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RESENHA - CULPABILIDADE DOS DELITOS COMISSIVOS DOLOSOS

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Agenda 24/03/2019 às 00:34

Comentários sobre conceitos base no Direito Penal, tal como a culpabilidade dos delitos comissivos dolosos, perpassando sobre os conceitos que integram a ideia do assunto principal.

TAVARES, Juarez. Fundamentos de Teoria do Delito. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. Capítulo VIII, A culpabilidade dos delitos comissivos dolosos (pp. 453-511).

A CULPABILIDADE DOS DELITOS COMISSIVOS DOLOSOS

Dentre a evolução dos elementos da culpabilidade dos crimes dolosos, a de Roxin –que insere a responsabilidade- merece destaque. A partir dela começou-se a considerar a culpabilidade como a capacidade de culpa e consciência da antijuridicidade cometida. Esta teoria foi criticada por HIRSCH, principalmente, sob a ótica da teoria finalista, afirmando-se que a obrigação da culpabilidade com os fins preventivos levaria ao desprovimento de fundamento, não podendo usá-la como instrumento de limitação da pena. Roxin rebate com dois argumentos: primeiro, está concepção seria incompatível com os fundamentos legais do estado de necessidade exculpaste; segundo, a sua concepção trata a culpabilidade como fundada na prática de uma conduta injusta, mesmo com a acessibilidade normativa do autor, e não nos fins preventivos. Após essa introdução, traz-se os elementos que compõem a culpabilidade dos crimes comissivos dolosos: A capacidade de culpabilidade; a consciência potencial da antijuridicidade; a exigibilidade de comportamento conforme a norma; a responsabilidade (aqui está inserido os princípios da intervenção mínima e idoneidade).


I.    A CAPACIDADE DE CULPABILIDADE

1.PANORAMA GERAL

Segundo Tavares (2018, p. 455), a capacidade de culpabilidade é definida a partir da capacidade de entendimento e autodeterminação do indivíduo em face de suas deficiências. A doutrina tradicional traz a capacidade de culpabilidade como imputabilidade, mas, de acordo com a estrutura da ação performática, a imputabilidade é um dado relevante para a configuração do injusto. O autor traz a definição de pessoa deliberativa, que é aquela que está dentro do contexto de elaboração da norma, e é capaz de fazer uma autoavaliação quanto a sua conduta, assim como a dos demais. Dessa forma, um sujeito inimputável não pode ser pessoa deliberativa, e nem pode ser considerado como capaz de produzir ação penalmente relevante.

2.    A INCAPACIDADE DIMINUÍDA

Os casos de capacidade diminuída de culpabilidade são os que, embora o indivíduo transpareça um transtorno mental que diminui sua capacidade de adaptação social, ele pode ser considerado pessoa deliberativa -essa situação é tratada pelo artigo 26 do Código Penal (CP). A redução de culpabilidade não a exclui, somente gera uma redução obrigatória de pena e até mesmo medida de segurança quando for necessário. É uma fase que analisa se o agente deve ser submetido às próximas etapas de averiguação de sua culpabilidade.  Deve-se ter a compreensão da culpabilidade como u limite e não como uma reprovação.

3.    EMOÇÃO, PAIXÃO E EMBRIAGUEZ

A emoção e a paixão, segundo o CP, não excluem a capacidade de culpabilidade. Já a embriaguez pode gerar, desde que seja completa, resultado de caso fortuito ou força maior. Na embriaguez culposa, o fato ocorrido, após a embriaguez, não pode ser imputado ao agente de forma dolosa. Quanto a embriaguez resultado de caso fortuito ou força maior, o primeiro ocorre quando for um fato imprevisível/inevitável. O segundo, quando o indivíduo não puder controlar a ação precedente, mesmo se esforçando.  Haverá embriaguez completa quando o agente não tem mais autocontrole. Esse fato, resultante de embriaguez completa mais caso fortuito e força maior, deve ser tratado como causa de ausência de ação. O que vale também para entorpecentes ou substâncias que causem dependência física/psíquica. 

