Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Da tutela antecipada em sede recursal

Exibindo página 2 de 4
Agenda 28/08/2005 às 00:00

2 DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA TAL COMO PRECONIZADA PELA ART. 273 DO CPC.

            Almeja-se com o presente capítulo percorrer todos os meandros legais, doutrinários e jurisprudenciais da instituto da antecipação de tutela, para uma melhor concepção do instituto sob a ótica da instância recursal.

            2.1Da origem do instituto.

            O instituto da antecipação de tutela passou a ser reiteradamente utilizado no processo civil brasileiro com a redação dada pela Lei n.º 8.952/1994 ao art. 273 do Código de Processo Civil. Quer-se com isso afirmar que a antecipação de tutela já existia e já era utilizada antes mesmo do advento da citada lei. Inúmeros são os exemplos de dispositivos legais que, implícita ou expressamente, acolhiam a possibilidade de se antecipar os efeitos da decisão final, total ou parcialmente.

            Assim, por exemplo, na ação possessória (art. 928 e 929 do CPC); na ação de nunciação de obra nova (art. 937 do CPC); na ação de busca e apreensão de coisa vendida a crédito com reserva de domínio (art. 1.071 do CPC); na ação de embargos de terceiro (art. 1.051 do CPC); na ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente em garantia (Dec.-Lei 911/69, art. 3º, "f"); na ação de mandado de segurança (Lei 1.533/51, art. 7º, II); na ação de desapropriação (Dec.-Lei 3.365/41, art. 15); na ação popular (Lei 4.717/65, art. 5º, §4º; na ação civil pública (Lei 7.347/85, art. 12; na tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer (Código de Defesa do Consumidor, art. 84, §3º; nas liminares previstas na Lei do Inquilinato (Lei n.º 8.245/91, art, 59, §1º)

            A redação dada ao art. 273 do CPC veio oficializar a existência da antecipação de tutela no direito brasileiro, ampliar a generalizar a aplicação do instituto e instaurar, doutrinariamente, a diferença entre a pretensão cautelar e a antecipatória.

            O art. 273 do CPC oficializou a existência do instituto sob comento, eis que somente a partir de sua nova redação é que os operadores jurídicos passaram a conceber um instituto próprio para antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da decisão final de mérito.

            No mais, o art. 273 do CPC estendeu a possibilidade de se antecipar os efeitos da tutela final de mérito a outras pretensões, não só àquelas hipóteses retro mencionadas, desde que satisfeitos os requisitos legais exigidos.

            Por fim, a nova redação do art. 273 do CPC estabeleceu, com nitidez, a diferença entre a pretensão cautelar e a antecipatória, desencadeando discussões no âmbito da doutrina e da jurisprudência. Quanto a isso, há de se dizer que, antes da nova redação do art. 273 do CPC, além daquelas hipóteses legais enumeradas de antecipação de tutela, a pretensão antecipatória era obtida sob às vestes da medida cautelar inominada compreendida pelo art. 798 do CPC. Como assevera William Santos FERREIRA, "nessas ações o que o autor buscava era o próprio bem da vida pretendido, e não apenas e tão-somente assegurar o resultado do processo de conhecimento ou do processo de execução", razão pela qual restou batizada de cautelar satisfativa". [38]

            Muito embora evidente que se estava, ao utilizar a previsão do art. 798 do CPC, suprindo uma falha do ordenamento, consistente em não prever a antecipação de tutela para todas as pretensões cuja a antecipação dos efeitos era possível, muitas foram as confusões geradas na comunidade jurídica. A diferença entre a tutela cautelar e a antecipatória não era facilmente compreendida, ensejando distorções no pleito de providências jurisdicionais de urgência, como bem retrata Cândido Rangel DINAMARCO:

            Por vezes a confusão que se faz entre a tutela antecipada e a tutela cautelar pode gerar conclusões equivocadas. Em julgado do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, entendeu-se que não seria cabível, em sede antecipatória, o cancelamento de protesto de duplicata já declarada paga, pois nada se acautelaria, uma vez que o protesto já havia ocorrido (AI 730.951, 10ª Câmara, j. 01.04.1997, Rel. Paulo Hanaka). No entanto, a ocorrência do protesto, se cumpridos os requisitos do artigo 273 confere total interesse ao postulante da medida, já que de nada adiantaria após anos obter o referido cancelamento, pois já estaria impossibilitado de atuar com instituições financeiras, cliente e tantas outras conseqüências advindas do protesto (este é o escopo da tutela antecipada). Em nossa atuação profissional já tivemos oportunidade de ajuizar a mesma ação e o juiz deferiu a tutela, mas de forma muito mais criativa: para desviar-se do perigo de irreversibilidade (já que havia um registro publico do protesto), determinou que não fosse mais sobre este informado qualquer apontamento, o que também deveria ser observado pelos bancos de dados (como Serasa, SPC etc). [39]

            Nesse sentido, também o escólio de Luiz Guilherme MARINONI:

