Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

CRIMES PASSIONAIS: O tratamento conferido pelo direito àqueles que agem sob o domínio do sistema emocional

Exibindo página 4 de 4
Agenda 25/05/2017 às 19:04

CONCLUSÃO

A partir da análise do crime quando cometido em razão da paixão e das características do agente, foi possível compreender melhor como o ordenamento jurídico brasileiro encara tais situações. Notadamente, apreendeu-se que existem diversos fatores que levam ao cometimento de um crime passional e nem sempre o gênero é predominante para desencadear a ação, a não aceitação de término de relacionamento amoroso, a rejeição da pessoa amada, o adultério e a vingança são causas comuns.

Quanto aos sentimentos que conduzem ao homicídio passional, resta demonstrado que em se tratando de amor, apenas o sensual (apelativo ao sexual) pode dar origem à ação criminosa dada de maneira passional, por ser efêmero, egoísta, que gera males e ódios como insegurança psicológica, possessividade, desestruturação emocional, orgulho avassalador e vingança conduzindo a esse delito.

A paixão e o ciúme são normalmente o pavio dos casos passionais (vê-se como o próprio nome foi escolhido), pois arrasta suas vítimas para as situações que desencadeiam o crime. No que diz respeito a imputabilidade da emoção e da paixão, resta dizer que o Direito é uma ciência que deve ser analisada minuciosamente em cada caso, estudando detalhadamente a norma em abstrato e adequando-a ao caso concreto para que promova a justiça de forma correta e justa.

A tentativa do ordenamento jurídico brasileiro de minimizar os danos causados por crimes passionais se pode visualizar pela lei do feminicídio, que tem como sujeito da proteção maior as mulheres em geral.

De certa forma, ao longo do trabalho pontuamos que não apenas as mulheres são vítimas desse tipo de crime, mas também podem assumir a condição inversa, todavia, os crimes passionais não são crimes direcionados à violência de gênero, pois homossexuais também podem ser vítimas tanto quanto autores do delito, abolindo-se assim conceitos retrógrados. Parece-nos, entretanto, que o legislador pretendeu quitar uma dívida histórica, todo um passado que protegia legislativamente homens que, através da falaciosa justificativa de defesa da honra, podiam tirar a vida de suas parceiras ou ex-parceiras sem maiores questionamentos.

Apesar da inovação legal e da proteção concedida às mulheres, deve-se notar que não houve da parte do legislativo a vontade de encarar um novo tipo penal ou de acrescentar aqueles já existentes a passionalidade. Desta forma, seguimos, sem orientação normativa, tateando um mar de subjetividades quando do julgamento de crimes motivados pela paixão, pelo ciúme, vingança, ódio, adultério.

No caso de homicídios dolosos motivados pela paixão, continuamos aguardando o julgamento dos tribunais de júri, da complacência ou indignação de pessoas do povo, de leigos jurídicos, dominados também por suas emoções, ou seja, um crime cometido em razão das emoções e julgado também por elas.

Por tal razão, mostra a falha sócio cultural e sócio educacional do Estado com seus cidadãos.

Faz-se necessário que o homicídio com motivação passional seja devidamente disciplinado no Ordenamento Jurídico Brasileiro, não ficando a mercê dos julgamentos, que seja tipificado, que a lei delimite a aplicação de pena quando ocorrerem, para que não sejam aplicadas atenuantes de penas em casos que o homicídio foi praticado de forma premeditada e com requintes de crueldade, para que o direito fundamental à vida humana prevaleça sobre o direito à honra, e para que não se possa confundir relacionamento com direito de propriedade, visto que este último só pode existir entre ser humano e coisas apropriáveis.

Portanto, relacionamentos devem ser tratados com respeito mútuo, liberdade e individualidade, pois a vida é algo sublime e única, não podendo ficar a mercê das violentas emoções causadas por motivos fúteis, torpes, embaladas pela possessividade e egolatria.


