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A responsabilidade civil ambiental referente aos acidentes com biodiesel

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Agenda 26/05/2017 às 10:40

3 . LEGISLAÇÃO

O Direito Ambiental Brasileiro apresenta atualmente um conjunto de normas que possuem função reguladora de programas e projetos vinculados à produção de biocombustíveis, para que haja um controle quanto à preservação ambiental.

Desta forma, chega-se a temática dos estudos sobre o Direito Ambiental vinculado à agroindústria, setor econômico responsável pelo cultivo da cana de açúcar, mamona e soja, principais vegetais utilizados como fontes de matéria prima para a produção dos biocombustíveis comercializados Brasil, além das demais oleaginosas.

O Brasil tem como base legal acerca da preservação do meio ambiente a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981) e a constitucionalização da temática através dos artigos 170 e 225 da Constituição Federal de 1988.

A Lei nº 6.938/1981 desenvolve no art. 9º a instrumentalização para que seja de fato aplicado o controle das etapas e processos para a instalação e manutenção de atividades produtoras de produtos e subprodutos com base na matéria prima natural. O inciso V chama atenção por tratar da ideia de incentivo ao desenvolvimento de novas tecnologias que aprimorem o uso do meio ambiente buscando a sustentabilidade.

Art 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente:

(...)

V - os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade ambiental;

O órgão consultivo e deliberativo é, nos termos do inc. II do art 6º da Lei 6.938/1981, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), com a finalidade de assessorar,  que é um colegiado representativo dos órgãos federais, estaduais e municipais, do setor empresarial e da sociedade civil. Somada à Política Nacional do Meio Ambiente a Resolução CONAMA 001, de 21 de janeiro de 1986, inaugurando a participação do Conselho Nacional do Meio Ambiente como agente regulador nas questões de aplicabilidade das normas ambientais vigentes no Brasil. Em seu artigo 1º, a Resolução CONAMA 001/1986 estabelece o que vem a ser impacto ambiental, onde:

Art. 1º Para efeito desta Resolução considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam:

I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

II - as atividades sociais e econômicas;

III - a biota;

IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;

V - a qualidade dos recursos ambientais.

A Resolução CONAMA 237/1997 veio para definir e orientar o que é licenciamento ambiental, bem como as formas de obtenção da licença ambiental, detalhando como proceder. Em seu artigo 2º, esta resolução demonstra a necessidade da aplicação do processo de licenciamento ambiental nos “empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental” criando assim a possibilidade de afastar efeitos danosos ao meio ambiente, lembrando que, conforme Celso Antônio Pacheco Fiorillo, “haverá dano mesmo que este não derive de um ato ilícito”. (FIORILLO, 2013, p. 65)

O Brasil, conforme o site da revista BiodieselBR, se tornou rapidamente um dos maiores produtores mundiais de biodiesel, e desde o início do programa do biodiesel têm ocorrido ajustes nas legislações brasileiras para que pudessem abranger todas as situações. Dentre as alterações, ao menos quatro regras importantes devem ser mencionadas:

a) Selo Combustível Social:

Visa indicar quais usinas brasileiras promovem o desenvolvimento social no país. Auxilia no desenvolvimento a agricultura familiar, já que o principal critério para que as indústrias recebam o selo é a compra de porcentuais pré-definidos de matéria-prima vinda deste tipo de agricultura. É essencial que se cumpra essa regra, pois só quem possui o selo pode participar desde o início de cada leilão de compra de biodiesel.  As que não possuem tem acesso apenas a partir da segunda rodada de cada leilão, quando 80% do volume já foi contratado. Em fevereiro de 2009, através de nova regulamentação (a instrução normativa número 1), definiu percentual mínimo obrigatório para a compra de matéria-prima oriunda de agricultor familiar.

Há também um incentivo para que as indústrias comprem matérias-primas alternativas à soja facilitando a adesão do selo por aquelas que possuem esta prática.

