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Regime jurídico do processo administrativo disciplinar

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Agenda 13/07/2017 às 23:55

Análise do processo administrativo disciplinar (PAD) como instrumento obrigatório para consecução de determinados objetivos da Administração.

1. INTRODUÇÃO

O Processo Administrativo Disciplinar surge como instrumento administrativo obrigatório para consecução de determinados objetivos da administração. Tal imprescindibilidade decorre, incialmente, do regime adotado pela Constituição da República, que em seus arts 1º, caput e III; art 5º, LIII, LIV, LV; art. 37, caput; art. 41, §1º, II, explicita garantias e dispõe vedações atinentes à Administração Pública aos servidores a ela vinculados.

Dessa forma, pretende o presente trabalho versar acerca das peculiaridades, formalidades, procedimento e princípios que revestem o processo administrativo disciplinar. Para tanto, serão apresentados conceitos, disposições legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais relacionadas ao tema, com o objetivo de delinear o panorama contemporâneo que circunda a matéria.


2. CONCEITO

Antes de falarmos especificamente sobre o conceito de processo administrativo disciplinar, é importante que ressaltemos o que é o poder disciplinar e seu funcionamento.

O poder disciplinar é, antes de qualquer coisa, aquele que objetiva a punição de condutas tidas como ilícitas dentro do procedimento administrativo, nas leis administrativas, buscando manter o bom funcionamento da entidade pública e a coesão moral e ética, não prejudicando a eventual punibilidade no âmbito civil e penal. Desta forma, busca coagir o servidor público a exercer sua função em conformidade com o que se estabelece, tendo, consequentemente, um bom funcionamento dos órgãos e entidades.

Bem é verdade que o servidor público tem o dever de obediência àquilo que estabelecem as normas, assim como alguns comandos de seus superiores, ressalvadas as hipóteses de ordens ilícitas, em que este pode legitimamente se recusar a efetivar, seguindo os critérios de hierarquia de comando e a legalidade no âmbito da administração pública.

De tal forma, aquele que se encontra em regular exercício de suas funções não pode estar ao mesmo tempo cometendo um ilícito, uma vez que não existem contradições ou omissões dentro do exercício administrativo, se existe ilegalidade, existe irregularidade na atividade.

Para esse fim, surge o processo administrativo disciplinar, investigando as denúncias de irregularidades e buscando a melhor resposta a tal fato.

No que tange ao processo administrativo disciplinar, seria o meio, de que se usam as autoridades administrativas para investigar a responsabilidade de um servidor público em relação à infração praticada em exercício de sua função, ou que esteja de alguma forma correlacionada a esta.

O processo administrativo disciplinar tem sua base na Lei 8.112/90, no título V, que estabelece o método pelo qual será dado, sendo obrigatória a promoção de sua apuração imediata, com a formação de uma comissão de servidores, designados por autoridade competente, para tal, de modo que a sindicância não exceda o prazo de 30 dias, que pode ser prorrogado por uma única vez.

Tem como fim a punição, com instauração de processo disciplinar, que pode levar inclusive à perda do cargo, a aplicação de advertência, ou o arquivamento do processo de acordo com o resultado a que chegar a sindicância.


3. OBJETIVOS DO PAD

São objetivos do processo administrativo:

  1. A correspondente investigação e esclarecimento acerca da existência de infração disciplinar por parte do servidor público, e quais foram os meios fáticos em que ela ocorreu;
  2. A garantia do devido procedimento, com direito a ampla defesa do servidor a quem é imputada a conduta;
  3. O respaldo, ou fundamentação, da decisão tomada pela autoridade julgadora, para que esta tenha base firme e não possa ser atacada uma vez que correta, ou tomada como mera arbitrariedade em desfavor do servidor.


4. PRINCÍPIOS DO PAD

O processo administrativo, tanto de modo geral quanto especificamente falando, está vinculado aos princípios basilares do Direito Administrativo, como o princípio da legalidade, da impessoalidade e da eficiência, por exemplo. Não apenas os princípios expressamente previstos no art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988, mas também os implícitos.