            A reforma eliminou a necessidade do uso distorcido da "ação cautelar" para a obtenção da tutela antecipatória, possibilitando a correção dos equívocos que eram cometidos.... Em um dos artigos que escrevemos para justificar a introdução da tutela antecipatória no Código de Processo Civil deixamos bem clara a problemática da duplicação dos procedimentos para o mesmo fim: "a prática forense tem mostrado várias hipóteses em que processos rotulados de "cautelar" perdem qualquer sentido após a concessão da liminar. Isto quer significar que a prática, em vários casos, reduziu a importância do processo cautelar a uma liminar. A prática, com apoio da doutrina, aceita a tese de que a cautelar pode substituir o mandado de segurança, uma vez escoado o seu prazo decadencial. O que era direito líquido e certo transforma-se em fumus boni iuris. Porém, passada a fase propícia à concessão da liminar, por inexistir necessidade de elucidação de matéria de fato, o juiz está em condições de proferir sentença capaz de produzir coisa julgada material. Ou seja, a ação cautelar seria suficiente para a resolução definitiva do mérito. Contudo, a doutrina deixa claro que o lugar do julgamento do mérito é no chamado "processo principal", desnecessariamente instaurado quando percebido que o processo dito cautelar foi travestido para tornar viável a postulação da liminar. Nestes casos, realmente, a conclusão deveria ser a de que a "ação principal" é despicienda e a "ação cautelar" não é cautelar. Necessário é um procedimento de cognição exauriente em que seja possível a obtenção de uma tutela antecipatória. A doutrina transforma direito líquido e certo em fumus, mas não tem coragem para reconhecer que são completamente desnecessários dois procedimentos para tais casos. [40]

            Atualmente, passou-se a mais facilmente compreender que a tutela cautelar destina-se a assegurar a eficácia prática do processo de conhecimento ou de execução, uma vez declarada a procedência da pretensão, ao passo que a tutela antecipatória destina-se a antecipar os efeitos do provimento final de mérito, total ou parcialmente. Todavia, em prol do princípio da fungibilidade, a reforma procedida pela Lei n.º 10.444, de 07 de maio de 2002, inseriu no art. 273 o §7º, o qual veio a declarar que: "Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado."

            Para José Rogério Cruz & TUCCI, "A introdução do §7º vem mitigar a exegese estritamente formalista que se verifica na prática, em detrimento da urgência de determinadas situações. Jamais se aconselha que a forma sacrifique o direito do jurisdicionado." [41]

            Mesmo antes da reforma, porém, já se observava da jurisprudência uma atitude comprometida com a efetividade do direito material em detrimento da forma, como restou declarado, por exemplo, no acórdão unânime, proferido em julgamento de Agravo de Instrumento n.º 806.046-6, da 12ª Câmara Cível do 1º TACSP, relatado por José Roberto BEDAQUE, como se ressai da seguinte passagem:

            (...) A antecipação parcial dos efeitos da tutela se mostra possível no caso concreto (...) Tratando-se de tutela de urgência e provisória, possível a incidência da regra da fungibilidade, cabendo ao julgador adotar a solução mais adequada à preservação da utilidade do resultado final, desde que atendidos os limites objetivos da demanda (...).

            Quanto à aplicabilidade do dispositivo sob comento em sentido inverso, vale dizer, quando se requerer, sob às vestes de tutela cautelar, providência de natureza antecipatória, divide-se a doutrina. Alguns seguem à risca a regra legal, enfatizando ser impossível a fungibilidade em sentido contrário, e outros concedem à regra legal uma interpretação extensiva. Aceitando a fungibilidade também quando se pleiteia através de cautelar tutela antecipatória, manifesta-se Cândido Rangel DINAMARCO, in verbis:

            ... além de reconhecer a realidade da experiência do foro, constitui poderosa alavanca destinada a remover preconceitos, sendo certo que tal dispositivo deve ser interpretado "pelo que disse e pelo que não disse", uma vez que, também na hipótese inversa, na qual pleiteada medida cautelar, desde que presentes os respectivos requisitos, deverá ser deferida a tutela antecipatória cabível.... [42]

            2.2Do Conceito do Instituto.

            Inúmeros são os conceitos formulados para se definir o que é tutela antecipada. Para Nelson NERY JUNIOR, a tutela antecipada "é a tutela satisfativa no plano dos fatos, já que realiza o direito". [43]

            Na opinião de Cândido Rangel DINAMARCO, ela antecipa os efeitos do provimento, efeitos esses que são a própria tutela que só no futuro seria obtida. [44]

            Pela doutrina de William Santos FERREIRA, a tutela antecipada "é a admissão de seu pedido mediato, e não do seu pedido imediato, já que este último só na sentença é que será apreciado". [45][46]

            Para Luiz Guilherme MARINONI, a antecipação da tutela é uma técnica "que permite se dê tratamento diferenciado aos direitos evidentes e aos direitos que correm risco de lesão"; "produz o efeito que somente poderia ser produzido no final"; "...permite que sejam realizadas antecipadamente as conseqüências concretas da sentença de mérito", as quais "podem ser identificadas com os efeitos externos da sentença, ou seja, aqueles efeitos que operam fora do processo e no âmbito das relações de direito material". [47]

            2.3Das pretensões jurisdicionais propícias a terem seus efeitos antecipados.