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O selo possui validade de cinco anos, porém, possui um controle trimestral do Ministério do Desenvolvimento Agrário sobre as aquisições de matérias-primas, podendo também perder o certificado aquelas empresas que obtiverem cancelamento do registro da Receita Federal e a autorização da ANP.

b) Matérias-Primas

Foi criado o decreto 6.458/08, o qual, determina que os fabricantes de biodiesel que comprarem matéria-prima produzida pela agricultura familiar das regiões Norte e Nordeste e do Semiárido possuirão direito à total isenção de PIS/Pasep e da Cofins.              A regra anterior ao decreto previa a isenção completa dos dois tributos apenas para os que adquirissem mamona ou palma da agricultura familiar para que seja estimulado o cultivo das demais oleaginosas.

 c) Especificação:

A Resolução 07/08 da ANP é um marco para a indústria de biodiesel brasileira. A agência decidiu tornar mais rígida a especificação do combustível produzido no país, abandonando o padrão provisório (Resolução ANP nº 42, de 24.11.2004 – D.O.U. 9.12.2004 – retificada D.O.U. 19.4.2005), especialmente para que o nosso produto tenha melhor aceitação na Europa e nos Estados Unidos, facilitando a exportação.               A nova regra levou em consideração estudos internacionais que demonstram quais são as exigências de mercados em países com grande consumo do combustível.

A ANP decidiu modificar apenas os parâmetros que a indústria brasileira pudesse atender sem maiores dificuldades. Entre as principais mudanças implantadas pela resolução está a redução de limites para alguns resíduos, por exemplo. A norma reduziu o limite tolerável de metais alcalinos, álcoois, glicerol, fósforo, carbono e enxofre. O índice de acidez aceitável também foi diminuído. A norma também criou novas regras para o teor de água e para a contaminação total existente no biodiesel brasileiro.

d) Registro na ANP:

Em 2008, a ANP fez algumas alterações no sistema de autorizações necessárias para as empresas trabalharem com biodiesel editando a resolução n.º 25, que mudou as regras.

Desde então, há três tipos de autorização diferentes que as usinas precisam conseguir na ANP: uma serve apenas para a construção, para a modificação das instalações e para a ampliação de usinas; a segunda serve para a produção do combustível; e a terceira, finalmente, dá à empresa o direito de vender o biodiesel.


4. ACIDENTES

Com uma frequência maior do que a desejada, ocorrem acidentes relacionados a este produto, mais comumente em fabricas ou durante o transporte do biodiesel. Para melhor visualização temos por exemplo um acidente ocorrido no dia 11 de abril de 2011, no qual ocorreu uma explosão no parque industrial da Oleoplan. O acidente matou um dos trabalhadores da usina e feriu outros dois sem maior gravidade. Localizada no município de Veranópolis (RS), a Oleoplan é uma das maiores usinas de biodiesel do Brasil, com capacidade de produção estimada em 378 milhões de litros. 

Mais recentemente, em 18 de janeiro de 2012, um caminhão da empresa Medeiros e Cabral Ltda sofreu um acidente em meio ao transporte, causando o derramamento de 44 mil litros de biodiesel na quadra 207 Sul, em Palmas. Parte do óleo atingiu o lago da Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães e provocou a interdição da Praia da Graciosa.

4.1 O DANO AMBIENTAL

Por conta de tais acidentes, devemos analisar os danos ambientais que podem ser causados, para determinar o procedimento a ser tomado em tais situações.

O termo dano é um dos alicerces essenciais da responsabilidade civil, de modo que se faz imprescindível conceituá-lo.

Conforme o Dicionário Online de Português:

Dano: Ação ou efeito de danificar. Inutilização, estrago de coisa alheia. Mal ou prejuízo causado a alguém. Direito Dano emergente, prejuízo efetivo, real, provado. Dano infecto, prejuízo possível, eventual, iminente.

Sinônimo: perda, prejuízo, estrago, agravo, detrimento

É importante ressaltar que inexiste relação indissociável entre a responsabilidade civil e o ato ilícito, de forma que haverá dano mesmo que este não derive de um ato ilícito. Dessa forma, o conceito que se coaduna com o aqui exposto é o de que dano é a lesão a um bem jurídico.

Ocorrendo lesão a um bem ambiental, resultante de atividade praticada por pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que direta ou indiretamente seja responsável pelo dano, não só há a caracterização deste como a identificação do poluidor, aquele que terá o dever de indenizá-lo.

4.2 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL

No campo da responsabilidade civil, a influência do Direito Ambiental (Lei 6.938/1981, art. 14, §1 º, que trata da responsabilidade civil objetiva por dano ambiental) foi bastante significativa. (FIGUEIREDO, 2013, pg. 131).

