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Da tutela antecipada em sede recursal

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Agenda 28/08/2005 às 00:00

3.DA TUTELA ANTECIPADA EM SEDE RECURSAL.

            Chega-se ao capítulo principal da presente monografia, no qual será cotejada a antecipação de tutela sob a ótica da instância recursal.

            Pretende-se, aqui: a) demonstrar as finalidades da aplicação do instituto da antecipação da tutela no âmbito recursal; b) enumerar as razões doutrinárias e jurisprudenciais que ressaltam a necessidade em se prover a antecipação de tutela também na sede recursal, bem como as fórmulas e interpretações que a autorizam; c) cotejar o procedimento a ser observado para se obter a antecipação da tutela na instância recursal; d) cotejar o comportamento da doutrina e da jurisprudência quanto à possibilidade de antecipação de tutela na sede recursal; e) vislumbrar a antecipação de tutela em face de cada espécie de recurso.

            Como quadro teórico base, valer-se-á principalmente da doutrina elaborada por William Santos FERREIRA, autor de obra específica sobre o tema (Tutela Antecipada no âmbito recursal), e por outros doutrinadores que, embora não com tanta amplitude, vez que trataram de aspectos pontuais da antecipação da tutela no âmbito recursal, como a questão relativa ao denominado "efeito ativo" do agravo de instrumento. Assim, será cotejada também a doutrina engendrada por Roberto ARMELIN, Teori Albino ZAVASKI, Eduardo TALAMINI, Cássio Scarpinella BUENO, Arruda ALVIM, Teresa ARRUDA ALVIM WAMBIER, Sérgio Sahione FADEL, José Miguel Garcia de MEDINA, Ovídio A. Baptista da SILVA, Eduardo CAMBI, entre outros referenciados na indicações bibliográficas.

            3.1. DA NECESSIDADE DE SE INTEGRAR O INSTITUTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA AO ÂMBITO RECURSAL.

            Evidente que de nada valeria todo o esforço legislativo, doutrinário e jurisprudencial engendrado para se arquitetar um instituto apto a antecipar a tutela almejada com a prestação jurisdicional, se seus efeitos não pudessem ser concretizados e sentidos também na fase recursal. Bastaria a interposição de um recurso dotado de efeito suspensivo, orientada pelo intuito protelatório do réu, para frustrar o gozo dos efeitos da tutela. Por tal razão especialíssima, acertadamente frisou William Santos FERREIRA que "a tutela antecipada não pode ser um instituto represado na primeira instância, mas que terá sua função marcante, até com maiores justificativas, no âmbito recursal". E tal assertiva justificou-se no reconhecimento de que a recorribilidade é uma extensão da ordinariedade, devendo ser criada uma forma de, pelo menos, afastar os efeitos danosos da protelação que oportuniza:

            Se a ordinariedade, enquanto tempo necessário para julgamento das causas que são submetidas à apreciação do Poder Judiciário, foi elemento motivador da criação da tutela antecipada de forma genérica em nosso sistema processual, não se pode esquecer que a recorribilidade é uma extensão da ordinariedade e que, se é imprescindível a sua existência, por outro lado é cristalino que, se é imprescindível a sua existência, por outro lado é cristalino que, ao lado do grande número de argumentos que lhe são favoráveis, encontra-se também um agravamento do fato tempo.... [88]

            Igualmente, se aplica ao presente contexto a famosa afirmação de Luiz Guilherme MARINONI, segundo a qual o tempo do processo não pode ser um ônus do autor. Evidentemente que hoje o tempo do processo é ampliado pela recorribilidade das decisões, recorribilidade esta, em grande parte dos casos, desencadeada pelo propósito protelatório do réu.

            Roberto ARMELIN, a respeito, enfatiza:

            Inicialmente, até mesmo por sua posição geográfica, pode-se equivocadamente – interpretar o instituto da antecipação de tutela como concebido para projetar sua eficácia no âmbito do processamento, em primeiro grau de jurisdição, do processo de conhecimento, em que a tutela de urgência, antecipatória de efeitos da pretensão, era desconhecida.

            A questão, todavia, não se cinge à positivação e localização do instituto no Código de Processo Civil, senão que, encerrando princípio geral de Direito (devido processo legal, inafastabilidade do controle jurisdicional), demanda identificação de seu fundamento de eficácia e validade, para, posteriormente, perquerir-se eventual limitação à propagação de seus efeitos. [89] (sem grifo no original)

            Ademais, é preciso considerar que o art. 273 do CPC não estabeleceu momento ou momentos para o pedido de antecipação de tutela, autorizando-se afirmar que pode ser deduzido a qualquer momento. A propósito, este é o posicionamento externado por Fernando César ZENI:

            Inicialmente devemos ressaltar que o autor, via de regra, pleiteia a antecipação de tutela como liminar na própria petição inicial, o que não o impede, no entanto, de requerer a medida a qualquer tempo no processo, pois não há uma oportunidade certa e única imposta com força preclusiva pela lei. [90]

            Voltando-se para a efetividade da prestação jurisdicional, o Código de Processo Civil, sistema orgânico que é, foi sendo dotado, ao longo de sua saga, e especialmente com as reformas mais recentes, de inúmeros dispositivos, cuja intenção é justamente viabilizar o gozo, o quanto antes, da tutela jurisdicional deferida por cognição sumária ou exauriente, assim, por exemplo, a restrição das hipóteses de concessão de efeito suspensivo ao recurso de apelação, possibilitando-se a execução provisória da tutela deferida pela sentença [91], a possibilidade de o relator conferir efeito suspensivo à decisão agravada ou conceder a tutela jurisdicional negada pela decisão agravada, o denominado "efeito ativo" do agravo de instrumento.

            Não há de se estranhar a alusão à cognição exauriente, uma vez que a integração do instituto da antecipação de tutela no âmbito recursal, por vezes, terá o condão de proporcionar meios para se usufruir a tutela prestada por uma sentença ou por um acórdão, cuja decisão neles inserta restou fulcrada na mais ampla produção e exame de provas, mas cujos efeitos ainda não se fizeram sentir. No âmbito recursal, pois, antecipação de tutela nem sempre será sinônimo de cognição sumária, como se ressai das palavras de William Santos FERREIRA, como segue:

            ...a tutela antecipada tem cabimento:

            a) quando não existe o provimento definitivo (sentença ou acórdão) ou;

            b) quando, embora já exista o provimento definitivo, este ainda não gera efeitos.

            Estas circunstâncias ocorrem no âmbito recursal.

            Já abordamos este assunto quando procuramos demonstrar a diferença entre provimento e tutela efetiva (itens 3.1 e 3.3), e vem a calhar a lição de Cândido Rangel Dinamarco: "Inexiste tutela jurisdicional enquanto o comando enunciado na sentença permanecer nó na sentença e não se fizer sentir de modo eficaz na realidade prática da vida dos litigantes". Neste sentido também assevera Ovídio A. Baptista da Silva: "Satisfazer o direito, para nós, é realizá-lo no plano das relações humanas. É fazer com que o núcleo de seu conceito passe a ter existência efetiva no plano da realidade social. Este resultado nada tem a ver com o prévio reconhecimento judicial de sua existência eventualmente proclamada por uma sentença". [92] (sem grifos no original)

            Uma das atitudes do legislador processualista para alcançar o mister da efetividade foi, sem dúvida, a restrição ao manejo das ações autônomas de impugnação (mandado de segurança, medida cautelar), também denominadas pela doutrina e pela jurisprudência de sucedâneos recursais, dada a habilidade com que satisfazem as finalidades buscadas pelos recursos. Obstando a adoção dos sucedâneos recursais, o sistema privilegiou a busca pela solução das questões dentro do mesmo processo na qual elas se originaram, evitando, assim, o tumulto processual.

            E esse mérito, afirma Tereza ARRUDA ALVIM WAMBIER, deve-se à inserção no sistema do art. 273 do CPC:

            Ainda que a nosso ver esta hipótese não venha a ser comum, não vemos óbice a que se possa conceder a tutela antecipada no tribunal, tendo em vista seus pressupostos e sua finalidade. O advento do art. 273 muito provavelmente acabará com o uso das cautelares com função satisfativa, que não lhe é própria. A reforma visou, entre outras coisas, revitalizar o principal e matar o sucedâneo: é o que deve ocorrer com o uso inadequado do mandado de segurança, para dar efeito suspensivo ao recurso, em face dos dizeres do atual art. 558, caput, do CPC.. As cautelares satisfativas consistiam na solução criativa e inortodoxa dos advogados e dos tribunais, para tapar um buraco, que o sistema não tem mais. [93] (sem grifos no original)

            Hoje, pode-se afirmar que o sistema processual brasileiro está arquitetado de forma a se proporcionar ao jurisdicionado o gozo da tutela deferida, afastando, principalmente, a nociva atitude protelatória do réu. Mais do que isso, a doutrina e a jurisprudência também evoluíram, ao extraírem dos dispositivos insertos no codex essa mais valia, oportunizando a concretização do tripé: ordem jurídica justa, efetividade e instrumentalidade.