            Nem todas as pretensões jurisdicionais podem ter seus efeitos antecipados, vez que o ordenamento jurídico não permite que determinadas conclusões restem efetivadas mediante cognição sumária, diante da irreversibilidade da providência jurisdicional.

            Este assunto tem a ver com os tipos de ações e sentenças, das quais já se falou no item I. Agora, partindo-se da classificação das ações e sentenças, analisar-se-á o instituto da tutela antecipada face a cada uma das modalidades de ações e sentenças.

            Preliminarmente, diga-se que predomina na doutrina o entendimento de que a antecipação só pode ocorrer em relação às tutelas prestadas pelas sentenças condenatórias, executiva lato sensu e mandamental, restando inviável em relação às sentenças declaratória e constitutiva.

            Como a antecipação da tutela em relação às ações condenatórias, mandamentais e executiva lato sensu não enseja maiores divergências na doutrina e na jurisprudência, comecemos por elas para, na seqüência, tratarmos do assunto sob a ótica das ações declaratórias e constitutivas.

            2.3.1 Da Antecipação da Tutela Buscada Pela Sentença Condenatória.

            Com relação à possibilidade de se antecipar os efeitos da sentença condenatória, não existem divergências na doutrina, a única discussão, referenciada por William Santos FERREIRA, diz respeito tão somente a saber-se se a execução dessa antecipação pode ocorrer nos próprios autos em que foi proferida ou se deve efetivar-se em autos apartados. Em tal caso, a doutrina majoritária, todavia, tem perfilhado o entendimento de que só deve ocorrer em procedimento autônomo quando houverem dificuldades para a execução da tutela antecipada, como sói ocorrer no caso de obrigações ilíquidas.

            No âmbito das ações condenatórias, ocorre a produção antecipada do efeito executivo da sentença, que equivale ao bem da vida almejado pelo autor (ao pedido mediato).

            Sobre a relação entre a antecipação e a sentença condenatória, manifesta-se Luiz Guilherme MARINONI, nos seguintes termos:

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

            Na realidade, como já foi dito no início deste item, não há propriamente antecipação dos efeitos da sentença, ou mesmo antecipação do efeito executivo, mas sim produção antecipada do efeito executivo para a realização imediata do direito. Esta realização antecipada por ser total ou parcial, e nesta hipótese fica ainda mais evidente que não é correto pensar em antecipação do efeito executivo, uma vez que não pode haver antecipação de parte de um efeito, mas apenas produção antecipada de um efeito para uma finalidade parcial. Nesta linha, se o que é antecipado é um bem da vida, antecipa-se a tutela, e não a sentença; como já foi explicado, a sentença é somente uma técnica para a prestação da tutela. [49] (sem grifo no original)

            2.3.2.Da Antecipação da Tutela Buscada Pelas Sentenças Mandamental e Executiva Lato Sensu.

            Como diz William Santos FERREIRA:

            ... se é admitida a tutela antecipada nas ações condenatórias, com muito mais razão deve-se admiti-la nas ações executivas lato sensu e nas ações mandamentais, pois, se a exigência de cumprimento da sentença prescinde de execução ex intervallo, ou seja, a execução se realiza nos próprios autos, em regra nada há que impeça a tutela antecipada nestes casos. [50]

            Quer o autor acima dizer que a sentença mandamental e executiva lato sensu, justamente por se afinarem com o espírito da efetividade, ao diminuírem o tempo necessário à obtenção do pedido mediato (o bem da vida desejado), permitem, com maior razão, a antecipação deste resultado.

            Com efeito, o art. 461 do CPC, preconiza, em seu § 3º, a possibilidade de que a tutela específica da obrigação seja concedida antecipadamente: "Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada."

            Ademais, os meios coercitivos cuja utilização é autorizada pelo art. 461, §5º, do CPC, para o cumprimento da obrigação de fazer ou não-fazer, por exemplo, a multa por tempo de atraso, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas etc, na lição de Athos Gusmão CARNEIRO, só contribuem para a antecipação da tutela. [51]

            Luiz Guilherme MARINONI, frisando que a sentença mandamental e a executiva lato sensu são técnicas para a prestação da tutela, demonstra ser possível ao juiz, utilizando-se dos instrumentos processuais disponíveis, conceder a tutela no final do procedimento ou em seu curso. [52]

            2.3.3.Da (Im)possibilidade de se Antecipar o Bem da Vida Almejado Pelas Sentenças Meramente Declaratórias e Constitutivas.

