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A regulação das avarias comuns no Direito Marítimo

Agenda 09/04/2017 às 21:29

O Direito Marítimo considera como avarias todas as perdas, danos ou despesas extraordinárias sofridas pela carga ou pela embarcação. Saiba como a doutrina e a legislação comercial pátria as regula.

As avarias no Direito Marítimo são todas as perdas, danos ou despesas extraordinárias sofridas pela carga ou pela embarcação.

O conceito de avaria vem expresso no artigo 761 do Código Comercial, o qual prevê:

Art. 761 - Todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, conjunta ou separadamente, e todos os danos acontecidos àquele ou a esta, desde o embarque e partida até a sua volta e desembarque, são reputadas avarias.

Disciplina o artigo 763 do Código Comercial:

Art. 763 - As avarias são de duas espécies: avarias grossas ou comuns, e avarias simples ou particulares. A importância das primeiras é repartida proporcionalmente entre o navio, seu frete e a carga; e a das segundas é suportada, ou só pelo navio, ou só pela coisa que sofreu o dano ou deu causa à despesa.

As Avarias se dividem em duas espécies:

Avaria simples ou particular : é aquela avaria ocorrida somente no navio ou na carga durante o tempo dos riscos. Afeta somente ao armador ou ao dono da mercadoria avariada sendo que os danos são suportados por uma só pessoa.

Avaria grossa ou comum : é toda e qualquer despesa ou dano extraordinário decorrente de um ato intencional ou voluntário, sendo que a despesa visa a segurança do navio e de suas cargas, em uma situação de perigo real e iminente, com o intuito de evitar um mal maior à expedição marítima. Nessa avaria as despesas são divididas proporcionalmente entre os proprietários das cargas embarcadas e navio.

Nas avarias comuns ou grossas verifica-se a participação efetiva da vontade humana no intuito de preservar o bem comum diante de perigo ou desastre imprevisto, mesmo que implique em sacrifício de interesses particulares. Por esse motivo, serão indenizados todos os interessados na expedição do navio, bem como, todos contribuirão para o pagamento da indenização, criando, assim uma relação simultânea de direito e de obrigação.

O alijamento, modalidade de avaria comum, consiste no ato de lançamento de carga presente no navio ao mar, por necessidade de manutenção da segurança da embarcação e assegurar a conservação das mercadorias presentes do navio e que não se fez necessário dispensá-las no mar. Objetiva manter o navio em curso, deixando-o mais leve. Não consiste em abandono de carga, pois esta permanece sob o domínio do proprietário, que poderá recuperá-la, sendo que, as despesas de salvamento também se identificam como modalidade de avaria comum.

É importante salientar que a avaria grossa não comporta a modalidade culposa.

Internacionalmente, a regulamentação das avarias comuns estão dispostas nas Regras de York-Antuérpia, incorporadas aos contratos de comércio internacional marítimo. Criada em 1864, na cidade de York, foram efetivadas em 1877, na cidade da Antuérpia, passando por uma grande reforma nos anos de 1924 e em 1974, sendo este último na Conferência de Hamburgo, dando a forma que se apresenta hoje. As regras são organizadas de forma alfabética - A a G-, e numéricas em algarismos romanos - I a XXII, sendo que as primeiras se referem ao fundamento, natureza e culpa na avaria, e as segundas, concernem à exclusão e inclusão de gastos, bem como juros, bonificações, depósitos e deduções.

A doutrina acentua que não há que se falar em avaria grossa se ao tempo do dano ou despesa a embarcação se apresentava sem carga.

Há diferença entre o alijamento e o aligeiramento.

Alijamento é o lançamento ao mar de objetos carregados no navio para aliviá-lo. Aligeiramento é o transbordo das mercadorias para outras embarcações. Os danos havidos no aligeiramento também são avarias comuns.

Discute-se ainda a abalroação e seus danos.

 O Código Comercial traz a luz em seus artigos 749 a 752 as definições do dano causado por abalroação, como se segue: “Art. 749 - Sendo um navio abalroado por outro, o dano inteiro causado ao navio abalroado e à sua carga será pago por aquele que tiver causado a abalroação, se esta tiver acontecido por falta de observância do regulamento do porto, imperícia, ou negligência do capitão ou da tripulação; fazendo-se a estimação por árbitros. Art. 750 - Todos os casos de abalroação serão decididos, na menor dilação possível, por peritos, que julgarão qual dos navios foi o causador do dano, conformando-se com as disposições do regulamento do porto, e os usos e prática do - lugar. No caso dos árbitros declararem que não podem julgar com segurança qual navio foi culpado, sofrerá cada um o dano que tiver recebido. Art. 751 - Se, acontecendo à abalroação no alto-mar, o navio abalroado for obrigado a procurar porto de arribada para poder consertar, e se perder nessa derrota, a perda do navio presume-se causada pela abalroação. Art. 752 - Todas as perdas resultantes de abalroação pertencem à classe de avarias particulares ou simples; excetuasse o único caso em que o navio, para evitar dano maior de uma abalroação iminente, pica as suas amarras, e abalroa a outro para sua própria salvação (artigo nº. 764). Os danos que o navio ou a carga, neste caso, sofre, são repartidos pelo navio, frete e carga por avaria grossa”. 

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Passa-se a discutir a regulação das avarias comuns que é o processo que serve para classificar as avarias para determinar o montante delas e para fixar a contribuição dos interessados.

Apuram-se desse modo essas avarias: a massa ativa ou conjunto dos prejuízos, danos materiais e despesas feitas e a massa passiva ou o total dos valores do navio, do frete e da carga.

