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Crime doloso contra vida de civil, questões controvertidas e soluções quanto ao parágrafo 1ª do artigo 09ª pós Lei 13.491/17.

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Agenda 09/11/2018 às 07:36

Competência Constitucional do Tribunal do Júri.

Quanto à Justiça Militar do estado, a expressão júri foi expressamente prevista no parágrafo 4º do art. 125 e agora com a lei 13.491/17 o CPM também deixou de forma expressa júri.

Art. 125....

§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças.[20]

Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

.............

§ 1 º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri. [21]

Geralmente fala-se em tribunal do júri e sua competência constitucional, porém sem que seja feita a devida análise do instituto júri na CF/88 e se é defeso que exista júri em outras justiças. Por isso, vejamos uma análise detalhada do instituto júri.

Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:

I - o Supremo Tribunal Federal;

I-A o Conselho Nacional de Justiça;

II - o Superior Tribunal de Justiça;

II-A - o Tribunal Superior do Trabalho;         

III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;

IV - Os Tribunais e Juízes do Trabalho;

V - Os Tribunais e Juízes Eleitorais;

VI - os Tribunais e Juízes Militares;

VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.[22]

Analisando os órgãos do poder judiciário elencados no art. 92 da CF/88, o júri não aparece, como também nos incisos referentes à Justiça Federal e Justiça Estadual não se faz nenhuma menção de júri nesses órgãos. Então, pergunta-se: por que não poderia o júri existir na Justiça Militar?

O júri encontra-se previsto dentre os direitos e garantias individuais (art. 05., XXXVIII, CF). Tal situação chegou a gerar alguma controvérsia em relação a esta instituição ser não um órgão do Poder Judiciário, mas um organismo político, desligado do Judiciário, onde os jurados exerceriam o seu direito ao sufrágio, como cidadãos no exercício da cidadania (cf. James Tubenchlak, Tribunal do Júri- Contradições e soluções, p. 9). Essa não é a melhor posição. (Nucci, Tribunal do Júri, 4ª Ed, p.48).

E conclui o autor.

Enfim, trata-se de um órgão especial do Poder Judiciário, que assegura a participação popular direta nas suas decisões de caráter jurisdicional. Cuida-se de uma instituição de apelo cívico, demonstrativa da importância da cidadania e democracia na vida em sociedade. (Nucci, Tribunal do Júri, 4ª Ed, p.48).

Precisa é a lição do magistrado do TJM/MG Fernando Galvão que afirma;

Ao preservar a competência do Tribunal do Júri, quando a vítima for civil, a Constituição Federal não estabeleceu uma nova Justiça especializada: uma justiça do júri. O Tribunal do Júri não materializa nenhuma Justiça especializada, mas apenas um órgão jurisdicional que compõe a organização judiciária da justiça competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. A única conclusão a que se pode chegar é que a Emenda Constitucional determinou que se institua o Tribunal do Júri na Justiça Militar Estadual, que é a competente para o julgamento dos crimes militares praticados por militares estaduais. Fica muito claro que a finalidade da ressalva foi impedir expressamente que o juiz de direito do juízo militar julgue singularmente os crimes militares dolosos contra a vida cometidos contra civil. Conforme a norma do § 5º do art. 125 da CF/88, a regra geral é que o juiz de direito do juízo militar julgue singularmente os crimes cometidos contra civil. O dispositivo anterior (§ 4º) excepciona esta regra para preservar a garantia fundamental do Tribunal do Júri.[23] Grifei.

O júri na CF/88 encontra-se no rol do art.05 e nela não existe nenhum óbice do mesmo ser criado na Justiça Militar nem muito menos afirma que só possa ser instituto na justiça comum estadual ou na justiça comum federal.

Art. 5º..........................

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;[24]

Na redação constitucional nada obsta que o CPPM seja uma lei que tenha em seu procedimento a instituição do júri, podendo inclusive fazer de forma diversa da existente no CPP, desde que seja respeitada a plenitude de defesa, sigilo das votações, soberania dos veredictos e julgamentos para os crimes dolosos contra a vida.

Pela redação do artigo 05º da CF, pode inclusive o CPPM regular a matéria com quantidade de jurados diferentes do CPP, incluir crimes além dos dolosos contra vida - aqui ficando a critério do legislador. O que não se pode afirmar é que o júri não é cabível nas justiças militares, por que a constituição nunca disse isso.

Acerca do júri ser um direito e garantia fundamental, vale mais uma vez as lições do magistrado bandeirante. (Nucci, Tribunal do Júri, 4ª Ed, p.45)

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Para concluir, o júri é direito e garantia humanas fundamentais formais, merecendo ser respeitado, especialmente no que concerne aos princípios constantes das alíneas do art. 5º, XXXVIII, da CF. O seu caráter formal não elimina a situação jurídica de figurar no rol dos direitos e garantias individuais do mencionado art. 5º. O poder Constituinte Originário ali o inseriu. Não devem o operador do Direito e o legislador ordinário lesar o seu status e as regras constitucionais que o regulam.

Acerca do júri ser algo que transcende no processo penal, vale o trecho da matéria veiculada no jornal O Estado de São Paulo de entrevista dada por um promotor do Tribunal do Júri em São Paulo acerca do julgamento de policias militares.