            No direito brasileiro ainda se encontra certa resistência no que concerne a se admitir a antecipação da tutela buscada pelas sentenças declaratórias e constitutivas, o que não ocorre, por exemplo, no direito italiano. Neste, como noticia Luiz Guilherme MARINONI, o novo art. 282 do Código de Processo Civil admite a execução provisória das sentenças declaratórias e constitutivas, como se infere da seguinte passagem de sua obra:

            O novo art. 282 afirma, simplesmente, que a sentença de primeiro grau é provisoriamente executiva entre as partes. O fato de o art. 282 admitir, em princípio, a produção imediata dos efeitos das sentenças constitutiva e declaratória, torna o direito italiano uma fonte muito rica, em termos de direito comparado, para a solução do problema da tutela antecipatória nas ações declaratória e constitutiva. [53]

            E mais:

            Durante os trabalhos preparatórios à reforma processual italiana, ficou clara a intenção do legislador em não limitar o art. 282 à execução imediata da sentença condenatória. A questão foi debatida no Senado italiano e a proposta do senado Acone, que restringia o art. 282 às sentenças de condenação, foi rejeitada sob o argumento – apresentado pelo senador Lipari – de que numerosas sentenças declaratórias ou constitutivas podem ser beneficiadas pela norma. [54]

            Não obstante a alteração legislativa, expõe o mesmo autor acima citado que a doutrina se encontra evidentemente dividida, parte admitindo a eficácia imediata das sentenças declaratória e constitutiva e outra não. Ressalva-se, no entanto, informa o autor, as sentenças condenatórias derivadas de pedido condenatório cumulado com constitutivo.

            No direito brasileiro, também se observa cisões na doutrina, todavia, não há dispositivo semelhante ao art. 282 do Código de Processo Civil italiano, dando azo à uma interpretação que acolha a antecipação da tutela almejada com as sentenças constitutiva e meramente declaratória.

            Aqueles que não admitem a antecipação da tutela meramente declaratória, partindo do pressuposto de que o pedido mediato (bem da vida almejado) e o imediato (decisão declaratória) se confundem, concluem que não se teria o que antecipar, vez que "estar-se-ia antecipando a decisão de mérito propriamente dita" [55].

            Contornando os impasses gerados por essa interpretação, outra ala da doutrina afirma que nos pedidos declaratórios com repercussões mandamentais ou executivas, a tutela pode ser antecipada, como, por exemplo, o caso da declaratória de paternidade que gera a repercussão prática relativa ao dever de prestar alimentos.

            William Santos FERREIRA refuta o posicionamento daqueles que defendem que atos como baixa de restrições constantes em bancos de dados cadastrais, como SPC e Serasa, são meros atos de execução imprópria da sentença, não se constituindo o deferimento dos mesmos, antes da sentença, antecipação da tutela, demonstrando, com isso, que a sentença declaratória nem sempre tem efeitos imediato. Com efeito, assevera:

            Em hipóteses como estas, sem dúvida a tutela não estará efetivada enquanto não verificados tais atos. Isto se deve à complexidade da vida moderna, em que tudo está de tal forma relacionado (e vinculado!) que qualquer alteração é capaz de atingir uma gama enorme de situações que dependam da premissa alterada. (...)

            Estas características deixam patente que a sentença por si só não é elemento suficiente para, de plano, afastar-se o cabimento da tutela antecipada, pois a certeza tem reflexos (rectius: efeitos) relevantíssimos no âmbito social. [56]

            Na seqüência, o autor acima conclui pela viabilidade em se antecipar o efeito da tutela meramente declaratória:

            E esta constatação é fundamental para poder se admitir a tutela antecipada nas ações meramente declaratórias, porque, como se demonstrou, os efeitos da sentença, embora prescindam de execução propriamente dita, extravasam os estreitos limites da mera declaração judicial solitariamente considerada, pois é por causa da sentença que se deverá corrigir no mundo uma série de situações que dependam da premissa alterada pela sentença.

            Logo, cumpridos os requisitos do artigo 273 do Código de Processo Civil, afigurar-se-á plenamente cabível a concessão da tutela antecipada em ações meramente declaratórias, pois serão antecipados os efeitos que só seriam verificados após a certeza jurídica exposta na sentença ("os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial"- caput do artigo 273). [57]

            Na crítica de José dos Santos BEDAQUE, aqueles não admitem a antecipação da tutela almejada através das sentenças meramente declaratórias no fundo não entendem que os atos que podem ser executados antecipadamente não implicam atribuição de certeza jurídica. [58]

            Humberto THEODORO JUNIOR compartilha o entendimento de que a antecipação de tutela não se aplica apenas às sentenças condenatórias, argumentando da seguinte forma:

            Isto, porém, não faz com que a antecipação de tutela seja um incidente só admissível na ação condenatória. Aqui se cogita de execução no sentido mais lato do termo, e não no específico de título executivo em sentido estrito. Qualquer sentença, mesmo as declaratórias e constitutivas, contém um preceito básico, que se dirige ao vencido e que se traduz na necessidade de não adotar um comportamento que seja contrário ao direito subjetivo reconhecido e declarado ou constituído em favor do vencedor. É a sujeição do réu a esse comportamento negativo ou omissivo em face do direito do autor que pode ser imposta por antecipação de tutela, não só nas ações condenatórias, como também nas meramente declaratórias e nas constitutivas. Reconhece-se, provisoriamente, o direito subjetivo do autor e impõe-se ao réu a proibição de não agir de maneira contrária, ou incompatível com a facultas agendi tutelada. [59]

            No que tange à antecipação da tutela promovida pelas sentenças constitutivas, ensina William Santos FERREIRA que existem dois óbices para a sua admissão, quais sejam: o fato de se objetivar com tais sentenças a alteração de uma relação jurídica, o que só poderia ocorrer no momento do proferimento da sentença e a circunstância de não ensejarem execução.

