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O neoprocessualismo e suas consequências na fase recursal do novo Código de Processo Civil

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Agenda 02/03/2019 às 16:10

O CPC/2015 teve o objetivo não apenas de reestruturar e sistematizar o código anterior. Ele foi além, buscou adequar as normas processuais aos valores constitucionais, efetivando os direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana.

Resumo: O presente artigo trata da influência do neoprocessualismo na elaboração do Novo Código de Processo Civil brasileiro, em que se valorizam os direitos fundamentais, as garantias e os princípios processuais constitucionais, ao tratar o Processo Civil como instrumento para realização do interesse público, um verdadeiro Direito Constitucional aplicado, abolindo o formalismo excessivo. Ademais, adota-se a diretriz metodológica de que o processo deve ser justo, célere, efetivo e equânime, em especial quando se trata da fase recursal, a qual é, atualmente, alvo de ferrenhas críticas. Enfatiza-se a necessidade de reformulação e de simplificação do procedimento recursal, por meio da análise das modificações que foram introduzidas no ordenamento jurídico pátrio.

Palavras-chave: Processo Civil. Neoprocessualismo. Novo Código de Processo Civil. Recursos.  

SUMÁRIO: 1 Introdução: A Crise do judiciário. 2 A Evolução do Processo Civil: O Neoprocessualismo. 3 As Influências no Neoprocessualismo no Novo Código de Processo Civil: A (Des) Necessidade de um NCPC. 4 O Sistema Recursal no Novo CPC 5 Considerações Finais. 6 Referências Bibliográficas. 


1 Introdução: A crise do Judiciário 

A busca de um sistema processual mais célere, acessível e efetivo não é atual. Isso porque, a propagada crise do Judiciário não fica adstrita ao paradigma jurídico moderno, prolonga-se ao longo de toda a história dessa Instituição estatal e se consubstancia no desequilíbrio existente entre o elevado número de postulações formuladas em Juízo e a irrisória quantidade de julgados proferidos, o que prejudica o adequado trâmite processual, bem como a efetiva prestação jurisdicional.

Tal conjuntura deve ser analisada a partir de um viés histórico e social, em que a evolução das medidas técnico-jurídicas para combater a crise que permeia o Poder Judiciário ao longo dos anos, é um reflexo das forças sociais movidas durante a história do Sistema Processual brasileiro.

A definição de crise não se restringe ao âmbito jurídico, ela é objeto de estudo de diversas áreas do conhecimento, cite-se: as ciências sociais, que entendem que ela surge quando a própria estrutura sistêmica não permite possibilidades idôneas para que se contorne problemas internos ou externos existentes e; as ciências biológicas, como a medicina que concebe a crise de uma maneira sistêmica e mecânica, em que ela é um reflexo de uma “patologia”, traduzindo uma ideia de perecimento.[2]

Doutrinadores, ínclitos juristas, operadores do Direito apontam enfaticamente a crise enfrentada pela prestação jurisdicional estatal, suas obras retratam a crise e a rechaçam de forma enérgica, ao criticar a atual conjuntura brasileira. São raros, entretanto, os estudiosos que apontam solução para os problemas enfrentados.

Não se pode contentar com o atual panorama jurídico, a crise desempenha, sem dúvida, um papel fundamental para a Modernidade, afinal são com os erros que levaram a ela que se aprende, mas não se deve persistir nos mesmos.

Afinal, a crise enfrentada não atinge somente os litigantes que recorrem aos órgãos judiciais, a eficácia de suas decisões e a aplicabilidade de seus julgamentos, afeta, outrossim, a própria carga valorativa do Judiciário, enquanto Instituição estatal, gerando descrença na sua prestação, e perda da confiança depositada nesse Poder, enquanto mantenedor da Justiça.

Com vistas a reverter tal conjuntura, foi nomeada pelo Senado Federal, em setembro de 2009, uma comissão de juristas com a incumbência de elaborar o anteprojeto do novo Código do Processo Civil, presidida pelo Ministro Luiz Fux, à época integrante do Superior Tribunal de Justiça[3], o qual foi publicado em 16 de março de 2015 (Lei nº 13.105), com a entrada em vigor em 18 de março de 2016.

O novo CPC almejou a adequação do modelo processual civil com os objetivos do Estado Democrático de Direito, a partir das diretrizes traçadas na Constituição da República Federativa do Brasil e da efetivação prática dos primados legais e constitucionais. Diante de tal quadro metodológico utilizado pela Comissão, é necessário analisar o contexto em que está imersa a elaboração do novo Código de Processo Civil brasileiro, bem como a carga axiológica e procedimental que guiou a feitura do digesto processual civilista.


