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Ética ambiental e o caput do artigo 225 da Constituição Federal do Brasil

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Agenda 27/06/2017 às 09:57

O objetivo geral da pesquisa foi o de analisar se o caput do art. 225 da CF positiva princípios de ética ambiental.

Resumo: O artigo discute o conceito de ética e ética ambiental e faz análise hermenêutica do caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988 (CF). O objetivo geral da pesquisa foi o de analisar se o caput do art. 225 da CF positiva princípios de ética ambiental. O trabalho tem natureza aplicada, por meio do método exploratório, através do procedimento de pesquisa bibliográfica. Deste modo, no primeiro momento será averiguado o conceito de ética, para então adentrar no entendimento, e também conceito, de ética ambiental. A fim de se obter uma melhor compreensão, far-se-á a análise dos conceitos de ética, direito e meio ambiente, como forma de demonstrar os pontos de contato e interdisciplinaridade. Após, será apresentado o tratamento dado pela CF ao meio ambiente, e, por fim, far-se-á análise hermenêutica do caput do art. 225 da CF. Concluiu-se que, o caput do art. 225 da CF positiva princípios de ética ambiental.

 Palavras-chave: Ética Ambiental. Direito fundamental. Meio Ambiente. Caput do artigo 225 da CF.


INTRODUÇÃO

O meio ambiente é “[...] essencial à sadia qualidade de vida[2] [...]”, em outras palavras sem ele não existe vida saudável. De outro turno, o homem necessita de moradia, alimento, luz solar, água potável e bens de consumo que lhes são úteis no dia a dia. As matérias primas para a fabricação desses bens de consumo são retiradas do meio ambiente e, por motivos óbvios, é necessário interferir ou provocar mudanças nele.

Até certo limite tais mudanças são necessárias, e também toleráveis, baseado em um pensamento equilibrado, referentes às visões Eco e Antropocêntrica. Nessa linha de pensamento, é cediço que umas das finalidades do meio ambiente é a de servir ao homem, em contrapartida, este, sabedor de que o meio ambiente não é inesgotável, deve utilizá-lo de maneira equilibrada e sustentável.

A ética ambiental é o mecanismo que dá ao homem princípios cognitivos que o levem a agir de maneira correta quanto ao uso do meio ambiente. Aliada a ela está o caput do artigo 225 da CF que positiva e determina atos éticos no trato do homem para com o meio ambiente, como forma de protegê-lo às gerações presentes e futuras.


1 METODOLOGIA

A natureza da pesquisa é aplicada, pois tem a finalidade de gerar conhecimentos para aplicação prática, com a finalidade de solucionar problemas específicos. Conforme ensina McBride (2013) apud Moura (2014), pelo fato da pesquisa aplicada investigar problemas reais, seus pesquisadores estão frequentemente preocupados com a validade externa de seus estudos, observam os comportamentos a serem aplicados a situações reais. Estes pesquisadores tem o intento de aplicar seus resultados em problemas que envolvem indivíduos que não são participantes de seu estudo.

Quanto ao objetivo o método utilizado será o exploratório. De acordo com Gil (2010) este tipo de pesquisa tem a finalidade de proporcionar maior proximidade com o problema, a fim de torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. A maioria destas pesquisas envolvem levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado ou análise de exemplos que estimulem a compreensão.

Referente ao procedimento o caráter do trabalho é de pesquisa bibliográfica que para Fonseca (2002) realiza-se a partir do levantamento de bases teóricas já perscrutadas e publicadas em meios eletrônicos e escritos.


2 ÉTICA: ESCORÇO HISTÓRICO E CONCEITO

Antes de ingressarmos no estudo da ética, importante destacar, mesmo que de forma sucinta, o entendimento de moral, haja vista, a intrínseca relação entre ambos os conceitos.

Desta forma, Laland (1999) esclarece que moral se refere aos costumes, as regras de conduta admitidas numa sociedade determinada, ao estudo filosófico do bem e do mal, trata-se daquilo que é oposto ao imoral.

Pode-se distinguir entre uma moral do bem, que vista estabelecer o que é o bem para o homem – a sua felicidade, realização, prazer etc., e como se pode atingi-lo – e uma moral do dever, que apresenta a lei moral como um imperativo categórico, necessária, objetiva e universalmente válida, como ensina Kant: “O dever é uma necessidade de se realizar uma ação por respeito à lei”, ainda segundo Kant a moral é a esfera da razão prática que responde à pergunta: “O que devemos fazer?”, (Japiassú e Marcondes, 2006).

