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Peculiaridades relativas ao juízo de admissibilidade dos recursos ordinários nos juizados especiais cíveis

Agenda 07/12/2017 às 15:00

Quais especificidades devem ser observadas no atendimento dos pressupostos intrínsecos e extrínsecos dos recursos no âmbito dos juizados cíveis?

1. INTRODUÇÃO

Com efeito, antes de examinar o mérito de uma ação, o juiz deve verificar se estão preenchidos os pressupostos processuais e as condições da ação. Da mesma maneira, antes de examinar a pretensão recursal, deve analisar os requisitos de admissibilidade do recurso.

Os requisitos de admissibilidade dos recursos constituem matéria de ordem pública, que, portanto, podem ser examinados de ofício pelo juiz. Nada mais são que os pressupostos indispensáveis para que o recurso possa ser conhecido, e sem o seu preenchimento, a pretensão recursal não pode sequer ser examinada.

Podem ser divididos em requisitos intrínsecos, que dizem respeito à relação entre a natureza e o conteúdo da decisão recorrida e o recurso interposto, e os extrínsecos, que levam em conta fatores estranhos à decisão impugnada, eis que são externos à mesma.

De acordo com essa classificação, os requisitos intrínsecos são: cabimento, legitimidade para recorrer e o interesse recursal; e os extrínsecos são: tempestividade,  preparo, regularidade formal, e inexistência de fato extintivo ou impeditivo do direito de recorrer.

O CPC, em relação à apelação, estabeleceu que o juízo de admissibilidade daquele recurso não será mais feito pelo juiz de primeiro grau, mercê do disposto no seu art. 1.010, §3°. Entretanto, nos juizados especiais, entende-se que o juízo de admissibilidade continua bipartido e duplo.

Confira-se:

“ENUNCIADO 166 - Nos Juizados Especiais Cíveis, o juízo prévio de admissibilidade do recurso será feito em primeiro grau (XXXIX Encontro - Maceió-AL)”. 


2. DESENVOLVIMENTO

2.1. REQUISITOS INTRÍNSECOS

2.1.1. CABIMENTO    

Os recursos são apenas aqueles criados por lei. O rol legal é numerus clausus, taxativo.

O artigo 944 do CPC enumera os recursos em geral, mas, nada impede que normas especiais prevejam outros recursos, como ocorreu com a Lei nº 9.099/95, em relação ao recurso inominado (art. 41). Note-se que a apelação inexiste no procedimento sumaríssimo, sendo previsto apenas esse recurso sem nome em relação às sentenças.

Além desse recurso, admitem-se os embargos de declaração e, para alguns, o agravo de instrumento, em situações excepcionais, apesar da inexistência de previsão específica em relação a este último, na Lei nº 9.099/95.

2.1.2. LEGITIMIDADE

As partes – autor e réu – são os legitimados por excelência.

Além deles, podem interpor recurso aqueles que tenham sido admitidos por força de intervenção de terceiros. Entretanto, como se sabe, a intervenção de terceiros, como regra, não é admitida nos juizados especiais, o que impede essa ampliação da legitimidade.

O Ministério Público pode recorrer, também, ainda que tenha atuado como fiscal da ordem jurídica, e não como parte.

 O terceiro prejudicado também pode recorrer, nos termos do art. 996 do CPC, porém, com a ressalva já mencionada em relação aos juizados especiais.

O advogado somente pode recorrer em nome próprio no que tange aos honorários advocatícios, por força do art. 23 da Lei nº 8.906/94.

Não podem recorrer: o juiz, os servidores do Judiciário, e o perito.

2.1.3. INTERESSE RECURSAL

Para que haja interesse é preciso que, por meio do recurso, se possa conseguir uma situação mais favorável do que a obtida com a decisão ou sentença. O interesse está condicionado à sucumbência do interessado.

Esse interesse é diferente nos embargos de declaração, cujo objetivo é aclarar, sanar alguma contradição, integrá-la ou corrigir erro material. Infelizmente, não raro, as partes tentam se utilizar desse recurso para fins de reforma da decisão e/ou sentença, o que pode ensejar sanções processuais.