Em 1999 foi promulgada a lei 9784, que estabelece as regras básicas sobre os processos administrativos em âmbito federal. É importante ressaltar que a lei não possui caráter nacional, como é, por exemplo, o Código Pena, dado que sujeita aos seus mandamentos apenas os agentes vinculados à administração direta e indireta federal, bem como os poderes legislativo e judiciário, mas cada estado e município, bem como o Distrito Federal, possui autonomia para criar as próprias regras para regular os processos administrativos em seus respectivos âmbitos.

Os dois objetivos maiores da lei são a proteção dos direitos dos administrados e o melhor cumprimento dos fins da administração.

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No que se refere aos princípios, é o art. 2º da lei que os enumera de maneira expressa. Não quer dizer, no entanto, que estão lá presentes todos os princípios referentes aos processos administrativos, dado que os específicos da matéria são trazidos basicamente pela doutrina. O art. 2º, já citado, repete, de maneira geral, os princípios já consagrados pela administração de um modo geral:

Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre ouros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Como já dito antes, o artigo acima reproduzido, repete os artigos gerais da administração, trazendo alguns dos expressos no caput do art. 37 da Constituição Federal, mas não sem excluir os demais, que o legislador preferiu deixa-los implícitos neste momento, como os princípios da impessoalidade e o da publicidade, que também guardam importância nesta matéria.

Aqui, no entanto, interessam-nos mais os princípios, também implícitos, próprios dos processos administrativos, quais sejam: oficialidade, informalismo, instrumentalidade das formas, verdade material e gratuidade.

Os grandes doutrinadores brasileiros não são, como não poderiam ser, silentes em relação a este assunto.

Para Celso Antonio Bandeira de Melo aparecem onze princípios obrigatórios: audiência do interessado, acessibilidade aos elementos do expediente, ampla instrução probatória, da motivação, da revisibilidade, da representação e assessoramento, da lealdade e boa-fé e da verdade material, que devem se aplicar a todo e qualquer procedimento. Para este autor, os princípios da oficialidade e da gratuidade não são obrigatórios nos procedimentos ampliativos de direito suscitados pelos interessados e o princípio do informalismo só não se aplica aos procedimentos licitatórios.

Já o professor Hely Lopes Meirelles, adota especificamente cinco princípios: legalidade objetiva, oficialidade, verdade material e garantia da defesa.

Outra grande doutrinadora brasileira, Maria Sylvia Zanella Di Pietro adota os seguintes princípios: publicidade, oficialidade, obediência às formas e aos procedimentos, da gratuidade, ampla defesa e contraditório, atipicidade, pluralidade de instâncias, da economia processual e da participação popular.

A seguir, faz-se breve análise dos princípios mais importantes no âmbito dos processos administrativos, levando-se em conta não apenas a letra da lei, mas também os ensinamentos dos grandes doutrinadores brasileiros.

4.1 Princípio da Oficialidade

Diferentemente do que acontece no processo levado a cabo pelo poder judiciário no Brasil, que é inerte, ou seja, só age quando provocado, o processo administrativo rege-se pelo princípio da oficialidade, segundo o qual a instauração e a impulsão do processo se dão de ofício. A administração não precisa vincular-se à provocação. Não poderia ser diferente. Os objetivos maiores do processo administrativo é salvaguardar os interesses do administrado e o melhor cumprimento dos fins da administração, além do fato de que, os princípios maiores do Direito Administrativo são a indisponibilidade do interesse público. Cabe, portanto, à Administração conduzir o processo administrativo, adotando todas as medidas necessárias. É este princípio que autoriza a Administração a requerer diligências, investigar fatos de que toma conhecimento no curso do processo, solicitar pareceres, laudos, informações, rever os próprios atos e praticar tudo o que for necessário  para a consecução do interesse público (DI PIETRO, 2007)

4.2 Princípio do Informalismo

Este é o princípio segundo o qual a Administração deve buscar a adoção de formas simples, não rígidas, mas que sejam suficientes para dar segurança aos administrados. O fato de adotar formas mais simples não pode significar desrespeito aos princípios fundamentais do processo, menos ainda ao princípio mestre da legalidade, mas apenas um distanciamento dos formalismos burocráticos mais próximos dos processos judiciais, o que ajuda na busca da verdade dos fatos.

