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Impeachment: confusão jurídica

Agenda 21/05/2017 às 15:32

O processo de impeachment não exige provas como em processos judiciais, mas baseia-se em acusações e fundamentos plausíveis. É importante interpretá-lo de forma a se afastar dos conceitos jurídicos que os operadores do direito costumam carregar.

Mesmo após toda as discussões em volta do processo de impeachment da então Presidente da República, Dilma Rousseff, que se encerrou em 31 de agosto de 2016 com a cassação do mandato de Dilma, muita confusão e dúvidas ainda são corriqueiras, principalmente no meio jurídico.

Insta salientar que o processo de impeachment sempre traz à tona os limites imprecisos entre o direito e a política, sendo constante o equívoco e a confusão que nós, principalmente, na condição de operadores do direito, costumamos impingir na análise do processo de impedimento.

Esse equívoco e confusão advém do fato de que estamos sempre condicionados a examinar a questão do impeachment como se fosse uma demanda judicial a ser julgada pelo Poder Judiciário, onde questionamentos acerca de elementos probatórios decorrem do insofismável princípio do devido processo legal.

Ocorre que não é por menos que a Constituição Federal prevê o procedimento bifásico para o impeachment, composto por uma fase preambular, denominada de juízo de admissibilidade do processo, que é de competência da Câmara dos Deputados, e por uma fase final, onde ocorre o processo de julgamento, cuja competência é atribuída ao Senado Federal.

Dessa feita, o que se constata é que a função jurisdicional, no caso do impeachment, não foi reservada ao Poder Judiciário, mas às casas legislativas, órgãos eminentemente políticos, que são pautados pela parcialidade e devem levar em consideração a vontade daqueles que elegeram seus membros, tanto que a legitimidade ativa para a apresentação da denúncia por crime de responsabilidade foi conferida a qualquer cidadão no pleno gozo de seus direitos políticos1.

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Assim, não se trata de uma demanda eleitoral ou atrelada a qualquer órgão do Poder Judiciário, onde a análise de provas pré-constituídas é condição exigida para a admissibilidade da denúncia apresentada contra o Presidente da República, haja vista que no procedimento de admissibilidade a Câmara dos Deputados profere juízo político, competindo verificar, conforme já anotou o Supremo Tribunal Federal2 ´´se a acusação é consistente, se tem ela base em alegações e fundamentos plausíveis, ou se a notícia do fato reprovável tem razoável procedência, não sendo a acusação simplesmente fruto de quizílias ou desavenças políticas.´´

Portanto, o que se constata é que a denúncia que deflagra o processo de impeachment não prescinde de provas para justificar a sua apresentação e, nem mesmo, a sua admissibilidade pela Câmara dos Deputados, bastando a existência de acusação consistente fundada em alegações e fundamentos plausíveis e, também, de razoável procedência da notícia do fato reprovável.

Assim, não é crível condicionar a apresentação da denúncia por crime de responsabilidade e, muito menos, a sua admissibilidade àquelas provas que nós, operadores do direito, estamos acostumados a lidar nas querelas judiciais, sob pena de se anular o juízo político peculiar do Congresso Nacional quando do exercício do juízo de admissibilidade, processamento e julgamento do impeachment.


Notas

1 Lei nº 1.079/50. Art. 14. É permitido a qualquer cidadão denunciar o Presidente da República ou Ministro de Estado, por crime de responsabilidade, perante a Câmara dos Deputados.

2 (MS 21.564, Rel. p/ o ac. Min. Carlos Velloso, j. 23.09.1992, Plenário, DJ de 27.08.1993).

Sobre o autor
Luiz Cesar Barbosa Lopes

Superintendente do Ibama no Estado do Ceará de 05/2021 a 12/2022; Secretário Executivo da Controladoria Geral do Município de Goiânia de 01/2023 a 07/2023; Mestre em Administração Pública pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento, Ensino e Pesquisa - IDP; Pós-Graduado em Compliance e Integridade Corporativa pela PUC/Minas; Consultor Político e Eleitoral; Pós-graduado em Direito Penal; Especialista em Direito Eleitoral.

Informações sobre o texto

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