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A não incidência da multa de 10% no cumprimento de sentença no processo trabalhista:

Agenda 07/05/2018 às 10:30

Em princípio, não incidem na fase inicial do cumprimento de obrigação de pagar estabelecida em sentença trabalhista a multa de 10% e os honorários sucumbenciais de 10% previstos no art. 523, § 1º, do CPC.

No dia 21 de agosto de 2017, o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) realizou o julgamento do Tema nº 4 de seus Recursos Repetitivos, instaurado para a debater a incidência – ou não – da multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC/73 (e no art. 523, § 1º, do CPC/2015) ao cumprimento de obrigação de pagar no processo do trabalho.

Recorda-se que a reforma processual efetuada pela Lei nº 11.232/2005 sobre o CPC/73 consolidou o processo sincrético, envolvendo as etapas de cognição e execução na mesma relação jurídica processual, deixando a segunda fase de ser realizada em um processo autônomo. O cumprimento da sentença continuou com o mesmo objetivo do processo de execução, de satisfazer o direito do credor, por meio do cumprimento da obrigação pelo devedor, ou independentemente da vontade deste.

No cumprimento das obrigações de pagar quantia certa, o Estado expropria bens do devedor para o pagamento da dívida, o que afasta, em princípio, a utilização de meios de execução indireta, e da fixação de multa pelo descumprimento. Porém, o art. 475-J do CPC/73 previa que o devedor deve satisfazer a obrigação no prazo de 15 dias, sob pena de incidência de multa no percentual de 10% do montante devido:

“Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação”.

A norma foi reproduzida, com algumas alterações, pelo art. 523, § 1º, do CPC/2015:

“Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

§ 1o Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento”.

A multa incide obrigatoriamente no cumprimento de sentença, por força de lei, logo, o executado tem a ciência prévia de que será punido, caso não efetue o pagamento do débito no prazo de 15 dias.

Ainda, por ser estabelecida por lei, essa multa incide independentemente de requerimento do credor.

Caso haja vários devedores, não haverá a obrigação de cada um de pagar 10%, considerando que o dispositivo legal prevê expressamente sua incidência sobre o valor do débito, independentemente da quantidade de executados.

Há quem sustente que, caso o devedor demonstre não ter condições de pagar a dívida, não incide a multa. Porém, não existe qualquer ressalva legal sobre essa situação; deixando de efetuar o pagamento no prazo, prossegue-se no cumprimento da sentença, com a expedição de mandado de penhora e avaliação, acrescida a dívida da multa de 10%. Salienta-se, contudo, que existem decisões de tribunais no sentido de que, havendo o cumprimento espontâneo da obrigação, ainda que com um pequeno atraso, não se aplica a multa.

A controvérsia sobre a incidência – ou não – dessas regras ao processo trabalhista está na existência de normas processuais específicas na CLT sobre a execução de obrigação de pagar quantia. Dentre elas, destaca-se o art. 880 da CLT, que prevê a intimação do executado para o pagamento da dívida no prazo de 48 horas, sob pena de penhora:

“Art. 880. Requerida a execução, o juiz ou presidente do tribunal mandará expedir mandado de citação do executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas ou, quando se tratar de pagamento em dinheiro, inclusive, de contribuições sociais devidas à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou garanta a execução, sob pena de penhora”.

Portanto: (a) a regra especial (CLT) fixa o prazo de 48 horas para pagamento, sob pena de penhora; (b) a regra geral (CPC) fixa o prazo de 15 dias para pagamento, sob pena de multa de 10% e honorários advocatícios de 10%.

No julgamento do Tema nº 4 dos Recursos Repetitivos, após a manifestação de três amigos da Corte, o relator do Recurso de Revista nº 1786-24.2015.5.04.0000, Ministro Mauricio Godinho Delgado, buscou a compatibilização das normas da CLT com as do CPC, para concluir que, desde que conste no dispositivo da decisão judicial que constituir o título executivo, incide no processo trabalhista a multa de 10%, pelo descumprimento da obrigação no prazo de 15 dias. Ressalvou que essa regra não se aplica quando o executado já tiver prestado a garantia do juízo (especialmente por meio do depósito recursal), ou quando o título for sentença homologatória de acordo com outra sanção pelo descumprimento, ou quando se tratar de cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública (que possui regras específicas).

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Por outro lado, o Ministro João Oreste Dalazen divergiu do voto do relator, para concluir que incidem no cumprimento de sentença trabalhista apenas as regras especiais da CLT, que preveem um prazo inferior para o cumprimento da obrigação (ou a garantia do juízo ou a indicação de bens à penhora), mas não estipulam a multa como sanção inicial pelo descumprimento. Por uma diferençade 3 votos, esse entendimento preponderou no julgamento do colegiado.

Assim, por maioria (13 x 10 votos), o Pleno do TST concluiu que não incide no processo trabalhista a multa de 10% prevista no CPC, em virtude da existência de regras específicas na CLT, que preveem, nas obrigações de pagar quantia: (a) o cumprimento da obrigação no prazo de 48 horas, sob pena de penhora (art. 880); (b) ou a garantia da execução pelo devedor, por meio do depósito do valor devido e das custas processuais, ou da nomeação de bens à penhora (art. 882).

Consequentemente, o Tribunal Superior do Trabalho definiu a seguinte tese no Tema nº 4 dos Recursos Repetitivos:

“A multa coercitiva do artigo do artigo 523, parágrafo 1º do CPC (antigo artigo 475-J do CPC de 1973) não é compatível com as normas vigentes da CLT por que se rege o processo do trabalho, ao qual não se aplica”.

Portanto, em princípio, não incidem na fase inicial do cumprimento de obrigação de pagar estabelecida em sentença trabalhista a multa de 10% e os honorários sucumbenciais de 10% previstos no art. 523, § 1º, do CPC, tampouco o prazo de 15 dias para pagamento, mas sim o prazo de 48 horas para pagamento, nomeação de bens à penhora ou depósito, sob pena da penhora de bens do executado.

Contudo, isso não impede que, na ausência de bens à penhora e na reiteração do descumprimento da obrigação, seja fixada pena de multa (inclusive superior ao percentual de 10%, ou até mesmo periódica) ou qualquer outra medida indutiva, coercitiva, mandamental ou sub-rogatória necessária para assegurar o cumprimento da decisão judicial, conforme prevê o art. 139, IV, do CPC.

Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Oscar Valente. A não incidência da multa de 10% no cumprimento de sentença no processo trabalhista:: tema nº 4 dos recursos repetitivos do TST. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5423, 7 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/61394. Acesso em: 22 dez. 2024.

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