3. REQUISITOS EXTRÍNSECOS

3.1. TEMPESTIVIDADE

Todo recurso deve ser interposto dentro do prazo estabelecido em lei, geral ou especial. Será intempestivo, e, portanto, inadmissível, o recurso que for apresentado fora do prazo.

No procedimento ordinário, deve-se observar, quanto à contagem e possibilidade de prorrogação dos prazos, o disposto nos artigos 219 e 224, do CPC, que trouxeram importantes inovações nessa matéria.

Todos os recursos do CPC[1], salvo os embargos de declaração, devem ser interpostos no prazo de 15 (quinze) dias.  Os embargos de declaração serão interpostos no prazo de 5 (cinco) dias.

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Nos juizados especiais, o prazo do recurso inominado continua a ser de 10 (dez) dias, conforme dispõe o artigo 42 da LJE. O prazo dos embargos de declaração também é de 5 (cinco) dias.

Vale lembrar, que os prazos, nos juizados especiais, continuam a ser contados de maneira contínua, e não em dias úteis, diversamente, da novidade introduzida pelo CPC[2].

Veja-se:

“ENUNCIADO 165 - Nos Juizados Especiais Cíveis, todos os prazos serão contados de forma contínua (XXXIX Encontro - Maceió-AL)”.

Inexiste prazo em dobro para entes públicos nos juizados especiais, mesmo no âmbito do juizado da fazenda pública (art.7º, Lei nº 12.153/09). A mesma regra se aplica aos litisconsortes com advogados diversos, ainda que sejam de escritórios diferentes.

Veja-se:

“ENUNCIADO 164 - O art. 229, caput, do CPC/2015 não se aplica ao Sistema de Juizados Especiais (XXXVIII Encontro – Belo Horizonte-MG)”.

A oposição de embargos de declaração por qualquer dos litigantes interrompe o prazo para a apresentação de outros recursos. Essa eficácia interruptiva agora vale também nos juizados especiais, eis que o artigo 1.065 do CPC alterou a redação do art. 50 da LJE. Outra novidade do CPC deu-se com a supressão da ‘dúvida’ do rol de motivos ensejadores dos declaratórios, o que era muito criticado pela doutrina, que a dúvida é uma consequência da falta de clareza do decisum.

3.2. PREPARO

Aquele que recorre deve pagar as despesas com o processamento do recurso, que constituem o preparo.

Cabe à legislação pertinente estabelecer quais os recursos que exigem o recolhimento do preparo, que é destinado à Fazenda Pública. Além do preparo, nos processos físicos, o recorrente deverá pagar o porte de remessa e de retorno, que diz respeito às despesas com correios.

Há, porém, recorrentes que, dada sua condição, estão isentos do preparo (art. 1.007, §1°). São eles: Ministério Público, Fazenda Pública, beneficiários da justiça gratuita.

O valor do preparo depende da legislação pertinente. No Estado de São Paulo, vigora a Lei nº 11.608/2003, que fixa como base de cálculo do preparo o valor da condenação, ou, não havendo, o valor da causa. Especificamente, em relação aos juizados especiais, essa norma estabelece o recolhimento mínimo (piso) de 5 UFESP’s para o primeiro grau e mais 5 UFESP’S para o segundo grau, o que, por vezes, causa confusão aos advogados.

Recentemente, a alíquota do preparo foi elevada para 4% no Estado de São Paulo, por força da Lei nº 15.855/2015.

Como regra geral, o recolhimento do preparo deve ser comprovado no ato de interposição do recurso, ocasião em que também deve ser comprovado o pagamento do porte de remessa e de retorno dos autos físicos.

A Súmula nº 484 do Superior Tribunal de Justiça admite que o preparo seja efetuado no primeiro dia útil subsequente, quando a interposição do recurso ocorrer após o encerramento do expediente bancário.

No procedimento ordinário, a falta do recolhimento do preparo no ato de interposição não é causa de rejeição liminar do recurso.