            Tendo em vista que o sistema recursal está dotado de meios para oportunizar o gozo da tutela jurisdicional de forma rápida e efetiva, não tornando a oportunidade de recorrer um impasse e em outros casos tornando o recurso um meio de obter a tutela de modo antecipado, vislumbrar-se-á quais são estes meios e como atuam, cotejando a questão da antecipação de tutela em face de cada espécie recursal, o que se propõe na seqüência do presente trabalho monográfico.

            3.2Da antecipação de tutela através do recurso de agravo de instrumento.

            Dúvida não há de que os operadores jurídicos sempre buscaram obter meios de se antecipar os efeitos da tutela jurisdicional almejada.

            Noticia a doutrina que, num passado não muito distante, a recorribilidade das decisões liminares era restrita. No Código de Processo Civil de 1939, as liminares possessórias e liminares em mandado de segurança eram irrecorríveis. Na seqüência, com o Código de 1973, passou-se a se admitir a recorribilidade genérica das decisões interlocutórias através do recurso de agravo de instrumento, desprovido, em regra, todavia, de efeito suspensivo, o que compelia o operador jurídico a se utilizar do mandado de segurança ou da ação cautelar para obtê-lo.

            Essa prática reiterada contribuiu para convencer a jurisprudência, como informa William Santos FERREIRA, de que:

            ...o agravo de instrumento, solitariamente considerado, não era meio hábil a expurgar os danos irreparáveis ou de difícil reparação advindos da decisão impugnada, motivo pelo qual a adoção do mandado de segurança apresentava-se como complementação ao recurso interposto e meio, portanto, hábil a expurgar o referido perigo. [94]

            Por isso, passou-se a admitir a concessão do efeito suspensivo, mas tão somente nas taxativas hipóteses (numerus clausus) preconizadas pela antiga redação do art. 558 do CPC [95].

            Em nítido aperfeiçoamento, o art. 558 do CPC foi reformado pela Lei n.º 9.139, de 30 de novembro de 1995, passando a ter a seguinte redação:

            O relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara.

            Parágrafo único: Aplicar-se-á o disposto neste artigo às hipóteses do art. 520. (sem grifo no original)

            Possibilitando a concessão do efeito suspensivo nos casos dos quais pudesse resultar lesão grave e de difícil reparação, o agravo de instrumento passou a proporcionar a antecipação da tutela, entendimento este que ficou expresso na decisão abaixo citada:

            Em sua nova sistemática, o recurso de agravo, que será dirigido diretamente ao Tribunal (art. 524 do CPC), enseja que o relator, "a requerimento do agravante" e desde que seja "relevante a fundamentação", suspenda o cumprimento da decisão agravada, entre outros, nos "casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação" (CPC, art. 558). O desiderato do legislador foi, indubitavelmente, o de conferir ao relator a faculdade de antecipar os efeitos do futuro e provável juízo de provimento do agravo e, com isso, assegurar a utilidade dessa decisão, que estaria comprometida sem uma providência oposta à que decorre da decisão agravada.

            A finalidade da norma, e não a estrita literalidade do dispositivo, é que deve presidir a interpretação do art. 558 do CPC. Nesse pressuposto, impõe-se concluir que o relator do agravo poderá, sendo relevantes os fundamentos e havendo perigo de dano, determinar as providências consistentes na antecipação do futuro e provável juízo de provimento do recurso, para o efeito de suspender o cumprimento do ato agravado, ou, sendo ele omissivo ou indeferitório, para adiantar a tutela por ele negada.

            Assim, mesmo em caso de urgência, é o agravo de instrumento, e não a via autônoma da ação do mandado de segurança, o meio processual adequado para controlar decisão judicial que indefere pedido de antecipação da tutela. [96] (sem grifos no original)

            Ampliada a concessão do efeito suspensivo ao recurso de agravo de instrumento também para outros casos dos quais pudesse resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, instaurou-se ampla discussão na doutrina, ante a freqüente utilização do mandado de segurança para atacar as decisões pelas quais o relator concedia efeito suspensivo ao recurso de agravo de instrumento, levando-se a indagar se tais decisões não resultariam da discricionariedade judicial, esta entendida como a faculdade que se concede ao agente público de, em determinado caso concreto, escolher, segundo os critérios subjetivos de conveniência e oportunidade [97], qual a opção, das legalmente aceitar, deve seguir e, em sendo assim, se seria possível impugná-las por meio do mandado de segurança.

            A doutrina se dividiu. Uns reconheciam no dispositivo processual supra mencionado a outorga de poder discricionário ao relator, passando este a ser dotado de faculdade para conceder o referido efeito, após cotejar a existência dos pressupostos retro mencionados no caso apreciado, outros entendiam que o julgador teria o dever de suspender os efeitos da decisão agravada.

            Posicionando-se pela existência de uma "faculdade", posicionaram-se: a) Humberto THEODORO JUNIOR: "Sempre, pois, que o relator se deparar com demonstrado risco de dano grave e de difícil reparação e com recurso dotado de relevante fundamentação, terá o dever e não a faculdade de suspender os efeitos da decisão recorrida, se a parte requerer a medida autorizada pelo art. 558 do CPC." [98]; b) Alcides Mendonça LIMA: "Não é um direito assegurado ao vencido recorrente, porquanto ao juiz se outorga a faculdade de deliberar se é, ou não, possível, sustar a execução da ordem." [99]; William Santos FERREIRA: "Como se vê, trata-se de uma técnica utilizada pelo legislador para acompanhar a intensa mobilidade das sociedades de nossos dias (...). Exemplo dessa preocupação legislativa encontramos no caput do art. 558 do Código de Processo Civil, que (...), em complementação optou por também trazer conceitos vagos: "... e em casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação...".

            Aceitando a tese de que a concessão do efeito suspensivo constituía-se em um dever do relator e direito do agravante, manifestaram-se: a) Carlos Silveira NORONHA: o legislador teria acertado em submeter à vontade do agravante a suspensão da execução do ato judicial gravoso. [100]; b) Kazuo WATANABE: "Se presentes os pressupostos legais, a antecipação da tutela é um direito, e não medida dependente de discricionariedade do juiz." [101]; c) Athos Gusmão CARNEIRO: "Em suma, não se cuida de faculdade do juiz, ou de poder discricionário, mas de um direito subjetivo processual que a parte poderá exigir da justiça". [102]

            Eduardo TALAMINI, procurando verificar a existência de discricionariedade e seu grau no âmbito das tutelas de urgência, concluiu que:

            a) com relação à definição concreta dos conceitos jurídicos indeterminados previstos nos dispositivos legais que disciplinam a tutela de urgência ("prova inequívoca", "fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação", "verossimilhança da alegação", "abuso do direito de defesa", entre outros), não há discricionariedade, eis que "A atividade de concreta determinação do "conceito vago" envolve certa "liberdade" do julgador, a qual será exercida levando-se em conta as "máximas da experiência", os valores reinantes na comunidade e assim por diante. Mas, nela, não há nenhuma discricionariedade." [103];

            b) sobre o estabelecimento de aparente facultatividade de atuação nas expressões "o juiz poderá", "a tutela antecipada poderá ser revogada", entre outras, concluiu também não autorizarem o emprego da discricionariedade, dizendo que: "... o agente público, no exercício de função pública, jamais possui simples "faculdade" (...). Todo o "poder" que se lhe confere tem em vista uma finalidade maior, o interesse público. Assim, quando a lei dá ao juiz determinado poder, igualmente o incumbe do dever de desempenhar esse poder adequadamente." [104]

            Por fim, uma última hipótese: c) quanto à atuação do magistrado quando lhe é disponibilizada uma pluralidade de medidas destinadas à efetivação da tutela urgente, concluiu que cabe ao juiz, dentro de certos limites, "adotar a(s) providência(s) mais apta(s) à adequada e integral efetivação da tutela deferida". [105]

            Sobre o efeito suspensivo do agravo de instrumento, Tereza ARRUDA ALVIM WAMBIER concluiu que "Só se pode então dizer que conceder efeito suspensivo ao agravo, com base no art. 558 do Código de Processo Civil é ato de natureza discricionária, exclusivamente se este termo for usado em sentido impróprio", vale dizer, como sinônimo de possibilidade de concessão conforme o prudente arbítrio do julgador. [106]

            Assim entendendo-se, não há óbice para a impetração de mandado de segurança face as decisões que indeferem a concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento.