2 A Evolução do Processo Civil: O Neoprocessualismo

O Sistema processual civil ao longo da História vivenciou fases metodológicas distintas, em que em uma linha evolutiva, novas ideias surgiam e eram consideradas um avanço, mas que com as alterações sociais frequentes se tornavam rapidamente anacrônicas e descontextualizadas dos anseios dos jurisdicionados, o que fazia com que tais modelos fossem, na verdade, “apenas um movimento circular, uma [...] guinada de 360 graus”[4].

Nesse sentido, as principais fases são: o praxismo (sincretismo), o autonomismo (processualismo), o instrumentalismo e, atualmente, o neoprocessualismo.

Em um primeiro momento, no praxismo, a ação era um direito material em movimento, em que a relação processual se confundia com a própria relação material. Já no autonomismo, em uma concepção diametralmente oposta a do sincretismo, o direito processual passou a ser analisado cientificamente de forma autônoma, em que o processo era um fim em si mesmo. Por sua vez, na fase do instrumentalismo, o processo era entendido como um instrumento de realização do direito material, a serviço da paz social, uma verdadeira relação circular de interdependência, em que o direito processual concretiza e efetiva o direito material, o qual, por seu turno, confere ao primeiro o seu sentido.

Diante de tal contexto evolutivo e a partir da influência do neoconstitucionalismo, começaram as primeiras vozes no mundo jurídico a defender um processo voltado à realização dos direitos fundamentais consubstanciados na Lei Maior brasileira.

Nesse sentido, são as sábias palavras de Álvaro de Oliveira[5]:

[...]Se o processo, na sua condição de autêntica ferramenta de natureza pública indispensável para a realização da justiça e da pacificação social, não pode ser compreendido como mera técnica mas, sim, como instrumento de realização de valores e especialmente de valores constitucionais, impõe -se considerá-lo como direito constitucional aplicado. 

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Nesse novo paradigma procedimental que vem sendo traçado no sistema processual civil brasileiro, a lei puramente interpretada deixa de ser o que prepondera nas decisões dos órgãos do Poder Judiciário, em um contexto em que o Direito e o ornamento jurídico ao serem analisados em sentido global ganham relevo, a partir de algumas mudanças fundamentais, como: princípios ao invés de regras, ponderação ao invés de subsunção, Constituição ao invés de lei[6].

A lei não mais vale por si só, deve ser interpretada de acordo com a Constituição e, precipuamente, em conformidade com os direitos fundamentais. Para que se tenha uma escorreita compreensão do que representa a ordem jurídica justa faz-se imprescindível ponderar as garantias constitucionais e os princípios fundamentais aplicáveis ao processo. Dessa forma, a designação de acesso à Justiça não pode ficar adstrito ao significado de mera possibilidade de apresentação de um processo ou de ingresso de um pleito em Juízo, deve ser, sim, interpretado de uma maneira extensiva, com o escopo de não retirar toda a magnitude de sentido que lhe é própria:

[...]compreendendo a noção ampla do acesso à ordem jurídica justa, que abrange: i) o ingresso em juízo; ii) a observância das garantias compreendidas na cláusula do devido processo legal; iii) a participação dialética na formação do convencimento do juiz, que irá julgar a causa (efetividade do contraditório); iv) a adequada e tempestiva análise, pelo juiz, natural e imparcial, das questões discutidas no processo (decisão justa e motivada); v) a construção de técnicas processuais adequadas à tutela dos direitos materiais (instrumentalidade do processo e efetividade dos direitos).

Por isso, para a noção de acesso à ordem jurídica justa converge o conjunto das garantias e dos princípios constitucionais fundamentais ao direito processual, o qual se insere no denominado direito fundamental ao processo justo.[7]

A adequada prestação jurisdicional, portanto, pressupõe a universalização de acesso à Justiça, no plano normativo processual, bem como sua tutela no plano material da administração da justiça, com o adequado comportamento do magistrado que com discrição, firmeza e o indispensável conhecimento da lei e do processo deve julgar as lides. Virtudes essas raras em um terreno contaminado por intrigas em que vicejam nulidades, egos inflados e o descaso com os jurisdicionados.