            Argumenta-se, para afastar, tais óbices, no sentido de que a antecipação não tem o condão de criar, modificar ou extinguir uma relação, mas de antecipar os efeitos destas alterações, já que aquelas medidas demandam cognição exauriente, a qual só é possível no momento em que o processo estiver maduro julgamento.

            Já o fato de a sentença constitutiva não demandar execução para surtir seus efeitos vem amparar a tese pela possibilidade de antecipação da tutela constitutiva, partindo-se do argumento segundo o qual: se a sentença condenatória pode ter a tutela a que dá origem antecipada, mesmo demandando execução, o que se dirá da constitutiva, que prescinde da execução diferida. [60]

            Feitas estas considerações, cabe, agora, analisar os pressupostos legais para a antecipação da tutela.

            2.4.Dos requisitos para a admissão da tutela antecipada.

            Pretende-se com a presente seção abordar rapidamente os contornos jurídicos da antecipação de tutela, tal como disciplinada pelo art. 273 do Código de Processo Civil, que apresenta hoje a seguinte redação:

            O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

            I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou

            II – fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

            §1º. Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões de seu convencimento.

            §2º. Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

            §3º. A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4º e 5º, e 461-A.

            §4º. A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

            §5º. Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.

            §6º. A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.

            §7º. Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.

            Fala a doutrina na existência de requisitos genéricos e outros específicos para o deferimento da antecipação da tutela. Todos aqueles e um destes devem estar presentes para a concessão da tutela.

            2.4.1.Dos Requisitos Genéricos.

            Tais requisitos são os seguintes: a) requerimento da parte; b) concessão total ou parcial dos efeitos do provimento final; c) prova inequívoca e verossimilhança da alegação; d) inexistência do risco da irreversibilidade.

            2.4.1.1 Do requerimento da parte.

            A concessão da antecipação da tutela, em observância ao princípio dispositivo [61], só pode ser deferida mediante requerimento da parte, em regra a autora e excepcionalmente a ré, nas ações de caráter dúplice, na reconvenção ou na oposição.

            Ressalte-se que o pedido pode ser feito inicialmente, no curso do processo, após a instrução probatória, quando o processo está prestes a ser sentenciado e na fase recursal. Nada obsta, também, que, sucessivamente, a um pedido de antecipação parcial da tutela, se deduza um pedido de antecipação total da tutela pretendida.

            2.4.1.2 Da concessão total ou parcial dos efeitos do provimento final

            Como já anunciado, também no pedido de antecipação de tutela deve o juiz ater-se ao princípio dispositivo, de forma que não lhe é lícito conceder mais (ultra petita), menos (infra petita) ou diversamente do que foi requerido (extra petita), devendo atender estritamente os termos do art. 128 e 460 do Código de Processo Civil [62]. Assim, por exemplo, se é requerida, a título de antecipação "parcial" da tutela, a retirada do nome do demandante do órgão de restrição ao crédito denominado Serasa, não poderá o MM. Juiz alargar o pedido, determinando também a exclusão ou a abstenção de inscrição em outros cadastros, como SCPC (Serviço Comercial de Proteção ao Crédito) e Sisbacen.

            Como o próprio nome diz, trata-se de antecipar a tutela, de modo que não é lícito ao juiz deferir algo impossível de ser prestado pela tutela final. Com destacado na Revista dos Tribunais 737/365, "A tutela antecipada consiste em um adiantamento da prestação jurisdicional, incidindo, sobre o próprio direito reclamado pela parte. O magistrado não pode, sob fundamento de aplicar o instituto, antecipar tutela que a própria sentença não outorgará porque estranha ao pedido formulado na ação, incidindo as regras dos arts. 128 e 460 do CPC."

            O atendimento ao pedido da parte pode ser total ou parcial. Em caso de antecipação parcial dos efeitos da tutela, mesmo que o magistrado se convença da possibilidade de antecipar integralmente a tutela, não poderá fazê-lo em respeito ao princípio dispositivo.

            2.4.1.3.Da prova inequívoca e da verossimilhança da alegação.

            Muita controvérsia já houve na doutrina e na jurisprudência no que concerne ao real significado da junção das expressões "prova inequívoca" e "verossimilhança da alegação". Para José Carlos Barbosa MOREIRA:

            Não se tem mostrado inteiramente pacífica, para dizer o menos, a convivência entre os dois pressupostos: o da "prova inequívoca" e o da "verossimilhança da alegação". Doutrina e jurisprudência enleiam-se em dificuldades quando tratam de explicar essa conjugação. Deixa certo a lei que, para a concessão do provimento antecipatório, basta a convicção de ser "verossímil" a alegação do requerente, isto é, não se exige a certeza de que ela seja veraz. Como entender, então, a referência a "prova inequívoca" – expressão que a primeira vista aponta no sentido da formação de convencimento certo? É sensível o desconforto que assalta os expositores do instituto e os julgadores que têm de aplicá-lo, quando se esforçam por juntar as duas pontas do fio. É igualmente sensível o artificialismo, para não dizer a precariedade, do nó com que costumam atá-las. [63]

            Pois bem, cabe salientar, preliminarmente, que, a fim de suprir a necessidade de prova para a antecipação de tutela, poderá o requerente se valer de prova documental, prova testemunhal ou pericial documentada, bem como postular a ouvida, imediata a informalmente, de testemunhas e a imediata inspeção judicial.