REFERÊNCIAS

BAHIA, Andreia. Crime passional vitima mais mulheres Disponível em: <http://sindepol.com.br/site/noticias/crime-passional-vitima-mais-mulheres.html> acesso 20 de out. 2016

BERTOLDI, Maria Eugênia; FÁVARO, Viviane Parize; SANTOS, Thainara Aparecida; SILVA, Jhenifer Regina; SOUZA, Cássia Andressa. Lei Maria Da Penha. JICEX - Revista da Jornada de Iniciação Científica e de Extensão Universitária do Curso de Direito das Faculdades Integradas Santa Cruz de Curitiba - ISSN 2357-867X, 2014.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha: aspectos assistenciais, protetivos e criminais da violência de gênero. São Paulo: Saraiva, 2014, 2a ed. - (coleção saberes monográficos).

BRANCO, Vitoriano Prata Castelo. Curso Completo de Criminologia. 1a ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1975.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988.

_______. Código Penal (1940). Código Penal: Decreto-Lei nº 2.848. Brasília, DF, 1940.

_______, LEI 11.340/06. Lei Maria da Penha. Brasília, DF: Senado Federal, 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso em: 15 mar. 2016.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. 6ª ed. rev. at. amp.  vol.2. São Paulo: Saraiva, 2007.

_______. Tratado de Direito Penal: parte geral. 17ª ed. rev. at.amp. São Paulo: Saraiva, 2012.

CALDAS, Alexsandro Nascimento. A legítima defesa como excludente de ilicitude. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1058, 25 maio 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8424>. Acesso em: 02 jul. 2016.

CARVALHO NETO, Inácio Bernardino de. A evolução do Direito sucessório do cônjugue e do companheiro no Direito brasileiro: da necessidade de alteração do Código Civil.Tese apresentada a Universidade de São Paulo para obtenção do título de doutor em Direito Civil. São Paulo/SP, 2005. Disponível em: <  http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2131/tde-14082008-080512/>.Acesso em: 08 ago. 2016.

COMPROMISSO E ATITUDE - Lei Maria da Penha. Dados e Estatísticas sobre a Violência contra a Mulher. Disponível em: <http://www.compromissoeatitude.org.br/dados-e-estatisticas-sobre-violencia-contraas-mulheres/>. Acesso em: 07 mar. 2016.

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 3.ed. rev. ampl. atual. Salvador: JusPodium, 2015.

DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Ronovar, 2002.

ELUF, Luiza Nagib. A Paixão no Banco dos Réus. 2. ed. – São Paulo : Saraiva, 2003.

_______. A paixão e o crime. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/v1/index.php?id=colunas&idcoluna=33&idmateria=2 31>. Acessoem:  05 jun. de 2016

FIRST, Michael; FRANCES, Allen; PINCUS, Harold Alan.Manual de Diagnóstico Diferencial do DSM-IV-TR. Trad. Maria Cristina Monteiro. Porto Alegre: Artmed, 2004.

FOLLMER, Simone Fernanda. A legítima defesa da honra e a violenta emoção nos crimes de homicídio passional. Monografia apresentadaao curso de graduação em Direito pelo Centro Universitário UNIVATES. Lajeado/RS, 2015. Disponível em: <https://www.univates.br/bdu/bitstream/10737/673/1/2014SimoneFernandaFollmer.pdf>. Acesso em: 11 ago. 2016.

GAIA, Luciana Garcia. Crimes Passionais. REGRAD,São Paulo, v.2, n.1, p.127-141, jan. 2009. Disponível em: <http://revista.univem.edu.br/index.php/REGRAD/article/view/174/194. Acesso em: 03 abr. 2016.

GARCÍA-PABLOS, Antonio de Molina; GOMES, Luiz Flavio. Criminologia.4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte especial - 11. ed. v. 4. Niterói: Impetus,

2015.

JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz. Direito Penal. 13 ed. rev, atual. e v. 4. amp. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

LAPA, Nadia. Feminismo pra que? In. Revista Carta Capital online. Publicado 13/01/2014 19h00.Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/blogs/feminismo-pra-que>. Acesso em: 02 abr. 2016.

_______. <http://www.cartacapital.com.br/blogs/feminismo-pra-que/crime-passional-nao-e-amor-e-poder-9225.html>. Acesso em: 20 de out. 2016

LASSERRE, Emmanuel. Os Delinquentes Passionais. Lisboa: Ferreira, 1909.

LEAL, João José. Cruzada doutrinaria contra o homicídio passional: análise do pensamento de Leon Rabinowicz e de Nelson Hungria. 2005. Disponível em: <http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/2342>.

