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Petição inicial: estrutura, desdobramentos e a consequente realização da audiência de conciliação ou mediação

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A designação de audiência de conciliação ou mediação contra a vontade de uma das partes violará o princípio da autonomia da vontade e o da duração razoável do processo?

Resumo: O artigo objetiva analisar um dos requisitos da petição inicial: a manifestação do autor do seu interesse quanto à realização ou não da audiência de conciliação ou mediação, à luz da estrutura e respectivos desdobramentos da exordial. Sua motivação partiu das divergências doutrinárias quanto à previsão legal de que esta audiência somente não ocorrerá, além dos casos em que não se admite a autocomposição, quando o autor e o réu manifestarem o desinteresse da sua realização, não bastando, portanto, a manifestação de desinteresse por uma das partes apenas. O trabalho foi elaborado a partir do estudo de pesquisa quantitativa e bibliográfica, fundamentando-se na leitura de livros, artigos e da legislação vigente para compreender os aspectos específicos e gerais da legislação processual civil e de preceitos constitucionais. Após os estudos realizados concluiu-se que a realização da audiência de conciliação ou mediação contra a vontade de uma das partes violará o princípio da autonomia da vontade das partes e o da duração razoável do processo, proporcionando uma demora maior para o desfecho da demanda. Dessa maneira, uma vez manifestado o desinteresse de uma das partes quanto à realização desta audiência, o juiz não deverá designá-la, dando prosseguimento normal ao feito.

Palavras-chave: Autocomposição. Autonomia de vontade das partes. Duração razoável do processo.

Sumário: Introdução. 1. Requisitos da Petição Inicial. 2. Indeferimento da Petição Inicial. 3. Improcedência Liminar do Pedido. 4. Preservação do Contraditório e da Ampla Defesa. 5. Efeitos do Despacho da Inicial. 6. O Contraponto da Realização da Audiência de Conciliação ou Mediação. Conclusão.


INTRODUÇÃO

A petição inicial é o veículo através do qual se manifesta formalmente a demanda proposta pelo autor ao juízo, sendo um dos principais elementos de uma demanda. É por meio da inicial que o autor provoca a atividade jurisdicional do Estado, revelando a lide ao Juiz e solicitando uma providência jurisdicional em face do réu e os seus desdobramentos na esfera cível (THEODORO JR, 2015).

Dentre os requisitos da petição inicial, destaca-se, no artigo 319, VII, do Novo Código de Processo Civil (NCPC), a manifestação do autor a respeito da sua intenção quanto à realização ou não da audiência de conciliação ou mediação, que, por sua vez, somente não ocorrerá, além dos casos em que não se admite a autocomposição, quando tanto o autor, quanto o réu, manifestarem o desinteresse da sua realização. Não bastando, portanto, a manifestação de desinteresse por uma das partes apenas (BRASIL, 2015).

Em virtude disso, muito se discute por parte de alguns doutrinadores, dentre eles Celso Scarpinella Bueno e Marcus Vinicius Gonçalves, quanto à demora na qual a realização desta audiência, contra a vontade de uma das partes, proporciona para o desfecho da lide e a sua consequente violação a princípios norteadores do processo como o da isonomia e da autonomia da vontade das partes (BUENO, 2016).

Portanto, este estudo visa realizar uma análise acerca da maneira em que é proposta esta audiência de conciliação ou mediação, regulamentada pelo artigo 334 § 4° do Novo Código de Processo Civil (NCPC) e os seus contrapontos a luz dos posicionamentos doutrinários, considerando o interesse da sua realização pelas partes e apresentando possíveis soluções para o caso.


1- REQUISITOS DA PETIÇÃO INICIAL

Conforme mencionado, a petição inicial é o instrumento pelo qual o autor provoca o Poder Judiciário, a fim de obter uma solução para o litígio no qual está envolvido. Nesse diapasão, Humberto Teodoro Jr. ensina que são duas as manifestações que, portanto, o autor faz na petição inicial: a demanda da tutela jurisdicional do Estado, que causará a instauração do processo, com a convocação do réu; e o pedido de uma providência contra o réu, que será objeto do julgamento final da sentença de mérito (THEODORO JR, 2015).

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O NCPC elenca, no artigo 319, os requisitos da petição inicial da seguinte maneira: I - o juízo a que é dirigida; II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu; III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; e VII - a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação (BRASIL, 2015).

O não atendimento a qualquer dos requisitos enumerados no art. 319 dará causa ao indeferimento da petição inicial se o autor, após ser intimado da decisão judicial, não proceder a emenda da peça (BRASIL, 2015).

O próprio art. 319, entretanto, faz ressalvas em seus parágrafos quanto aos requisitos previstos no inciso II. Caso o autor não disponha das informações relativas ao réu, poderá requerer ao juiz diligências necessárias para a obtenção das mesmas. A falta das informações previstas no inciso II também não dará causa ao indeferimento da inicial se a citação do réu for possível. Ademais, não se exigirá que a petição contenha os elementos identificadores do réu se a obtenção dessas informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça (BRASIL, 2015).