            O sistema legislativo evoluiu mais um pouco. Hoje, o art. 527, III, do CPC, admite expressamente, por força da redação dada pela Lei n.º 10.352, de 26 de dezembro de 2001, além da concessão de efeito suspensivo ao recurso de agravo de instrumento (fazendo remissão ao rol exemplificativo do art. 558 do CPC), o deferimento, em antecipação de tutela, total ou parcial, da pretensão recursal ou, em outras palavras, da providência negada em primeira instância, in verbis:

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            Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinente, o relator:

            (...)

            III – poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso, ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão. (sem grifo no original)

            A possibilidade de concessão, por intermédio da decisão do relator no agravo de instrumento, da antecipação de tutela negada em primeira instância, não é novidade instaurada diante da reforma do art. 527, III, do CPC. Antes da criação legislativa, precisamente com a edição da Lei n.º 9.139/95, formulou-se interpretação doutrinária posicionando-se por tal possibilidade.

            Essa interpretação partiu, aliás, de elogiável crítica à Lei n.º 9.139/95, que instituiu nova disciplina para o recurso de agravo, diante da convicção de que o agravo de instrumento, através do efeito suspensivo tão somente, não poria fim ao indiscriminado manejo do mandado de segurança [107], como sucedâneo recursal, eis que ficariam carentes de tutela aquelas situações em que o pedido de antecipação restasse negado, como ressaltou Eduardo TALAMINI, quem preconizou a adoção do "efeito ativo":

            Assim, de duas uma: (a) ou se interpretava teleologicamente o art. 558 do CPC que estava para ser implantado – entendendo-se que ele autorizaria não só a suspensão "do cumprimento da decisão" agravada (como diz literalmente o preceito), mas também a própria concessão antecipada da providência negada pelo órgão a quo e que se busca através do recurso; (b) ou, para esses casos (que tendem a ser cada vez em maior número, sobretudo após a realista adoção generalizada da tutela de urgência em nosso sistema), continuaria sendo usado o mandado de segurança.

            Concluíamos ponderando que a mesma ratio que se punha para a admissão da suspensão do cumprimento da decisão agravada servia para autorizar a concessão antecipada, no próprio agravo, da providência ativa que a decisão agravada negou: a garantia do resultado do recurso.

            Assim defendíamos o cabimento do efeito "ativo". [108]

            No mais, procurou o autor acima citado justificar a concessão do efeito ativo ao agravo de instrumento como forma de evitar danos:

            Mas – notávamos – não é apenas a concessão de efeito suspensivo (propriamente dito) que se presta a garantir o resultado do recurso – e, no mais das vezes, indiretamente, do processo como um todo. Há casos em que a decisão impugnada deixou de conceder uma providência (ativa) pleiteada pelo recorrente. Em certas situações, há urgência na obtenção de tal providência. O simples futuro provimento do recurso contra sua denegação poderia vir a ser inútil – vez que já concretizado o dano que se pretendia evitar. É precisamente o que se dá em relação às decisões que indeferem tutelas de urgências (antecipação, cautelares, liminares em mandados de segurança ou em outras ações especiais). [109] (sem grifos no original)

            Outros doutrinadores defendem também a concessão do chamado "efeito ativo", amparados, todavia, no art. 273 do CPC. Dizem eles que o relator estaria autorizado a antecipar a tutela almejada através do agravo com fulcro neste dispositivo. Porém, conforme dicção do autor acima citado, o apelo ao art. 273 do CPC serviria, tão somente, para reforçar o discurso em prol do "efeito ativo", vez que nem todas as providências antecipadas pelo relator seriam genuinamente antecipatórias da tutela, esta enquanto o bem da vida (objeto mediato) pretendido pelo jurisdicionado. Este o posicionamento, por exemplo, de Vicente GRECO [110], para quem, embora o mandado de segurança não deva ser afastado, é possível requerer, com base no art. 273 do CPC, a antecipação da tutela relativamente à pretensão definitiva do recurso.

            Tereza Arruda Alvim WAMBIER convenceu-se sobre a possibilidade de conceder-se o chamado "efeito ativo" ao agravo de instrumento, visualizando com esta possibilidade o fim do apelo ao mandado de segurança. A esse respeito, assevera:

            Hoje pensamos que, nesta hipótese, em vez de se fazer diretamente uso do mandado de segurança, o correto é considerar-se que o próprio relator possa conceder efeito "ativo" ao agravo, adiantando o "provável" julgamento do recurso, enquanto este está tramitando (e se diz provável, porque a parte deve demonstrar aparência de bom direito) não com base no art. 558, caput, que é regra excepcional, mas com base no art. 273, I, do CPC, do mesmo modo deve ocorrer com relação à apelação. [111]

            Roberto ARMELIN também se posicionou favoravelmente à concessão do "efeito ativo", nos seguintes termos:

            Todavia, nos casos em que a decisão agravada é negativa, ou seja, deixa de produzir, na esfera jurídica material das partes, o imprescindível efeito de evitar o advento dos danos irreparáveis ou de difícil reparação, a inovação consistente na possibilidade de concessão do efeito suspensivo à decisão agravada, na nova disciplina do agravo, é totalmente inócua e incapaz de impedir a concreta ocorrência dos aludidos danos.

            Remanesce, destarte, em sede de segundo grau de jurisdição, lacuna no sistema processual que sujeita o jurisdicional, em princípio, à sorte da eficácia da decisão interlocutória negativa de sua pretensão. (...)

            Resta-nos admitir a antecipação, total ou parcial, da tutela postulada no recurso de agravo, que seria inteiramente apta a impedir a efetivação dos aludidos prejuízos de difícil ou impossível reparação. [112]

            Por sua vez, Humberto THEODORO JUNIOR vislumbra que a tutela de urgência necessita ser efetiva ao máximo, não podendo restar impotente diante das situações em que a providência jurisdicional almejada pela parte seja negada, sendo válida, para tanto, a concessão do "efeito ativo":

            A tutela preventiva em segundo grau, durante o trâmite do agravo, é normalmente exercida pelo relator, por meio do expediente da suspensão da decisão impugnada (CPC, art. 558).

            Essa providência, todavia, mostra-se impotente para evitar o dano da decisão abusiva, quando o seu teor é negativo. De nada vale, com efeito, para o agravante obter a suspensão, por exemplo, de uma decisão que lhe indeferiu uma liminar qualquer. A situação de risco de dano continuaria a mesma.

            Em semelhante conjuntura, cabe ao relator, dentro dos poderes de antecipação de tutela, que se exercitam em qualquer fase do processo e em qualquer grau de jurisdição, tomar, provisoriamente, a decisão que, for compatível com a solução final do agravo. Desde, é lógico, que este esteja apoiado em relevante fundamentação e ocorra o efeito perigo de dano grave e de difícil reparação, caso tenha que se aguardar o julgamento do recurso, como exige o art. 273 do CPC. [113]

            William Santos FERREIRA assevera que tal providência recebeu da doutrina o nome de efeito suspensivo ativo do agravo de instrumento e operacionalizou o manejo do recurso em face de uma decisão que deixou de conceder um proteção jurisdicional pleiteada pelo recorrente e isso com o intuito de proporcionar que eventual resultado favorável do recurso possa ser concretizado. De sua obra, colhe-se: "O remédio a ser utilizado quando denegada em primeira instância a tutela antecipada é a interposição do agravo de instrumento, com pedido expresso de concessão pelo relator da antecipação dos efeitos da tutela recursal, ou, de forma mais singela, a concessão pelo relator da tutela antecipada denegada pelo juízo a quo." [114]

            Houve também doutrina contrária à interpretação engendrada por Eduardo Talamini, relativa à possibilidade do "efeito ativo" fulcrada no art. 558 do CPC. José Rogério CRUZ E TUCCI, por exemplo, entendeu que a preconizada providência ativa por parte do relator contrariaria "o sistema processual vigente", vez que o art. 527, II, apenas autorizaria a suspensão da eficácia da decisão agravada, concluindo que "... a ação de MS continuará sendo o remédio adequado para atacar ato proveniente de autoridade judicial, desde que concorrentes os pressupostos legais." [115]

            Barbosa MOREIRA concorda com a providência aqui cotejada, mas, todavia, prefere contemplá-la sob a denominação "antecipação da tutela recursal". A propósito, sua posição parafraseada por William Santos FERREIRA:

