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O plano de recuperação judicial especial para microempresas e empresas de pequeno porte e as objeções de credores com mais da metade dos créditos

Agenda 04/08/2005 às 00:00

As objeções dos credores titulares de mais da metade dos créditos

            A Nova Lei de Recuperação e Falências apresenta plano especial de recuperação judicial para as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, semelhante a antiga concordata. Contudo, a aceitação desse plano na prática dependerá em muito do entendimento que se der ao artigo 72, parágrafo único, da citada lei, que diz:

            "Art. 72. Caso o devedor de que trata o art. 70 desta Lei opte pelo pedido de recuperação judicial com base no plano especial disciplinado nesta Seção, não será convocada assembléia-geral de credores para deliberar sobre o plano, e o juiz concederá a recuperação judicial se atendidas as demais exigências desta Lei.

            Parágrafo único. O juiz também julgará improcedente o pedido de recuperação judicial e decretará a falência do devedor se houver objeções, nos termos do art. 55 desta Lei, de credores titulares de mais da metade dos créditos descritos no inciso I do caput do art. 71 desta Lei."


Fundamento das "objeções"

            Qual seria o fundamento das "objeções" previstas no parágrafo único? A Lei faz referência aos termos do artigo 55 que disciplina o processamento da objeção do credor ao plano geral, esta devendo ser submetida à apreciação da assembléia. No plano especial para MEs e EPPs o caso é outro: a deliberação sobre a procedência da objeção caberá ao próprio juiz.

            Nos parece, assim, que as objeções na recuperação especial devam vir fundamentadas ou no descumprimento dos requisitos legais gerais (e dos especiíficos do artigo 71) ou em razão econômica relevante. Não vemos como a objeção possa ser simples, sem qualquer justificativa. De fato, o juiz terá de apreciar a objeção, tendo-se formado lide pendente de solução. E para que se decida favoravelmente ao credor e negue o favor legal, deverá, necessariamente, haver relevante razão econômica ou de direito.

            ULHOA COELHO considera necessária a apreciação do juiz sobre a objeção, e vai além, restringindo mais seu conteúdo, que, segundo o festejado professor, "só pode versar sobre a adequação da proposta à lei" [01]. Inobstante, e com toda a vênia, temos que além do desatendimento aos requisitos legais os credores podem também argüir relevante razão econômica para indeferimento do pedido de recuperação.

            Exemplificamos: se o passivo já está superior em quatro ou cinco vezes o ativo (ilustrativamente), não é a concessão de prazo de 36 meses para pagamento do quirografários que irá salvar a empresa. Só que tal razão de fundo econômico deveria ser levantada por mais da metade dos credores para que fosse então negada a recuperação. Esse entender harmoniza o dispositivo com o preceito do artigo 170, inciso IX da Constituição Federal.

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Da interpretação do dispositivo à luz do artigo 170, inciso IX da Constituição Federal

            Pensar que a objeção prescindisse de fundamentação daria azo a real contradição no sistema: se é princípio constitucional o tratamento favorecido para a micro e pequena empresa (artigo 170, inciso IX) não se poderia pensar que a Lei estabelecesse critério que simplesmente tornasse impossível ou muito difícil este favorecimento.

            Pois é o caso deste parágrafo único do artigo 72. De fato, se a simples objeção de mais da metade dos credores puder restringir o favor legal, independentemente de qualquer fundamentação, estar-se-ía estabelecendo empecilho no mais das vezes insuperável à empresa de pequeno porte e à microempresa.

            A se seguir uma interpretação literal do dispositivo ter-se-ía a seguinte contradição: enquanto que no procedimento regular as objeções seriam submetidas à assembléia, e fatalmente teriam de ser fundamentadas, para exercerem poder de convencimento, no procedimento opcional para as pequenas empresas a simples objeção daria margem à inexorável decretação da quebra.

            Outro contra-senso de uma exegese puramente gramatical seria a admissão de mera petição com a objeção simples no plano especial, enquanto que no procedimento regular o credor teria de se fazer presente à assembléia, com todos os custos envolvidos, para fazer valer sua contrariedade. Não poderíamos admitir uma visão totalmente distante do preconizado na Lei Maior.

            Em resumo, o que pensamos é que qualquer objeção fundada na falta de adequação do pedido de recuperação especial aos requisitos da Lei (os gerais e os especiais do artigo 71), se julgada procedente pelo juiz, dá margem por si só à decretação da quebra. Agora, para que as objeções fundadas em razões de natureza econômico-financeiras venham a determinar a convolação em falência, necessário que tenham relevância e fundamento, e que sejam levantadas pelos detentores de mais da metade dos créditos quirografários.

            Desse modo, o procedimento especial seria simplificado, pois dispensaria a realização da assembléia (o objetivo principal do procedimento especial), e guardaria ainda assim certa similitude com a recuperação judicial ordinária, permitindo aos credores apresentar objeções fundamentadas de natureza não jurídica.

            Esse o entendimento que se harmoniza com o espírito geral da Lei e com a interpretação do dispositivo à luz do artigo 170, inciso IX da Constituição Federal.


Nota

            01

COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei e Falências e de Recuperação de Empresas. Saraiva, 2005, p.186.
Sobre o autor
Tony Luiz Ramos

advogado e contabilista em São João Batista (SC)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Tony Luiz. O plano de recuperação judicial especial para microempresas e empresas de pequeno porte e as objeções de credores com mais da metade dos créditos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 761, 4 ago. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7103. Acesso em: 22 nov. 2024.

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