Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Aquisição de terras por estrangeiros nos Estados Unidos

Agenda 20/07/2020 às 21:35

Apresentam-se as restrições legais para aquisição imobiliária por estrangeiros nos Estados Unidos.

As leis sobre o direito de propriedade nos Estados Unidos derivaram originalmente das leis inglesas sobre terras. A Inglaterra proibia estrangeiros de possuírem imóveis porque todas as escrituras requeriam uma promessa de lealdade perante o Rei; e este pacto conflitava com a aliança do não-cidadão perante a soberania de seu Estado de origem.

Tal vedação, no entanto, inibia a expansão territorial e por isto acabou objeto de crítica na Declaração de Independência. Depois que a América galgou autonomia, as imposições da common law acerca dos estrangeiros continuaram intactas; mas elas vagarosamente foram sendo extirpadas no século seguinte, conforme a necessidade de ampliação territorial e de captação de investimentos externos. Em torno de 1800, quando a expansão geográfica americana atingiu o limite, tanto as legislações estaduais quando federais voltaram a restabelecer limitações à aquisição imobiliária por estrangeiros. Muitas das proposições do período inclusive ainda vigoram.

O domínio de terras por estrangeiros é fundamentalmente uma questão de Estado, e existem três focos perceptíveis de atuação governamental. Primeiro, a preocupação sobre a aquisição de terras por indivíduos provenientes de países inimigos, no caso de guerra declarada; segundo, a necessidade de salvaguardar recursos naturais para os cidadãos e residentes dos EUA; terceiro, a percepção de que os estrangeiros devem ser tratados com equidade, conforme as políticas internas de imigração e os princípios das relações internacionais.

Diversas normas refletem o triplo enfoque mencionado. O Ato de Tratamento ao Inimigo, 50 U.S.C.App. §1º, conferiu poderes ao governo para controlar as transações imobiliárias durante o estado de sítio. As Regulações de Controle de Bens de Estrangeiros limitaram as transações efetuadas por nacionais de determinados países, como Cuba e a República da Coréia. O Ato Emergencial de Poderes Econômicos U.S.C.A. § 1701, garantiu ao Chefe do Executivo autoridade ampla para controlar a propriedade de não-cidadãos durante o estado de defesa. O Presidente Carter utilizou da prerrogativa na crise de reféns no Irã, bloqueando todos os bens de cidadãos iranianos, inclusive imóveis. Igualmente, o Presidente Bush congelou pertences de cidadãos do Kuait e do Iraque em 1991, após a invasão do primeiro pelo segundo. Depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, George W. Bush fez o mesmo em relação aos bens de suspeitos de terrorismo.

Algumas leis federais regularam a exploração da agricultura, pecuária, mineração e a extração de madeira de lei por estrangeiros, que devem notificar o Departamento de Agricultura caso adquiram propriedades rurais para o cultivo de grãos. 7 U.S.C.A. § 3501. O Ato Taylor de Pecuária 43 U.S.C.A. § 315b, restringiu a exploração da atividade aos cidadãos ou imigrantes que tenham postulado a cidadania. A Lei de Mineração de 1882 e o Ato de Arrendamento de Terras para Mineração de 1920 (41 Stat. 437) estabeleceram regramentos específicos para a extração mineral, incluído o Petróleo. 30 U.S.C.A. § 181. Recentemente, determinadas leis regulamentaram a prospecção de óleo e recursos geotermais por empresas estrangeiras. O Serviço Florestal fixou diretrizes de instalação aos estabelecimentos que comercializam madeira, estabelecendo um sistema de preferência para os cidadãos norte-americanos.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

As legislaturas estaduais, todavia, não são totalmente livres para restringir os direitos dos estrangeiros. A cláusula constitucional de igualdade da décima quarta emenda invalida todos os preceitos que pretendam obstruir a aquisição de terras pelos residentes. Em Zscherning v. Miller (Sup.Ct.1968), a Suprema Corte definiu a competência exclusiva do Presidente da República para celebrar relações internacionais, declarando nulas as leis que porventura restrinjam o direito de propriedade sobre bens de indivíduos egressos de países totalitários. Em tese, o entendimento também evita imposições locais aos investimentos estrangeiros. Quando o governo garante aos cidadãos a propriedade imobiliária via tratado, o Estado é obrigado a observá-lo, pois a norma internacional é parte integrante da lei suprema da nação.

No Direito Real, vigoram inúmeras regras que controlam a aquisição de imóveis por parte de estrangeiros. Todos os Estados autorizam que residentes que tenham pleiteado a naturalização possam comprar terras, mas o tratamento uniforme acaba aí. Alguns Estados proíbem a propriedade de imóveis por não-residentes, uns limitam o período de exercício dominial e outros vedam a aquisição por inimigos, em caso de guerra declarada, ou limitam os direitos reais aos sujeitos que preenchem os requisitos para o gozo da cidadania. Existem ainda pontualíssimas discriminações: a Carolina do Sul limita os lotes rurais a um milhão e meio de acres; outros Estados proíbem aos estrangeiros a aquisição de imóveis pertencentes ao poder público e a obtenção de licenças para a exploração de minas ou jazidas.

Geralmente não há restrição ao direito sucessório do estrangeiro, mas algumas unidades federadas insistem em aplicar o regime de reciprocidade, estabelecendo a condição de que cidadãos americanos possam herdar terras no país alienígena e figurar na condição de sucessores. Alguns Estados demandam que as propriedades herdadas por não-cidadãos sejam vendidas após certo período contado da abertura da sucessão. Muitos Estados apresentam ressalvas na incorporação imobiliária realizada por estrangeiros.

Pelo que se nota, a prática imobiliária nos EUA exige exame acurado da legislação de cada Estado, a natureza da transação a ser efetuada e a identidade do estrangeiro envolvido, pessoa física ou jurídica. As leis também devem ser investigadas sob o enfoque da constitucionalidade, já que o exercício da propriedade e da posse por não-cidadãos permanece nebulosa na jurisprudência estadunidense.

Sobre o autor
Alexandre Rocha Pintal

Advogado da Fundação Estatal de Saúde de Curitiba, inscrito na OAB/PR sob o n.º 42.250, pós-graduado em Direito Público, do Trabalho e Previdenciário, autor de Direito Imigratório (Juruá 4ª ed., 2014), articulista de revistas e sites especializados.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PINTAL, Alexandre Rocha. Aquisição de terras por estrangeiros nos Estados Unidos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6228, 20 jul. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74033. Acesso em: 22 nov. 2024.

Mais informações

Traduzido e adaptado de Waissbrodt, David & Danielson, Laura. Immigration Law in a Nutshell. West Publishing Company. 5th ed, 2005.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!