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Competência legislativa e administrativa, áreas de preservação permanente e reserva legal

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Agenda 13/05/2005 às 00:00

1. Meio Ambiente, proteção e desenvolvimento

             Desde o início da civilização, o ser humano polui o planeta. É difícil imaginar alguma atividade humana da qual não resulte alguma forma de poluição. Somente na segunda metade do século anterior, a consciência preservacionista despertou e o meio ambiente ganhou espaço nos meios de comunicação e no seio da comunidade, contribuindo para inibir o mau uso dos recursos naturais, que se soube serem limitados.

            O idealismo de alguns cidadãos cresceu, ampliou-se e incorporou-se à cultura dos mais variados povos. Tanto é assim que a maioria dos países possui leis - a de alguns, é verdade, mais rígidas - disciplinadoras de impactos ambientais relacionados às atividades produtivas ou não.

            Assim, transcorridas três décadas da Conferência de Estocolmo e disseminada a mensagem preservacionista, o grande desafio continua sendo o de conciliar a crescente demanda de alimento e de bens da vida do homem com a conservação dos elementos naturais do planeta.

            A partir deste momento, surge a idéia de desenvolvimento sustentado, ou sustentável (não vem ao caso, mas a doutrina diverge quanto à nomenclatura) como forma de compatibilizar o desenvolvimento econômico e social (inevitáveis) com as necessidades humanas e a preservação do planeta.

            Entretanto, no que diz respeito às florestas brasileiras, embora a proteção legislativa tenha sido implementada relativamente tarde, iniciou praticamente no despertar da antes referida consciência preservacionista, mais especificamente, com a edição do Código Florestal - Lei 4.771 de 15.09.1965. Ou seja, não obstante tenha iniciado antes mesmo da vigência da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), concretizou-se posteriormente às reais necessidades, visto que o cultivo desenfreado de florestas e as suas grandes derrubadas iniciaram quando as matas naturais foram sendo consumidas em diferentes usos ou quando foram destruídas na busca de áreas agricultáveis.

            Referido Código sofreu, como se era de esperar, várias modificações, buscando adequar-se à evolução social e em prol da premente proteção das florestas. Aliado a isso, muitos Estados e Municípios têm contribuído na rigidez da legislação e da fiscalização, esta, é bem verdade, ainda deficitária. Soma-se a isto a edição da Lei 9.605/98, conhecida como Lei dos Crimes Ambientais, muito embora não se restrinja apenas à esfera penal, mas também à administrativa.

            Como prova dos resultados, mesmo que ainda distantes do ideal, cita-se o caso do Rio Grande do Sul, onde foi feito o primeiro inventário florestal em âmbito estadual no Brasil e constatou-se que houve um significativo aumento na cobertura florestal. Os dados relativos ao ano de 2001, coletados junto ao DEFAP (Departamento de Florestas e Áreas Protegidas), órgão da Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (SEMA), informam que o território gaúcho conta com 17,53% de florestas nativas (florestas naturais) contra 5,62% em 1981, e 0,97% de florestas plantadas, contra 0,62% em 1981.

            Esses percentuais referem-se à utilização do uso da terra e seu feliz acréscimo decorre do abandono do uso da áreas mais difíceis de serem cultivadas, do maior rigor da legislação e em virtude da crescente conscientização dos proprietários sobre a importância das florestas para a continuidade das espécies.

            O presente estudo que restringe-se à questão legal, nem de perto tem a pretensão de enfocar todas as discussões que envolvem a legislação florestal - que são muitas - mas apenas de fazer algumas considerações necessárias à compreensão da questão que envolve a competência para legislar e fiscalizar sobre florestas e explicações sobre as Áreas de Preservação Permanente e a Reserva Legal.


2. Competência legislativa e administrativa em matéria florestal

            A Constituição Federal de 1988, em matéria ambiental, foi extremamente provedora, estando, inclusive, em sintonia com os diplomas internacionais que versam sobre a matéria. Enaltece, em seu texto, o princípio da proteção ambiental, em prol das gerações presentes e futuras.

            Dentro deste contexto, a Carta Constitucional trata da competência em matéria ambiental, que deve ser estudada no âmbito legislativo e administrativo (fiscalização). Prevê, no inciso VI, do artigo 24, abaixo transcrito, que a competência para legislar sobre florestas é concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal:

            "Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

            (...)

            VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

            §1.° No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-à a estabelecer normas gerais.

            §2. ° A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

            §3° Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência plena, para atender a suas peculiaridades.

            §4° A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário." (grifou-se)

            Não obstante referido artigo não mencione os municípios, é possível a estes legislar sobre a flora local e sobre as áreas verdes, por expressa disposição dos incisos I e lI, do artigo 30, da Constituição Federal, que assim dispõem:

            Art. 30. Compete aos Municípios:

            I - legislar sobre assuntos de interesse local;

            II - suplementar a legislação federal e estadual no que couber;

            (..)." (grifou-se)

            Desta forma, conforme preceitua Paulo Affonso Leme Machado: "a declaração de que uma determinada árvore fique imune ao corte tanto pode ser elaborada pela União como pelos Estados e Municípios. É de se atentar que o art. 7° do Código Floretal preceitua ‘mediante ato do Poder Público´´. Deixou em aberto qual o Poder Público, interpreta-se, pois, que as mencionadas pessoas de Direito Público são igualmente competentes" (1).

            Assim, o referido autor chega à conclusão de que "a Constituição Federal deixou claro que o tema ‘florestas’ é de competência concorrente da União e dos Estados (art. 24, VI). Continua válida a possibilidade de o Município legislar sobre a flora local e notadamente sobre as áreas verdes (art. 30, I e II, da CF)".

            No mesmo sentido o entendimento de Edis Milaré, após fazer referência à competência administrativa (executiva), adiante trabalhada: "E no art. 24, VI, prevê a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre florestas. Aos Municípios, nessa matéria, cabe suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, conforme dispõe o art. 30, II" (2). (grifou-se)

            Ainda sobre esta questão, Paulo Affonso Leme Machado, em sua obra Estudos de Direito Ambiental, ensina que:

            "O ‘interesse local´´ não precisa incidir ou compreender necessariamente todo o território do município, mas uma localidade ou várias localidades de que se compõe um município. Foi feliz a expressão usada pela Constituição Federal de 1988. Portanto, podem ser objeto de legislação municipal aquilo que seja da conveniência de um quarteirão, de um bairro, de um subdistrito ou de um distrito". (3)

(grifou-se)

            Ademais, o interesse local não é caracterizado pela exclusividade do interesse, mas sim pela sua predominância. E como refere o Professor Paulo Affonso, na última obra citada, "a União e os Estados também irão legislar com base em seus interesses - interesse nacional ou federal e interesse estadual - inobstante a divisão de competência entre esses dois entes não tenha expressamente mencionado o termo interesse" (4).

            O que não cabe ao Município, dentro do interesse local, é extrapolar seus limites espaciais. Tanto é assim que a Constituição não faz qualquer limitação acerca de assuntos e situações, a não ser a geográfica. Ademais, desde 1891 já era conferida aos Municípios, constitucionalmente, uma competência privativa, só que com a expressão "peculiar interesse".

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            À União é assegurada a prerrogativa de produção de normas gerais, deixando aos demais entes da federação a competência suplementar. Ou seja, cabe à legislação federal abarcar princípios e regras de condução da questão ambiental do País, que deve ser especificada pelos Estados, Distrito Federal e Municípios – estes quando referir-se à área de interesse local. Deve a União evitar, assim, o estabelecimento de regras casuísticas, específicas ou exemplificativas, para não exceder ao limite da principiologia.

            Obviamente, por uma questão de especificação de competência, quando, por exemplo, lei estadual e lei federal (esta apresenta linhas gerais) legislarem sobre o mesmo tema, aquela, automaticamente, terá sua eficácia suspensa, no que lhe for contrária, conforme preceitua o §4°, do artigo 24, antes referido e assinalado. Nesse sentido a doutrina de Luis Carlos Silva de Moraes ao mencionar que "a lei dispõe sobre hipóteses. Tornando-se fatos, terão repercussão em todos os ramos do Direito mencionados. Havendo lei federal sobre normas gerais, lei estadual tem sua eficácia suspensa, no que lhe for contrária" (5).