            Alguns, comparando a situação da antecipação da tutela com a da tutela cautelar, chegam a afirmar que a prova inequívoca seria um fumus boni iuris qualificado, como suscita Kazuo WATANABE: "O juízo fundado em prova inequívoca, uma prova que convença bastante, que não apresente dubiedade, é seguramente mais intenso que o juízo assentado em simples"fumaça", que somente permite a visualização de mera silhueta ou contorno sombreado de um direito." [64][65]

            Outros concluíram que tais requisitos conduziriam o magistrado a um juízo de certeza quanto ao suporte fático e jurídico da tutela pleiteada, o que equivaleria, como bem diz o autor acima citado "a apagar, na substância, a diferença entre o provimento antecipatório e a sentença de procedência do pedido." [66] (sem grifo no original)

            Chegou-se a propor a aplicação dos requisitos em tela sob à ótica de um "juízo de probabilidade", refutando-se a mera verossimilhança, como o fez Cândido Rangel DINAMARCO: "... embora formalmente contraditórias, devem as duas locuções ser aproximadas, através do conceito de probabilidade, portador da maior segurança do que a mera verossimilhança". [67]

            Por vezes, se atribuiu à expressão "prova inequívoca" o sentido de prova bastante para convencer o órgão judicial da verossimilhança da alegação do requerente e neste contexto é que se insere a posição externada por José Carlos BARBOSA MOREIRA, quando diz que questão não gira em torno de se graduar a força persuasiva da prova, já que a inequívoca é aquela prova que só num sentido seja possível entender – independentemente, note-se, de sua maior ou menor força persuasiva. [68]

            Luiz Guilherme MARINONI afirma que "A denominada "prova inequívoca", capaz de convencer o juiz da "verossimilhança da alegação", somente pode ser entendida como a "prova suficiente" para o surgimento do verossímil [69], entendido como o não suficiente para a declaração da existência ou da inexistência do direito". [70] E, para obter esse juízo, deve o julgador considerar: "(i) o valor do bem jurídico ameaçado, (ii) a dificuldade do autor provar a sua alegação, (iii) a credibilidade, de acordo com as regras de experiência, da alegação e (iv) a própria urgência descrita." [71] (sem grifo no original)

            Elucidativo é o conceito que De Plácido e SILVA confere à verossimilhança: "No entanto, conforme é assente na jurisprudência, sendo a verossimilhança uma questão de fato, não se podem sobre ela estabelecer regras doutrinárias. Deve, portanto, ser deixada ao prudente arbítrio do juiz, que a resolverá segundo as circunstâncias que cercam cada caso, diante do exame das relações existente entre as provas feitas e os fatos que se pretendem provar." [72]

            Prova inequívoca não seria, portanto, aquela capaz de conferir ao magistrado "certeza", mas sim aquela que não gerasse dubiedades quando de sua apreciação para efeitos de concessão da antecipação de tutela. É claro que neste contexto a probabilidade é largamente utilizada, vez que o juízo que o magistrado realiza ao apreciar o pedido de antecipação de tutela ampara-se na probabilidade de que o direito alegado e demonstrado pela prova trazida aos autos até este momento e não em "certeza processual" [73], a qual só terá ou estará próximo no momento da prolação da decisão final. Aliás, nesse sentido é a intervenção feita por William Santos FERREIRA, in verbis: "Os argumentos e sua comprovação influenciam o magistrado a concluir não pela mera aparência (que se presta à tutela cautelar), mas pela probabilidade máxima, para o momento processual de sua decisão, que razão assiste ao postulante da tutela antecipada, repita-se para aquele momento processual e à luz das provas até então existentes." [74] Com efeito, a prova inequívoca é aquele "prova formalmente perfeita, cujo tempo para produção não é incompatível com a imediatidade em que a tutela deve ser concedida", como doutrina Luiz Guilherme MARINONI. [75]

            Esta conclusão, ademais, vem sendo acolhida pela jurisprudência, como se ressai de inúmeros julgados. Assim, em recente julgado do STJ, no qual se entendeu que o fato deve ser incontroverso [76]; em julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no qual restou assentado que a prova inequívoca "deve conduzir a um grau de convencimento tal qual, a seu respeito, não possa ser oposta qualquer dúvida razoável, ou seja, cuja autenticidade ou veracidade seja provável" [77].

            Luiz Guilherme MARINONI, dá sua contribuição, propondo que o critério da "probabilidade" seja combinado com a da "proporcionalidade",

            Assim, o posicionamento mais sensato de todos os aqui expostos conduz ao entendimento de que a prova inequívoca deve ratificar a alegação do postulante da antecipação de tutela, não sendo capaz, já que na tal pedido é precedido, nas mais das vezes, da instrução probatória, de conferir juízo de certeza "processual" [78], necessário para a decisão final. Pode-se dizer, assim, com esteio na doutrina de Luiz Guilherme MARINONI, que a prova inequívoca equivale à uma prova provisória que, não cercada pelas demais provas que serão produzidas durante o trâmite processual, ampara o pedido de antecipação de tutela, permitindo sua concessão.