4.    ACTIO LIBERA IN CAUSA

Esta teoria é implicada pelo intervalo entre o momento em que se realiza o fato e o que antecede a lucidez do agente, quando se tratando de embriaguez. Dois sistemas foram idealizados para se pensar a situação em que a pessoa sem embriaga, visando cometer o delito e não sofrer imposição penal, são eles: modelo do tipo e modelo de exceção. O primeiro, defende que a execução do delito se inicia no momento em que o agente ingere ou álcool/substância. O segundo, “...justifica-se a punibilidade do agente por um apelo de política criminal, orientado pelos fins preventivos da pena ou pelo costume.” (TAVARES, 2018, p. 462).  Mas, todos o dois são falhos, pois o primeiro passa por cima do princípio da legalidade (muda o momento da realização da ação típica previsto), e o segundo é incompatível com um modelo democrático (desconsidera a condição real do sujeito).

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O direito penal brasileiro trata dessa questão a partir da autoria mediata: “... o sujeito, consciente, coloca-se em condição de incapacidade para se usar, ele mesmo, depois, como instrumento para a prática do crime, quando já em estado de inimputabilidade.” (ANIBAL, p. 53 apud TAVARES, 2018 p. 462). Pode-se dizer que o ordenamento brasileiro adota a teoria da libera in causa, quando o agente se embriaga com o propósito de cometer um delito.

Só é possível projetar o fato antecedente ao consequente se ambos forem homogêneos, assim, o crime realizado deve ser o mesmo tipo do crime que fora programado. A responsabilidade será excluída, quando, o fato antecedente não se esgotar no fato posterior.


II.    A CONSCIÊNCIA POTENCIAL DO INJUSTO

1.    A SOLUÇÃO LEGAL BRASILEIRA

Não há culpabilidade se o agente não é capaz de entender a ilicitude de sua conduta. Essa situação pode ocorrer sobre a norma proibitiva -quando o erro for inevitável, há a exclusão da consciência da ilicitude e quando for evitável, há a diminuição da pena de um sexto a um terço-; e sobre os elementos de uma norma permissiva –quando o erro é inevitável, exclui-se a culpabilidade e quando é evitável, exclui-se a imputação dolosa (abrindo espaço para uma imputação culposa, se o fato for punível como crime culposo).

2.    A CONTRIBUIÇÃO DOUTRINÁRIA

2.1. O DIREITO PENAL COMUM

Foi com a teoria do direito penal comum que a questão do erro adquiriu relevância. Na Idade Média, onde vigorava, assumiu-se que se a responsabilidade era objetiva, então o erro sobre a ilicitude era relevante. 

2.2. A TEORIA DO DOLO

Apesar da ideia de obrigação do conhecimento das leis, a todos, CARMIGNANI trazia a possibilidade de afastamento dessa ideia como regra, como por exemplo: no caso de um indivíduo que vive pouco tempo em determinada comunidade. Junto a evolução do conceito de culpabilidade, acrescenta-se ao dolo a consciência da antijuridicidade. Essa evolução deu espaço para que se reconhecesse o erro de proibição, que gerou a teoria do dolo –que defendia que o indivíduo que não tivesse conhecimento da antijuricidade da sua conduta, não atuava com dolo. Ao excluir o dolo, excluía-se a culpabilidade, restando a culpabilidade culposa quando o erro pudesse ter sido evitado; e quando não fosse evitável, excluía-se o dolo e a culpa.

2.3. A TEORIA EXTREMA DA CULPABILIDADE

A partir do finalismo, substitui-se a teoria do dolo pela teoria da culpabilidade. Segundo WELZEL, não se integra mais a culpabilidade pelo dolo, mas pela potencial consciência da antijuridicidade. O dolo faz parte do tipo, não compõe a culpabilidade. Nesta teoria, da culpabilidade, considera-se a consciência potencial da antijuridicidade, sedimentada pela distinção entre erro evitável e erro inevitável. A fórmula de WELZEL que caracteriza o nome teoria extrema da culpabilidade, em que ele destaca: se era impossível para o indivíduo possuir o conhecimento da antijuridicidade, o erro seria inevitável de proibição, excluindo a culpabilidade dolosa e culposa; se era possível que o indivíduo conhecesse a ilicitude da sua conduta, seria erro evitável, não excluindo a culpabilidade, embora pudesse atenuá-la.