            Como bem ressalta Barbosa Moreira, evidentemente não se trata de "suspender" a decisão agravada, eis que suspender o que foi negado nada representa – o que o agravante pretende é substituir uma negação por uma afirmação. Talvez em razão disto é que vem sendo utilizada a equivocada terminologia "efeito ativo" – equivocada, porque estar-se-ia dizendo que suspender os efeitos de uma decisão seria um "efeito passivo", o que evidentemente não guarda qualquer sintonia, pois tanto a interposição do recurso quanto a decisão do relator, inclusive suspendendo os efeitos da decisão impugnada são situações processualmente ativas; e, quanto ao "efeito em si", como se verá, a concessão da tutela antecipada (o batizado "efeito ativo") é decorrência do efeito devolutivo, daí preferirmos a denominação antecipação da tutela recursal. A relação existente entre os dois – efeito suspensivo e "efeito ativo" -, que justifica a possibilidade do segundo, é o tratamento desigual decorrente da posição que sustenta o cabimento tão-somente do efeito suspensivo. [116]

            A jurisprudência também mostrou-se favorável à concessão do "efeito ativo", como forma de se oportunizar uma tutela de urgência plena. Nossos tribunais tiveram oportunidade de examinar a questão, havendo reiteradas decisões a favor da possibilidade de concessão de efeito ativo (ou antecipação de tutela recursal), inclusive do STJ: "Ainda que a decisão interlocutória seja de conteúdo negativo, a via adequada para impugná-la é o recurso de AI, ao qual pode ser conferido o denominado ´´efeito suspensivo ativo". [117]

            Dos tribunais ordinários são colacionados os arrestos abaixo:

            CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – SUPRESSÃO DE VANTAGENS – REDUÇÃO DE PROVENTOS – LIMINAR – AGRAVO DE INSTRUMENTO -EFEITO SUSPENSIVO ATIVO – 1. Supressão de vantagens incorporadas aos proventos do agravante. Sobrestamento do ato administrativo que determinou os descontos para ressarcimento ao erário. Indeferimento da liminar no mandado de segurança. 2. Atribuição de efeito suspensivo ativo ao agravo de instrumento interposto. 3 -redução do valor dos proventos viola o princípio da irredutibilidade dos vencimentos bem como do direito adquirido. A idade avançada do agravante, com mais de 84 (oitenta e quatro) anos, justifica a urgência da medida concedida. 4. Presentes os requisitos do art. 7°, II, da Lei n° 1533/51, que autorizam o deferimento da liminar em mandado de segurança, e os pressupostos do art. 558, do CPC, impõe-se a atribuição de efeito suspensivo ativo ao agravo, mantendo-se a decisão impugnada. 5. Agravo regimental improvido. [118] (sem grifos no original)

            AGRAVO DE INSTRUMENTO – MANDADO DE SEGURANÇA – EFEITO SUSPENSIVO ATIVO – CONCESSÃO DE LIMINAR – EXISTÊNCIA DO FUMUS BONI JURIS E PERICULUM IN MORA – POSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO – Verificada a existência do fumus boni juris e do periculum in mora, o agravo de instrumento se mostra adequado para reformar a decisão monocrática que deixou de conceder a liminar em mandado de segurança, nos moldes delineados no artigo 7º, inciso II, da Lei nº 1.533/51. [119] (sem grifo no original)

            AGRAVO DE INSTRUMENTO – PEDIDO DE EFEITO ATIVO À DECISÃO QUE INDEFERIU LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA – PARCELAMENTO DE DÉBITO TRIBUTÁRIO – Lei Estadual nº 11.117/99 que alterou a redação do art. 24 da Lei Estadual nº 10.789/98. Estabelecimento de novo prazo para solicitação do benefício. Interpretação teleológica. Presentes o fumus boni juris e o periculum in mora. Liminar concedida. Recurso provido. [120] (sem grifos no original)

            Demonstra-se, assim, que uma das formas preconizadas pelo sistema recursal brasileiro para se obter a antecipação da tutela jurisdicional, obstando-se os efeitos de uma decisão com ela incompatível ou proporcionando o seu gozo, após seu pedido ter sido negado em primeira instância, é o manejo do recurso de agravo de instrumento, especialmente diante da circunstância de tais providências serem autorizadas pela pessoa do relator, antecipadamente à análise da questão pelo colegiado, afastando-se os efeitos perniciosos do decurso do tempo.

            3.3. DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA NA SENTENÇA E SUA IMPUGNAÇÃO.

            Muitas são as controvérsias que pairam em torno da antecipação da tutela, a sentença e sua impugnação. A primeira delas que será aqui tratada diz respeito à possibilidade de antecipação da tutela no bojo da sentença.

            Além desta questão, cotejar-se-á a relativa à impugnação da antecipação deferida na sentença e a forma mais viável para sua impugnação, os efeitos atribuídos ao recurso que a impugna, a questão inerente à subsistência da antecipação concedida na sentença ou antes de sua prolação, sendo por esta confirmada ou não.

            3.3.1.Da Concessão da Antecipação da Tutela no Bojo da Sentença.

            A controvérsia inerente ao presente tópico parte do pressuposto de que a antecipação pode ser concedida no início do processo ou em seu curso, nunca na sentença, sob o argumento de que a finalidade do instituto disciplinado no art. 273 do CPC seria antecipar a tutela que o autor busca na petição inicial e que será obtida na sentença, se procedente sua pretensão. Para essa corrente, não se justifica a concessão da antecipação de tutela na sentença, pois neste momento não mais está antecipando a tutela, mas a concedendo definitivamente. Tal corrente doutrinária também se embasa na expressão "final julgamento" constante do §5º do art. 273, do CPC, entendendo-a como obstativa da aplicação da antecipação de tutela no âmbito recursal.

            Outras discussões giram em torno de se saber se a antecipação de tutela concedida na sentença tem natureza jurídica de decisão final ou interlocutória, para o fim de se determinar qual será o recurso hábil a impugná-la, bem como se tal recurso tem o condão de suspender a antecipação concedida.

            Esta questão será tratada na seqüência.

3.3.2.Do efeito suspensivo do recurso de apelação e da execução provisória da tutela deferida na sentença.

            A doutrina dominante manifesta-se no sentido de não haver óbice à concessão da antecipação dos efeitos da tutela na sentença, desde que estejam presentes os requisitos exigidos pelo art. 273 do CPC.

            A antecipação da tutela através do recurso de apelação é questão que atrai maiores controvérsias. Como diz Eduardo TALAMINI, "Há, por fim, ainda outro grupo de questões que têm sido objeto de intensa disputa. Dizem respeito às relações entre a antecipação da tutela e o efeito suspensivo da apelação". [121]

            A questão, singelamente considerada, gira, tal como no agravo de instrumento, em torno dos efeitos do recurso.

            A apelação é dotada ex lege de efeito devolutivo e suspensivo, pois, segundo dicção do art. 515 do CPC, "... devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada" (tantum devolutum quantum appellatum), e, por força do art. 520 do CPC, "... será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo." Todavia, este mesmo dispositivo excepciona algumas hipóteses, taxativamente enumeradas, hábeis a, acaso configuradas na demanda, impedirem a atribuição do efeito suspensivo ao recurso de apelação, in verbis:

            Será, no entanto, recebida só no efeito devolutivo, quando interposta de sentença que:

            I – homologar a divisão ou a demarcação;

            II – condenar à prestação de alimentos;

            III – julgar a liquidação de sentença;

            IV – decidir o processo cautelar;

            V – rejeitar liminarmente embargos à execução ou julgá-los improcedentes;

            VI – julgar procedente o pedido de instituição de arbitragem;

            VII – confirmar a antecipação dos efeitos da tutela.

            A conseqüência de se inibir o efeito suspensivo da apelação é autorizar, desde logo, a execução provisória, como se ressai do art. 521 do CPC: "Recebida a apelação em ambos os efeitos, o juiz não poderá inovar no processo; recebida só no efeito devolutivo, o apelado poderá promover, desde logo, a execução provisória da sentença, extraindo a respectiva carta." (sem grifos no original)

            O teor deste dispositivo, aliás, é confirmando pelo art. 587, inserto no Livro do Processo de Execução, quando declara que a execução da sentença é provisória, quando a sentença for impugnada mediante recurso, recebido só no efeito devolutivo.

            Para não deixar de tecer comentários sobre a execução provisória da sentença, diga-se que o dispositivo que a disciplina, o art. 588, bem como o 522, acima referido, foram consideravelmente reformados pela Lei n.º 10.444, de 07.05.2002.

            O art. 520 passou a contemplar mais uma hipótese: a confirmação da antecipação dos efeitos da tutela. Situação esta que será analisada na seqüência com mais acuidade.

            E a reforma promovida no art. 588, por sua vez, teve o condão de acelerar e tornar mais concreta a satisfação do direito reconhecido no pronunciamento judicial, ao autorizar o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de domínio ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, uma vez prestada caução idônea, requerida e prestada nos próprios autos da execução (inc. II), salvo nos casos de crédito de natureza alimentar, até o limite de 60 (sessenta) vezes o salário mínimo ou quando o exeqüente se encontrar em estado de necessidade (§2º.).