            Manoel Gonçalves, mencionando as normas gerais, a legislação complementar e a supletiva, explica:

            "Salienta-se que, nesse campo de competências concorrentes, a Constituição estabelece a repartição vertical, dando à União o poder de fixar normas gerais, cabendo aos Estados a legislação complementar, sem excluir, todavia a legislação supletiva. Esclarece o texto que inexistência de lei federal confere competência plena aos Estados, e, quando de sua superveniência, a lei estadual perderá eficácia naquilo que lhe contrário (§§ 1 °, 2 °, 3° e 4° do art. 24). " (6)

(grifou-se)

            Para rechaçar qualquer dúvida acerca da plena possibilidade de o Município legislar em matéria ambiental, mesmo não havendo menção no artigo 24 da Constituição Federal, importante trazer à colação os ensinamentos de Édis Milaré, Celso Ribeiro Bastos e Vladimir Passos de Freitas, respectivamente:

            Édis Milaré

            "Observe-se que esse artigo não explicita a competência legislativa do Município, o que tem levado à conclusão precipitada de que ele não tem competência normativa em matéria ambiental.

            Levado ao pé da letra tal entendimento, chegar-se-ia ao absurdo de sustentar também que ele não tem competência para legislar sobre urbanismo, por ser matéria de competência concorrente incluída no art. 24. É evidente o disparate! Se a Constituição conferiu-lhe poder para "proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas" - competência administrativa -, é óbvio que para cumprir tal missão há que poder legislar sobre a matéria. Acrescente-se, ademais, que a Constituição Federal, entre inúmeras competências conferidas aos Municípios, entregou-lhes a de, em seu território, legislar supletivamente à União e aos Estados sobre proteção do meio ambiente.

            A propósito, lembre-se também que os Municípios, segundo o regime constitucional de 1988, passaram a integrar a federação como entes autônomos (arts. 1° e 18), o que importa dizer que o Estado brasileiro não é aquela estrutura hierárquica em que o Município ocupa o último degrau. Ao contrário, significa que Estados, Municípios e Distrito Federal são sujeitos ativos da União, isto é, são os atores do pacto federativo.

" (7) (grifou-se)

            Celso Ribeiro Bastos

            "Cumpre reiterar, por fim, que no âmbito de sua competência constitucional o Município exerce a função de legislar sem submissão hierárquica, sendo inconstitucionais a lei estadual e a lei federal que, desbordando dos limites das respectivas competências, invadirem o campo da competência municipal". (8)

(grifou-se)

            Vladimir Passos de Freitas

            "Pode, da mesma forma, legislar sobre assuntos de interesse local, como dispõe o inc. I do art. 30 acima citado. Há situações a este respeito que não despertam qualquer dúvida. Por exemplo, uma lei que estabeleça normas sobre o plantio, preservação e poda de árvores é de interesse eminentemente local. É que muitos problemas e dúvidas surgem sobre este assunto. Não só entre particulares como entre Prefeituras e órgãos do Estado membro.

" (9)

            A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça corroboram esse entendimento:

            "Recurso - Via ‘fax’ - Validade. O simples fato de o original do recurso haver sido protocolado após o prazo referente a interposição não o prejudica, no que utilizado o moderno meio de transmissão que é o ‘fax´´. Implica relega-lo a inutilidade o empréstimo de valia condicionada a entrada do original, no protocolo, dentro do prazo pertinente ao recurso.

            Meio Ambiente - Disciplina Normativa - União - Estados. À União cabe baixar as normas - gerais sobre a defesa e a proteção da saúde, a abranger às relativas ao meio ambiente. A autuação dos Estados mostra-se válida no que não as contrariam." (10) (grifou-se)

            "Constitucional. Meio Ambiente. Legislação Municipal Supletiva. Possibilidade.

            Atribuindo, a constituição federal, a competência comum à União, aos Estados e aos Municípios para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, cabe, aos Municípios, legislar supletivamente sobre a proteção ambiental, na esfera do interesse estritamente local.

            A Legislação municipal, contudo, deve se constringir a atender às características próprias do território em que as questões ambientais, por suas particularidades, não contém com o disciplinamento consignado na lei federal ou estadual. A legislação supletiva, como é cediço, não pode ineficacizar os efeitos da lei que pretende suplementar.