Isso porque, nas palavras do processualista Luiz Guilherme Marinoni[8]: “[...] é preciso pensar na relação entre o direito fundamental à tutela jurisdicional e o ‘modo de ser’ da jurisdição, ou melhor, entre o direito fundamental processual do particular e a capacidade de o Estado efetivamente prestar a tutela jurisdicional.”

Esse “modo de ser” da jurisdição é o que permite que esse instituto processual influencie na própria atividade prestacional, e na mudança de paradigma do Processo Civil. Não é suficiente que a jurisdição esteja conforme a Constituição, é necessário também que o juiz disponha de meios executivos para efetivação da prestação da tutela jurisdicional, afinal sem essa possibilidade, o Poder Judiciário não poderia disponibilizar a escorreita proteção dos direitos fundamentais.

A tutela jurisdicional um direito fundamental (art. 5°, XXXV da CF/88), que deve ser prestado de modo efetivo, célere e adequado (art. 5°, LXXVIII da CF/88), há uma vinculação do legislador, do administrador e do juiz, pois os direitos fundamentais possuem uma dimensão objetiva, constituindo um conjunto de valores básicos e diretivos da ação positiva do Estado.[9]

Nesse diapasão, as normas constitucionais, bem como todas as demais normas possuem como atributo a imperatividade, e por isso não traduzem sugestões, recomendações ou conselhos, e sim pressupõem comandos a serem seguidos por todos, e uma vez violados “abrem-se as portas do Judiciário” para a reparação. Sendo assim, o ordenamento jurídico deve prover meios tanto no sistema constitucional, quanto infraconstitucional para que o direito ou o bem jurídico tutelado seja reparado e disponibilizado ao seu titular de direito.

Consubstanciadas nessa realidade inúmeras ações são ajuizadas. Na maioria delas, ao contrário do que usualmente se acredita, ocorre um desvirtuamento da utilização dos instrumentos processuais previstos em lei e que se encontram à disposição da sociedade. Muitas vezes, por falta de informação, ou melhor dizendo, de comprometimento do operador do direito com a função que deve ser exercida: a proteção de direitos.

O direito processual moderno rompe com o tradicional sistema do processo. Este, por imposição de seu próprio modo de ser tende ao isolamento, alienado dos anseios da sociedade, da realidade do homem, o que contribui para a descrença na justiça e dos resultados práticos por ele proporcionados. Aquele, pelo contrário, encontra-se imerso em um universo axiológico da sociedade por ele representada, o que abandona o caráter puramente técnico e objetivo do processo. Eis que surge a um processo orientado, sim, pelo formalismo, mas não o excessivo, ele agora é voltado à boa-fé e à lealdade processual, é o que Álvaro de Oliveira denomina de formalismo ético ou valorativo[10]. Os direitos fundamentais, como cediço, influenciam todo o ordenamento jurídico pátrio, ao servir de orientação para as atividades desenvolvidas por todos os Poderes constituídos.

E é nessa conjuntura que o Código de Processo Civil de 1973 se encontra configurado, afinal:

Tornou-se inevitável a revisão do sistema jurídico-processual, com a mudança da perspectiva de seus escopos e a criação de novas técnicas para tanto eficientes, dando vida às denominadas ondas renovatórias, movimentos direcionados ao acesso efetivo à justiça e caracterizados, cronologicamente, pela assistência judiciária aos necessitados, pela representação dos interesses supra-individuais, pela necessidade de reformas estruturais, orgânicas e funcionais no conjunto geral de instituições judiciárias, nos mecanismos idôneos à obtenção de provimentos jurisdicionais e no direito material, culminando, agora, com os esforços de implementação de técnicas e instrumentos adequados à obtenção de tutela jurisdicional efetiva[11].

Hoje, é necessária uma tutela constitucional do processo, com o escopo de que os institutos e instrumentos processuais sejam correlatos à promoção da ordem constitucional, de seus princípios, garantias e direitos fundamentais materiais e processuais. Prega-se a Jurisdição Constitucional. Qual seria a valia dos direitos fundamentais, se não dispusessem de aplicabilidade imediata? Sem dúvida, não passariam de vagas promessas[12].

Trata-se desigualmente os desiguais, conforme suas desigualdades, com vistas a assegurar um dos princípios constitucionais do processo: a paridade das armas dos litigantes. O Direito deve ser entendido como um instrumento de transformação social.

Isso porque, “os direitos foram assegurados, ou seja, formalmente existiam, porém, isso não é o suficiente. Devem ser materialmente concretizados. Busca-se a melhor forma de interpretá-lo ou digeri-lo”[13].

