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A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica e alguns de seus reflexos no ordenamento jurídico brasileiro:

Lei nº 8.078/90, Lei nº 8.884/94, Lei nº 9.605/98 e Lei nº 10.406/02

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Agenda 15/03/2005 às 00:00

8 BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A DESCONSIDERAÇÃO NO PROCESSO

Após analisar o direito material e os casos em que se permite seja desconsiderada a personalidade jurídica, merecem ser tecidas algumas considerações sobre a aplicabilidade prática do instituto.

Para tanto, indispensável visitar o campo do direito processual, mormente o civil.

A questão central é: como deve ser feita a desconsideração da personalidade jurídica? É necessário um processo de conhecimento específico para tanto ou pode ser feita por simples requerimento em processo existente?

Para FÁBIO ULHOA COELHO (2002:55), "o juiz não pode desconsiderar a separação entre a pessoa jurídica e seus integrantes senão por meio de ação judicial própria, de caráter cognitivo, movida pelo credor da sociedade contra os sócios ou seus controladores".

Para o autor, havendo execução baseada em título contra a pessoa jurídica, não é permitido por simples despacho direcionar o processo contra os sócios, pois isso representaria uma "inversão do ônus probatório" (2002:55).

Sem dúvida que a simples inclusão de sócios no pólo passivo da execução, sem que eles figurem no título, pode representar até mesmo ofensa à CR, especialmente ao art. 5.º, LV.

Ainda que se alegue que será possível exercer a defesa por meio dos embargos, não se deslembre que estes dependem da prévia garantia do juízo.

Nessa linha, a constrição efetuada sobre bens dos sócios, que não figurem no título, também afronta o inciso LIV do art. 5.º da CR, pois não deixa de representar uma restrição à propriedade sem o devido processo legal.

Qual seria então o processo legal?

Num primeiro momento, poder-se-ia alegar que, não havendo especificação na lei, dever-se-ia seguir a regra geral, ou seja, o rito comum do processo civil. Seria sumário ou ordinário segundo as peculiaridades do caso, como, por exemplo, o valor da obrigação que se pretende imputar.

Nessa linha, seria suscitado que não caberia simples requerimento, por ausência de previsão legal específica quanto ao rito, razão pela qual se aplicaria a regra geral. Em segundo, geraria tumulto processual. Terceiro: cada juízo processaria de modo diferente o requerimento, gerando ofensa à isonomia dos jurisdicionados.

Além disso, se o objetivo primordial da desconsideração da personalidade jurídica é atingir o patrimônio de uma membro da pessoa jurídica, este deve figurar na lide, ou seja, deverá ser citado para apresentar sua defesa. Só haverá sentido em manter a pessoa jurídica na relação processual se ela também tiver alguma responsabilidade.

Porém, uma última questão antes de terminar: como fica a prescrição com relação à obrigação que se pretende imputar por meio da desconsideração?

É certo que antes de desconsiderada a pessoa jurídica não há pretensão contra os membros desta. Porém, a favor da pessoa jurídica, em princípio, estará fluindo o prazo prescricional para exigir o adimplemento da obrigação.

Se como decorrência da desconsideração houver solidariedade do membro da pessoa jurídica, a ação movida em face desta irá interromper a prescrição também em relação ao sócio. Vale lembrar que, na linha defendida neste trabalho, a desconsideração da personalidade jurídica, em sua formulação original, não pode ter como efeito a solidariedade.

Quando se pretender a desconsideração da personalidade jurídica para que se reconheça ser a obrigação de responsabilidade unicamente do membro da pessoa jurídica, sem qualquer vínculo com esta, então o mais adequado parece ser o ingresso de ação com cumulação de pedidos, sendo o primeiro deles o de desconsideração e, sendo acolhido este, o de condenação ao adimplemento da obrigação.

Ressalte-se que para esta ação a legitimidade passiva é do membro ao qual se pretende imputar a obrigação, e não da pessoa juridica (COELHO,2002: 55).


CONCLUSÃO

A pessoa jurídica nasce como forma de suprir certas necessidades nas relações sociais.

Várias teorias procuraram explicá-la, discutindo sobre sua existência ou não, bem como sobre a própria natureza de sua realidade.

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Conquanto tenha solucionado diversos problemas, ante seu caráter instrumental, passou a ser utilizada indevidamente.

Isso ensejou o nascimento da doutrina da desconsideração da pessoa jurídica, uma forma de estabelecer limites de uso do instituto da pessoa jurídica.

Essa doutrina gerou diversos reflexos que acabaram sendo acolhidos pelo ordenamento brasileiro, porém de forma diferente de acordo com o ramo do direito.

Assim, verifica-se ser menos rígida a autonomia da pessoa jurídica no direito ambiental. No direito do consumidor e no da concorrência há um grau um pouco mais elevado na separação patrimonial e, no direito civil, é ainda mais difícil a desconsideração.

Se a desconsideração representa ausência dos efeitos da personalização para determinados atos, não cabe dizer que a solidariedade seria efeito de sua aplicação, pois para um sujeito de direito ser solidário é pressuposto sua existência.

Obviamente que a possibilidade de no caso concreto ser atribuída a responsabilidade por determinada obrigação à própria pessoa jurídica e a seus membros conforme a participação nos proveitos ou nos ilícitos causados é uma solução mais adequada do que a buscada pela doutrina original da desconsideração.

Por isso, mais importante do que saber se determinado dispositivo representa ou não hipótese de desconsideração da personalidade jurídica é buscar a solução adequada para cada caso, nos termos da legislação vigente.


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Sobre o autor
Leandro Sarai

Doutor e Mestre em Direito Político e Econômico e Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SARAI, Leandro. A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica e alguns de seus reflexos no ordenamento jurídico brasileiro:: Lei nº 8.078/90, Lei nº 8.884/94, Lei nº 9.605/98 e Lei nº 10.406/02. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 615, 15 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6440. Acesso em: 23 dez. 2024.

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