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A regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU

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Agenda 10/12/2018 às 17:59

5 ASPECTOS RELEVANTES DO IPTU

5.1 O IPTU e as restrições ambientais

O meio ambiente ecologicamente equilibrado é princípio constitucional que  visa assegurar, como fim último, a própria vida. Isso justifica a razão de o constituinte ter dedicado capítulo próprio para tratar do tema (Título VIII, Capítulo VI).

Especificamente quanto ao tópico ora abordado, percebe-se que o artigo 225, §1º, inciso III, da Constituição Federal[21], possibilita ao Poder Público a definição de espaços a serem especialmente protegidos. Trata-se de um instrumento de garantia e efetividade ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (2014, p. 39/46).

Noutras palavras, há autorização para que restrições de cunho ambiental sejam implementadas com o intuito de assegurar a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações. Referidas restrições podem, inclusive, afetar o patrimônio do particular, o que, a depender da abrangência, gerará reflexos na base cálculo do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana.

De fato, acaso as restrições/limitações de cunho ambiental cheguem a ponto de atingir propriedades tributadas pelo imposto ora em estudo, faz-se necessário analisar em que grau ocorreu a redução/supressão do conteúdo econômico da propriedade. Conforme o caso,  tributação poderá restar afetada ou até mesmo prejudicada.

Noutras palavras, é necessário realizar o cotejo entre as normas constitucionais, pois, além de assegurar às presentes e futuras gerações um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o constituinte também se preocupou com o resguardo do direito fundamental à propriedade, à sua função social e à capacidade contributiva.

Como visto, a disponibilidade econômica da propriedade, domínio útil ou posse configura o fato gerador do IPTU. Acaso tal disponibilidade fique comprometida, a tributação deverá ser proporcional ou não poderá subsistir, sob pena de malferir os princípios da capacidade contributiva, da vedação ao confisco e, também, da igualdade.

CEZAROTI registra que “os proprietários ou possuidores de imóveis urbanos que sofrem limitações administrativas que se sentirem lesados em razão destas restrições podem pleitear a redução do IPTU a ser pago”. (2002, p. 235).

Para tanto, será necessário consultar a legislação municipal do local onde ocorre a tributação e cumprir os requisitos necessários ao pleito.

A título de ilustração, cita-se o disposto na Lei Municipal n. 1633/1991[22], do Município de Piracaia/São Paulo, que prevê estabelece a redução do valor venal de terrenos que possuam restrições ambientais, tais como mata natural, faixas de terreno “non aedificandi”, situados ao longo de cursos d´água e considerados de preservação permanente pela legislação federal.

No julgado, cuja ementa segue abaixo transcrita, há elementos que demonstram a possibilidade de afastar a incidência do IPTU quando a restrição retirar o conteúdo econômico da propriedade.

Agravo de Instrumento. Ação Anulatória de débito fiscal c.c pedido de indenização por danos morais. IPTU. Município de Ilha Comprida. Decisão que indeferiu a tutela provisória. Pretensão  à reforma. Acolhimento. Laudo técnico acostado pelos agravantes que indica estar o imóvel inserido em área de preservação ambiental permanente, notadamente na denominada zona de vida silvestre (Decretos estaduais ns. 26.881/87 e 30.817/89). Existência de restrições severas ao direito de propriedade que podem afastar incidência tributária. Inteligência do art. 32 do CTN. Município que, ademais, não impugnou o recurso e deixou de contestar a ação principal. Tutela de urgência deferida, ante a formação de um juízo positivo de probabilidade, no caso concreto. Decisão reformada. Recurso provido. Agravo de Instrumento n. 2023180-21.2017.8.26.0000 Comarca: Iguape Agravantes: Olindo Zanderin e outro Agravado: Municipio da Estancia Balnearia de Ilha Comprida, Relator Ricardo Chimenti.

A esse propósito, HARADA compreende que, se “houver apossamento administrativo do imóvel ou situação equivalente representada pela superveniência de normas ambientais que interditam o uso da propriedade, o IPTU não poderá ser cobrado” (2012, p. 143). O entendimento conta com suporte constitucional, pois, a interdição total da propriedade, que impede sua disponibilidade econômica, equivale a verdadeira desapropriação.

