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Os princípios constitucionais do Direito do Trabalho e os direitos trabalhistas constitucionais:

uma breve reflexão crítica

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Agenda 09/11/2004 às 00:00

IV.Os Princípios Constitucionais Trabalhistas

Inicialmente, convém destacar que os princípios constitucionais do Direito do Trabalho estão voltados para o trabalhador enquanto indivíduo e enquanto parte integrante de uma coletividade social e econômica específica.

Neste sentido, o eminente professor Celso Ribeiro Bastos observa que a expressão trabalhador empregada pela Constituição vigente refere-se, a princípio, ao empregado, cuja definição legal é dada pela legislação infraconstitucional ordinária, mas precisamente pelo artigo 3º. da vestuta CLT.

Vislumbro que os princípios jurídicos constitucionais que delimitam o Direito do Trabalho se fundamentam numa série de pressupostos abstratos de caráter jurídico que conferem validade e eficácia jurídica às normas legais dessa disciplina jurídica, quer a nível constitucional, quer a nível infra-constitucional, pressupostos abstratos esses alicerçados num conjunto integrado de valores de cunho político e social aceitos pela Sociedade Brasileira.

Em outras palavras, os princípios constitucionais trabalhistas são preceitos jurídicos de caráter geral e abstrato que delimitam os contornos das soluções dos litígios judiciais laborais, quer no âmbito do dissídio individual, quer no âmbito do dissídio coletivo.

Por via de conseqüência, a aferição da validade e eficácia jurídicas das garantias e direitos trabalhistas agasalhados no texto constitucional vinculam-se diretamente à aplicabilidade dos princípios constitucionais trabalhistas tanto em termos sociais e políticos, no sentido amplo, quanto em termos jurídicos stricto sensu.

In casu

, seguindo o magistério do ilustre jurista e tratadista José Afonso da Silva, as normas e princípios jurídicos constitucionais podem ser classificadas quanto a sua eficácia, como se segue: 1º.)normas e princípios jurídicos constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata; 2º.)normas e princípios jurídicos constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas passíveis de restrições; e 3º.)normas e princípios jurídicos constitucionais de eficácia limitada ou reduzida.

Os princípios jurídicos constitucionais e as garantias e os direitos laborais insertos na Lex Legum de 1988, infelizmente, são normas e princípios jurídicos, via de regra, de caráter programático e, enquanto tal, despidas de eficácia jurídica imediata. (9)

Entendo que não deveria ser assim. Em especial, vejo que os princípios constitucionais trabalhistas - enquanto bens jurídicos fundamentais pertinentes à toda Sociedade Brasileira - correspondem a normas de observância obrigatória e dotadas de função pragmática no âmbito do sistema jurídico, qual seja a de definir, mediante a imposição de limites ético-jurídicos e parâmetros sócio-políticos, a eficácia jurídica dos direitos e garantias constitucionais trabalhistas.

Ressalto que a minha concepção acima exposta não é metafísica, mas uma concepção de cunho sociológico e histórico. Quanto maior for o consenso acerca da validade dos princípios jurídicos constitucionais, maior será a sua eficácia e, portanto, maior será o seu grau de legitimação perante a Sociedade.

Os princípios jurídicos constitucionais e as garantias e os direitos laborais constantes na atual Carta Política se classificam em: 1º.)princípios, garantias e direitos materiais trabalhistas; e 2º.)princípios, garantias e direitos processuais trabalhistas. Os primeiros, por sua vez, se subdividem em: 1º.)princípios, garantias e direitos materiais trabalhistas individuais; e 2º.)princípios, garantias e direitos materiais trabalhistas coletivos.

As garantias e direitos constitucionais materiais trabalhistas, apesar de serem, em grande sua maioria, normas de eficácia de eficácia contida, são normas que tem "... eficácia paralisante de efeitos de normas que forem incompatíveis e impeditiva de qualquer contrária ao que estabelecerem." (10) Neste diapasão, ad exemplum, o prazo do aviso prévio não poderá ser nunca inferior a 30 (trinta) dias (Constituição Federal de 1988, artigo 7º., inciso XXI).

Julgo que o Constituinte de 1988 deixou escapar a oportunidade de dar um significativo passo adiante, qual seja o de fixar de maneira precisa os limites da eficácia das garantias e dos direitos laborais, eis que tais espécies de garantias e direitos reclamam do Estado, necessariamente, uma postura ativa, a fim de propiciar uma liberdade concreta do hipossuficiente - o obreiro -, e não apenas uma liberdade formal, possibilitando, desta maneira, a criação de um equilíbrio jurídico na relação capital x trabalho.

Incluo as garantias e os direitos trabalhistas reconhecidos pela Lex Legum vigente no âmbito das liberdades públicas, cabendo ao cidadão destinatário de tais garantias e direitos - o trabalhador - o sagrado direito de reivindicar do Estado a sua fruição plena.

