III. A EXIGIBILIDADE DE OUTRA CONDUTA
1. PANORAMA GERAL
Em vista do problema que se tem para encontrar o ponto nodal da culpabilidade –que antes era fundado na exigibilidade de outra conduta-, YAROCHEWSKY entende que o critério decisivo seria a investigação acerca do motivo do agente. Há uma diferenciação doutrinária entre exculpação e exclusão da culpabilidade. Esta ocorre quando o agente é inimputável, ou quando há erro de proibição inevitável; a primeira, ocorre, nas hipóteses que estão previstas no Código referentes à coação irresistível e obediência hierárquica.
2. COAÇÃO IRRESISTÍVEL
Exclui-se a culpabilidade quando o agente atua sob o comando de outrem, estando sob ato de coação em que não pode resistir. Ela é psíquica, em que o indivíduo atua, até mesmo com vontade (mas vontade dominada pelo coactor); diferentemente da coação física absoluta, que exclui a própria ação, pois o agente é usado como se o seu corpo fosse só um instrumento. Na coação irresistível, responde somente o coactor, há a exclusão de culpabilidade para o agente. Não se admite que o coactor seja indeterminado, ele deve ser necessariamente determinado.
3. OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA
Rege-se pela mesma forma da coação irresistível. Nela deve conter os seguintes elementos: a) a um funcionário superior, com competência para emitir ordens administrativas e seus subordinados; b) um funcionário subordinado, com competência para executar a ordem; c) a emissão de uma ordem não manifestamente ilegal; d) a execução da ordem nos estritos termos do comando recebido e dentro da competência do executor; e) o desconhecimento por parte do executor acerca da ilegalidade da ordem. (TAVARES, 2018, p. 497).Exclui-se a culpabilidade o agente que executa a ordem, se tiver em conformidade com os elementos acima citados. O emissor responde pelo fato.
4. ESTADO DE NECESSIDADE EXCULPANTE
Ele decorre do estado de necessidade justificante, na situação em que o bem sacrificado seja de valor maior ao do bem protegido pelo agente. Deve haver uma situação de necessidade e uma necessária. A de necessidade é quando existe um perigo atual para o bem/direito do agente/terceiro, que não seja evitável e não tenha sido por ele provocado, de forma intencional –configurado no momento em que o sacrifício do bem protegido não pode ser exigido ao agente. A necessária alcança o sacrifico do direito/bem, que é de maior valor do que o bem protegido.
5. O EXECESSO ESCUSÁVEL DE LEGÍTIMA DEFESA
Excesso intensivo ocorre quando o agente usa os meios necessários para afastar uma agressão antijurídica, mas por força de confusão/medo/susto, vê-se impossibilitado de agir de outra forma. Excesso extensivo é quando age de forma além do limite comum em legítima defesa. Estados astênicos são as emoções passivas. Já os estados astênicos estão relacionados à energia (emoção agressiva). No excesso escusável, não importa se foi produzido de forma dolosa ou culposa, se forem verificadas as condições de exclusão da culpabilidade, a norma torna-se inaplicável em relação a punibilidade.
6. CAUSA GERAL DE EXCULPAÇÃO
Desde que a situação não se enquadre nas hipóteses que tratamos acima, será possível submeter a conduta a uma averiguação final, analisando se o indivíduo poderia ter agido de outra forma (um comportamento conforme o direito). Deve-se levar em conta alguns elementos quando se avalia essas condutas: a) uma situação semelhante à de estado de necessidade ou coação; b) um perigo atual de lesão do bem jurídico do agente ou de terceiro; c) a necessidade de atuação para debelar o perigo e evitar, assim, a lesão do bem jurídico; d) a execução da ação, atendendo ao princípio da proporcionalidade em relação aos bens em conflito; e) o contexto da atuação do agente e sua disponibilidade para executar uma conduta conforme o direito; f) o confronto entre a lesão de bem jurídico e a finalidade do ato no sentido de salvar bem equivalente. (TAVARES, 2018, p. 502).
Essas condições são os princípios básicos da ordem jurídica. É essencial que o indivíduo se situe diante a um perigo atual ao seu bem ou de terceiro, que não pode de outro modo evitar. Entra nesse contexto, também, a situação em que em estado de necessidade/coação não é possível agir conforme o direito, e os atos de desobediência civil, que não estão no âmbito do exercício regular de um direito.
IV. RESPONSABILIDADE
O princípio da subsidiariedade defende a ideia de proteger o bem jurídico utilizando-se de todas as formas menos gravosas o possível, a fim de evitar o direito penal, quando se puder resolver mediante outras alternativas menos invasivas. Esse princípio não interveio diretamente na culpabilidade. No Brasil, exclui-se a responsabilidade penal quando há uma forma subsidiária de tratar daquele ilícito (ex.: arrependimento eficaz, com impedimento de consumação por parte do agente); quando uma infração é irrelevante na esfera administrativa, e admite-se a irrelevância pelo mesmo motivo na esfera penal; se a absolvição criminal também gerar a absolvição administrativa; ou quando o conflito foi resolvido pela punição administrativa.
CONCLUSÃO
A culpabilidade é um instituto inquestionável e importantíssimo para o direito penal, sobretudo em um ordenamento que funciona sob um Estado Democrático de Direito. Com ele, acredito que o sistema penal torna-se mais justo e compromissado frente aos problemas da sociedade, visto que atua com o compromisso de atender às necessidades sociais. É de interesse da coletividade que pessoas que não são passíveis de culpabilidade não sejam puníveis.
Fruto de uma evolução histórica, passou-se a analisar alguns elementos na culpabilidade nos delitos comissivas dolosos, como: capacidade de culpabilidade, consciência potencial da antijuridicidade, exigibilidade de comportamento conforme à norma, e a responsabilidade. Estes elementos, juntos, formam as características necessárias para que se exclua a culpabilidade de uma pessoa: não ser capaz de determinar seu comportamento, ter consciência da ilicitude de seu comportamento, agir contrário a norma, e que não exista outra forma menos gravosa pra tratar o ilícito.
Pode-se citar vários exemplos, em que seria absurdo e totalmente contrário ao objetivo do direito penal, de condutas que não são passíveis de punição/ou tem está reduzida, como: doentes mental, ébrios habituais, legítima defesa, etc. Em todas essas situações, o sistema criminal age de forma a tutelar o indivíduo que não é passível de pena.
É necessário que haja previsões legais penais, não só para punir, mas para tratar de casos em que o agente necessita de ajuda/tutela do Estado. É conveniente e interessante que se expanda os estudos que tratam de assuntos como estes, para que não haja a abertura para discursos (como temos hoje) em que infratores são considerados seres sem direitos/voz.
O Direito Penal foi feito, e deve, para agir como defensor dos interesses da sociedade, e não há como falar em interesse geral, sem se falar em um sistema justo, que legisla para punir e para proteger os que não são passíveis de punição por diversas hipóteses previstas no Código -e mais importante ainda, é reconhecer que essas hipóteses não estão presentes por um motivo torpe, mas por necessidade e conveniência de um Estado Democrático de Direito.