Quando alguém comete um crime o que se espera é a condenação penal desse indivíduo, da qual a pena pode ser prisão, restritiva de direitos e multa. São as penas trazidas do bojo do Código Penal e Processo penal.
Agora o que pouca gente sabe, ou mesmo busca na seara da justiça são os efeitos cíveis de uma condenação, tais como reparação de danos morais, materiais, estéticos e pensionamentos em virtude do crime cometido.
Esse texto irá trazer um esclarecimento para as pessoas que foram vítimas ou mesmo seus familiares de algum crime e que tem direito a serem reparadas pelo ofensor ou seus representantes na esfera cível.
Entenda, a reparação cível é bem diferente do cumprimento da pena que o condenado receberá do Estado. Na pena do Estado, o apenado tem uma dívida com a justiça, na reparação cível o réu condenado tem uma dívida com a vítima e ou seus familiares.
Pouca gente sabe e se sabe procura a reparação dos danos pelo condenado. Imagine, se alguém xingar o outro e for condenado por injúria, poderá ser condenado na esfera cível a pagar uma indenização variável a depender do caso entre cinco e quarenta salários mínimos. Agora pense em alguém que matou uma pessoa: muito maior deve ser esse valor.
Veja também que uma pessoa que mata um homem que tem filhos pequenos, deve ficar responsável pela pensão até que eles completem a maioridade ou encerrem o curso superior, isso sem prejuízo de danos morais.
Então, passa-se a esclarecer a partir de agora quais são os efeitos civis decorrentes da condenação criminal, e como as vítimas e seus familiares podem fazer para terem seus danos reparados pelo condenado.
I- CONCEITUAÇÃO.
De início, é importante definir o que é ilícito penal e ilícito civil. O delito penal é o que é definido como crime, seja no Código Penal ou Leis esparsas penais. Por exemplo, matar alguém, art. 121 do Código Penal.
Já um ilícito civil é o que é regrado pelo Código Civil, por exemplo, abuso no direito de cobrar uma dívida. Trata-se de problemas não tipificados como crime.
Tem-se também ilícitos em áreas administrativas como as multas de trânsito, de meio ambiente, da receita federal, desde que não seja crime tributário entre tantos outros.
Esse texto trata dos ilícitos penais, aqueles tipificados como crime e o dever de indenizar do condenado pelo delito.
II- O que diz a Lei?
O próprio Código Penal Brasileiro normatiza que um dos efeitos da condenação é a reparação do dano, vejam;
Art. 91 – São efeitos da condenação:
I – tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;
Dessa forma, a sentença penal condenatória se torna um título executivo judicial que pode ser executada na esfera cível, aquela em que busca a indenização.
Após ser prolatada a sentença penal condenatória e transitada em julgado, essa poderá ser levada no juízo cível que irá mensurar o quantum indenizatório.
Imagine alguém que foi condenado por dirigir embriagado e ter causado lesão corporal grave em outra pessoa, essa sentença será levada ao juízo cível que irá tomar conhecimento dos fatos e valorar os danos, sejam eles, estéticos, morais ou materiais – incluindo lucros cessantes- para a vítima e sua família.
III- A Família da vítima também pode ser indenizada.
Em muitos casos onde ocorreu homicídio, por exemplo, restará à família da vítima ser indenizada pelo ocorrido. Esse já é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no chamado dano moral por RICOCHETE.
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. LEGITIMIDADE ATIVA. PAIS DA VÍTIMA DIRETA. RECONHECIMENTO. DANO MORAL POR RICOCHETE. DEDUÇÃO. SEGURO DPVAT. INDENIZAÇÃO JUDICIAL. SÚMULA 246/STJ. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DE SÚMULA. DESCABIMENTO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. IMPOSSIBILDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ E 283/STF. 1. (…) 2. Reconhece-se a legitimidade ativa dos pais de vítima direta para, conjuntamente com essa, pleitear a compensação por dano moral por ricochete, porquanto experimentaram, comprovadamente, os efeitos lesivos de forma indireta ou reflexa. Precedentes. 3. Recurso especial não provido. (REsp. n.º 1.208.949 – MG, Terceira Turma, Relatora MINISTRA NANCY ANDRIGHI, julgado em 07.12.2010).
Agora imagine o caso por exemplo dos menores que perderam um de seus genitores por homicídio. O réu que for condenado deve inclusive pagar o pensionamento até a maioridade ou conclusão de curso superior, sem prejuízo de danos morais.
Da mesma forma ser responsável por pensão de alimentos à viúva se essa dependia do marido para a subsistência.
IV- DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR.
Como dito anteriormente, ao se praticar o ilícito penal, nasce o dever de indenizar, isso claro, se ao final do processo penal houver uma sentença condenatória, transitado em julgado, ou seja, que não há mais recursos.
