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A TERCEIRIZAÇÃO NO PERÍODO PÓS-REFORMA TRABALHISTA

Efeitos da subordinação

Agenda 11/04/2018 às 13:17

O presente artigo apresenta de uma forma clara e fundamentada as cautelas a serem tomadas pelas empresas nos casos de terceirização de serviços, expondo as formas em que o empregado, apesar de terceirizado, pode estar subordinado à empresa Tomadora.

Conforme amplamente sedimentado, o contrato de trabalho pode ser realizado de forma expressa ou tácita. Sabemos também que, ainda que inexistente qualquer tratativa entre as partes, havendo qualquer atividade prestada à outra pessoa (ou empresa), de forma pessoal, habitual, onerosa e subordinada, estaremos, na verdade, falando de um vínculo empregatício, in factu, consumado.

Sabemos também o que significa cada um destes elementos, mas neste artigo, em especial, falaremos um pouco a respeito da subordinação, elemento este destacado como principal sujeito para fim de definir se determinado caso, trata-se (ou não), de uma relação de emprego ou apenas de uma prestação de serviços (que não tem relação empregatícia).

É inclusive, através deste único e singular elemento que inúmeros processos são ganhos e perdidos diariamente em nosso país e no mundo,podendo, dependendo do caso, comprometer severamente as atividades de uma empresa.

AFINAL O QUE É SUBORDINAÇÃO?

Subordinação “é o estado de dependência ou obediência em relação a uma hierarquia de posição ou valores[1]”, ou traduzindo em linhas gerais, a sujeição de alguém ao poder de mando de outrem.

Numa relação de trabalho e emprego, a subordinação, diferente do que muitos pensam, está estritamente vinculada ao modo e forma que se efetiva uma prestação de serviços e não sobre a própria pessoa do prestador.

Nota: Como motorista de um veículo, você não realiza o ato de percorrer as vias,pois, quem o faz é o próprio veículo. Porém, como motorista, você o conduz de modo que ele próprio percorrerá o caminho do modo que melhor lhe aprouver, podendo conduzi-lo pelos caminhos que desejar, evitando os buracos das vias se assim desejar, pedágios, pode ainda acelerar e frear, mas a todo o momento, quem estará percorrendo o caminho por você será o veículo.

            Contextualizando a nota acima, o tomador diz ao prestador o que deve ser feito, mas não há como ele ser o próprio prestador a fim de levar a cabo as atividades do seu jeito particular.

Perceba, assim, que a subordinação de toda e qualquer pessoa, seja na esfera laboral, ou mesmo num simples contrato de prestação de serviços, encontra, de certo modo, uma espécie de limitação.

Nota: Subordinação não é, ao contrário do que muitos pesam, total e ilimitada, mas sim, restrita e totalmente limitada.

QUAIS AS PARTICULARIDADES DA SUBORDINAÇÃO?

Ao contrário do que muitos imaginam, a subordinação não é simplesmente o fato do “mandar e obedecer”. Pelo contrário, muitas vezes o fato de obedecer, ou como no caso acima, de “seguir determinado caminho”, não necessariamente decorre de uma ordem expressa (ou movimento do condutor), pois a própria razão, leia-se, o próprio existir, já diz ao prestador (ou aquele que leva a cabo as tarefas) o que precisa ser realizado.

Nota: No caso do veículo do exemplo anterior, não poderia o motorista, por exemplo, exigir que ele voasse. Pois, logicamente, ele foi feito para andar na terra. Acaso a máquina tivesse consciência própria, ela própria, diante de suas limitações e condições estruturais, saberia que ela não foi feita pra isso. Ela tem rodas e não, asas.

Ex: Ninguém precisa mandar você não xingar, atropelar, ferir ou matar algum transeunte para você saber que isto não é correto. Isto é, de certo modo, uma ordem indireta, emanada por força do bom costume. É uma ordem ética e moral.

  Sintetizando, no cotidiano empresarial, não precisa, necessariamente, existir uma ordem direta exarada por um indivíduo (pessoa física ou jurídica), dirigida ao prestador, para que ele saiba o que precisa ser feito. Se você, por exemplo, metalúrgico, contrata um soldador para realizar quaisquer tipos de "serviços não especificados" em sua indústria metalúrgica, e o coloca para trabalhar em um local onde nele existam uma máquina de solda, cilindro e duas partes metálicas, onde uma se encaixa na outra de forma singular, você não precisa dizer a ele que ele precisa “soldar” as partes de outro jeito. Ele próprio, diante de sua experiencia como soldador, presumirá como deverá proceder.