2.4. A TEORIA LIMITADA DA CULPABILIDADE

Aqui, insere-se uma classificação: normas proibitivas e normas permissivas. O erro de proibição direto recai sobre a norma proibitiva em si; o erro de tipo permissivo recai sobre elementos de uma causa de justificação (norma permissiva). Neste último, sendo erro evitável, exclui-se a culpabilidade dolosa, de modo que a culposa ainda pode ser analisada se tiver um tipo previsto. No erro de permissão -que recai sobre os limites jurídicos da causa de justificação reconhecida ou não pela ordem jurídica-, se o erro for inevitável exclui-se a culpabilidade; se for evitável, não há exclusão da culpabilidade dolosa, só a atenuação. O erro de exculpação -recai sobre a existência de um elemento de uma causa de exculpação -se o erro for inevitável, exclui-se a culpabilidade; se for evitável, há diferentes soluções. Mas, de acordo com a doutrina, “...o erro sobre os limites de uma causa de exculpação seria irrelevante porque somente a ordem jurídica poderia estabelecer as hipóteses de sua incidência.” (TAVARES, 2018, p. 470). Ademais, adota-se solução semelhante aos casos acima. Por fim, há o erro de proibição direto (relacionado a norma proibitiva) que integra o erro sobre o conteúdo da norma e sua validade; e o erro de subsunção (relacionado a norma proibitiva), se o indivíduo interpreta de forma errônea a norma, e assim, desconhece que sua conduta viola a norma.

3.    AS ESPÉCIES DE ERRO

3.1. O ERRO DE PROIBIÇÃO DIRETO

Realiza-se quando o indivíduo desconhece que a sua ação é criminosa, ou quando ele interpreta de forma errada e pensa que a norma não rege a sua conduta. Nele, exclui-se a culpabilidade quando é inevitável; e atenua a pena de 1/6 a 1/3 quando é evitável.

3.2. O ERRO DE TIPO PERMISSIVO

Pode haver duas soluções: quando inevitável, exclui a culpabilidade; quando evitável, exclui a culpabilidade dolosa, de forma a permitir o reconhecimento de uma culpabilidade culposa quando há tipo previsto.

3.3. O ERRO DE PERMISSÃO

Acontece quando o indivíduo crê que está autorizado a agir de acordo com a causa de justificação não reconhecida, ou se ele entende que pode ultrapassar os limites da causa de justificação reconhecida. Segue a mesma lógica do erro de proibição direto, quanto a culpabilidade –que se aplica também as causas de exculpação.

4.    O OBJETO DO ERRO

O erro de proibição tem como objeto a norma criminalizadora e a punibilidade da conduta. Há o erro de subsunção, que é o erro de interpretação dos elementos do tipo. Existe, também, um debate sobre o objeto do erro –atinge só a proibição ou também a punibilidade? Defende-se que, no Estado Democrático de Direito, é indispensável que o indivíduo seja capaz de distinguir se a sua conduta é passível de pena, sendo ela sanção civil ou pena criminal. (Se ele desconhecer, será erro de proibição). Outro erro considerável é o que está relacionado ao erro sobre uma condição objetiva de punibilidade ou sobre uma causa de exclusão ou extinção de pena. Na condições objetivas de punibilidade, no âmbito de abrangência da proibição, admite-se relevância do erro. Ela é vinculada a norma criminalizadora, de modo a ser incorporada pelo dolo. É um erro de proibição, visto que afeta a o entendimento da possibilidade de sanção somente quando se verifique as condições.

Quanto às causas de exclusão ou extinção da pena, também constitui erro de proibição quando se dá erro sobre a extensão. Mas, quando as causas não afetam os fundamentos do justo, o erro em relação a existência/extensão das causas é irrelevante.  Fala-se em erro sobre a jurisprudência controvertida sob uma norma que ainda é vigente, se o agente age de acordo com a decisão do Tribunal, sua conduta estará conforme ao ordenamento jurídico -chama-se erro de proibição condicionada. Por fim, há duplo erro quando, o agente efetuar sua ação, sabendo da possibilidade de existir uma situação de fato, que afastaria a ilicitude e, ao mesmo tempo, sabe que pode exceder seus limites. Neste caso, aplica-se o erro de proibição: se evitável, diminui a pena; se inevitável, exclui a culpabilidade. 

5.    A TEORIA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO

As causas de justificação são, agora, elementos negativos do tipo e não matéria da antijuridicidade, dessa forma não há mais a distinção ente erro de tipo e erro de proibição. A solução para esses casos é idêntica à da teoria limitada da culpabilidade: se for inevitável, exclui o dolo e a culpa; se for evitável, exclui o dolo, mas abre espaço para o culposo.