Sendo assim, não se pode conceber uma simples criação de medidas jurídicas para que se mitigue os efeitos da crise do Judiciário. Faz-se imprescindível uma mudança de pensamento dos próprios operadores do Direito. Ressalte-se que tanto o excesso de demanda se comparado com a quantidade de julgamento proferidos, tanto a qualidade das decisões prolatadas não são a causa da crise, e sim consequências dela.

É notória a preocupação do novo Código de Processo Civil em adequá-lo à nova ótica do sistema processual, mais voltada para a concretização dos direitos fundamentais consubstanciados na Lei Maior, ao sistematizá-lo a partir dos paradigmas doutrinários e jurisprudenciais atuais.


3 As Influências no Neoprocessualismo no Novo Código de Processo Civil: A (Des) Necessidade de um NCPC 

 O mundo jurídico não acompanha na mesma velocidade os avanços das relações interpessoais, que são cada vez mais complexas. A crise permeia a modernidade, e o Direito não deve ser interpretado de uma forma descontextualizada da sociedade, afinal seu objeto de estudo está em constante modificação.

Diante de tal conjuntura, o atual Código de Processo Civil de 1973, para adequar o ordenamento jurídico aos anseios sociais e aos novos litígios apresentados ao Poder Judiciário, sofreu várias reformas pontuais ao longo dos anos, o que fez com que o digesto processual civilista perdesse sua sistematicidade, e, até mesmo, gerou conflitos entre alguns dispositivos legais, passando a ser considerado por muitos doutrinadores como uma verdadeira “colcha de retalhos”.

O processo deve ser guiado a partir de pensamentos contemporâneos, com vistas a construir uma sociedade livre, justa e igualitária, o que, aliás, é um dos objetivos fundamentais da República Federativa brasileira, previsto constitucionalmente, deixando para trás resquícios do modelo individualista[14] perpetuado durante a vigência do Código de Processo Civil de 1973, com fortes influências do pensamento iluminista que o inspirou.

Apesar das numerosas críticas dirigidas ao novo Código, em especial, a de que ele não traz grandes modificações ao ordenamento jurídico, sendo sua única função na realidade sistematizar o atual CPC, ele é, sem dúvida, a materialização do avanço de pensamento voltado aos direitos fundamentais aplicados ao Sistema Processual Civil.

 Não obstante o objetivo precípuo do presente artigo ser o de analisar, a partir de um viés teórico-prático a influência do neoprocessualismo no novel Código Processual Civil, não se pode deixar de registrar a crítica de que o NCPC, na realidade, não traz nenhuma visão inovadora, que rompe com paradigmas, e sim apenas “passa para o papel” o que já se encontrava consubstanciado na Lei Maior brasileira. Os princípios constitucionais e as garantias fundamentais aplicáveis ao processo já se encontram previstos na Constituição, contudo ainda eram pouco utilizados pelos Poderes Constituídos estatais, isso se deve à cultura positivista arraigada que ainda permeia o pensamento no mundo jurídico que necessita que um princípio esteja necessariamente expresso em lei para ser aplicado.

E não só isso. Além de o Estado não aplicar os direitos fundamentais como norte de suas atividades é ele quem ocupa, na grande maioria das demandas, o polo passivo, sendo a tão difundida ausência de vontade política um verdadeiro empecilho, em virtude de que o Poder Público, além de não colaborar para a eliminação dos obstáculos que atrasam a justiça, cria novos. Cite-se como exemplo a Previdência Social, que é uma “cliente contínua” dos tribunais que se utiliza de recursos protelatórios, enfrentando decisões de questões já consolidadas em vários litígios e em diversos tribunais. Não bastando isso, mesmo tendo certeza da derrota, leva o litígio até o Supremo, para obter a mesma resposta que lhe foi fornecida na Primeira Instância.

Ressalte-se, ainda, que o aumento populacional, a conscientização por parte dos cidadãos de seus direitos, além da evolução tecnológica, tudo isto concorreu para a procura da justiça em uma escala, sem precedentes.

Essas causas, contudo, não são determinantes, em virtude de que o Judiciário encontra-se imerso no mundo social, e já deveria ter se adequado aos aspectos problemáticos que atingem a população. Mesmo percebendo o número crescente de demandas o Judiciário não se aparelhou de uma forma eficiente e satisfatória.

Sendo assim a crise é produto de um Judiciário que tem uma estrutura orgânico-administrativa anacrônica e regulamentada por procedimentos de elevado grau burocrático que não acompanham as mudanças que ocorrem constantemente na sociedade.