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A moral é o “bom costume” louvado por determinada sociedade. É uma prática comum e aceitável no grupo. É o oposto do “imoral”. Não deturpa os princípios que regem os iguais e se esbarra na zona cinzenta de uma condutiva “moralmente duvidosa”, ou seja, que possa gerar opróbrio a outrem que é regido pelos mesmos princípios.

No que se refere à ética, far-se-á análise histórica, baseada no livro Olinto (2013), “Ética dos maiores mestres através da história”, a fim de servir de norte ao entendimento de ética, dada a importância de seu conceito no presente trabalho.

Assim, a Grécia é o berço da filosofia, e também da ética, tendo em Sócrates, Platão e Aristóteles os fundadores. Os dois últimos desenvolveram suas teorias a partir do pensamento Socrático: Platão, com seu idealismo, criou a ideia de transcendência, já Aristóteles, o da imanência.

Na Idade Média, destacaram-se dois pensadores que desenvolveram o que se pode chamar de “ética cristã”: Agostinho de Hipona, que foi influenciado por Platão, criou a ética do amor e do conflito, e Tomás de Aquino, que recebeu influência de Aristóteles, verticalizou a ética.

Nesse período, sob a guia do cristianismo os pensadores medievais verticalizaram a metafísica quando a batizaram ao identificar o conceito de ser com a realidade divina pessoal. Isto é, o ser, conceito abstrato e universal, tornou-se o nome de um ente pessoal, Deus, e a busca pelos valores sobrenaturais duelou com os prazeres deste mundo, passando este último a plano secundário, sob a ideia de implantação do Reino de Deus.

Na Idade Moderna, capitaneada por Immanuel Kant, ocorreu a subjetivação da ética. Apresentando entendimento contrário ao período cristão, pois passou a exaltar os valores humanos, trazendo-o novamente à pauta de estudo, por meio do movimento renascentista, através de uma releitura do humanismo.

A Idade Contemporânea, tornou a ética objetiva, principalmente com Jonh Rawls, através de sua teoria da justiça social, Jürgen Habermas por meio da ética discursiva e Amartya Sen, que desenvolveu a ideia do progresso como liberdade.

Este período, marcado por erupções sociais, trouxe à tônica, reflexões do real, do palpável. Dadas marcantes mudanças na sociedade, impulsionada pela globalização, a ideia de “justiça social” foi inserida na pauta das discussões éticas.

Por fim, nessa curta excursão histórica da ética, surge a bioética, que segundo o autor é uma nova maneira de entender a ética dos tempos passados; um mundo novo demanda uma ética nova, adequada às novas condições de vida. Essa ética se ocupa com os seguintes temas e áreas do saber: a) discussão ética geral dos avanços da biotecnologia; b) biogenética humana; c) biodiversidade. Pode-se perceber que a bioética, quando se ocupa com a biodiversidade, serve de embrião para o entendimento de ética ambiental.

Sobre ética existem duas concepções fundamentais: a primeira que a considera como ciência para o qual a conduta humana deve ser guiada, e dos meios para atingir tal fim, deduzindo tanto o fim quanto os meios da natureza do homem; a segunda, que a considera como a ciência do móvel da conduta humana e procura determinar tal móvel com vistas a dirigir ou disciplinar essa conduta. Essas duas concepções, que se relacionam de várias maneiras na Antiguidade e no mundo contemporâneo, são profundamente diferentes e falam duas línguas diversas. A primeira fala a língua do ideal para o qual o homem se dirige por sua natureza e, por consequência, da “natureza”, “essência” ou “substância” do homem. Já a segunda fala dos “motivos” ou “causas” da conduta humana, ou das “forças” que a determinam, pretendendo ater-se ao conhecimento dos fatos (Abbagnano, 2007).

Para esta pesquisa entender ética como ciência da conduta é o suficiente a fim de servir de base para a compreensão do conceito de ética ambiental – que pode ser entendida como uma forma qualificada ou específica da ética –, como se verá a seguir.

Na tarefa hercúlea de diferenciar moral de ética, pode-se dizer que a primeira possui um entendimento mais amplo, macro, pois sua concepção é dedutiva, ao passo que a segunda está mais próxima do normativo, porém, como esclarece Mora, às vezes estes conceitos são usados de forma intercambiável,

Moral é derivada de mors, costume, como "ética" de ethos e essa "ética" e "moral" às vezes são usados de forma intercambiável. Como Cícero disse, "no que se refere aos costumes, que os gregos chamam ethos que costumamos chamar essa parte da filosofia da moral, mas deve enriquecer a língua latina e chamá-lo de moralidade.". No entanto, o termo "moral" geralmente tem um significado mais amplo do que a palavra "ética". (1950, p. 232, tradução nossa).