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QUE TIPOS DE SUBORDINAÇÃO EXISTEM, AFINAL?

Já se sabe que a subordinação não precisa, necessariamente, ser aquela diretamente emanada de alguém e dirigida à outra pessoa, especificando o quê, ou até mesmo, como algo deve ser feito.

Para fins de discussão de direitos trabalhistas, o que os empregadores e demais operadores do direito precisam saber é que existem, na verdade, 3 (três) tipos de subordinação distintas e amplamente vistas no cotidiano, mas pouco conhecidas e/ou abordadas. São elas:

· SUBORDINAÇÃO TRADICIONAL OU CLÁSSICA: Em análise sumária, é a subordinação popularmante conhecida e facilmente traduzida no ato do “Eu mando, você obedece”É manifesta, na prática, por ordens diretas emanadas por um indivíduo (mandante e/ou tomador), dirigidas a outro indivíduo que as obedece (subordinado e/ou prestador). É a espécie de subordinação mais conhecida, sem dúvidas.

· SUBORDINAÇÃO OBJETIVA: É o tipo de subordinação que se manifesta pela integração do trabalhador nos fins e objetivos do empreendimento do tomador dos serviços. Existe, neste caso, um poder jurídico (ou de qualquer outra natureza que não a ordem direta) sobre a atividade exercida, e esta atividade acaba, por fim, se integrando na atividade do tomador.

É uma espécie de “relação de coordenação ou de participação integrativa ou colaborativa, através da qual a atividade a atividade do trabalhador como que segue, em linhas harmônicas, a atividade da empresa, dela recebendo o influxo próximo ou remoto de seus movimentos...”[2]

Parece um pouco complicado de entender num primeiro momento, mas a notícia abaixo, de um processo que transitou pelas veredas de nosso judiciário será bastante para demonstrar como a subordinação objetiva se verifica na prática:

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho deu provimento a recurso de revista de uma médica veterinária e reconheceu sua relação de emprego com a Clínica Irmãos Agrela Ltda., de São Paulo. A Turma entendeu que, apesar de a médica ter autonomia para definir seu próprio horário de trabalho, havia, no caso, subordinação objetiva e estrutural ao tomador de serviço. "A flexibilidade de horário, em trabalho diário de segunda a sábado, não traduz autonomia e ausência de subordinação", afirmou o relator do recurso, ministro Maurício Godinho Delgado. (...) Na inicial da reclamação, a médica pediu o reconhecimento de vínculo entre dezembro de 2001 e agosto de 2006, quando, durante sua licença-maternidade, foi comunicada pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV) que não seria, a partir daquele momento, a responsável técnica pela empresa. Na defesa, a clínica sustentou que a relação jurídica mantida com a veterinária estaria amparada pelo Código Civil, e não pela legislação trabalhista, pois estaria comprovada a autonomia e a ausência de subordinação, condição necessária para o reconhecimento do vínculo, conforme o artigo 3º da CLT. "Uma médica veterinária que trabalhe diariamente, por quase cinco anos, de segunda-feira a sábado, pessoalmente, com onerosidade, para uma clínica veterinária está objetivamente, além de estruturalmente, subordinada a essa mesma clínica", afirmou o relator. "O fato de possuir certa liberdade de horário não afasta, de modo algum, a subordinação objetiva e estrutural. De maneira geral, os trabalhadores intelectuais não têm controle férreo e rigoroso de horários, sem que, com isso, deixem de ser subordinados". Para o relator, o Direito do Trabalho, como ramo jurídico de inclusão social e econômica, "não absorve fórmulas criativas ou toscas de precarização, como a parassubordinação e a informalidade". A decisão foi unânime. [3]

  Veja que no caso acima, a médica veterinária não recebia ordens diretas e tinha total liberdade para a execução de suas atividades. Porém, ao estar inserida dentro de uma dinâmica empresarial de uma Clínica Veterinária, obviamente, não poderíamos esperar que ela, no auge de sua consciência e experiencia, prestasse serviços de qualquer outra natureza, que não o atendimento clínico dos animais dos clientes desta clínica.

  · SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL: A subordinação estrutural, por fim, é aquela que se traduz, segundo o Min. Godinho Delgado, na “inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento.”