4.3 Princípio da Instrumentalidade das Formas

Este é o princípio segundo o qual há a possibilidade de aproveitamento dos atos processuais que tenham cumprido sua finalidade, mesmo que estejam presentes vícios de formalidade.

4.4 Princípio da Verdade Material 

Segundo este princípio a Administração não está restrita apenas à versão dos sujeitos, podendo e devendo produzir provas, todas possíveis, desde que sejam lícitas, necessárias para seu convencimento

4.5 Principio da Gratuidade

Como o próprio nome sugere, este princípio estabelece que a Administração não pode cobrar despesas processuais no âmbito dos processos administrativos.


5. FASES DO PAD

Logo após a denúncia, se acatada for, será instaurado o processo disciplinar. A Lei nº 8.112, de 1990, em seu art. 151, raciona o processo administrativo disciplinar em três etapas: 1- instauração: publicação do ato que institui a comissão processante; 2- inquérito administrativo: fase dirigida pela comissão, que inclui instrução, defesa e relatório; 3- julgamento pela autoridade competente.

5.1 Instauração

Será instaurado o processo a partir da publicação da portaria no Diário Oficial da União, que deverá ser realizado pela autoridade competente . A sua publicação constitui ato que autoriza a comissão processante a iniciar seus trabalhos, a qual deverá trazer consigo a designação dos membros da comissão apuradora, o tipo de procedimento a ser realizado, a duração dos trabalhos, o objeto da apuração, entre outros. Há que se observar que não poderá haver a indicação do nome do servidor suspeito, bem como a conduta investigada e sua tipificação legal, isto por força do parecer da AGU GQ-12/94 .

O art. 149 prescreve que a comissão será formada por três servidores estáveis, a serem designados pela autoridade competente, de acordo com as regras de hierarquia previstas no art. 143, §3º e observadas as limitações de impedimento e suspeição do art. 149, §2º, que veda a participação de membros que sejam cônjuge, companheiro ou parente do acusado.

Esta comissão deverá exercer suas atribuições com independência: sem interferência da autoridade instauradora, e imparcialidade: buscando a verdade real sem preferência pessoal quanto ao acusado, se atendo sempre aos fatos nos documentos dos autos e à portaria instauradora. Sendo ainda assegurado o sigilo necessário à elucidação do caso .

O processo disciplinar deverá ser concluído no prazo de 60 dias, prorrogáveis por igual período se necessário, contados da data de publicação da portaria. Há, porém, que se notar que a inobservância dos prazos não gerará vício ou nulidade ao processo (art.169, §1º).

A instauração do processo implicará na interrupção da prescrição (art. 142, §1º) e também impedirá a exoneração a pedido e aposentadoria voluntária, até o fim do processo e cumprimento da sanção se houver (art. 172).

5.2 Inquérito Administrativo

O inquérito administrativo deverá observar os princípios do contraditório, sempre se assegurando ao acusado o direito à ampla defesa, através dos meios e recursos admitidos em direito (art. 153). Por isso, deve-se fazer uma notificação prévia ao acusado sobre a instauração do processo, assim que a portaria for baixada, para que desde logo se ponha em exercício o direito de defesa.

Ao servido acusado é reservado o direito de acompanhar o procedimento pessoalmente ou através de procurador, que não necessariamente deverá ser advogado. Poderá ainda arrolar testemunhas, produzir e requerer provas e outros meios para construir sua defesa.

Nesta fase, os membros da comissão deverão realizar as tomadas de depoimentos, acareações, investigações e demais diligencias cabíveis para coleta de provas, lançando mão inclusive de técnicos e peritos se necessário.

Há de se anotar que deve ser sempre levado em consideração a licitude da prova e as mesmas devem se apresentar, sempre que possível, em forma escrita. Alguns exemplos de provas são: documental, testemunhal, pericial, confissão, as obtidas por assistência técnica, simulação, reconhecimento de coisas ou pessoas e até mesmo provas emprestadas de outros processos.