Na inicial, o autor indicará o direito subjetivo que pretende exercitar em face do réu, apontando o fato do qual esse direito provém. É necessário que se demonstre a relação entre o fato material e a providência que se pleiteia contra o réu, justificando-a juridicamente. Não é exigido, porém, a menção a texto de lei que fundamente a pretensão do autor oposta ao réu. Até mesmo a equivocada evocação de norma legal não impedirá que o julgador aprecie o pedido autoral sob a ótica do preceito legal adequado, conforme aduz Humberto Theodoro Júnior:

“Quando o Código exige a descrição do fato e dos fundamentos jurídicos do pedido, torna evidente a adoção do princípio da substanciação da causa de pedir, que se contrapõe ao princípio da individuação. Para os que seguem a individuação, basta ao autor apontar genericamente o título com que age em juízo, como, por exemplo, o de proprietário, o de locatário, o de credor etc. Já para a substanciação, adotada por nossa lei processual civil, o exercício do direito de ação deve se fazer à base de uma causa petendi que compreenda o fato ou o complexo de fatos de que se extraiu a conclusão a que chegou o pedido formulado na petição inicial. Entretanto, não é obrigatória ou imprescindível a menção do texto legal que garanta o pretenso direito subjetivo material que o autor opõe ao réu. Mesmo a invocação errônea de norma legal não impede que o juiz aprecie a pretensão do autor à luz do preceito adequado. O importante é a revelação da lide por meio da exata exposição do fato e da consequência jurídica que o autor pretende atingir. Ao juiz incumbe solucionar a pendência, segundo o direito aplicável à espécie: iura novit cúria.” (THEODORO JR. 2015, p.1123)

O autor deverá indicar os meios de prova que utilizará durante o processo, não havendo a necessidade de requerer imediatamente medidas probatórias concretas. Somente se exige a indicação das espécies das provas a serem produzidas (GONÇALVES, 2016).

O inciso VII do artigo 319, que trata da opção do autor pela realização ou não da audiência de conciliação, é inovação do NCPC, não havendo no Código revogado a previsão desse requisito da petição inicial. O autor deverá requerer a audiência de conciliação ou dizer, de maneira clara, que não deseja sua realização. Se o autor se omitir quanto a esse requisito, o entendimento é que a audiência deverá ser designada (BRASIL, 2015).

Cabe ressaltar que, por previsão expressa do Código, a audiência de conciliação somente será dispensada se ambas as partes se manifestarem pelo desinteresse pela sua realização. Dessa maneira, ainda que o autor demonstre, na petição inicial, seu desinteresse na composição, a audiência ainda será realizada, se o réu assim o desejar (DONIZETTI, 2016).

Quando se tratar de ação que tenha por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, também será requisito da petição a discriminação das obrigações objeto da controvérsia e a quantificação do valor incontroverso do débito (DONIZETTI, 2016).

Está autorizado o autor, ainda, a incluir em sua petição inicial o pedido de tutela provisória de urgência em caráter liminar, desde que a medida se mostre necessária e cabível, seguindo as disposições do art. 300 e seguintes do NCPC (BRASIL, 2015).

Finalmente, quando postulando em causa própria, o advogado deverá declarar, na petição inicial, o endereço em que receberá as intimações no curso do processo.


2- INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL

As hipóteses de indeferimento da petição inicial dividem-se em três espécies, quais sejam: de ordem formal, contempladas no artigo 330, incisos I e IV; de inadmissibilidade da ação, quando não há como julgar o mérito por faltar-lhe condição necessária ao feito, como se observa nos incisos II e III do artigo 330; e, por motivo de improcedência do pedido, como preceitua o inciso III do parágrafo primeiro do artigo 330 (THEODORO JR., 2015).

O inciso I do artigo 330 traz a hipótese do indeferimento por inépcia, quando a inicial não possui aptidão para produzir os resultados almejados, por falta de pedidos ou por falta de fundamentação. O parágrafo primeiro do artigo 330 preceitua que será inepta a inicial quando não contiver pedido ou causa de pedir; o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; ou contiver pedidos incompatíveis entre si (GONÇALVES, 2016).

A petição inicial poderá ser indeferida ainda quando detectada falta das condições da ação desde logo. É o que aduz os incisos II e III do artigo 330. Assim, será indeferida a inicial quando a parte for manifestamente ilegítima, de modo que tal ilegitimidade da parte há de ser incontestável, podendo ser detectada prima facie, e quando ao autor carecer de interesse processual (BRASIL, 2015).

Outras hipóteses de indeferimento da petição inicial são o não preenchimento dos requisitos elencados nos artigos 319 e 320, ou, quando postulando em causa própria, o advogado não cumprir as determinações do art. 106, do mesmo dispositivo legal. O juiz assinará prazo de 15 dias para emenda da petição inicial em ambos os casos, desde que constatados omissões, defeitos e irregularidades sanáveis. Findo o prazo, sem que a petição inicial seja emendada, esta será indeferida e o processo extinto sem resolução do mérito (THEODORO JR., 2015).