            Diante do exposto até aqui, pode-se dizer, a priori, que, para a hipótese de sentença de procedência, o fato de se desprover eventual recurso de apelação do efeito suspensivo defere ao autor uma antecipação de tutela, à medida que o autoriza a promover a execução provisória da sentença, passando a gozar, imediatamente, ainda mais com a reforma do art. 588 do CPC, dos efeitos da tutela.

            No mais, explicita-se que, para uma cognição integral da questão, faz-se necessário cotejar as seguintes questões, as quais serão tratadas em itens apartados: a) a antecipação da tutela diante da sentença de improcedência e da extinção do processo, sem julgamento do mérito; b) a antecipação da tutela confirmada pela sentença; d) a antecipação da tutela concedida pela sentença; d) a antecipação da tutela pleiteada após a sentença e antes da remessa da apelação ao tribunal; e) a antecipação da tutela pleiteada já no tribunal.

            3.3.2.Da Antecipação da Tutela Diante da Sentença de Improcedência e da Extinção do Processo, Sem Julgamento do Mérito.

            Duas são as hipóteses em que, por incompatibilidade lógica, o provimento que antecipou a tutela não subsiste ante o advento da sentença: quando esta extingue o processo, sem julgamento do mérito, ou quando esta declara a improcedência do pedido do autor, ainda que não se manifeste expressamente sobre a antecipação. E isso porque, como ensina Eduardo TALAMINI, "... a mantença da antecipação, que pressupõe juízo de plausibilidade favorável ao beneficiário da medida, e a sentença que lhe foi desfavorável, que descarta necessariamente tal plausibilidade. Daí ser até mesmo supérflua a expressa menção à revogação da medida urgente, na sentença de improcedência." [122]

            Tal posicionamento, todavia, não deixou de ser contestado por outros doutrinadores. Luiz Guilherme MARINONI, por exemplo, defendeu a possibilidade de se manter a antecipação de tutela emitida antes da sentença de improcedência, nos seguintes termos: "... se é justo impedir o autor de executar a sentença – que declarou seu direito – para se preservar a esfera jurídica do réu, não há razão para não se reputar justa a manutenção da tutela inibitória antecipada – no caso em que a sentença declarou inexistente o direito que foi suposto na tutela sumária – quando se teme que o autor possa ter seu direito violado" [123]. No mais, referido autor fulcrou a defesa pela manutenção da tutela antecipada mesmo em face de sentença de improcedência na questão da demora do processo, assinalando:

            A tutela antecipatória não deve ser tão excepcional quanto imaginam alguns, já que a demora do processo, principal responsável pela crise da justiça civil, não só excepcionalmente põe em risco os direitos. Exigir uma evidência que torne impossível a antecipação da tutela é uma opção distante da realidade da justiça civil; uma opção cômoda mas não séria. Afinal, o juiz ciente da sua responsabilidade sabe que pouca coisa pode ser mais injusta do que uma vitória processual que signifique uma derrota no plano da realidade social. Aliás, não custa lembrar o alerto de Piero Pajardi, em testemunho de jurista e de Presidente da Corte de Apelação de Milão: de garantismo se morre! [124]

            Referido autor teve como paradigma a lição engendrada por Ovídio Baptista da SILVA, para quem:

            ... não se leva em consideração a circunstância de que a revogação prematura do provimento liminar, ou mesmo da medida cautelar concedida em sentença final cautelar, deixará o direito litigioso sem qualquer proteção assegurativa (sic) durante a tramitação dos recursos, em muitos casos extremamente demorada, de tal modo que a reformada sentença, nos graus superiores de jurisdição, poderia deparar-se com uma situação de prejuízo irremediável ao direito somente agora reconhecido em grau de recurso. Para que situações desta espécie sejam evitadas, recomenda-se que o magistrado – sensível às circunstâncias especiais do caso concreto – disponha, em sua sentença contrária à parte que obtivera a provisional, que esta medida liminar, não obstante a natureza do julgamento posterior divergente, conserve-se eficaz até o trânsito em julgado da sentença a ser proferida no juízo do recurso. Esta parece ser a tendência contemporânea da doutrina italiana (...)". [125] (sem grifo no original)

            Eduardo TALAMINI não duvida da possibilidade de realmente ocorrer o risco de o provimento recursal, que venha a acolher a pretensão do autor, reste ineficaz ante a ausência de antecipação. Todavia, prega que tal questão há de ser dirimida pelo tribunal competente para o julgamento da apelação, desde que haja requerimento do recorrido pela concessão da tutela antecipada. [126]

            José Roberto dos Santos BEDAQUE defende ser necessário que o juiz, no momento da sentença, casse os efeitos da antecipação de tutela. E assim se posiciona porque faz analogia com o caso da sentença que julga conjuntamente a demanda principal e a cautelar, cuja apelação em relação a esta não é dotada de efeito suspensivo, por força do art. 520, IV, do CPC:

            ... como a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional tem natureza cautelar, a solução pode ser a mesma, ou seja, o efeito suspensivo da apelação contra a sentença de rejeição da tutela principal, em cujo processo tenha havido a antecipação dos efeitos dessa mesma tutela, não alcança esse provimento, que perde eficácia de imediato. Deverá o juiz, portanto, julgar improcedente o pedido principal e cassar os efeitos antecipados. Neste aspecto, estará decidindo sobre a pretensão antecipatória, revogando-a. Tal capítulo da sentença versa apenas a tutela antecipada, cuja natureza é cautelar, aplicando-se, portanto, o disposto no art. 520, IV, do Código de Processo Civil. [127]

            3.3.4Da tutela antecipada confirmada e concedida pela sentença diante da impugnação.

            Como se viu retro, o art. 520 do CPC foi reformado, passando a atribuir efeito suspensivo também ao recurso de apelação interposto face a sentença que tenha confirmado a antecipada de tutela.

            Antes dessa reforma, o ordenamento brasileiro carregava consigo a incoerência de inviabilizar a atribuição de efeito suspensivo à apelação interposta face a sentença que confirmava a antecipação de tutela, mesmo autorizando a execução imediata desta (art. 273, §3º, do CPC).

            Neste sentido, pronunciou-se José Rogério CRUZ e TUCCI: "Na verdade, a incoerência do sistema já havia sido assinalada mais de uma vez por Athos Gusmão Carneiro, ao preconizar que o provimento liminar, lastreado em mero juízo de verossimilhança, poderia ser executado, enquanto a sentença, respaldada em juízo de certeza, ficava com sua eficácia contida por força da interposição da apelação!" [128]

            Na mesma esteira, a lição de José Roberto BEDAQUE: "... o ato decisório escudado em mero juízo de verossimilhança, que pressupõe atividade de cognição superficial, tenha a força de gerar efeitos imediatos, enquanto a sentença, resultante de cognição exauriente, tenha seus efeitos suspensos até quando do julgamento da apelação." [129]

            A doutrina, todavia, não se quedou inerte face a esta incoerência legislativa, como se vê das citações acima. Propugnou que a decisão antecipatória da tutela concedida antes da sentença seria eficaz de per si, não podendo ser atingida por eventual recurso de apelação recebido no duplo efeito, isto é, não deixaria de ser eficaz pela interposição do recurso.

            Deste modo posicionaram-se, entre outros, Eduardo TALAMINI, Arruda ALVIM, José Roberto dos Santos BEDAQUE, Cássio Scarpinella BUENO.