No que diz respeito à prova testemunhal, a lei em comento esclarece que as testemunhas serão intimadas a depor mediante mandado expedido pelo presidente da comissão (art. 157) e deverá ser prestado oralmente e só então reduzido a termo, pois é vedada sua prestação via escrita pela testemunha (art. 158). A inquirição das testemunhas será feita separadamente, preferencialmente no mesmo dia, afim de evitar que as testemunhas se relacionem e troquem informações. E caso houver contradição nos depoimentos será realizada acareação entre as testemunhas sobre os pontos controversos.

Logo após a tomada dos testemunhos, e produção de todas as provas, deverá ser realizado o interrogatório do acusado, adotando-se os mesmos parâmetros das testemunhas (art. 159). Sendo facultada a presença do procurador e vedada a interferência deste no interrogatório.

Caso houverem mais de um acusado, serão interrogados separadamente e caso haja divergências nas respostas do interrogatório, também far-se-á acareação (art. 159, §1º).

Após a análise de todas as provas coletadas a comissão deverá formular a ata de encerramento da instrução, na qual constará a sua deliberação sobre a constância ou não de causa para indiciação do acusado.

Tipificada a infração disciplinar, será formulada a indiciação do servidor, com a especificação dos fatos a ele imputados e das respectivas provas (art.161). O termo de indiciação é o que norteará o indiciado a formular sua defesa, nele estará a delimitação da acusação.

O indiciado será citado por mandado expedido pelo presidente da comissão para apresentar defesa escrita, no prazo de dez dias, assegurando-se-lhe vista do processo na repartição. Havendo dois ou mais indiciados, o prazo será comum e de vinte dias (art. 161, §§1ª e2º).

        Caso o indiciado se recuse ao recebimento da citação, o prazo para defesa contar-se-á da data declarada, em termo próprio, pelo membro que fez a citação, com a assinatura de duas testemunhas.

     Poderá ainda haver a citação ficta, feita por edital, quando o indiciado não for encontrado e até mesmo citação por hora certa, quando o acusado se oculta propositalmente para não receber a citação.

     A defesa deverá ser escrita, elaborada pelo indiciado ou procurador devidamente constituído, na qual deverão constar os contra-argumentos sobre as acusações do mérito do processo.

     Caso não seja oferecida a defesa no prazo legal, será considerado revel (art. 164). E então a autoridade que instaurou o processo deverá designar um servidor como defensor dativo, pois a revelia nesse caso não significa a confissão dos fatos.

     Após a apreciação da defesa, a comissão deverá elaborar um relatório minucioso, resumindo as peças principais dos autos e provas usadas para formar sua convicção quando a inocência ou não do acusado (art. 165).

     Caso a responsabilidade do servidor seja reconhecida, a comissão deverá indicar o dispositivo legal/regulamentar infringido e as circunstâncias do ato (art. 165, §2º).

     O processo disciplinar, juntamente com o relatório da comissão, então será remetido à autoridade competente que determinou a sua instauração, para que seja realizado o julgamento (art. 166).

5.3 Julgamento

     Após o recebimento do processo, a autoridade julgadora deverá proferir sua decisão no prazo de vinte dias após o recebimento (art. 167). O qual deverá acatar o relatório da comissão, a não ser que as provas difiram do disposto nos autos (art.168).

     Caso seja observada a ocorrência de vício insanável, a autoridade deverá declarar a nulidade do processo, e no mesmo ato deverá constituir nova comissão para instauração de novo processo administrativo (art. 169).

     Caso seja verificada que a infração também se tipifica penalmente, o processo disciplinar deverá ser remetido ao Ministério público, para que se proceda com devida ação penal (art. 171).

Sobre o autor
Marcel Reis Monroe

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Maranhão - UFMA. Dedica-se aos temas primordiais do Direito Constitucional, Processual Civil, Financeiro e Tributário.

Informações sobre o texto

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