Atribuir a Crise do Judiciário a fatores unicamente externos é querer retirar um problema que ocorre internamente para fatores alheios a ele. As leis, sem dúvida, não acompanham a dinâmica social, mas não é unicamente por isso que o Judiciário não consegue responder de maneira satisfatória as demandas que lhe são apresentadas.

A adequação do modelo processual ao previsto do texto constitucional não deve ficar adstrita ao plano teórico, impondo ao operador do Direito a adoção de novas posturas na prática do processo, ao valorizar direitos e garantias processuais, para que não se permita nenhuma forma de retrocesso jurídico, nem mesmo que se recaia nos mesmos erros que ferem os valores democráticos e maculam os interesses da sociedade.

O formalismo é fundamental para que o processo se organize, é um elemento que fundamenta a segurança do processo, evitando arbitrariedades, contudo foi se desvirtuando ao longo de décadas, desgastou-se e passou a simbolizar um formalismo excessivo. Somente deveria ser considerado, porém, como um elemento disciplinador, uma diretriz a ser seguida, voltada a um bem maior: o da realização da Justiça material da decisão. Não se pode, em hipótese alguma, admitir que o rito processual se aloque em um patamar superior, afastando-se de sua substância.

No direito processual, mais ainda do que em outros ramos do direito, seu caráter finalístico é evidente; finalismo esse que não pode ser voltado para si, pois inexiste finalismo em si, senão direcionado para os fins últimos da jurisdição. Visa-se atingir a um processo equânime, peculiar do Estado democrático de direito, que sirva à ideia de um equilíbrio ideal entre as partes e ao fim material do processo: a realização da justiça material[15].

O novo Código buscando combater o formalismo excessivo que permeia o atual sistema processual, já em seus primeiros artigos demonstra a diretriz principiológica, bem como um novo paradigma metodológico a ser observado pelos juristas, devendo-se utilizar um viés interpretativo baseado na equidade, em que o processo é um meio garantidor dos direitos fundamentais.

 É previsto, ainda, no novo CPC que ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

Com uma clara influência neoprocessual o novo Código de Processo Civil é orientado, assegurando princípios, como o da isonomia material e da cooperação entre os litigantes, trazendo à tona a preocupação do legislador contemporâneo: um ordenamento jurídico justo, em conformidade com os valores constitucionais.

O processo, afinal, não busca apenas atender ao interesse das partes, e sim a um interesse mais abrangente: o interesse público. Em sua substância demonstra que é voltado para a justa solução dos conflitos que venham a surgir a partir das relações sociais, chegando ao conhecimento do Poder Judiciário.

Não pode conceber a garantia ao acesso a Justiça e ao justo processo apenas como um único ato processual, e sim como vários atos processuais concatenados, os quais se iniciam a partir da propositura da ação.

Isso porque, é ela “o mais fundamental de todos os direitos, já que é imprescindível à efetiva concreção de todos eles”[16]. É uma das formas de expressão dos valores do Estado Democrático, na medida em que retira do particular a faculdade de exercer arbitrariamente as próprias razões, e transfere ao Judiciário, enquanto Poder Público, a decisão de litígios entre os indivíduos. E não só isso. Tem como escopo também o adequado desenvolvimento do processo, admitindo o contraditório, a ampla defesa, a prolação de uma sentença condizente com o que está presente nos autos, dentre outros, garantindo-se, assim, a efetiva participação do jurisdicionado.

Para se garantir a mais ampla participação dos cidadãos no processo e, por conseguinte, na sociedade, ressaltando a cidadania ativa, advoga-se, aqui, pela retirada dos empecilhos que obstaculizam o exercício da ação. “Até porque ter direitos e não poder tutelá-los certamente é o mesmo do que não os ter”[17],

Ocorre que, ao longo dos tempos, eclodiram obstáculos que levaram à discussão do acesso à justiça, dentre eles: a demora do processo. Tal empecilho é colocado no centro das preocupações quando se trata, em especial, da fase recursal.

Sobre a autora
Gabriela Frazão

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Pará – UFPA. Analista do Ministério Público do Trabalho da 8ª Região. Chefe da Assessoria Jurídica do 4º Ofício Geral da PRT da 8ª Região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FRAZÃO, Gabriela. O neoprocessualismo e suas consequências na fase recursal do novo Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5722, 2 mar. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72307. Acesso em: 4 dez. 2024.

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