6.    O GRAU DE CONHECIMENTO DO AGENTE

Para que seja assegurada a possibilidade de consciência do injusto, é necessário que seja possível aferi-la na esfera do leigo. Dessa forma, se o agente pode alcançar a proibição segundo a limitação acima, ele é capaz de entender que sua conduta é proibida. Analisa-se, também, “...a possibilidade de o agente alcançar a proibição formal contida na norma, mas não a antijuridicidade material de sua conduta.” (TAVARES, 2018, p. 478). Verificando-se, assim, como a agente se posiciona diante da compreensão da norma.

7.    O AUTOR POR CONVICÇÃO

O autor por convicção é o que se contrapõe, de forma consciente, ao ordenamento jurídico, motivado pelos seus ideais filosóficos, políticos, de vida, religiosos. (o último pode implicar uma subordinação as regras próprias). Ele não pode invocar o erro de proibição em seu favor, o máximo que ele pode “ganhar” é ser beneficiado na fase de individualização da pena. Pode acontecer dessas ideologias serem muito intensas, e acabar por admitir o erro de proibição. Se houver dúvida quanto à validade da proibição, o fato não fica restringido à culpabilidade, abre espaço para se discutir sobre a liberdade individual e interesse de punir do Estado. (este só pode punir se for absolutamente necessário para preservar o direito subjetivo de outrem – princípio da intervenção mínima). 

8.    O ERRO CULTURALMENTE MOTIVADO

Quando há uma desvinculação cultural radical, a solução é a ausência de ação, pois os membros da comunidade em questão não possuem os elementos básicos a afirmar que existe uma conduta performática. Se for um grupo mais próximo da cultura vigente, é possível falar em culpabilidade. O maior exemplo são os índios, que têm, hoje, sua cultura respeitada e não são analisados perante nosso sistema penal. É um erro inevitável, no plano da vontade de exercício da atividade. Para ser caracterizado como erro culturalmente motivado, é necessário que: o agente pertença, desde o nascimento, aquele grupo cultural diferente; que o agente tivesse consciência de licitude sobre o ato cometido, em relação as normas do seu grupo originário; a internalização das normas do grupo dele é vinculante para a sua ação; ele não se desvinculou de seu grupo, nem aceitou se submeter as normas do território em que se encontre.

O erro de proibição culturalmente motivado refere-se a uma situação em que o agente conhece ou pode conhecer a norma proibitiva, mas estará incapacitado de se orientar por esse conhecimento por força de seu condicionamento a padrões culturais diversos, internalizado na própria formação de sua personalidade.” (VILLAVICENIO TERREROS. 2017, p. 176 apud TAVARES, 2018, p. 462).

 9. EVITABILIDADE DO ERRO

É determinada mediante dois fatores: a capacidade de conhecimento do autor e as condições normativas objetivas. Aqui, destaca-se a importância de a norma ser clara e de fácil compreensão, para que o cidadão possa acessa-la. Sendo assim, o próximo passo é analisar a capacidade psicológica do autor. Analisa-se o contexto sobe duas etapas:  a) a atividade concreta do autor, em face de sua experiência; b) sua capacidade objetiva de desempenho dessa atividade segundo as regras a ela relativas; c) o grau de autonomia ou subordinação da atuação, se individual ou coletiva; d) sua posição hierárquica na execução da atividade; e) a necessidade ou não de suplementos de informação. (TAVARES, 2018, p. 488).

O conhecer a proibição não pode estar afastado da atividade concreta do autor. Há a possibilidade que o autor não consiga entender, claramente, a ilicitude de sua conduta, quando lê a norma. Há um esquema que permite que se decida se o autor poderia alcançar o conhecimento da proibição: “a) o motivo para pôr à prova a ilicitude de seu comportamento; b) as exigências da prova; c) o trato da jurisprudência; d) o grau de confiança das fontes de informação.” (TAVARES, 2018, p. 489). Os elementos devem ser averiguados negativamente, cabe ao Estado demonstrar que a conduta do agente estava incorreta.Há uma classificação quanto as dúvidas: dúvida relevante, dúvida irrelevante, dúvida sanável, dúvida insanável, dúvida próxima e dúvida remota. Relevante é a que tem capacidade de influenciar a consciência do agente, a ponto de impedir que realize o ato. Irrelevante é a que não interfere no conhecimento do agente. Sanável é a que pode ser esclarecida. Insanável é a que não é possível de ser esclarecida nem por especialista, pela complexidade. Próxima é a que deriva da leitura da norma defronte ao fato. E a remota, é a que não deriva de leitura, só da interpretação de fatos. 

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