Desta forma, constata-se que na maioria dos casos, os conceitos de ética e moral são utilizados de forma indistinta, pois como lidam com a conduta humana, torna-se difícil impor um limite no campo de atuação, como Japiassú e Marcondes (2006) ensinam, moral em um sentido macro é sinônimo de ética como teoria dos valores que coordenam a ação ou conduta do homem, tendo um caráter normativo ou prescritivo. Em um entendimento mais estrito, a moral refere-se aos costumes, valores e normas de conduta específicos de uma sociedade ou cultura, enquanto que a ética considera a ação humana do seu ponto de vista valorativo e normativo, em um sentido mais genérico e abstrato.


3 ÉTICA AMBIENTAL

Segundo Milaré (2009) ética ambiental é ética de terceira geração, pois supondo já a ética ou a moral individual e social, concentra-se na sobrevivência do planeta Terra com todos os seus ecossistemas e a família humana.

Trata-se de ética de terceiro geração, pois o meio ambiente – como adiante será demonstrado –, é classificado como um direito de terceira geração. Ética ambiental é uma “ética qualificada” ou “ética especializada” pois cuida das questões voltadas ao meio ambiente, inserindo nesse contexto o meio ambiente natural, artificial, paisagístico e arqueológico.

Nesse contexto é plausível afirmar que a atual ordem mundial exige uma postura moral e ética específica, atinente às questões ambientais, haja vista, que a conduta humana é o principal fator de mudança no mundo natural.

No que se refere à relação do homem quanto a subsistência do meio ambiente, no contexto de ecologia e da ética ambiental, Milaré leciona que:

E o que é a ecologia, senão “relação, inter-ação e dialogação de todas as coisas existentes (viventes ou não) entre si e com tudo o que existe, real ou potencial?” A ecologia não tem a ver apenas com a natureza (ecologia natural), mas também com a sociedade e a cultura (ecologia humana, social etc.). “Numa visão ecológica, tudo o que existe, coexiste. Tudo o que coexiste, preexiste. E tudo o que existe e preexiste subsiste através de uma teia infinita de relações compreensivas. Nada existe fora da relação. Tudo se relaciona com tudo em todos os pontos”. Essa teia de fios fortemente entrelaçados reafirma a interdependência entre todos os seres, funcionaliza as hierarquias e nega o direito do mais forte: “todos os seres, por microscópicos que sejam, contam e possuem sua relativa autonomia – nada é supérfluo ou marginal –, tem futuro não simplesmente o maior e mais forte, mas o que tiver mais capacidade de relação e disponibilidade de adaptação” (2009, p. 121).

O papel do homem, nesta relação, está em saber utilizar o meio ambiente ao seu favor e benefício, porém não de forma supérflua e indiscriminada, ou seja, não com uma visão capitalista, utilitarista ou consumista.

Nisto consiste a ética ambiental e sua razão de existência: a de instigar no homem – que segundo Aristóteles é animal político (2005) –, o uso correto do meio ambiente.

Não se defende aqui uma ideia, extremada ou polarizada, Ecocêntrica, ou de outro turno Antropocêntrica. É necessário ter uma posição equilibrada neste ponto. O homem deve servir-se do meio ambiente – até por ser medida de necessidade para sua sobrevivência e perpetuação da raça –, de maneira equilibrada e sustentável, pois, apesar de parecer lúdico e até romântico, o meio ambiente não tem fim em si mesmo, em contrapartida, a sua utilização pelo homem deve ser norteada por princípios éticos.


4 ÉTICA, DIREITO E MEIO AMBIENTE: CONCEITOS E INTERDISCIPLINARIDADE

No presente trabalho a conexão entre os conceitos de ética, direito e meio ambiente é indiscutível – levando-se em consideração que o meio ambiente em suas múltiplas formas de se relacionar com estas duas ciências, suscita a criação de normas éticas e jurídicas –, pois eles se entrelaçam e, ao se reportar a um, fatalmente ter-se-á inferências ao outro, seja de forma direta ou indireta.

A ligação entre ética e direito é inquestionável e de longa data. Também é necessário ressaltar que assim como o ramo do Direito Ambiental surgiu como remédio necessário para ordenar as questões ambientais, a ética ambiental teve sua origem em uma concepção similar: apresentar princípios norteadores que suscitem conduta humana eticamente positiva na fruição do meio ambiente.