            2.4.3.Dos Requisitos Específicos.

            Os requisitos específicos restarão observados no preenchimento de uma das seguintes hipóteses: a) fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; b) abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

            2.3.2.1. Do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

            A expressão "fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação", na lição de Rosemiro Pereira LEAL, "comparece, no CPC (item I, art. 273), como requisito complementar (cumulativo-imperativo) das situações jurídicas de inequivocidade e verossimilhança, uma vez que se pode ler, no texto, o e (conjunção) e o ponto e vírgula antes do ou, o que, por claro, coloca o fundado receio como elemento inapartável (não alternativo) do juízo, lógico-antecipatório da tutela legal se com ele não concorre o do abuso do direito de defesa (item I, art. 273)." [79]

            Vislumbrada a função requisito em tela na antecipação de tutela, resta concluir a respeito de seu significado.

            Pois bem, colhendo-se os ensinamentos da doutrina chega-se a concluir que o presente requisito presta-se a resgatar a efetividade da prestação jurisdicional, posto que, como diz William Santos FERREIRA, "Se a antecipação não for concedida, diante da demora em se aguardar a sentença final ou até eventuais recursos com efeito suspensivo, poderá ocorrer um dano irreparável ou de difícil reparação, que afetará a própria prestabilidade do provimento definitivo". [80]

            Arruda ALVIM também se posiciona neste sentido: "A ratio do artigo 273, I, pode, sucintamente, expressar-se à luz do seguinte dilema: ou se antecipa a proteção à pretensão mesma (total ou parcialmente, na medida do que se tem por imprescindível à sobrevivência da pretensão), ou essa pretensão perece; ou, então, ocorrerá um dano que somente com a tutela antecipatória pode ser evitado." [81]

            No manejo do pedido de antecipação da tutela, de toda a sorte, deverá o requerente demonstrar o "dano" e o "fundado receio de sua ocorrência" objetivamente, não podendo entender o juiz que aquele decorre do mero receio subjetivo da parte, como ensina Humberto THEODORO JUNIOR: "pode-se ter como verossímil o receio de dano grave que concorra de fato objetivamente demonstrável e não de simples receio subjetivo da parte" (o grifo é nosso!). Acrescentaríamos que a verossimilhança das alegações atinentes ao receio de dano deve decorrer de fato objetivamente demonstrado (evidenciado ou indiciariamente mostrado) no procedimento." [82]

            2.3.2.1.Abuso do direito de defesa e o manifesto propósito protelatório do réu.

            A possibilidade de se deferir a antecipação de tutela fulcrada nestes requisitos tem como principal estímulo a convicção de que "o tempo do processo não pode ser um ônus somente do autor", e a circunstância, muito comum na rotina forense, de que o réu tende a protelar a prestação jurisdicional almejada pelo autor, por lhe parecer mais conveniente esperar a decisão desfavorável do que reconhecer o direito do postulante e adimplir as obrigações decorrentes desse reconhecimento, como bem assevera Luiz Guilherme MARINONI [83].

            Esta realidade, aliás, é que vem motivando a utilização da antecipação de tutela em sede recursal, como será mais adiante cotejado, eis que o recurso é um instrumento valioso para se protelar a prestação jurisdicional definitiva.

            Ambas as hipóteses – abuso do direito de defesa e manifesto propósito protelatório do réu, na opinião de Carreira ALVIM, estão albergadas pelo art. 273, II, do CPC. A segunda hipótese estaria encartada na primeira, como se o abuso do direito de defesa sempre insinuasse o propósito protelatório do réu. Tal opinião não é, contudo, avalizada pela doutrina dominante, sob a alegação de que, por vezes, observa-se o intuito protelatório sem se constatar o abuso do direito de defesa. Pode o réu manifestar o intuito de protelar o feito, mesmo sendo capaz de apresentar uma defesa plausível.

            E tal obrar do réu, revela também Luiz Guilherme MARINONI, é ainda mais maléfico quando o autor depende economicamente do bem da vida almejado pelo autor, acentuando a desigualdade entre as partes litigantes.

            2.4DO MOMENTO DA CONCESSÃO.

            A antecipação da tutela pode ser concedida em qualquer fase: no início do processo ou em seu curso, não só em primeiro grau de jurisdição, mas também na fase recursal.

            2.5.DA EXECUÇÃO.

            A execução da antecipação de tutela opera-se de forma provisória, segundo o que dispõe o art. 588 do CPC, o qual também foi recentemente reformado, passando a contemplar a seguinte redação:

            A execução é definitiva, quando fundada em sentença transitada em julgado ou em título extrajudicial, é provisória, quando a sentença for impugnada mediante recurso, recebido só no efeito devolutivo.

            I – corre por conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os prejuízos que o executado venha a sofrer;

            II – o levantamento de depósito em dinheiro, e a prática de atos que importem alienação de domínio ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, dependente de caução idônea, requerida e prestada nos próprios autos da execução;

            III – fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior;

            IV – eventuais prejuízos serão liquidados no mesmo processo;

            §1º. No caso do inciso III, se a sentença provisoriamente executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente nessa parte ficará sem efeito a execução.