Nesta ordem de idéias, entendo que aquelas garantias e direitos trabalhistas constitucionalmente previstos que ainda aguardam regulamentação, ou que foram regulamentados de forma incompleta pelo legislador ordinário, são passíveis de serem tutelados via Mandado de Injunção a ser ajuizado perante o Pretório Excelso, com fulcro no disposto no artigo 5º., inciso LXXI. (11)

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No meu entendimento, concessa maxima venia de todos os doutos que porventura tenham visão divergente da ora perfilhada, a principal inovação da assim denominada Constituição Cidadã no âmbito das garantias e dos direitos trabalhistas constitucionais, foi o seu redimencionamento ético-jurídico no sentido de colocá-los não mais como no âmbito dos direitos individuais stricto sensu mas como direitos sociais alicerçados no trabalho como elemento definidor da dignidade humana.

Ressalte-se, por oportuno, que o artigo 6º. da "Constituição Cidadã" elenca o trabalho como direito social, na forma da Constituição.

Tal dispositivo constitucional, nos moldes que se encontra redigido, não encontra paralelo no nosso ordenamento jurídico pretérito, quer a nível constitucional, quer a nível infraconstitucional.

Até as normas processuais constitucionais aplicáveis ao Direito do Trabalho adquiriram, salvo melhor juízo, um novo dimensionamento jurídico, eis que devem serem aplicadas, a partir da vigência da Constituição de 1988, em conformidade com a valorização do trabalho enquanto elemento da aludida dignidade humana.

A competência da Justiça do Trabalho foi ampliada, o que representa, sem a menor sombra de dúvida, uma conquista de enorme importância não só para a classe obreira, como também para a Sociedade como um todo.

Sem embargo, e na esteira do entendimento acima firmado, vejo que a atual Constituição trouxe inovações de monta no âmbito das garantias postas à disposição do trabalhador a fim de fazer valer os seus direitos, em especial o Mandado de Injunção, o Mandado de Segurança Coletivo, o Habeas Data e a ampliação do campo de abrangência da Ação Civil Pública. Daí resultar que a eficácia jurídica das garantias e direitos constitucionais trabalhistas vigentes deve ser aferida tendo como parâmetro fundante ou principal a sua adequação à realidade da Sociedade como um todo e, no particular, às necessidades econômicas do destinatário último das garantias e direitos ora em comento: o obreiro.

O real sentido da supremacia jurídica das normas principiológicas constitucionais relativas às garantias e aos direitos laborais deve ser buscado na sua aplicabilidade de forma a mais abrangente possível e nunca de maneira restritiva. Por outras palavras, creio que os princípios constitucionais trabalhistas devem ser mesurados tomando como ponto de partida a sua efetividade social.

Cumpre destacar que a atual Carta Magna apresentou duas inovações principiológicas de monta no tocante aos princípios jurídicos trabalhistas, qual sejam: 1º.)o Princípio da Igualdade de Direitos entre os Trabalhadores Urbanos e Rurais (12); 2º.)o Princípio da Proteção contra Despedida Arbitrária ou Sem Justa Causa.

Desde a Constituição de 1934, quando foram introduzidos os primeiros direitos sociais no nosso ordenamento jurídico, não se dava um passo tão significativo no tocante ao reconhecimento da igualdade entre ambas as espécies de trabalhadores. Na esteira do magistério sempre preciso do ilustre mestre Arnaldo Süssekind, os direitos trabalhistas elencados no artigo 7º. da atual Lex Fundamentalis aplicam-se, exceto as exceções legalmente previstas, aos empregados urbanos e rurais, sem distinção de sexo, idade, estado civil e credo religioso.

No tocante ao segundo princípio, expresso no inciso I do art. 7º. da Constituição da República, "... corresponde, na verdade, um conjunto de normas aplicáveis à despedida arbitrária ou sem juta causa:

a)indenização compensatória (inc. I);

b)seguro-desemprego (inc. II);

c)levantamento dos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS (inc. III)." (13)

O Princípio de Direito de Greve insculpido no caput do artigo 9º. da atual Lex Legum é abrangente, eis que engloba os empregados das empresas privadas, das empresas públicas para-estatais e servidores públicos da administração pública direta e indireta da União Federal, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios. Esta abrangência é outra inovação de monta havida na Constituição vigente.

O exercício do direito de greve, evidentemente, não é irrestrito, submetendo-se às restrições legais em conformidade com os interesses da Coletividade.

Por fim, resta abordar uma questão que julgo de extrema importância, a saber: como interpretar os princípios constitucionais do Direito do Trabalho?

Em síntese, julgo que a interpretação dos princípios constitucionais trabalhistas deve ser feita de forma sistêmica, isto é, levando-se em consideração as regras constitucionais em seu conjunto. Em outras palavras, os aludidos princípios constitucionais devem ser interpretados levando-se em consideração a estrutura normativa constitucional como um todo, tanto sob aspecto teleológico quanto sob o aspecto histórico e sociológico e, nesta medida, deve necessariamente ter como fundamentos ou parâmetros principais: 1º.)a proteção do hipossuficiente; 2º.)a preponderância dos interesses coletivos sobre os interesses individuais; 3º.)a desconsideração de eventuais formalismos legais em face das necessidades reais, concretas, da Sociedade como um todo.