LYRA, Roberto. Polícia e justiça para o amor: criminalidade artística e passional. Rio de Janeiro: A Noite, s.d.

NAÇÕES UNIDAS. IV Conferência Mundial da Mulher. China, Beijing, 4 – 15 set., 1995. Disponível em: <http://www.un.org/esa/gopher-data/conf/fwcw/off/a--20.en>. Acesso em: 5 mar. 2016.

PASSINATO, Wania. “Femicídios” e as mortes de mulheres no Brasil. cadernos pagu (37), julho-dezembro de 2011: 219-246 Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/262654331> acesso 22 de out. 2016

PINTO, Gabriela Berlese. Violência Doméstica e Familiar à luz da Lei Nº 11.340/2006. 2007. 32 pág. Monografia de Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de bacharelado em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. PUCRS, Porto Alegre/RS. Disponível em: <http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2007_1/gabriela_berlese.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2016.

RABINOWICZ, Léon. O Crime Passional. São Paulo: Mundo Jurídico, 2007.

RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 18 ed. rev. ampl e atual. Rio de Janeiro: Lumes Juris, 2011.

RUSSEL and CAPUTTI.Femicide: The Politics of Women Killing. New York, Twayne Publisher, 1992.

SEO, KhallinTiemi. Manifestações de ciúme e suas conseqüências, na dinâmica de relacionamento conjugal. Monografia apresentada à Faculdade de Ciências da Saúde, como requisito parcial para obtenção do título de Psicólogo pela Associação Cultural e Educacional de Garça/ SP. Disponível em: <http://newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/41.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2016.

SILVA, Luciane Lemos da; COELHO, Elza Berger Salema; CAPONI, Sandra Noemi Cucurullo de. Violência silenciosa: violência psicológica como condição da violência física doméstica. Interface (Botucatu),  Botucatu,  v. 11, n. 21, p. 93- 103,  Apr.  2007 .   Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-32832007000100009&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 18  Ago.  2016. 

SHIMA, Erica Maresol Reina. O homicida passional – entre a paixão e a morte. Revista Direito UNIFAC, 2011, n. 127.

SIMIÃO, Daniel Schroeter. Reparação, justiça e violência doméstica: perspectivas para reflexão e ação/Compensation, justice anddomesticviolence: perspectives for thinkingandacting. Vivência: Revista de Antropologia, v. 1, n. 46, 2016.

SIMON, Robert I. Homens maus fazem o que homens bons sonham: um psiquiatra forense ilumina o lado obscuro do comportamento humano. Traduzido por: Laís Andrade e Rafael Rodrigues Torres. Porto Alegre: Artmed, 2009.

SOUZA, Sérgio Ricardo. Comentários à lei de combate à violência contra mulher. Curitiba: Juruá, 2007.

STOCKER, Michael; HEGEMAN, Elizabeth. O valor das emoções. Traduzido por: Cecília Prada. São Paulo: Palas Athena, 2002.

TELES, Maria Amélia de Almeida. O que são direitos humanos das mulheres. São Paulo: Brasiliense, 2006, p.77.                                                                                   


Notas

[1]Artigo 5º, CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) XXXVIII - e reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: (…) c) a soberania dos veredictos; (…)” (BRASIL, 1988)

[2]O homem médio seria aquele que representa o equilíbrio dentro de uma sociedade, nem aquele que seja completamente ignorante, nem aquele que entenda de tudo, absolutamente brilhante. Utiliza-se enquanto paradigma no campo do direito para solucionar situações conflituosas, onde se questiona o que um homem centrado, equilibrado em termos de moral e costumes faria.

[3]A Organização dos Estados Americanos foi fundada em 30 de abril de 1948, constituindo-se como um dos organismos regionais mais antigos do mundo, sendo fundada três anos após a criação da ONU. Com 21 países signatários, entre eles o Brasil, reunidos em Bogotá, Colômbia, assinaram a Carta da Organização dos Estados Americanos, onde a organização definia-se como um organismo regional dentro das Nações Unidas. Os países-membros se comprometiam a defender os interesses do continente americano, buscando soluções pacíficas para o desenvolvimento econômico, social e cultural.

Sobre a autora
Nara Rubia Gomes Carneiro

Bacharel em direito pela Faculdade de Jussara.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!