"Basta chegar em plenário, mostrar os antecedentes do réu e pintá-lo como um bandido. Ele pode estar envolvido em um acidente de trânsito ou ter sido pego com um cigarrinho de maconha. Não interessa. Se o Júri o considerar bandido, o PM que o matou é absolvido. Os oficiais costumavam ser mais rigorosos com erros policiais."[25]Grifei

Portanto, não há que se fazer confusão de júri e justiça comum, nem que exista proibição constitucional de se ter o júri na estrutura do processo penal militar, já que na verdade é o júri o direito do militar ser julgado pelo povo, e hoje com a lei 13.491/17 o parágrafo 1º do artigo 09º vem de forma expressa falar em júri. Se a instituição do júri já era possível na justiça militar do estado com a edição da EC/45, hoje também o é na Justiça Militar da União.


Conclusão

Em razão de todo o exposto no presente artigo, a solução mais coerente que teríamos seria o Congresso Nacional mudar o CPPM e nele incluir o procedimento do Tribunal do Júri e no júri existente na Justiça Militar, para que não sejam alvos de críticas quanto a corporativismo, assim como no rito do CPP seria defeso que esse júri seja composto por militares, podendo inclusive a formação e instrução do júri no CPPM ter rito diferente do CPP, bastando respeitar a exigência mínima do art. 5º, inciso XXXVIII da CF/88.

 Enquanto o Congresso não faz a devida alteração no CPPM, o correto é a aplicação do art. 03, alínea ‘a’ do CPPM e ser utilizado o rito do júri do CPP nos seus art. 406 a 497, sendo que na Justiça Militar da União a primeira fase seria perante o Conselho de Justiça. No âmbito da Justiça Militar do Estado, por imperativo constitucional a primeira fase seria feita pelo Juiz de Direito de forma monocrática, solucionando dessa forma a celeuma e insegurança jurídica existentes, bem como a violação que temos visto diuturnamente do juiz natural, onde o juiz de direito da justiça comum faz a primeira fase de um crime militar, quando a competência para tal é dada ao júri e não ao juiz sumariante.


Notas

[1] ALVES-MARREIROS, Adriano. https://www.observatoriodajusticamilitar.info/single-post/2017/11/11/Lei-134912017-o-j%C3%BAri-que-n%C3%A3o-h%C3%A1-mais-e-o-que-n%C3%A3o-haver%C3%A1-uma-an%C3%A1lise-sobre-a-mudan%C3%A7a-da-natureza-comum-para-militar-de-certos-crimes-dolosos-contra-a-vida

[2] Neves, Cícero Robson Coimbra. Streifinger, Marcelo. Manual de direito penal militar, Saraiva, 2012, p. 345

[3] https://tjmsp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/385483371/arguicao-de-inconstitucionalidade-12010/inteiro-teor-385483469

[4] Assis, Jorge Cesar de. Crime militar & processo; comentários à Lei 13.491/2017/ Curitiba: Juruá, 2018, p.87

[5] Neves, Cícero Robson Coimbra, Manual de direito processual penal militar-3. Ed.- São Paulo; Saraiva Educação, 2018, p.287

[6] Idem, p. 347

[7] Investigação preliminar no processo penal/ Aury Lopes Jr., Ricardo Jacobsen Gloeckner.- 5. Ed. ver, São Paulo; Saraiva, 2013, p. 93

[8] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm

[9] Novelino, Marcelo. , Júnior, Dirley da Cunha, Constituição Federal Para Concursos, 8ª Ed. 2017, JusPODIVM, P. 335

[10] Giacomolli, Nereu Jose, O devido processo penal: abordagem conforme a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica, 3. Ed, São Paulo, Atlas, 2016, p. 309

[11] http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347091

[12]https://www.assofepar.org.br/admin/files/arquivos/kjhh0lidjoac57t1cipqa2bmo68fsbufkvrdgenmge3ln49.pdf

[13] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del1002.htm

[14] http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347091

[15] http://www.tjmsp.jus.br/Jurisprudencia/Ementas/Details/12127

[16] http://www.tjmsp.jus.br/Jurisprudencia/Ementas/Details/12307

[17] https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/178774183/recurso-extraordinario-re-804269-sp-sao-paulo

[18] https://www.jusbrasil.com.br/diarios/documentos/492772451/andamento-do-processo-n-1062591-recurso-extraordinario-28-08-2017-do-stf

[19] Neves, Cícero Robson Coimbra, Manual de direito processual penal militar-3. Ed.- São Paulo; Saraiva Educação, 2018, p.171.

[20] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm

[21] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del1001Compilado.htm

[22] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm

[23] http://jusmilitaris.com.br/sistema/arquivos/doutrinas/juri.pdf

[24] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm

[25] https://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,e-preciso-testemunho-de-jesus-para-condenar-policial-imp-,960470

Sobre o autor
José Osmar Coelho

Advogado, Especialista em Direito Militar na Universidade Cruzeiro do Sul e Especialista em Ciências Criminais na Universidade Cândido Mendes, Pós Graduado em Politica e Estrategia pela Universidade do Estado da Bahia em convenio com ADESG/BA

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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