            Uma vez autorizada pela União a produção e deferido o registro do produto perante o ministério competente é defeso aos municípios vedar, nos respectivos territórios, o uso e o armazenamento de substâncias aacrotóxicas, extrapolando o poder suplementar, em desobediência a lei federal.

            A proibição de uso e armazenamento por decreto e em todo o Município constitui desafeição à lei federal e ao princípio da livre iniciativa campo em que as limitações administrativas hão de corresponder às justas exigências do interesse público que as motiva sem o aniquilamento das atividades reguladas.

            Recurso conhecido e improvido. Decisão indiscrepante." (11) (grifou-se)

            No que diz respeito à competência administrativa, ou executiva - proteção das florestas - consubstanciada no Poder de Polícia, a Constituição Federal dispõe, em seu artigo 23, inciso VII, abaixo transcrito, que esta é de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Frisa-se, desde já, que a competência administrativa não suscita tantos conflitos se comparada com a legislativa:

            "Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

            (...)

            VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;

            Parágrafo único. Lei complementar fixará normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional."

(grifou-se)

            A doutrina de Edis Milaré compartilha deste entendimento ao referir que "a Constituição da República de 1988, em seu art. 23, VII, estabelece que a preservação das florestas e da flora é de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios" (12).

            O parágrafo único do artigo 23 é completamente desnecessário, tendo em vista que a fixação de normas para a cooperação entre os entes federados não precisa dar-se via lei complementar. Um convênio é instrumento suficientemente hábil à atuação conjunta na preservação de florestas.

            É o caso, por exemplo, do Convênio assinado em 20 de dezembro de 1999, entre a FEPAM (Fundação Estadual de Proteção Ambiental) e o Município de Porto Alegre (RS) - com a interveniência da SMAM (Secretaria Municipal de Meio Ambiente) - delegando a este a competência para o licenciamento e fiscalização ambiental em Porto Alegre.


3. Área de preservação permanente

            As áreas de preservação permanente e as reservas legais são formas de proteção jurídica especial das florestas nacionais. Ambas foram instituídas pelo Código Florestal brasileiro. Os artigos 2° (sua redação original foi alterada pela Lei n° 7.803/89) e 3°, criaram as denominadas áreas de preservação permanente.

            Estas áreas, conforme doutrina de Edis Milaré "consistem em uma faixa de preservação de vegetação estabelecida em razão da topografia ou do relevo, geralmente ao longo dos cursos d´´água, nascentes, reservatórios e em topos e encostas de morros, destinadas à manutenção da qualidade do solo, das águas e também para funcionar como ‘corredores de fauna’" (13).

            A Lei n° 7.754, de 14.04.1989, considera de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural existentes nas nascentes dos rios.

            Esse o conteúdo dos mencionados artigos 2° e 3° da Lei 4.771/65 (Código Florestal), indispensáveis à compreensão do tema:

            "Art. 2°. Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:

            a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d´´água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima seja:

            1 - de 30 m (trinta metros) para os cursos d´´água de menos de 10 m (dez metros) de largura;

            2 - de 50 m (cinqüenta metros) para os cursos d´´água que tenham de 10 (dez) a 50 m (cinqüenta metros) de largura;

            3 - de 100 m (cem metros) para os cursos d´´água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 m (duzentos metros) de largura;

            4 - de 200 m (duzentos metros) para os cursos d´´água que tenham de 200 (duzentos) a 600 m (seiscentos metros);

            5 - de 500 m (quinhentos metros) para os cursos d´´água que tenham largura superior a 600 m (seiscentos metros) de largura;

            b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d´´água naturais ou artificiais;

            c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados `olhos d´´água´´, qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 m (cinqüenta metros) de largura;

            d) no topo dos morros, montes, montanhas e serras;

            e) nas encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive;

            f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

            g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 m (cem metros) em projeções horizontais;

            h) em altitude superior a 1.800 m (mil e oitocentos metros), qualquer que seja a vegetação.

            Parágrafo único. No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limite a que se refere este artigo."

(grifou-se)

            "Art. 3°. Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando assim declarados por ato do poder público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas:

            a) a atenuar a erosão das terras;

            b) a fixaras dunas;

            c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;

            d) a auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares;

            e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;

            f )a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçadas de extinção;

            g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;

            h) a assegurar condições de bem-estar público.