A responsabilidade civil por danos ambientais possui um regime jurídico próprio utilizando as normas específicas ambientais, e complementarmente as normas dos demais ramos jurídicos no que for compatível e, conforme Marcelo Abelha Rodrigues[3], a responsabilidade nada mais é que decorrência de um princípio maior, justamente o poluidor/usuário-pagador, que consiste em uma norma de direito ambiental que visa obrigar o poluidor a arcar com os custos da reparação do dano por ele causado ao meio ambiente.

De forma complementar, conforme o Princípio 13, da Declaração do Rio, “os Estados deverão desenvolver a legislação nacional relativa à responsabilidade e à indenização referente às vitimas da contaminação e outros danos ambientais. Os Estados deverão cooperar de maneira inteligente e mais decidida no preparo de novas leis internacionais sobre responsabilidade e indenização pelos efeitos adversos dos danos ambientais causados pelas atividades realizadas dentro de sua jurisdição, ou sob seu controle, em zonas situadas fora de sua jurisdição”.

É competência concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal legislar sobre a responsabilidade por dano ao meio ambiente, com espeque no artigo 24, VIII, cabendo aos Municípios editar normas suplementando as federais e estaduais, de acordo com o interesse local.

Esta espécie de responsabilidade ambiental é expressamente constitucional, pois as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados, na forma do artigo 225, § 3º, da Constituição Federal. Isso significa que a responsabilização do produtor independe da existência de culpa, ou seja, da presença de imprudência, imperícia ou negligência, ou até mesmo da existência de dolo, que é caracterizada pela intenção de praticar o ato ilícito, bastando, apenas, a relação entre a ação ou omissão do agente e o dano.

Nesse mesmo sentido, dispõe o § 1º, do Art. 14 da Lei nº 6.938/81, in verbis:

§ 1º- as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

O ordenamento jurídico brasileiro, ao regulamentar a responsabilidade civil das empresas por danos ambientais, a fim de proporcionar real e efetiva responsabilização, fundamentou-se na teoria objetiva, de forma que o uso indisciplinado, bem como as atividades inadequadas e abusivas ao meio ambiente se torne uma preocupação de todos, visando assim, um meio ambiente saudável que preserve a qualidade de vida. Deve ser lembrar que o nexo causal é o vínculo que une conduta e resultado lesivo, variando a sua determinação de acordo com a teoria que se adote. É pressuposto indispensável para toda a responsabilização civil.

O dano ambiental deve ser entendido como toda e qualquer lesão que seja causada por ação humana, sendo esta culposa ou não, ao meio-ambiente, diretamente, como interesse da coletividade, interesses próprios e individualizáveis e que refletem no bem comum, aplicando-se a responsabilidade objetiva tanto a condutas comissivas quanto a condutas omissivas, portanto, considera-se a responsabilidade civil por danos causado ao meio ambiente. (AMADO, 2014, pg. 575)

As empresas no atual contexto de crescimento econômico constante e expansão industrial são potenciais degradadoras e poluidoras do meio ambiente de modo geral, podendo assim prejudica-lo, e comprometer a qualidade de vida e, em casos extremos, a própria vida humana, sendo diversas as condutas lesivas ao meio ambiente que já ensejaram danos de variados tipos.

Para que haja a responsabilização da pessoa jurídica, a infração deverá ser cometida por decisão de representante legal ou contratual  ou de órgão colegiado da pessoa jurídica; o autor material do crime deverá ser vinculado à pessoa jurídica; e a decisão deverá ser tomada no interesse ou benefício da pessoa jurídica. (FIORILLO, 2013, pg. 785).

Ainda pode se exigir que o autor material do crime tenha agido com a anuência da pessoa jurídica e a ação ocorra no âmbito das atividades da empresa.

Na esfera administrativa, face ao artigo 72, I a XI, Lei 9.605/98, as sanções são advertência, multa simples, multa diária, apreensão dos animas, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração, destruição ou inutilização do produto, suspensão de venda e fabricação do produto, embargo de obra ou atividade, demolição de obra, suspensão parcial ou total de atividades, restritiva de direitos, sendo consideradas sanções restritivas de direitos a suspensão de registro, licença ou autorização, cancelamento de registro, licença ou autorização, perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais, perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimento em estabelecimentos oficiais de crédito, proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de três anos.

Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas (art. 72, §1°).

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