Isto posto, e a partir de uma análise lógico-sistemática da atual Carta Política, podemos concluir este tópico afirmando que os princípios jurídicos constitucionais do Direito do Trabalho são todos aqueles preceitos que informam a construção de uma ordem social mais justa e um sistema econômico mais eficiente, ordem e estrutura essas que tem como primado o trabalho e que possuem como objetivos primários o bem-estar geral da população e uma justiça social. Quando digo uma ordem social mais justa e um sistema econômico mais eficiente alicerçados no trabalho não estou pugnado o estabelecimento de um regime jurídico do Estado de cunho socialista, mas tão-somente a criação de um sistema legal que priorize a eliminação, tanto quanto possível, das gritantes desigualdades sócio-econômicas existentes no nosso país.

Por via de conseqüência, os princípios constitucionais do Direito do Trabalho devem delimitar, fixar, os principais parâmetros legais da atuação do Estado Democrático de Direito não em termos abstratos, mas em um plano prático através de metas ético-jurídicas de amplo alcance sócio-econômico e político que venham a diminuir os desníveis sociais e econômicos mais agudos hoje existentes no Brasil.


V.Reflexões Finais

Os princípios jurídicos constitucionais se constituem num dos principais pilares de um ordenamento jurídico, seja positivado, seja consuetudinário.

A não observância dos princípios jurídicos ocasiona, via de regra, a ruptura do sistema legal positivado, em especial quanto à não-efetividade da aplicação concreta das normas legais, resultando, não raro, na ruptura do Estado Democrático de Direito.

Independentemente da criação de novos direitos e garantias a nível constitucional, tanto o legislador, quanto os operadores do Direito (juiz, procurador, advogado, etc.), devem estar sempre em busca de novos mecanismos jurídicos que permitam efetivar os princípios jurídicos constitucionais já existentes.

Nesta ordem de idéias, apesar de sua origem claramente corporativista-autoritária, vislumbro que o Direito do Trabalho no Brasil tem um desígnio de fundamental importância a cumprir, qual seja de ser "... o amparo aos trabalhadores e a consecução de uma igualdade substancial e prática para os sujeitos envolvidos." (14) Em especial, entendo que os operadores do Direito do Trabalho devem apoiar as modalidades de tutelas extrajudiciais de solução dos litígios trabalhistas, sem perder de vista os princípios basilares dessa disciplina jurídica, sobretudo a tutela protetora do hipossuficiente: o obreiro.

Na verdade, considero que o constituinte de 1988, quando pretendeu permitir a flexibilização dos direitos laborais reconhecidos constitucionalmente, o fez privilegiando a negociação coletiva em detrimento da negociação individual, procurando, desta maneira, criar ou estimular as condições mínimas para a auto-composição dos litígios trabalhistas, sem, contudo, cair na falácia dos dogmas neo-liberais, como, ad exemplum, os mitos da autonomia da vontade e da liberdade absoluta das partes na gênese e desenvolvimento dos contratos trabalhistas. (15)

Ante tudo o que foi exposto e analisado acima, concluo a presente obra afirmando que os princípios constitucionais que informam o Direito do Trabalho adquirem uma importância capital no âmbito da Ciência do Direito, transcendendo em muito o estreito campo de atuação do Direito do Trabalho, eis que se constituem atualmente num dos principais pressupostos jurídicos e meta-jurídicos garantidores do modelo de Estado Democrático de Direito almejado pelo Constituinte de 1988, modelo esse que, com o tempo, deve lograr realizar, de maneira efetiva, real, os direitos sociais insertos no bojo do texto constitucional em vigor. Neste contexto, considerando que não há Sociedade sem ordem e nem ordem social sem normatividade jurídica, porque esta é o espelho daquela, entendo que os princípios constitucionais que regem o Direito do Trabalho devem servir de bússola para as futuras reformas do Direito Laboral, reformas essas que devem ser efetuadas não pela mera vontade ou capricho do legislador pátrio ou dos poderosos de plantão, mas pelo prisma dos valores éticos e sociais e das reais necessidades sociais da vontade popular, em especial da classe obreira.

Sobre o autor
Ricardo Luiz Alves

licenciado em História pela PUC/RJ, bacharel em Direito pelo Centro Integrado de Ensino Superior do Amazonas (CIESA), servidor da Justiça do Trabalho em Manaus (AM)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES, Ricardo Luiz. Os princípios constitucionais do Direito do Trabalho e os direitos trabalhistas constitucionais:: uma breve reflexão crítica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 490, 9 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5915. Acesso em: 22 nov. 2024.

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