Ou seja, o tomador concede ao prestador toda uma infraestrutura para que este realize suas atividades, sem necessariamente, direcioná-lo no modo e forma como pretende que este realize tais atividades. Como no caso do soldador, retro mencionado, de acordo com a estrutura a qual a pessoa esteja inserida, por seu próprio bom senso, ela já é capaz de conduzir suas ações, sem que existam ordens expressas para que ela as realize.

RECURSO DE REVISTA. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL. In casu , firmou-se um acordo de vontade entre as partes no sentido de que a reclamante exerceria a função de manicure e pedicure. Por outro lado, a empresa concederia a ambiência, com toda a sua infraestrutura, para a execução das tarefas. Ademais, a reclamada estabelecia a organização dos horários e dos atendimentos dos clientes. Na realidade, a reclamante estava submetida ao poder diretivo da empregadora, o qual abarca a estrutura organizacional interna da empresa (subordinação estrutural ou integrativa), que se traduz pela inclusão do empregado na dinâmica e nos fins empresariais, bem como pela especificação do serviço prestado. Nesse sentido, as circunstâncias detectadas pelas instâncias de origem como aspectos que desautorizariam o vínculo de emprego indicam, a bem da verdade, uma opção pelo não exercício concreto de distintas prerrogativas inerentes ao poder diretivo do empregador, tendo optado a reclamada por uma forma menos ostensiva de imposição de comandos, conferindo maior fluidez e controle apenas indireto, o que não descaracteriza o vínculo trabalhista existente.Efetivamente, a possibilidade de alteração do horário de trabalho da autora, em seu interesse exclusivo, a ausência de punições por faltas e a eventual realização de atendimentos em domicílio não demonstram a ausência de subordinação jurídica, apenas delineiam os mecanismos da técnica organizacional adotada pela reclamada. Há, porém, a demonstração da existência de controle e de pessoalidade nos serviços. Diante do exposto, não há dúvida da presença dos elementos caracterizadores da relação de emprego, da forma exigida pelos artigos 2º e 3º da CLT. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 15191620105150002 1519-16.2010.5.15.0002, Relator: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 29/05/2013, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 07/06/2013)

COMO SABER QUAIS AS ATIVIDADES QUE PODEM SER TERCEIRIZADAS?

A terceirização é um fenômeno criado e oriundo do efeito da industrialização, que teve seu ápice na década de 1950. Na ocasião as empresas queriam focar seu trabalho e garantir uma expertise técnica maior, oferecendo produtos e serviços de melhor qualidade aos clientes, deixando assim, que as atividades acessórias das empresas fossem realizadas por outras empresas também especializadas neste tipo de serviço.

Assim, historicamente, verifica-se que a terceirização decorre a priori de uma necessidade industrial e não de uma estratégia jurídica. Em uma análise atual, a terceirização, por se tratar de exceção à regra, só deve ser realizada pelas empresas em decorrência de uma necessidade imperiosa, e não de uma opção estratégica para esquivar-se de direitos trabalhistas.

Desta forma, mesmo após a reforma trabalhista, que popularmente fora noticiada a chave para a terceirização ampla e irrestrita, os empregadores precisam saber que, na prática isto não se verifica, pois uma vez limitada a atuação do prestador aos interesses e dinâmica empresarial, estará ele, na verdade, exercendo atividades subordinadas ao tomador, podendo, tal fato, configurar no vínculo empregatício.

[1] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho – 15ª Edição, 2017.

[2] VILHENA, Paulo Emilio Ribeiro de. Relação de Emprego – estrutura legal e supostos, São Paulo: Saraiva, 1975. P. 235.

[3] Fonte: http://www.tst.jus.br/en/noticias/-/journal_content/56/10157/359205?refererPlid=10730 – Tribunal Superior do Trabalho – TST - Processo: RR-528100-67.2006.5.02.0081 - (Samira Silva/GAB e Carmem Feijó/SECOM)

Sobre o autor
Felipe Santiago de Freitas

Advogado especialista em Segurança Digital, Gestão e Governança de Dados pela Pontifica Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS; Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Credenciado em "Justice" pela Harvard University. Credenciado em Gobernanza de Datos Personales en la Era Digital pela Pontifica Universidad de Javeriana - COL. Sócio na Teixeira Freitas Advogados, responsável pela área de Privacy e Data Protection, DPO e consultor LGPD.

Informações sobre o texto

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