Ensina a doutrina com Danjon, Jacobs, que deve prevalecer o critério de que todas elas são reunidas num só regulamento, na linha do que dispôs o Congresso de Bruxelas, de 1888.

Será o regulador ou ajustador de avarias quem fará a regulação das avarias comuns, uma vez nomeado por ambas as partes, a instância do capitão, como dita o artigo 783 do Código Comercial.

Observe-se a apuração da massa ativa.

Assim ensina Sampaio de Lacerda(Curso de Direito Privado da Navegação, volume I, 2º edição, pág. 232) que deve-se ter em conta o navio, a carga e o frete.

  1. Navio: se o navio sofreu reparos, o dano sofrido pelo armador equivale às despesas realizadas realmente nas reparações, inclusive as feitas para a entrada dele no dique, a fim de ser consertado. Se, porém, perde-se o navio ou perdem-se seus acessórios, o valor a eles atribuído era o que teriam no porto de destino. Entenda-se que no caso de reparos deve-se admitir as deduções do velho para o novo, pois na medida em que se substituem peças velhas por novas, o que tende a valorizar o navio, leva-se em conta a idade do navio, conforme a regra XIII de York e Antuérpia de 1924(Estocolmo, letra c) as excluíram;
  2. Carga: a perda resultante da destruição ou da deterioração das mercadorias é apreciada segundo o preço que valem concorrentemente no lugar e no último dia da descarga do navio, as mercadorias da mesma espécie, no estado em que as mercadorias sacrificadas estavam antes da avaria comum(Regra XV((). Mas pode suceder que o lugar de chegada não seja o porto do destino e sim um outro de arribada, à vista da interpretação da viagem por força maior, como ensinou ainda Lacerda de Almeida(obra citada, pág. 233). Nesses casos deve-se admitir seja o valor atribuído ao do porto em que as mercadorias de fato chegaram, como dispõem as regras de York e Antuérpia. Do valor atribuído a carga devem ser deduzidas as despesas com o desembarque, inclusive os chamados direitos alfandegários, levando-se em conta o estado material das mercadorias no momento do sacrifício. Se elas tivessem sofrido anteriormente ao sacrifício alguma avaria particular, como deterioração, seu valor estaria reduzido. Se, porventura, alguns carregadores estipularem o fretamento com cláusula “livre de avaria” e outros não e, durante a viagem, haja uma avaria comum, hipótese que, pensamos, o maior justo e razoável seria, como pensaram Lyon Caen e Danjon, que a validade da cláusula dependeria  de aceitação de todas as partes interessadas na expedição;
  3.  Frete: a regra do Código Comercial, no artigo 621, terceira alínea, é de que o frete das fazendas alijadas para salvação comum, no navio e da carga abona-se por inteiro como avaria grossa.

Importante a apuração da massa passiva, que se vê como se lê do artigo 787 do Código Comercial que determina:

Art. 787 - Liquidando-se as avarias grossas ou comuns no porto da entrega da carga, hão de contribuir para a sua composição:

1 - a carga, incluindo o dinheiro, prata, ouro, pedras preciosas, e todos os mais valores que se acharem a bordo;

3 - os fretes, por metade do seu valor também.

Não entram para a contribuição o valor dos víveres que existirem a bordo para mantimento do navio, a bagagem do capitão, tripulação e passageiros, que for do seu uso pessoal, nem os objetos tirados do mar por mergulhadores à custa do dono.

Discute-se com relação às pessoas salvas graças ao sacrifício feito pelo capitão e da tripulação.

A doutrina, fruto da lição de Danjon, propugna pela contribuição, pois que, se o sacrifício não houvesse sido feito e os coolies não houvessem sido salvos, o empresário teria evidentemente um prejuízo pecuniário. Essa opinião não é aceita por Brunetti, em seu tratato, volume III, segunda edição, n. 705.

Em relação às mercadorias carregadas sobre o convés e às mercadorias clandestinas, a regra é que devem contribuir se se salvaram, mas se se perderam, nada receberão(Regra XIX de York e Antuérpia, 1924). O mesmo sucederá com relação às mercadorias que o proprietário mudou de lugar sem licença do capitão, como dita o artigo 790 do Código Comercial.

Em relação às provisões de  boca e munições de guerra, bem como as roupas de uso da tripulação, anota a doutrina que a exclusão de provisão de víveres é antiga. No presente, as legislações dispõem amplamente pela exclusão de roupas e bagagens dos tripulantes e dos passageiros, anotando-se o que dispõe o artigo 787, n. 3, segunda alínea.

Os principais comentários na matéria apresentam a seguinte fórmula de cálculo de contribuição:

M.P(massa passiva) / M.A(massa ativa) = 100/x

Na matéria ainda apontam-se os artigos 784 e 785 do Código Comercial,  que diz sobre a garantia do pagamento da quota de contribuição da cota de contribuição:  

Art. 784 - O capitão tem direito para exigir, antes de abrir as escotilhas do navio, que os consignatários da carga prestem fiança idônea ao pagamento da avaria grossa, a que suas respectivas mercadorias forem obrigadas no rateio da contribuição comum.

Art. 785 - Recusando-se os consignatários a prestar a fiança exigida, pode o capitão requerer o depósito judicial dos efeitos obrigados à contribuição, até ser pago, ficando o preço da venda sub-rogado, para se efetuar por ele o pagamento da avaria grossa, logo que o rateio tiver lugar.

Mas o capitão não pode reter, ele próprio, fazendas para o pagamento. Assim se vê da leitura do artigo 619 do Código Comercial.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

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