            Luiz Guilherme MARINONI pregou que a tutela antecipatória é eficaz de per si, refutando a alegação de que a mesma poderia ser simplesmente substituída pela sentença:

            A tutela sumária que produz antecipadamente o efeito executivo que é próprio da sentença condenatória, abrindo oportunidade para a antecipação da realização do direito, não pode ser simplesmente substituída pela sentença condenatória trânsita em julgado. Quando ocorre o trânsito em julgado da sentença antes da plena realização do direito, a sentença de cognição exauriente e definitiva empresta carga declaratória à decisão proferida com base em cognição sumária, transformando a tutela antecipada em tutela final. A "execução" prossegue como definitiva não porque pode levar à realização do direito, mas sim porque o direito em que se funda já foi declarado com força de coisa julgada material. [130] (sem grifos no original)

            José Roberto dos Santos BEDAQUE foi outro doutrinador que se manifestou contrário à influência do provimento que concedeu a antecipação da tutela pelo efeito suspensivo atribuído ao recurso de apelação, como parafraseado por William Santos FERREIRA: "embora não exista previsão expressa no artigo 520 do Código de Processo Civil, o efeito suspensivo não incide sobre a antecipação concedida, já que, se assim não se entender, restariam completamente frustrados os objetivos do novo instituto, e é justamente para este objetivo que o juiz concede a antecipação." [131]

            A jurisprudência também se manifestou concordância com a interpretação dada pela doutrina. Em acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, restou assentado que: "O processo nunca mais existirá para embaraçar o direito material das partes, porque a antecipação da tutela é uma arma contra a nocividade do efeito suspensivo...". [132] (sem grifo no original)

            No mais, William Santos FERREIRA, o sistematizador da tutela antecipada no âmbito recursal, arrolou sete fundamentos que militam em prol da eficácia da antecipação da tutela concedida ou confirmada na sentença: 1º fundamento) "a sistemática da tutela antecipada não permite a incidência do efeito suspensivo sobre ela, conforme a literalidade genérica do artigo 520 poderia induzir"; 2º fundamento) a concessão da tutela antecipada é concedida especificadamente na sentença por saber o juiz que, se apenas proferir sentença, os efeitos daquela não se farão mais sentir; 3º fundamento) não se pode impedir a concessão da tutela antecipada na sentença amparado na expressão "até final julgamento", constante do art. 273, §5º, do CPC, uma vez que tal expressão é empregado como solução final e definitiva do conflito; 4º fundamento) o conhecimento que o juiz tem na fase de prolação da sentença autorizam ainda mais a concessão da antecipação da tutela, a qual se justifica em razão da provável impugnação recursal; 5º fundamento) o art. 520, VII, do CPC afasta implicitamente o efeito suspensivo em relação à antecipação de tutela concedida na sentença; 6º fundamento) a decisão que concede a antecipação da tutela é eficaz imediatamente e não encerra o litígio; "mesmo obtido o bem da vida almejado (portanto eficácia imediata!), o processo precisa continuar. Se não tivesse eficácia imediata, não haveria razão para a ressalva, uma vez que, se o autor não consegue o que almeja, é claro que continuará na sua busca"; 7º fundamento) o recurso que deve atacar a sentença que concede a antecipação da tutela é a sentença diante da "decisão de conteúdo mais abrangente". [133]

            Araken de ASSIS, porém, criticou a prática predominante nos tribunais, consistente em deferir a tutela antecipada um pouco antes da sentença, asseverando que "antecipar o juiz pouco antes da sentença, nas condições anteriores, em ato apenas formalmente autônomo, é reprovável burla à lei". [134]

            No mesmo sentido, exortou sua discordância, Antônio Cláudio da Costa MACHADO: "Atente-se para o fato de que o encerramento da audiência de instrução, seguida da apresentação de memoriais, é obstáculo à outorga de tutela antecipada, porque o juiz já está em condições de prover tutela definitiva. Além do mais, a decisão antecipatória que se conceda na sentença é inexeqüível de imediato, se o réu interpuser apelação com efeito suspensivo (art. 520, intio)". [135]

            Roberto ARMELIM entendeu que não seria possível a antecipação da tutela, em grau recursal, com amparo no art. 273, I, do CPC, mas, tão-somente, com fulcro no art. 273, II, do CPC, ante a ausência de ressalva ao efeito suspensivo no caso em tela:

            Já no que pertine à apelação, fenômeno diverso deve ser analisado, especialmente porque esse recurso é dotado, por expressa disposição legal, de efeito suspensivo como regra, enumerando-se as poucas hipóteses de exceção no art. 520 do Estatuto Processual.

            Dessa forma, e até que não se altere a redação do referido art. 520, como pretende a d. Comissão Revisora do CPC, a interposição do recurso de apelação tem o condão de imediatamente evitar a hipótese prevista no inc. I do art. 273 do Estatuto Processual, de sorte que não vislumbramos a necessidade de antecipação de tutela em sede de apelação com lastro no aludido inc. I do artigo 273. [136] (sem grifo no original)

            No mais, a doutrina consentânea ao argumento de que a antecipação da tutela é eficaz de per si, não podendo seus efeitos serem obstados por eventual recurso de apelação dotado de efeito suspensivo, defende, no mais, que, em razão dessa cisão, a antecipação confirmada na sentença não se confundiria com esta, podendo ser atacada mediante agravo de instrumento, sem perigo de ofensa ao princípio de unirrecorribilidade ou da unicidade recursal, o qual estabelece que, como ensina Nelson NERY JUNIOR, "para cada ato judicial recorrível há um único recurso previsto pelo ordenamento, sendo vedada a interposição simultânea ou cumulativa de mais outro visando a impugnação do mesmo ato judicial." [137]

            Com efeito, propugnou Eduardo TALAMINI:

            Alguma dúvida pode haver apenas na definição do recurso de que se deverá valer o réu para tentar suspender a tutela antecipada. Duas soluções são imagináveis: 1ª) o réu teria de pedir ao relator da apelação, como incidente deste recurso, a suspensão da antecipação da tutela (a premissa teórica é a de que a antecipação integraria materialmente a sentença e só não seria abrangida pelo automático efeito suspensivo da apelação por uma imposição lógica); 2ª) o réu teria de interpor agravo de instrumento e nele requerer efeito suspensivo (a premissa teórica é a de que a decisão concessiva da antecipação não se confundiria com a sentença, embora inserida no mesmo documento).

            Do ponto de vista teórico, parece mais adequada a segunda orientação. Em termos práticos, ela também é especialmente satisfatória para eliminar qualquer impasse quando se pretender sustar a eficácia da tutela antecipada antes que a apelação suba ao tribunal (obviamente, não se aplica aqui a regra do art. 523, §4º - o que se dirige aos casos em que do provimento a ser impugnado não resultem danos imediatos à parte). Fora desse caso, no entanto, a segunda solução implica a complicação prática da duplicação de recursos. É razoável aplicar, nesse tema, a diretriz da "fungibilidade". [138]

            Hoje, a reforma promovida pela Lei n.º 10.444/01 atendeu aos reclamos da doutrina, como se observa, aliás, da exposição de motivos do projeto de lei que deu origem à mesma:

            ... respeitáveis objeções conduziram à manutenção, como regra geral, da sistemática do duplo efeito, de longa tradição, pelo menos no estágio atual das reformas no Código e enquanto não se dispõe de estatísticas precisas a respeito do número percentual de apelações que são total ou parcialmente providas. Além disso, busca-se inclusive, evitar um previsível acúmulo, em segunda instância, de pedidos cautelares tendentes à concessão do efeito suspensivo à apelação. [139]

            A questão, pois, está pacificada, podendo-se afirmar, como diz José Rogério CRUZ E TUCCI, que "a eficácia que foi previamente antecipada continuará realizando o direito mesmo após a interposição do recurso de apelação." [140]

            Já no que concerne à tutela antecipada concedida na sentença, em decorrência da reforma do art. 520, do CPC, retro mencionada, a doutrina, vem atribuindo uma interpretação extensiva aludido ao seu inciso VII, entendendo que a apelação deve ser recebida somente no efeito devolutivo também na hipótese em que a antecipação de tutela for concedida na sentença, e não apenas na hipótese que é por esta confirmada. José Roberto BEDAQUE é um dos que perfilha deste entendimento, como se observa da passagem abaixo:

            ... embora a situação não esteja prevista no art. 520 do CPC, evidentemente deve ser incluída entre aquelas em que inexiste esse efeito. Se assim não se entender, restariam completamente frustrados os objetivos do novo instituto. Aliás, a antecipação concedida na própria sentença tem como conseqüência exatamente retirar o efeito suspensivo da apelação. No que se refere aos efeitos antecipados, o julgamento é imediatamente eficaz, ainda que suscetível de apelação. Por isso mesmo inexiste qualquer incompatibilidade entre a possibilidade de a antecipação acarretar a produção de efeitos antes mesmo do julgamento final e a não produção de efeitos da sentença sujeita à apelação. [141]

            Ovídio A. Baptista da SILVA, todavia, refuta o entendimento acima. Ele entende que a natureza jurídica das decisões liminares que antecipam os efeitos da tutela da futura sentença de mérito não é de mera decisão interlocutória, porque o juiz vai além de um mero exame de questões incidentais e, se antecipados os efeitos, na própria sentença, o recurso seria apelação, tão-somente. [142]

            Luiz Guilherme MARINONI propõe que os efeitos da tutela não sejam antecipados na sentença, mas através de decisão interlocutória, no momento em que é proferida a sentença, pois, do contrário, retirar-se-ia a possibilidade de o réu ter o direito ao recurso adequado, tendo em vista o posicionamento de alguns tribunais em situações semelhantes. [143]

            Paulo Afonso Brum VAZ sustenta a tese de que o juiz deveria antecipar os efeitos da tutela em decisão em separado, mesmo que seja deferido simultaneamente à prolação de sentença, para evitar problemas no campo dos recursos e porque as decisões têm naturezas diversas, uma proferida com fundamento no juízo de probabilidade e a outra fundada num juízo de certeza. Não sendo este o caso, ou seja, estando a antecipação dos efeitos, no corpo da sentença, entende que a solução seria dois recursos, um contra a parte que antecipou os efeitos da tutela (AI) e outro, contra o provimento definitivo (apelação). Sustenta que essa situação não feriria os princípios da singularidade e da indivisibilidade das decisões, pois, na verdade, desde o nascedouro, os conteúdos são de naturezas diversas, constituindo-se dois provimentos, ainda que proferidos simultaneamente. Quando o juiz concede a antecipação dos efeitos da tutela no corpo da sentença, na verdade está proferindo simultaneamente duas decisões, que se distinguem pelo conteúdo, embora se exteriorizem sob a forma de sentença.

