle de zoonoses.

k)Apresentar o Relatório de Gestão do ano anterior à solicitação do pleito, devidamente aprovado pelo CMS.

l)Assegurar a oferta, em seu território, de todo o elenco de procedimentos cobertos pelo PAB e, adicionalmente, de serviços de apoio diagnóstico em patologia clínica e radiologia básicas.

m)Comprovar a estruturação do componente municipal do Sistema Nacional de Auditoria (SNA).

n)Comprovar a disponibilidade de estrutura de recursos humanos para supervisão e auditoria da rede de unidades, dos profissionais e dos serviços realizados.

Prerrogativas

a)Transferência, regular e automática, dos recursos referentes ao Teto Financeiro da Assistência (TFA).

b)Normalização complementar relativa ao pagamento de prestadores de serviços assistenciais em seu território, inclusive quanto a alteração de valores de procedimentos, tendo a tabela nacional como referência mínima, desde que aprovada pelo CMS e pela CIB.

c)Transferência regular e automática fundo a fundo dos recursos correspondentes ao Piso Básico de Vigilância Sanitária (PBVS).

d)Remuneração por serviços de vigilância sanitária de média e alta complexidade e, remuneração pela execução do Programa Desconcentrado de Ações de Vigilância Sanitária (PDAVS), quando assumido pelo município.

e)Subordinação, à gestão municipal, do conjunto de todas as unidades ambulatoriais especializadas e hospitalares, estatais ou privadas (lucrativas e filantrópicas), estabelecidas no território municipal.

f)Transferência de recursos referentes às ações de epidemiologia e controle de doenças, conforme definição da CIT.

Para a regulamentação da NOB 01/96 o Ministério da Saúde editou a Instrução Normativa nº 01/98 de 02 de janeiro de 1998 que regulamenta os conteúdos, instrumentos e fluxos do processo de habilitação de Municípios, de Estados e do Distrito Federal às novas condições de gestão criadas pela Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde - NOB SUS 01/96. Nesse diapasão, tomando-se por base que a NOB 01/96 foi bem sucedida na expansão da municipalização da gestão, já que cerca de 99% dos municípios brasileiros já eram participantes de alguma das formas de gestão estabelecidas, mas que ainda restava a regionalização e hierarquização preconizada pela Lei 8.080/90. Assim sendo, postulou-se na NOAS-SUS 01/2001 a elaboração por parte dos Estados-membros e Distrito Federal do Plano Diretor de Regionalização que em harmonia com o plano estadual de saúde deve assegurar o mais amplo acesso possível do cidadão às atividades de proteção à saúde em qualquer nível de complexidade. São os PDRs os documentos que devem prever e estabelecer as regiões ou microrregiões de saúde que serão divididas pelo critério de melhor atendimento administrativo a situações comuns a diversos municípios e estados-membros; os módulos assistenciais, que são unidades com poder de resolução no plano básico de assistência abrangendo um ou mais municípios, que nesse caso deverá eleger uma sede e4 as unidades territoriais de qualificação na assistência à saúde, nas Unidades da federação em que o modelo de regionalização não permitir microrregiões de saúde.

Para finalizar esse capítulo sobre a estrutura legal do SUS devo ainda aduzir algum comentário sobre a Emenda Constitucional 29, de 13.09.2000. Tal modificação à Lei Fundamental de 1988 pretendeu vincular percentual das receitas tributárias à política de saúde, assim como o constituinte originário houvera feito com a educação.

A EC 29, de 13.09.2000 alterou os artigos 34, 35,156,160,167 e 168 e acrescenta o art. 77 ao ADCT, afirmando as bases fundamentais dos valores a serem repassados pelos entes federativos na constituição de um piso orçamentário para as atividades de saúde. Dessa maneira, o art.77 do ADCT estabelece o ano de 2004 como termo final para os ajustes orçamentários a serem introduzidos com acréscimos de 5% para a União em relação ao exercício de 2000 reajustado consoante a variação nominal do PIB entre 2001 e 2004. Para os Estados e Distrito federal até 2004 o aumento orçamentário com a saúde deve ser de 12% e para os Municípios de 15%.

Sobre o autor
Sandro Alex de Souza Simões

Procurado Federal Especializado- INSS, Professor de Teoria da Constituição e História do Direito no Centro Universitário do Pará - CESUPA,Mestre em Direito Público- UFPA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIMÕES, Sandro Alex Souza. A estrutura legal do Sistema Único de Saúde:: breve escorço sobre o Direito Constitucional Sanitário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 363, 5 jul. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5420. Acesso em: 25 dez. 2024.

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