            §1° A supressão total ou parcial de florestas e demais formas de vegetação permanente de que trata esta Lei, devidamente caracterizada em procedimento administrativo próprio e com prévia autorização do órgão federal de meio ambiente, somente será admitida quando necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social, sem prejuízo do licenciamento a ser procedido pelo órgão ambiental competente.

            §2° Por ocasião da análise do licenciamento, o órgão licenciador indicará as medidas de compensação ambiental que deverão ser adotadas pelo empreendedor sempre que possível

            §3° As florestas que integram o património indígena ficam sujeitas ao regime de preservação permanente (letra g) pelo só efeito desta Lei." (grifou-se)

            "Art. 3°-A. A exploração dos recursos florestais em terras indígenas somente poderá ser realizada pelas comunidades indígenas em regime de manejo florestal sustentável, para atender a sua subsistência, respeitados os arts. 2° e 3° deste Código."

            O código Florestal conceitua área de preservação permanente (APP), em seu artigo 1°, §2°, inciso III, como sendo a "área protegida nos termos dos arts. 2 e 3 desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas".

            Em virtude da proteção jurídica conferida pelo Código Florestal, conforme acima disposto, toda e qualquer interferência nestas áreas (APPs) - construções de casas, estradas etc - deverá ser nulificada. Isto pode ocorrer tanto pelo Poder Público como pelos cidadãos, estes fazendo uso da Ação Popular.

            Paulo Affonso Leme Machado refere que, "nem o princípio da autonomia municipal possibilita ao Município autorizar obras públicas ou privadas nas áreas destinadas a florestas de preservação permanente, pois estaria derrogando e invadindo a competência da União, que estabeleceu normas gerais" (14)(grifou-se)

            Entretanto, Patrícia Azevedo da Silveira, com a qual se concorda, entende que se houvesse a interferência do município nestas áreas "não haveria a pecha da inconstitucionalidade, respeitando-se a autonomia de todos os entes da federação em seus respectivos campos de atuação" (15). Obviamente, a referida autora não está tratando de construções e interferências drásticas nestas áreas, mas sim de que questões referentes ao manejo florestal racional.

            Utiliza como argumento o fato de que o critério para a definição da metragem, baseado na largura do corpo d´´água é incompleto, pois funda-se no aspecto jurídico, quando, em realidade e até para que não se deprede o que se busca preservar, tem que se basear na técnica, mediante análise morfológica, pluviométrica etc.

            Assim, o preenchimento do conceito de área de preservação permanente é do âmbito do interesse local, oriundo de uma aferição técnica, sendo, por conseguinte, de competência, também, do município, para restringir, quando necessário, a possibilidade de depredação. O município pode, por exemplo, certificar, tecnicamente, que em prol da preservação daquela área é necessário ampliar-se o limite métrico estabelecido pelo Código Florestal como Área de Preservação Permanente.

            É que a legislação federal estabelece, no artigo 2°, por exemplo, um limite mínimo do que é considerado área de preservação permanente, a uma certa distância do corpo d´´água. Mas esta determinação, ou melhor, a adequação deste limite deve corresponder aos Municípios, por ser de interesse local. E é deles a tarefa de fazer uma análise técnica apurada para verificar se é ou não necessário aumentar este limite.

            O artigo 18 do Código Florestal preleciona que "nas terras de propriedade privada, onde seja necessário o florestamento ou o reflorestamento de preservação permanente, o Poder Público Federal poderá fazê-lo sem desapropriá-las, se não o fizer o proprietário". O parágrafo 1° refere que se "tais áreas estiverem sendo utilizadas com culturas, de seu valor deverá ser indenizado o proprietário" e o 2° que "as áreas assim utilizadas pelo Poder Público Federal ficam isentas de tributação".

            Da leitura do artigo acima, bem como do §2° do artigo 16 (proibição de corte raso nas áreas de Reserva Legal), constata-se que a legislação não quer apenas preservar as florestas, mas sim amplia-Ias. E no caso de inércia do proprietário, o Poder Público poderá fazê-lo para criar um padrão ecológico desejado.

            Quanto à obrigatoriedade ou não da Administração em plantar a floresta ou reflorestar, a doutrina, acompanhada do Professor Paulo Affonso Leme Machado, tem entendido que as florestas compreendidas no artigo 2° do Código Florestal são imperativas, enquanto as do artigo 3° dependem de motivação, mediante a análise da conveniência e da oportunidade de florestar e reflorestar. É que as daquele foram criadas ex vi legis, enquanto que as deste o foram por uma decisão discricionária da Administração.