O novo código de Processo Civil trouxe a possibilidade de haver indeferimento parcial da petição inicial. Assim, se vários os pedidos manifestados pelo autor, o indeferimento pode atingir alguns e admitir o prosseguimento do processo em relação aos demais. Se parcial o indeferimento será decisão interlocutória; se total, sentença terminativa (THEODORO JR., 2015).


3- IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO

A improcedência liminar do pedido é regulamentada pelo art. 332 do NCPC, responsável por elencar as hipóteses em que há o julgamento do pedido durante a apreciação da petição inicial, logo, anteriormente a citação do demandado.

Conforme preleciona Didier Junior: “A improcedência liminar do pedido é a decisão jurisdicional que, antes da citação do demandado, julga improcedente o pedido formulado pelo demandante. É decisão de mérito, definitiva, apta à coisa julgada e possível objeto de ação rescisória.” (DIDIER JUNIOR, 2016. Pág. 601.)

A terminologia demandado e demandante justifica-se diante da aplicabilidade à reconvenção, consistente em forma de defesa utilizada pelo réu ao propor uma demanda contra o autor, no mesmo processo.

Cumpre salientar que a improcedência liminar do pedido consiste em técnica cujo principal escopo traduz-se na celeridade conferida ao processo. Isto posto, diante da improcedência do pedido, o legislador chancela a prolação de sentença favorável ao demandante sem que haja prévia  citação (GONÇALVES, 2016).

Ademais, o julgamento liminar do pedido requer a observância de dois pressupostos, quais sejam: a dispensa da fase instrutória e a adequação do pedido às hipóteses elencadas no art. 332, I a IV e § 1º, do NCPC (BRASIL, 2015).

A dispensa da fase instrutória possui aplicabilidade condicionada à possibilidade de comprovação dos fatos por intermédio de prova documental, por conseguinte, é acertada a afirmativa de que a improcedência liminar é uma hipótese especial de julgamento antecipado do mérito.

De acordo com Theodoro Júnior: “O novo Código autoriza o julgamento imediato de improcedência do pedido, independentemente de citação do réu, em duas circunstâncias (NCPC, art. 332): (i) quando o pedido contrariar súmula dos tribunais superiores ou de tribunal de justiça local; acórdão ou entendimento firmado por tribunais superiores a respeito de recursos repetitivos ou incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; e (ii) quando se constatar a ocorrência de prescrição ou decadência. (THEODORO JR, 2015, p. 1131).”

Por fim, cumpre ressaltar que a mencionada técnica possui aplicabilidade tanto no juízo de primeira instância quanto nos tribunais, porquanto as decisões e seus respectivos recursos são: sentença, impugnável por apelação (juízo singular de primeira instância), decisão do relator, impugnável por agravo interno (juízo singular dos tribunais) e acórdão, impugnável por recurso especial, extraordinário, ordinário constitucional ou embargos de divergência (juízo colegiado).


4- PRESERVAÇÃO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

O princípio do contraditório remete-se a oportunidade de dar a outra parte o direito de contradizer os fatos trazidos no processo, com direito a participação, possibilitando a parte se manifestar contra a pretensão contrária (DONIZETTI, 2016).

A ampla defesa no processo civil diz que a parte pode usar todos os meios lícitos para se defender e a possibilidade de recorrer.  Garante efetivamente a participação da defesa em todos os atos do processo. Se o juiz perceber que existe falta de defesa ou defesa ineficiente, intimará o réu a constituir um novo advogado (DONIZETTI, 2016).

Quando o juiz indeferir o pedido de uma liminar, observando o artigo 332 do Novo Código de Processo Civil, não estará violando as normas do devido processo legal que exigem o contraditório e a ampla defesa. As possibilidades da retratação do juiz e do recurso de agravo de instrumento asseguram ao autor o direito de se manifestar contra o pedido de liminar deferida (THEODORO JR., 2015).

O juiz pode se retratar do pedido de liminar concedido, de acordo com o artigo 332, §3º, do NCPC, seguindo o processo o seu curso normal e podendo o réu usufruir do contraditório e da ampla defesa. Em caso de liminar concedida, e a sentença mantê-la, ao réu estará assegurado de participar do contraditório por meio das contrarrazões da apelação e contestação, esta última, caso o tribunal não mantiver a decisão liminar.

Estará assegurado ao autor e ao réu exercerem o contraditório e a ampla defesa, mesmo em sentença prolatada antes da citação do demandado, com caráter liminar, garantindo assim o cumprimento do princípio fundamental do direito ao devido processo legal.

Sobre os autores
Nayara Kelly Santos Mendes

Acadêmica de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros-UNIMONTES.

Rafael Ruas Batista

Acadêmico de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES

Victor Denucci Félix

Acadêmico de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros-UNIMONTES

Ludyara Ribeiro Fernandes

Acadêmica de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

XAVIER, Jhonathan; MENDES, Nayara Kelly Santos et al. Petição inicial: estrutura, desdobramentos e a consequente realização da audiência de conciliação ou mediação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5966, 1 nov. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64949. Acesso em: 22 nov. 2024.

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