            Teori Albino ZAVASCKI entende que seria correto conceder efeito tão somente o efeito devolutivo à apelação, no que se refere à impugnação da antecipação da tutela. Para conferir seu entendimento, traz-se à baila a ementa de acórdão de um Agravo de Instrumento julgador pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

            APELO RECEBIDO NO DUPLO EFEITO – TUTELA ANTECIPADA – CAUTELAR – 1. No que respeita à parte da sentença que julgou a cautelar, deve ser o apelo recebido apenas no efeito devolutivo, face ao que dispõe o inciso IV do art. 520 do CPC. 2. No que tange à parte da sentença que apreciou a tutela antecipada, que se constitui na antecipação do mérito, permitindo a execução, também deve ser o recurso de apelação recebido apenas no efeito devolutivo. 3. Agravo provido." [144]

            3.5.DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA ATRAVÉS DO RECURSO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

            Pouco há de se falar relativamente à antecipação da tutela no âmbito do recurso de embargos de declaração.

            Preliminarmente, diga-se que, freqüentemente, tal recurso é manejado apenas para protelar o feito. Tal circunstância, aliás, compeliu o legislador, através da reforma empreendida pela Lei n.º 8.950, de 13.12.1994, a prever a aplicação de multa para o recorrente, como restou inserto no parágrafo único do art. 538 do CPC, in verbis: "Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a 1% (um por cento) sobre o valor da causa. Na reiteração dos embargos protelatórios, a multa é elevada a até 10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito do valor respectivo."

            Essa notícia serve para justificar, até, a possibilidade de antecipação da tutela no âmbito do recurso em tela. Não obstante isso, a antecipação da tutela poderá ser requerida pelo autor, quando do julgamento de embargos de declaração opostos pelo réu, com fulcro em ambas as hipóteses do art. 273: na constatação da urgência, bem como do manifesto propósito protelatório do réu ou do abuso do direito de defesa.

            No que concerne à apreciação do pedido de antecipação da tutela, existem divergências. William Santos FERREIRA entende que, "Como o julgamento dos embargos pode demorar, nada há que impeça que o pedido de tutela antecipada seja apreciado pelo relator, que será o mesmo do acórdão embargado." [145] Ressalva este autor que a decisão provisória do relator será revista pelo colegiado.

            Sob outro prisma, Araken de ASSIS e Calmom de PASSOS entendem que a competência para a concessão da antecipação da tutela é do colegiado. [146]

            Ainda com relação aos embargos de declaração, a doutrina lança alerta no que concerne aos eventuais efeitos infringentes dos embargos de declaração. E, nesse sentido, o ensinamento de William Santos FERREIRA: "Aqui o cuidado do relator deverá ser redobrado, eis que deverá avaliar se o pedido do embargante (réu) poderá ter sucesso, hipótese em que a tutela antecipada será indeferida. Imagine-se o caso em que uma das matérias da apelação tenha sido a ocorrência da prescrição, não apreciada pelo acórdão; neste caso, se admitida, os embargos de declaração serão conhecidos e providos para o fim de dar provimento à apelação, julgando-se a ação improcedente nos termos do art. 269, IV." [147]

            3.6.DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA E OS EMBARGOS INFRINGENTES.

            William Santos FERREIRA remonta a duas hipóteses nas quais seria viável o pedido de antecipação da tutela na fase de interposição e julgamento dos embargos infringentes.

            A primeira das hipóteses seria aquela em que o embargante, que é autor da ação, teve negado provimento a sua apelação por maioria de votos, hipótese em que restaria cabível a antecipação da tutela ante a probabilidade se serem acolhidos os argumentos constantes do voto vencido.

            O exemplo dado por William Santos FERREIRA, todavia, merece reparos e não basta mais a ilustrar a incidência da antecipação da tutela por meio do recurso de embargos infringentes, ante à reforma promovida pela Lei n.º 10.352, de 26.12.2001 no art. 530 do CPC, pela qual o mesmo passou a admitir a interposição de embargos infringentes somente "quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória".

            No exemplo dado por William Santos FERREIRA, segundo a nova configuração do recurso sob comento, não haveria mais possibilidade de sua interposição e, por conseqüência, a dedução do pedido de antecipação da tutela.

            De toda a forma, supondo que fosse juridicamente possível ainda a hipótese acima, os fundamentos para a concessão da tutela antecipada deveriam estar agregados à extensão do voto vencido. Em outras palavras, quis o autor dizer que aqueles requisitos devem restar contemplados pela tese veiculada no voto vencido. Assim, exemplifica:

            ... se o autor na inicial apresentou duas causas de pedir, e o voto vencido no julgamento da apelação apenas admitiu uma delas, os embargos infringentes não poderão superar esta causa de pedir, o que significa dizer que os requisitos específicos do caput do artigo 273 só a esta causa de pedir poderão se referir. Se este espectro for superado, a apreciação deve restringi-lo ao âmbito da divergência. Mas não se confundam os motivos do voto vencido, que poderão até ser outros para admissão dos embargos infringentes, com a apreciação da causa de pedir, já que só a admitida pelo voto vencido poderá ser reapreciada. Neste caso haverá uma coincidência entre a tutela antecipada e a antecipação da tutela recursal. [148]

            Outra situação vislumbrada por William Santos FERREIRA é aquela em que o embargante é o réu, sendo que o autor da ação teve, em sede recursal, julgado procedente o seu pedido por maioria de votos.

            Esta hipótese, por outro lado, é admissível de acordo com a nova redação do art. 530 do CPC, eis que houve reforma da decisão de mérito, em grau de apelação.

            O efeito em que é recebido o recuso de apelação é extensível ao embargos infringentes, de forma que o problema criado no caso em tela, quanto ao gozo da tutela, é precisamente o eventual efeito suspensivo da apelação. Daí a correção do autor em defender que:

            Aqui também, ante a ausência de efeitos, é cabível em tese a tutela antecipada (justamente para antecipar os efeitos ainda não gerado). Mas deverá o julgador, para antecipar a tutela, verificar se os embargos infringentes interpostos pelo réu têm grandes chances de prosperar; se tiverem, desaparecerá, para a tutela antecipada (pedido do autor), a verossimilhança da alegação e a prova inequívoca, do que decorrerá o indeferimento do pedido; caso contrário, a tutela antecipada deverá ser deferida. [149]

            Arruda ALVIM, citado pelo doutrinador retro mencionado, faz considerações sobre a hipótese em que a antecipação da tutela for concedida na sentença, quando a apelação e eventuais embargos infringentes não poderão ter efeito suspensivo, o que traz as seguintes implicações:

            O que poderá ocorrer é que, pelo teor do voto vencido, a turma julgadora entenda que é o caso de modificar ou revogar a tutela antecipada se, no entendimento não circunscrito ao voto, senão que, no entendimento majoritário da turma julgadora, esta vier a entender não estarem, ou não mais estarem, presentes os pressupostos viabilizadores da concessão. Diferentemente, se há reforma da decisão em que se concedera a tutela antecipada, será efeito natural desse decisão a reversão ao estado anterior. [150]

            No mais, sobre a apreciação do pedido de antecipação de tutela, William Santos FERREIRA defende que deve ser feita ser feita monocraticamente: pelo relator do acórdão embargado ou pelo novo relator sorteado, priorizando a análise por aquele em caso de urgência, o qual deverá submeter sua decisão à reapreciação do novo relator.

            3.6.DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA E OS RECURSOS ESPECIAL E EXTRAORDINÁRIO.

            Cabe, por fim, indagar como se comporta a antecipação da tutela diante dos recursos especial e extraordinário.

            Em relação a tais recursos, dada a circunstância de serem recebidos tão-somente no efeito devolutivo (art. 542, §2º, do CPC), era comum a utilização da medida cautelar (como sucedâneo recursal), para que restasse obtido o efeito suspensivo. Em casos de urgência, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal a admitiam para tanto, inclusive com menção expressa em seus regimentos internos (art. 21, IV e V, do RISTF e arts. 34, V e VI, e 288 do RISTJ).