Entende-se também que com as inovações das execuções penais por condenação em segundo grau por órgão colegiado, já se pode também executar a sentença, haja vista que o bem da liberdade é maior que o bem patrimonial, e se já o entendimento de executar a pena restritiva da liberdade antes do transito em julgado, da mesma forma pode-se executar a sentença no juízo cível antes do trânsito.
Para que o autor do crime tenha que indenizar a vítima, por óbvio que é necessário o dano resultante do ilícito praticado. Importa frisar que mesmo que a sentença penal condenatória nada tenha dito sobre o dano, isso pouco importa e não interfere no ajuizamento da ação no âmbito cível.
A partir do ano de 2008 com a entrada em vigor da Lei nº 11.719, foi dada permissão ao juiz que ao prolatar a sentença penal já fixasse danos morais para a vitima ou seus familiares.
Nesse sentido, é extremamente importante que a vítima e ou seus familiares constituam advogado assistente de acusação para acompanhar o processo e cobrar tanto do Ministério Público quanto do juiz essa fixação, mas ainda que ela não tenha sido feita, não impede que se busque no juízo cível.
V- E QUANDO A SENTENÇA PENAL ABSOLVE O RÉU NÃO HAVERÁ INDENIZAÇÃO?
A absolvição do réu não impede que o mesmo fato seja discutido no âmbito cível, é o que diz o Código de Processo Penal, vejamos:
Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.
Por vezes, as provas no âmbito penal não são suficientes para determinar a autoria, mas havendo a existência material do fato, por certo poderá ser levado ao conhecimento do juízo cível para se apurar a responsabilidade do mesmo suposto autor ou de terceiros.
Existem alguns casos que a sentença penal absolutória pode interferir no juízo cível retirando o direito de indenizar, como nos casos do artigo 65 do Código de Processo Penal:
“Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legitima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito“
Em consoante com o artigo 65 do CPP está o artigo 188 do Código Civil :
Não constituem atos ilícitos;
I : os praticados em legitima defesa ou no exercício
regular de um direito reconhecido;
II : a deterioração ou destruição de da coisa alheia, ou a
lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Caso o juiz no âmbito penal reconhecer que o fato tenha sido praticado perante as excludentes; em estado de necessidade, no estrito cumprimento do dever legal, em legítima defesa ou no exercício regular do direito, afastará o ilícito do caso, fazendo coisa julgada no cível.
Porém, caso tenha ocorrido uma situação definida como estado de necessidade gerando danos e prejuízos, o responsável poderá no âmbito cível ter que indenizar a vítima, desde que esta não tenha dado causa a situação de perigo, conforme os artigos 929 e 930 do Código Civil.
Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.
Daí a necessidade de estar assistido por advogado para buscar a melhor forma de reparar os danos daqueles que são vítimas ou familiares de vítimas de crimes. Consulte sempre um advogado.
VI- QUAIS SÃO OS DANOS PASSÍVEIS DE REPARAÇÃO.
Há vários danos a serem responsabilizados por um ilícito penal, tais como danos morais, materiais, lucros cessantes, estéticos e pensões.
Imagine que alguém que trabalha com seu veículo, um caminhoneiro, e tem o seu veículo roubado. O veículo ficou desaparecido por três meses e foi encontrado. Suponha que esse motorista aufira rendimentos de dez mil reais por mês com esse veículo. O réu condenado pelo roubo terá que reparar os lucros cessantes no importe de R$ 30.000 reais corrigidos.
Os danos morais são aqueles pagos por abalo psicológico da vítima e seus familiares. Certamente que a maioria dos crimes e principalmente os que envolvem violência irão trazer esse dano, devendo ser reparado sem prejuízo dos demais que podem ser cobrados.
Os danos estéticos são aqueles que alteram a composição física de alguém. Imagine que durante um roubo a vítima seja esfaqueada e lhe reste uma cicatriz, pode ser cobrado o dano estético por esse fator.
Por isso quem foi vítima ou é familiar de vítima pode e deve buscar ser indenizado pelo causador do crime que foi condenado. É o mínimo para que ocorra a justiça. Imagina o homicida que mata um pai de família que era o único provedor daquela casa? Não basta só a pena de prisão! É necessário reparar o prejuízo daquela família.
CONCLUSÃO.
Na ocorrência dos crimes, tanto as vítimas como as famílias só esperam que o criminoso seja preso, mas a justiça vai além. Sendo esse o seu caso, não deixe por isso mesmo, lute pelos seus direitos. Quantas pessoas são mortas por motoristas embriagados, em um claro crime de trânsito e seus familiares estão sofrendo grandes dificuldades financeiras. Cobre desses criminosos a devida indenização. Como disse Rui Barbosa, quem não luta pelos seus direitos não é digno deles.