DIREITO À INTEGRIDADE PSÍQUICA
Integridade é a qualidade de íntegro. A palavra íntegro pode significar: inteiro, completo; perfeito, exato; reto, imparcial, inatacável; brioso, pundonoroso. Por direito a integridade psíquica deve se entender por conjunto de direitos da personalidade voltados à tutela higidez (estado de saúde físico ou mental) e do equilíbrio psicológico do ser humano, analisando a pessoa como um ser psíquico que se interage socialmente. A integidade psíquica portanto, permite ao indivíduo exercer sua liberdade de pensamento com consciência e vontade, de maneira completa, perfeita. Sua natureza é incorpórea, impondo a todos os particulares e ao Estado o dever de não-interferência na integridade psicológica de quem quer que seja.
Ainda, a Convenção Americana de Direitos Humanos adota e adere à assinatura na Conferência Especializada Interamericana Sobre Direitos Humanos, em San José da Costa Rica, em 22 de novembro de 1962, estabelece em seu artigo 5°§1: "Toda pessoa a que se respeite sua integridade física psíquica e moral". Embora muitos autores tratem separadamente o direito à integridade física do direito à integridade psíquica, hoje podem ser considerados superadas as concepções que desagregando a proteção do corpo humano do espírito, estabelecem regimes de tutela que não levam em conta a impossibilidade de fragmentar aspectos da própria condição humana.
"O direito à integridade mental é o direito-base de onde surgem todos os demais”. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2008). Direitos tutelados pelo art 5° da CRFB/88, consagrando todas as variantes: direito à liberdade coletiva, civil, política e religiosa dentre outras e a livre a manifestação do pensamento.
Direito à privacidade é inviolável, salvo por último caso por ordem judicial a vida particular da pessoa natural. Há ainda uma série de elementos ligados aos direitos à privacidade, como lar, família, comunicações telegráficas, dados telefônicos e correspondências, salvo em último caso por autorização judicial, nas hipótese e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal " E na Lei n°9.296,de 1996, lei que regulamenta o art. 5°, inciso XII.
ANÁLISE DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS
Demonstrando a prática jurídica do direito à intimidade, alguns Tribunais Superiores e Tribunais de Estado têm tomado decisões favoráveis à aplicação dos direitos a personalidade.
Por exemplo, em um caso de danos morais julgados pelo TJMG, em que Luiz Renato Oliveira Gomes alegava que Fahim Miguel Sawan utilizou a imagem do seu falecido pai para angariar votos na comunidade carente.
Na primeira sentença, a juíza entendeu que não restou configurado dano moral passível de indenização, asseverando, ao contrário, que a lembrança do trabalho honroso desenvolvido pelo Dr. Freud Gomes - pai do autor - muito enobrece "a vida de homens de bem (...) que trabalham em prol dos esquecidos".
O autor, inconformado com a decisão, interpôs recurso de apelação , no qual alega, em resumo, que houve efetivo dano moral com a veiculação da imagem do pai morto à propaganda política com o objetivo deliberado de angariar votos da comunidade carente; o direito à indenização por uso indevido de imagem não cessa com a morte do ofendido; o fato de o réu ter trabalhado junto com o de cujus e a suposta amizade entre ambos não se afigura como consentimento tácito para utilização da imagem do falecido; a autorização dada por um dos herdeiros não subtrai do autor o direito a ser indenizado, até porque, nos autos da Ação Declaratória Incidental de Falsidade documental (em apenso) restou demonstrado que referida assinatura é falsa.
O réu, por sua vez, ofereceu contrarrazões , nas quais, infirma as teses suscitadas pelo autor, pugnando, em consequência, pelo caráter personalíssimo do direito invocado, além de invocar o consentimento tácito do falecido. Frisa que inexiste dano moral, porquanto a reportagem é de cunho informativo, não trazendo, assim, qualquer dano à imagem do de cujus. Pede, por fim, a manutenção da sentença, além de protestar pela aplicação de multa de 1% sobre o valor da causa pela utilização das vias recursais com fins protelatórios.
Escapando, pois, à regra geral de que a indenização por danos morais resulta, na maioria das vezes, em lesões a direito personalíssimo, a hipótese dos autos, contempla situação em que o filho se sentiu lesado pela utilização indevida da imagem do pai falecido.
Sobre a possibilidade de descendentes protegerem a imagem de antepassados, o desembargador reporta-se à lição de Sergio Cavalieri Filho:
A imagem de um ancestral é muitas vezes para seus descendentes patrimônio moral mais valioso que os bens materiais por ele deixados. Dessa forma, os parentes próximos de pessoas famosas falecidas passam a ter um direito próprio, distinto da imagem do de cujus, que os legitima a pleitear indenização em juízo. Seria cruel e até desumano exigir que os parentes próximos do falecido - descendentes, ascendentes e cônjuge - quedassem inertes diante das ofensas contra ele assacadas. (Programa de Responsabilidade Civil. 6ª ed. P. 128) .
Observa-se, portanto, a pessoa viva pode defender - até porque dito interesse integra a própria personalidade - os direitos da personalidade da pessoa morta, desde que tenha legitimidade para tanto. Essa possibilidade significa ampla proteção jurídica, não apenas aos lesados diretos, mas, por igual, aos lesados indiretos. É o que a doutrina, modernamente, chama de dano por ricochete.
O desembargador considera oportuna a transcrição de decisão relatada pelo Ministro César Ásfor Rocha que proclama esse entendimento:
Os direitos da personalidade, de que o direito à imagem é um deles, guardam como principal característica a sua intransmissibilidade. Nem por isso, contudo, deixa de merecer proteção a imagem de quem falece, como se fosse coisa de ninguém, porque ela permanece perenemente lembrada nas memórias, como bem imortal que se prolonga por muito além da vida, estando até acima desta.