            Tal ação era utilizada de modo disciplicente, desconsiderando-se os seus reais pressupostos (periculum in mora e fumus boni iuris) e, nas mais das vezes, nem sequer subsumindo-se tais pressupostos à uma situação fática que permitisse suspender os efeitos da decisão recorrida. Não obstante isso, essa prática era acolhida pela doutrina e pela jurisprudência, eis que se constituiu numa forma de se oportunizar tutela às situações de urgência.

            Para o deferimento da cautelar, os tribunais sempre exigiam a admissão, pelo tribunal a quo, do recurso interposto, como ressaltado no julgado abaixo: "Presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, defere-se, em caráter excepcional, a medida cautelar para sustar-se a execução provisória do despejo até o julgamento do recurso especial já admitido." [151]

            E as razões para tal posicionamento são as seguintes: a) ao julgar a apelação, o tribunal põe fim a sua função jurisdicional, não mais tendo competência para proferir decisões no mesmo processo, ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos do art. 463 do CPC (corrigir inexatidões materiais ou retificar erro da cálculo ou sanar omissões, obscuridades e contradições por meio de embargos de declaração) e o juízo de admissibilidade dos recursos extraordinários pelo presidente do tribunal; b) antes da admissão do recurso a decisão que, em tese, admitisse a cautelar, limitaria-se a declará-la, não autorizando, assim, que surtisse seus efeitos; c) a atribuição de efeito suspensivo a recurso inadmitido implicaria supressão de instância.

            Para William Santos FERREIRA tais razões não procedem, admitindo que "a mera interposição do recurso já franqueia o ajuizamento da medida cautelar no tribunal "ad quem", e qualquer interpretação em contrário colide com o dispositivo, pois, se assim fosse, o dispositivo diria "conhecido o recurso...", e não há esta previsão! [152]

            A doutrina entendia que tal exigência era por demais exigente, ofensiva ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, passando que o indeferimento do recurso não obstaria a concessão da tutela cautelar.

            Também defendendo essa tese, William Santos FERREIRA asseverou: "Caso o recurso não supere o juízo de admissibilidade, se a parte interpuser agravo de instrumento desta decisão denegatória nada impedirá o deferimento da tutela cautelar, já que a decisão ainda não se encontrará preclusa e ainda estará sujeita à apreciação pelo órgão ad quem." [153]

            Parte minoritária da jurisprudência, na seqüência, começou a mudar de orientação e admitir que "Verificados o perigo de lesão irreversível e a aparência de bom direito, é irrelevante a circunstância de o recurso especial ainda não ter sido interposto ou estar à espera do juízo de admissibilidade." [154]

            Em razão da posição majoritária, que não admitia o manejo da cautelar para obter o efeito suspensivo quando ainda não admitido o recurso especial ou extraordinário, passou-se a pregar que o mandado de segurança seria, então, o remédio adequado para obter o efeito suspensivo quando ainda não admitido o recurso especial e/ou extraordinário, como defendido por Teori Albino ZAVASKI.

            Todavia, pontificava William dos Santos FERREIRA que tal impugnação só iria favorecer o réu:

            A decisão impugnada, de conteúdo ativo, terá seus efeitos suspensos, via medida cautelar. Com isso, não haverá a possibilidade de execução, inclusive sendo possível este efeito suspensivo (através de medida cautelar) nos casos de deferimento de tutela antecipada que foi impugnada por recurso especial, como já foi admitido recentemente no Superior Tribunal de Justiça.

            Contudo, nos casos em que a decisão proferida no tribunal a quo tiver conteúdo negativo, evidentemente, a suspensão dos efeitos desta não afastará a ocorrência de dano grave de incerta reparação, do que decorre o risco de ineficácia do futuro julgamento dos recursos extraordinário ou especial, a não ser que a decisão de primeira instância tenha sido concessiva, pois aí o "efeito suspensivo" mantém incólume a decisão concessiva da tutela antecipada. [155]

            Na ânsia de encontrar um meio para obter a tutela do direito do autor, não faltaram propostas para superar o empecilho acima mencionado. Barbosa MOREIRA propôs uma aplicação analógica da interpretação que realiza para permitir a concessão da tutela cautelar antes da citação do réu e diz "Se lá [na tutela cautelar] é possível, aqui [na tutela antecipada] também deve ser, porque, em certa medida, os dois tipos de providências visam não ao mesmo fim, mas a fins análogos: permitir a realização da boa justiça, de tal maneira que ela seja praticamente eficaz, e não apenas teoricamente eficaz." [156]

            Teori Albino ZAVASKI, por sua vez, propôs:

            Assim, em nome da ‘proteção de direito suscetível de grave dano de incerta reparação’ ou ‘para garantir a eficácia da ulterior decisão da causa’, ou, ainda, ‘em atenção aos princípios da instrumentalidade e da efetividade do processo’, pode o tribunal não apenas conceder medida para dar efeito suspensivo ao recurso especial ou extraordinário, mas também, se necessário, antecipar, provisoriamente, os efeitos da tutela recursal, sempre que tal antecipação seja indispensável à salvaguarda da própria utilidade do futuro julgamento. De nada adiantaria ter a Constituição assegurado à parte o direito de acesso ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, se não lhe assegurasse, também nos casos focados, que o provimento do seu recurso extraordinário ou especial trará resultados efetivos. (...)

            Negar medida que garanta virtual utilidade do futuro julgamento é, na prática, o mesmo que negar o próprio direito de recorrer. [157]

            Dessa forma, preconiza William Santos FERREIRA, seria disponibilizado ao jurisdicionado a antecipação da tutela recursal, pois uma vez concedida a liminar cautelar, retirará os efeitos decorrentes da decisão impugnada.

            Como em todas as hipóteses de pedido de antecipação de tutela, caberá ao requerente demonstrar, além dos requisitos previstos no art. 273 do CPC, a probabilidade de cabimento e sucesso do recurso interposto, aduzindo que: "É claro que se em análise prévia o julgador não vislumbrar sequer possibilidade de conhecimento do recurso interposto, não concederá a tutela antecipada. Lembre-se que, sem apreciação do mérito do recurso, nada se alterará; logo, não estarão cumpridos os requisitos do caput do art. 273." [158]

            O grande argumento de William Santos FERREIRA em prol da antecipação da tutela em sede recursal merece ser aqui reprisado: quanto mais se afunila a possibilidade de recorrer, mais viabilizada resta a antecipação diante do reconhecimento, por sucessivos juízos, da pretensão.

            Outro grande argumento em prol da antecipação da tutela para que reste concedido o efeito suspensivo aos recursos extremos é externado por Athos Gusmão CARNEIRO e parte do histórico, retro mencionado, da utilização da cautelar inominada para a obtenção da tutela antecipada (dizia-se satisfativa). Diz o mesmo, parafraseado por William Santos FERREIRA que: "Até em atenção ao princípio constitucional da igualdade, deve-se admitir, em tese, quando presentes os requisitos autorizadores, a antecipação da tutela, tal qual se admite a concessão de efeito suspensivo em caráter excepcional, quando interposto recurso extraordinário e/ou especial". [159]

            Ademais, a jurisprudência, amparada neste argumento, já obstou o efeito suspensivo de recurso especial, como se vê abaixo:

            Tutela jurisdicional antecipada (direito de transmissão dos jogos da Copa de 1998) – Recurso especial – Efeito suspensivo – Medida cautelar. 1. A concessão de efeito suspensivo é de caráter excepcional. 2. Ambas as tutelas pressupõem prejuízo iminente e concreto (periculum in mora). 3. Caso em que não se justifica seja suspensa a decisão de antecipação. 4. Pedido de liminar indeferido. Extinção do processo. [160]

            Assim, vê-se que, em prol da tutela jurisdicional ampla e efetiva dos direitos, coroada pela Constituição Federal de 1988 e demonstrada inequivocamente pelas reformas mais recentes, percebe-se que o espírito que deve predominar é aquele consentâneo à concessão da tutela almejada, quando existentes pressupostos para tanto, de forma que deve ser admitida a concessão do efeito suspensivo aos recursos extraordinários, por intermédio dos sucedâneos recursais, excluindo-se, todavia, os óbices relacionados neste item.

Sobre a autora
Adriana Estigara

Doutora pela PUC/SP Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada e Consultora na área do Direito Tributário, e Direito do Terceiro Setor, integrante do Lewis & Associados. Professora junto à Universidade Positivo nas graduação e na pós graduação junto às disciplinas de Direito Tributário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESTIGARA, Adriana. Da tutela antecipada em sede recursal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 786, 28 ago. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7202. Acesso em: 5 nov. 2024.

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