            §2º. A caução pode ser dispensada nos casos de crédito de natureza alimentar, até o limite de 60 (sessenta) vezes o salário mínimo, quando o exeqüente se encontrar em estado de necessidade.

            Em regra, a execução da antecipação de tutela será efetivada nos próprios autos do processo de conhecimento em que esta foi deferida, constituindo-se uma execução lato sensu, sendo incabível o manejo dos embargos à execução, porque não instaurado um processo de execução para tanto. Somente na hipótese em que for concedida proximamente ou após a sentença, bem como em grau recursal, restará necessária a extração de carta de sentença.

            2.6.DA REVOGAÇÃO OU MODIFICAÇÃO.

            Segundo o §4º do art. 273 do CPC, a tutela antecipada poderá ser "revogada" ou "modificada" a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

            Todavia, tanto a revogação como a modificação demandam provocação da parte, não podendo o juiz, sem ser instado a tanto, alterar ou revogar a medida ulteriormente concedida, em razão da preclusão pro judicato, bem como alteração do quadro fático que possibilitou a concessão da tutela.

            Tal provocação pode se dar através do recurso de agravo de instrumento, quando os argumentos para se pleitear a revogação ou modificação forem relativos à visualização por parte do juiz dos fatos existentes no momento de sua concessão. Quando restar modificado o quadro fático que deu ensejo à concessão da tutela, a revogação ou modificação poderão ser pleiteadas independentemente de agravo de instrumento, isso também na hipótese de ser negada a concessão da tutela. A respeito dessas novas circunstâncias, doutrina Luiz Guilherme MARINONI:

            Este sistema binário, para bem funcionar, deve supor que os pressupostos para a revogação-modificação da tutela nada têm a ver com a matéria que pode ser posta no agravo. As razões que permitem a revogação ou a modificação da tutela, quando não interposto o agravo, são as "novas circunstâncias", vale dizer, são "outras razões", no sentido de "razões" que antes não podiam ter sido apresentadas.

            Não é somente a alteração da situação de fato objeto da lide que permite a modificação ou a revogação da tutela, mas também o surgimento, derivado do desenvolvimento do contraditório, de uma outra evidência sobre a situação de fato. É o caso da produção da prova que pode alterar a convicção do julgador acerca da situação fática. [84]

            Também é este o posicionamento de Tereza ARRUDA ALVIM WAMBIER: "quando não interposto o agravo, o juiz só pode revogar ou modificar a tutela com base em novas circunstâncias. Inclui-se no conceito de novas circunstâncias também a alteração substancial no quadro probatório". [85]

            O surgimento de situações novas também autoriza a concessão da tutela antecipada, cujo pedido anteriormente restou indeferido, demonstrando tais situações a presença dos requisitos autorizadores.

            A decisão concessiva ou negatória da antecipação de tutela também pode ser alterada, ensina William Santos FERREIRA, por ocasião do juízo de retratação:

            Complementando e justificando a linha de raciocínio empregada, pode-se também verificar que a apreciação do pedido de antecipação de tutela é passível de impugnação recursal, razão pela qual não teria cabimento, além do juízo de retratação (art. 529), permitir-se ao juiz mudar de opinião antes ou após o pronunciamento da instância superior, que poderá, revendo a decisão (efeito devolutivo), manter ou alterar a decisão de primeira instância impugnada (efeito substitutivo), sintonia que deve ser mantida, mesmo inexistindo impugnação recursal. Mesmo a decisão proferida pelo tribunal no julgamento do agravo de instrumento não impedirá que, na sentença, o juiz profira decisão diversa, o que corrobora a ressalva acima para não se confundirem decisões resultantes de cognição sumária com a sentença em que há cognição exauriente e, frise-se, definitiva. [86]

            Também se revoga a antecipação de tutela sobrevindo decisão com ela incompatível, vale dizer, sendo prolatada sentença de improcedência do pedido do autor, a tutela antecipatória insubsiste ante o fato de que a decisão final se ampara em cognição exauriente incompatível com a manutenção de decisão fulcrada em cognição sumária, mesmo que a sentença seja omissa com relação à antecipação de tutela.

            No mais, assevera William dos Santos FERREIRA [87] que, sendo a sentença de procedência do pedido do autor, a tutela antecipatória ulteriormente concedida permanece incólume, vez que o juízo baseado em cognição exauriente confirmou aquele obtido através de cognição sumária. E, mesmo que seja conferido efeito suspensivo a eventual recurso de apelação, a tutela antecipatória não será revogada.

Sobre a autora
Adriana Estigara

Doutora pela PUC/SP Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada e Consultora na área do Direito Tributário, e Direito do Terceiro Setor, integrante do Lewis & Associados. Professora junto à Universidade Positivo nas graduação e na pós graduação junto às disciplinas de Direito Tributário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESTIGARA, Adriana. Da tutela antecipada em sede recursal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 786, 28 ago. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7202. Acesso em: 23 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!