O artigo 1.007 do CPC, que trata dessa matéria, distingue, porém, duas situações: a inexistência absoluta do recolhimento do preparo, e a sua insuficiência. No primeiro caso, o Código determina o recolhimento em dobro do preparo, como forma de punição da parte negligente. Já, na segunda, hipótese, o juiz deverá mandar intimar a parte, na pessoa do seu advogado, para complementar o valor, sob pena de deserção, no prazo de 5 (cinco) dias.

Note-se, que essa complementação, ou mesmo o recolhimento em dobro, não são admitidos nos juizados especiais, nos quais o recorrente tem o dever de fazer e comprovar o recolhimento do mesmo em 48 (quarenta e oito) horas, independentemente, de intimação, na esteira do art. 42, §1°, da LJE.

Confira-se:

“ENUNCIADO 168 - Não se aplica aos recursos dos Juizados Especiais o disposto no artigo 1.007 do CPC 2015 (XL Encontro - Brasília-DF)”[3].

3.3. REGULARIDADE FORMAL

Os recursos são, em regra, apresentados por escrito, contudo, há exceções previstas em leis especiais, como no art. 49 da LJE, que admite a interposição dos embargos de declaração oralmente. Todavia, as razões devem ser reduzidas a termo.

Não será admitido o recurso que venha desacompanhado de razões, que devem ser apresentadas, em sua totalidade, no ato de interposição.

3.4. INEXISTÊNCIA DE FATOS EXTINTIVOS OU IMPEDITIVOS DO DIREITO DE RECORRER

3.4.1. RENÚNCIA E AQUIESCÊNCIA

São sempre prévias à interposição, ao contrário, da desistência, que pressupõe recurso já apresentado.

A renúncia é manifestação unilateral de vontade, pela qual o titular do direito de recorrer declara a sua intenção de não o fazer. Caracteriza-se por ser irrevogável, prévia e unilateral, o que dispensa a anuência da parte contrária.

 A aquiescência é a manifestação, expressa ou tácita, de concordância do titular do direito de recorrer, com a decisão judicial. Impede que haja recurso, por força da preclusão lógica.

3.4.2. DESISTÊNCIA DO RECURSO

É causa impeditiva, tratada no art. 998 do CPC, e consiste na possibilidade de o recorrente, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, de desistir do recurso. Cuida-se de medida posterior à interposição do recurso, e pode ser tácita ou expressa.


4. CONCLUSÃO

Podemos destacar as seguintes conclusões em relação às peculiaridades do juízo de admissibilidade dos recursos ordinários nos juizados especiais.


5. BIBLIOGRAFIA

. ALVIM, Arruda. Manual de Direito Processual Civil, vol. 1, Parte Geral. 12ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

. CHIMENTI, Ricardo. Teoria e Prática dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais. 10ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008.

. CHIMENTI, Ricardo. Juizados Especiais da Fazenda Pública. 1ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010.

. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel, Teoria Geral do Processo. 23ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007.

. DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 2008.

. FUX, Luiz (coordenador). O Novo Processo Civil Brasileiro – Direito em Expectativa.  1ª ed., Rio de Janeiro: Forense - Gen, 2011.

. GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2016.

. JUNIOR, Humberto Theodoro; Curso de Direito Processual Civil, VOL. 1, Teoria Geral do Direito Processual Civil. 54ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2013.

. JUNIOR, Humberto Theodoro; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco; Pedron, Flavio Quinaud. Novo CPC, Fundamentos e Sistematização. 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2013.

. MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; O Projeto do CPC. 1ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

. TORRANO, Luiz Antônio Alves; Novo Código de Processo Civil. 1ª ed., Campinas: Servanda, 2016.


Notas

[1] Art. 1.003, §5º, CPC.

[2] Art. 219, CPC.

[3] O Enunciado nº 80 do FONAJE já previa a impossibilidade da complementação do preparo nos juizados especiais.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

STEINBERG, José Fernando. Peculiaridades relativas ao juízo de admissibilidade dos recursos ordinários nos juizados especiais cíveis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5272, 7 dez. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58818. Acesso em: 22 nov. 2024.

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