            As florestas de preservação permanente não podem ser manejadas de forma a sofrerem cortes rasos. Para alguns isso significa que essas florestas deixaram de ter finalidade econômica. Outros entendem que é um investimento assecuratório do bem-estar psíquico, espiritual e físico, não só do proprietário como da sociedade como um todo.

            O Código não exaure a discussão sobre a possibilidade de as florestas de preservação permanente serem florestas de rendimento. Entretanto, o § único do artigo 5° não deixa dúvidas sobre a proibição de qualquer tipo de exploração nos parques nacionais, estaduais e municipais.

            Não obstante esta expressa proibição, o Código Florestal, de maneira racional, em seu artigo 4°, pondera que a supressão de vegetação nestas áreas (APPs) poderá ser autorizada pelo órgão estadual competente, nos casos de utilidade pública ou de interesse social. Eis o conteúdo do mencionado artigo:

            Art. 4° A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto.

            §1° A supressão de que trata o ´´caput´´ deste artigo dependerá de autorização do órgão ambiental estadual competente, com anuência prévia, quando couber, do órgão federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o disposto no §2° deste artigo.

            §2° A supressão de vegetação em área de preservação permanente situada em área urbana dependerá de autorização do órgão ambiental competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico.

            §3° O órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de baixo impacto ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação em área de preservação permanente.

            §4° O órgão ambiental competente indicará previamente à emissão da autorização para a supressão de vegetação em área de preservação permanente, as medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser adotadas pelo empreendedor.

            §5° A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, ou de dunas e mangues, de que tratam, respectivamente, as alíneas ´´c´´ e Y do art. 2° deste Código, somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.

            §6° Na implantação de reservatório artificial é obrigatória a desapropriação ou aquisição, pelo empreendedor, das áreas de preservação permanente criadas no seu entorno, cujos parâmetros e regime de uso serão definidos por resolução do CONAMA.

            §°7 É permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente, para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa" (grifou-se)

            Como o §1°, do artigo 3° do Código prevê que, em se tratando de florestas de preservação permanente, o licenciamento da atividade compete à esfera federal, importante que seja feita uma análise em conjunto entre esse artigos.

            Da leitura destes dois artigos extrai-se que o interessado deve iniciar o procedimento de licenciamento na esfera estadual, sendo que este órgão verificará quem é competente, dando continuidade no licenciamento ou remetendo o processo para outra esfera, que poderá ser a municipal.

            Assim pronunciou-se Luís Carlos da Silva Moraes:

            "Agora, com a atual redação do art. 4°, §2°, desse código, as atividades florestais poderão ser licenciadas pelo município, caso esse tenha plano diretor (art. 182, §1°, CF/88) e órgão similar ao Conselho Nacional de Meio Ambiente (Dec. 99.274/91) e a área ser licenciada esteja no perímetro urbano." (16)

            Quando se tratar, portanto, de área pertencente à zona rural, ou o órgão estadual se dá por competente ou será remetido, nos termos do §1°, art. 3°, para a esfera federal.

            Quanto aos crimes ambientais relacionados às áreas de preservação permanente pode-se dizer, sinteticamente, até para não haver fuga ao propósito do tema, que a Lei 9.605/98 tipificou alguns comportamentos que não constavam nas contravenções do artigo 26 do Código Florestal e modificou as penas dos que já estavam previstos. Prevê, ainda, multas por infrações administrativas, nos artigos 38, 39 e 40, cuja redação foi repetida nos artigos 25, 26 e 30 do Decreto 3.179, de 21.09.1999.

Sobre o autor
Giuliano Deboni

Advogado membro do Escritório arah e Terra Machado Advogados, pós-graduado em gestão ambiental pela PUCRS, mestre em Direito Ambiental pela Università degli Studi di Milano (Itália) e doutorando em Direito Comparado pela mesma Universidade

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DEBONI, Giuliano. Competência legislativa e administrativa, áreas de preservação permanente e reserva legal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 677, 13 mai. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6718. Acesso em: 22 nov. 2024.

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