(STJ, Resp 26.866/0 RJ em 19.02.2001, in RT 789:201,p.179).
Delimitadas essas premissas, cumpre, a esta altura, perquirir, sobre a configuração de danos morais indenizáveis na hipótese trazida a lume.
Por fim, o desembargador alega que o confronto da tese esposada pelo apelante com o material de divulgação juntado aos autos não leva à inferência de que houve utilização específica da imagem do Dr. Freud com o intuito deliberado de angariar votos ou vinculá-lo à propaganda política encetada pela parte contrária. Insta salientar que, se realmente essa fosse a intenção da parte contrária, a inclusão da foto deveria ter sido feita na seção "apoiadores de Uberaba", inserida no miolo do encarte.
Afora esse aspecto, importa ainda considerar que, em razão de terem ambos - Dr. Freud e o apelante adesivo - a mesma profissão e o intuito de utilizá-la em prol dos menos favorecidos, é natural que, em razão dessa similaridade, tenham estabelecido relações de amizade ao longo da existência em comum, que, decerto, no futuro, legitimaria a aparição conjunta dos companheiros de outrora, ainda que, postumamente.
Baseado nesses argumentos, o desembargador nega o pedido de indenização por danos morais por utilização de imagem. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0701.02.015275-0/001).
Quanto a situação da transexual, pessoa que foi submetida a tratamento hormonal e cirúrgico para mudar de sexo ou ou pessoa que se identifica fortemente com o sexo oposto, a jurisprudência tem acompanhado e evoluído na que tange às mudanças sociais. A mudança de sexo e, posteriormente, a mudança de registro civil. A dignidade da pessoa humana deve ser preservada; a isso deve ser somado a proteção do direito a todos da sociedade(inclusive aos que optaram por mudar o sexo que nasceu).Quanto ao assunto, cabe transcrever julgado do Tribunal do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. ALTERAÇÃO DO NOME E AVERBAÇÃO NO REGISTRO CIVIL. TRANSEXUALIDADE. CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. O fato de o apelante ainda não ter se submetido à cirurgia para a alteração de sexo não pode constituir óbice ao deferimento do pedido de alteração do nome. Enquanto fator determinante da identificação e da vinculação de alguém a um determinado grupo familiar, o nome assume fundamental importância individual e social. Paralelamente a essa conotação pública, não se pode olvidar que o nome encerra fatores outros, de ordem eminentemente pessoal, na qualidade de direito personalíssimo que constitui atributo da personalidade. Os direitos fundamentais visam à concretização do princípio da dignidade da pessoa humana, o qual, atua como uma qualidade inerente, indissociável, de todo e qualquer ser humano, relacionando-se intrinsecamente com a autonomia, razão e autodeterminação de cada indivíduo. Fechar os olhos a esta realidade, que é reconhecida pela própria medicina, implicaria infração ao princípio da dignidade da pessoa humana, norma esculpida no inciso III do art. 1º da Constituição Federal, que deve prevalecer à regra da imutabilidade do prenome. Por maioria, proveram em parte. (SEGREDO DE JUSTIÇA)
(Apelação Cível Nº 70013909874, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 05/04/2006) .
O artigo 4º da Lei nº 9.029/1995 oferece ao trabalhador discriminado duas opções: a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, ou o pagamento em dobro da remuneração desse mesmo período. A remuneração em dobro, no entendimento do ministro Carlos Alberto, é verba que visa a indenizar o dano decorrente do não-pagamento do salário.Nesse sentido, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho admitiu recurso de revista de um frentista demitido por ser portador do vírus HIV e concedeu, além da indenização por dispensa discriminatória, reparação por dano moral no valor de R$ 10 mil. A indenização prevista no artigo 4º da Lei nº 9.029/1995 remunera apenas o dano material decorrente da despedida discriminatória, não tendo o condão de compensar o dano moral sofrido, afirmou o relator, ministro Carlos Alberto Reis de Paula.
CONCLUSÃO
Dessa forma, percebe-se a importância dos Direitos da Personalidade nas prerrogativas individuais inerentes à pessoa humana, quanto ao nome, à identidade, à honra, à moral, à integridade física e psíquica, na proteção da intimidade e da disposição do próprio corpo. Assim é de fundamental importância resguardar tais direitos, uma vez que protegem os indivíduos mesmo após a sua morte. Tais direitos também se encontram no art. 5°da CRFB/88, no que se diz respeito à igualdade. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.
REFERÊNCIAS
BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 2.a ed. Rio de Janeiro (RJ): Forense Universitária, 1995.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Constituicao.htm > Acessado em 20 ago. 2016.
Declaração Universal dos Direitos do Humano, Disponível : <https://portal.mj.gov.br> . acessado em 09 nov. 2016.
CONVENÇÃO Americana de Direitos Humanos (1969), (pacto de san josé da costa rica), Disponível em:<https://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm. Acessado em 09 nov. 2016
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. Parte Geral. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito civil brasileiro. Parte Geral, 5 ed. São Paulo (SP): Saraiva: 2007, v. 1.
VENOSA, Silvio Saulo. Direito Civil-Parte Geral. 7. ed. São Paulo (SP): Atlas, 2007. v. 1
Sites acessados
<www.ciudadania{sic}sexual.org> acessado em 09/11/2016
<www.jornalcorreiodacidade.com.br> acessado em 09/11/2016
<www.stj.gov.br/portal_stj> acessado em 18/11/2016