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5.2 O IPTU e o imóvel cultivado em área urbana

Quando se tratou do aspecto espacial do IPTU, registrou-se que o Código Tributário Nacional adotou o critério geográfico para a definição de zona urbana. Viu-se, também, que o conceito de zona rural resulta de um critério de exclusão, ou seja, o que não for urbano será considerado rural.

No entanto, percebe-se que, na vida prática, existem muitas áreas rurais dentro da zona urbana, o que ocorre até por conta do crescimento das cidades.

As propriedades em que há produção agrícola, pecuária e agroindustrial são importantes para o desenvolvimento e abastecimento das regiões, o que, inclusive, pode gerar redução de custos.

Por isso, em que pese o teor do art. 32 do Código Tributário Nacional, persiste a alteração introduzida no art. 15 do Decreto-Lei n. 57, de 18-11-1966, in verbis:

Art. 15. O disposto no art. 32 da Lei n. 5172, de 25 de outubo de 1966, não abrange o imóvel que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados. (BRASIL, 1966).

O dispositivo supra transcrito foi objeto de revogação pelo art. 12 da Lei n. 5868, de 12/12/1972, porém este dispositivo foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no RE 140773, relatado pelo Ministro Sydney Sanches.

Por isso, remanesce a vigência do art. 15 do Decreto-lei n. 57/1966, recepcionado com status de lei complementar pela Constituição Federal de 1967 e pela Emenda n. 1/69[23].

O Superior Tribunal de Justiça conta com diversas decisões que ressaltam os critérios a serem observados para a incidência do IPTU: a localização e a destinação. Tem compreendido que exclui a incidência do tributo municipal os imóveis cuja destinação seja, comprovadamente, a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, incidindo, quando então o imposto será o ITR.

PROCESSUAL CIVIL - IPTU E ITR - INCIDÊNCIA - IMÓVEL URBANO - IMÓVEL RURAL - CRITÉRIOS A SEREM OBSERVADOS - LOCALIZAÇÃO E DESTINAÇÃO - DECRETO-LEI N. 57/66 - RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

(...)

Os precedentes desta Corte a tratarem do tema, ora em análise, são firmes na conclusão de que ‘o artigo 15 do Decreto-Lei n. 57/66 exclui da incidência do IPTU os imóveis cuja destinação seja, comprovadamente, a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, sobre os quais incide o Imposto Territorial Rural-ITR, de competência da União’ (REsp 738628 / SP, Segunda Turma, DJ 20.6.2005)”.

Percebe-se que há na interpretação uma conciliação entre o interesse do proprietário e o do Município, que deve primar pelo meio urbano.[24]

5.3  O IPTU  e o direito real de laje

É sabido que em nosso país temos diversos municípios com áreas de parcelamento ilegal de solo e/ou loteamentos irregulares, o que, além de ser prejudicial ao meio ambiente, gera impactos negativos aos que residem nestes locais com prejuízos à sua dignidade.

Com o intuito de possibilitar a regularização fundiária urbana, adveio a Lei Federal n. 13.465/2017. O diploma legal, além de tratar da regularização fundiária urbana, dispõe sobre a regularização fundiária rural, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; institui mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis da União; e dá outras providências. 

Dentre os diversos temas, as alterações promovidas no Código Civil Brasileiro, com a inserção do direito real de laje no rol do art. 1.225 do citado diploma, chamam a atenção.

Consoante o disposto no art. 1510-A, o direito real de laje consiste na possibilidade de o proprietário de uma construção-base ceder a sua superfície superior ou inferior, a fim de que o titular da laje (compreendida como superfície superior ou inferior) mantenha unidade distinta (daquela originalmente construída sobre o solo). (BRASIL, 2002).

Tal direito reflete na seara tributária, pois, consoante o disposto no art. 1510-A, §2º, do Código Civil brasileiro, “o titular do direito real de laje responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre a sua unidade”.  (BRASIL, 2002).

Também de tamanha relevância é o disposto no §4º do referido artigo, no sentido de que a “instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas”.   

Ou seja, as alterações introduzidas já evidenciam que serão necessárias algumas adaptações na legislação municipal, mormente para que a tributação ocorra consoante os reflexos implementados pela Lei n. 13.465/2017.