Como leciona Milaré (2009) o mesmo sucede com a Moral ou a Ética em relação a essa nova ordem planetária. As necessidades do meio ambiente também alcançam a conduta humana em face do mundo natural e seus recursos, assim como do mundo dos homens e suas próprias concretizações, pois a presença da humanidade é fator preponderante do estado e da saúde da Terra. Em uma palavra, constrói-se uma nova moralidade dos indivíduos e da sociedade humana, perante a nossa casa comum.

O conceito de ética já fora abordado, o que, a esta altura, convém apenas rememorar que trata-se da “ciência da conduta”.

No tocante ao conceito do direito é importante salientar que se trata de tarefa demasiadamente complexa, haja vista, estar-se falando de uma concepção plurívoca. No tocante à etimologia seu entendimento mais atômico é directum ou rectum, que significa “reto”. Fiuza esclarece que “[...] A palavra direito vem do latim directum, que significa aquilo que é reto. Directum, por sua vez, vem do particípio passado do verbo dirigere que significa dirigir, alinhar [...]” (2010, p.04).

De fato, o termo direito foi inserido, com esse sentido, já na Idade Média, por volta do século IV. A palavra usada pelos romanos era ius. Quanto a esta, o entendimento dos filólogos não é pacífico. Para alguns, ius vem de iussum, particípio passado do verbo iubere, que quer dizer mandar, ordenar. O radicial, para eles, seria sânscrito, Yu (vínculo). Para outros, ius, estaria ligado a iustum, aquilo que é justo, tendo seu radical no védico Yos, significando, aquilo que é bom (ibid).

Obviamente, não é a finalidade deste trabalho a de dissecar o conceito de direito, aprofundando-se demasiadamente neste mister, em contrapartida, trazer à baila concepções, mesmo que de forma sucinta, é de salutar importância, para direcionar o entendimento. Neste sentido, é oportuno mencionar o conceito de Kelsen (1997) quando afirmar que direito trata-se de um ato através do qual uma conduta humana é prescrita, permitida ou, especificamente, facultada.

No que se refere ao meio ambiente, Silva (2009) leciona que se refere da interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas, no mesmo entendimento Milaré (2009) destaca que o meio ambiente, mediante suas múltiplas e variadas relações, inspira e fundamenta preceitos morais e normas jurídicas.

Sobre o autor
Adriano Brito Feitosa

Advogado, professor, palestrante, consultor jurídico e empresarial. Mestrando em Filosofia (UFBA); MBA (em andamento) em Marketing, Branding e Growth (PUC/RS); Especialização (em andamento) em Direito 4.0: Direito Digital, Proteção de dados e Cibersegurança (PUC/PR); Especialização (em andamento) em Gestão de Risco, Compliance e Auditoria (PUC/PR); Graduação (em andamento) em Ciências Contábeis; Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Advocacia Trabalhista. Especialista em Relações Pessoais e Gestão de Conflitos. Especialista em Métodos de ensino e aprendizagem numa perspectiva andragógica. Bacharel em Direito. Bacharel em Teologia. Bacharel em Filosofia. Fui técnico judiciário no Tribunal de Justiça do estado de Rondônia, onde exerci a função gratificada de conciliador judicial. Fui estagiário de Direito nos seguintes órgãos: Tribunal de Justiça, Justiça Federal, Procuradoria Geral Estadual, Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal. Fui estagiário de direito nos escritórios Enry Gouvea Advocacia e Carlos Alberto Trancoso Justo Advocacia. Fui estagiário administrativo no Ministério da Fazenda. Foi membro/colaborador do grupo de estudos "Fenomenologia e Hermenêutica", na Universidade Estadual de Feira de Santana, departamento de Filosofia, sob a orientação da Doutora Tatiane Boechat Abraham Zunino; Foi membro/colaborador do grupo de estudos "Nomisma, Riqueza e Valor: um estudo sobre o pensamento econômico de Aristóteles", na Universidade Estadual de Feira de Santana/BA, departamento de Filosofia, sob a orientação da Doutora Adriana Tabosa. Foi membro/colaborador do grupo de estudos "Pós-modernidade", no Seminário Latino Americano de Teologia da Bahia, sob a orientação do Doutor Daniel Lins; - Foi aluno especial do Mestrado em Ciências Sociais da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FEITOSA, Adriano Brito. Ética ambiental e o caput do artigo 225 da Constituição Federal do Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5109, 27 jun. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58568. Acesso em: 25 nov. 2024.

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