Com efeito, a lei tributária não tem o condão de alterar a definição, o conteúdo e o alcance dos institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, de forma expressa ou implícita, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. (art. 110, CTN)

A previsão, sem sombra de dúvidas, implicará alteração na legislação do IPTU dos Municípios de nosso país, pois são nítidos os reflexos na sujeição passiva tributária em face da disponibilidade econômica do direito real de laje e, também, na verificação da base calculada com a não inclusão, para o titular do direito real, de fração ideal de terreno ou das áreas edificadas não abrangidas por sua unidade.

5.4 Concessão de direito real de uso e o IPTU

O Código Tributário Nacional prevê expressamente que o fato gerador do IPTU é a “propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município” (art. 32, CTN).

DINIZ formula um conceito de propriedade a partir dos seus atributos, pois a compreende como sendo “o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar, dispor de um bem corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”. (2007, p. 114).

O domínio útil consiste no direito atribuído ao enfiteuta para usufruir do bem mediante o pagamento de uma renda anual ao aforador ou titular do domínio direto. É vedada a constituição de novas enfiteuses e subenfiteuses consoante o Código Civil de 2002, sendo que as existentes estão subordinadas às disposições do Codex de 1916.

Segundo o disposto no art. 1196 do Código Civil, “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”. (BRASIL, 2002).

O artigo 34 do Código Tributário Nacional dispõe que o possuidor “a qualquer título” será contribuinte do IPTU. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que somente a posse com “animus domini”, assim entendida a exclusiva (não desdobrada), configura o fato gerador do IPTU[25].

A partir das premissas acima, surge a seguinte dúvida: o cessionário do direito de uso pode figurar no polo passivo desta obrigação tributária?

A Corte Especial tem entendido que o cessionário do direito de uso não pode figurar como sujeito passivo porque a posse a que se refere o artigo 32 do Código Tributário Nacional é a exercida com “animus domini”. Inclusive conta com jurisprudência pacificada sobre o tema.

A ementa abaixo transcrita permite visualizar o entendimento da Corte:

TRIBUTÁRIO   E   PROCESSUAL  CIVIL.  AGRAVO  REGIMENTAL  EM  RECURSO ESPECIAL.  ALEGAÇÃO  DE  OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. IMÓVEL DE DOMÍNIO DA UNIÃO.  CONCESSÃO  DE  USO. IPTU. NÃO INCIDÊNCIA. CESSIONÁRIO. POSSE SEM  ANIMUS  DOMINI.  APRECIAÇÃO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS, EM ÂMBITO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I.  Trata-se  de  Agravo Regimental interposto em 05/10/2015, contra decisão monocrática, publicada em 28/09/2015. I[...].  É pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o bem imóvel público, ocupado por concessionária, não se  sujeita  à  incidência  de IPTU, na medida em que a posse, nessa situação,  decorre  de  relação de direito pessoal e não é dotada de animus domini, tratando-se, na verdade, de simples detenção de coisa alheia.  Precedentes:  STJ,  AgRg no AREsp 535.846/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 24/11/2015; STJ, AgRg no AREsp 691.946/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/06/2015. [...] AgRg no REsp 1534170 / DF AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2015/0116786-4, Relatado pela MIn. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Segunda Turma, julgado em 10/05/2016.

O entendimento apresenta sólidos argumentos, pois não há que se falar em posse com “animus domini” em se tratando de bens públicos, consoante o disposto no art. 183, §3º, da Constituição Federal. Ademais, faz-se necessário à identificação do sujeito passivo apurar quem detém a disponibilidade econômica do imóvel.

Sobre o autor
Vanderson Souza

Formado pela Universidade São Francisco desde 2004; Na área pública, atuei como: Escrevente Técnico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;, Advogado Público na Cia. Saneamento Ambiental de Atibaia; e, atualmente, atuo como Procurador Jurídico Municipal e advogo e presto consultoria jurídica a empresas com escritório na cidade de Atibaia Especializado em Ciências Penais, Direito Público e Tributário e Processual Tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Vanderson. A regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5640, 10 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/69567. Acesso em: 25 nov. 2024.

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Trabalho de conclusão de curso da especialização em direito tributário e processual pela Escola Paulista de Direito

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