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Aspectos gerais das agências reguladoras no direito brasileiro

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Agenda 25/10/2005 às 00:00

As agências reguladoras são autarquias especiais, sem relativa subordinação aos Poderes, pertencem à Administração indireta, com personalidade jurídica de Direito Público, e regulam e controlam determinadas atividades.

1. INTRODUÇÃO.

Surgido como contraponto ao liberalismo do Século XIX, principalmente a partir da Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918) e Revolução Russa (1917), e no campo jurídico com as Constituições do México (1917) e de Weimar (1919), que substituíram constituições liberais, o Estado do Bem-Estar Social não cumpriu seu papel no Brasil, sendo o país, até a década de noventa do Século que passou, um Pseudo-Estado do Bem-Estar. Pseudo porque o Estado Brasileiro no Século XX não ofertou, satisfatoriamente, educação, saúde, previdência, segurança, entre outras funções primordiais do Estado para proporcionar o bem-estar à toda coletividade. [01]

Existem determinadas características na História brasileira muito diferentes dos países hoje desenvolvidos. Nos Estados Europeus e Estados Unidos da América, muito usados como modelo para tudo o que se pretenda implantar no Brasil, muitas características da formação do Estado foram distintas.

O Estado do Bem-Estar Social cumpriu seu papel nos países desenvolvidos, o que não ocorreu no Brasil e nem nos chamados "países periféricos". Nessa realidade, os Governantes do Brasil na Década de 90 tentaram inserir o pensamento neoliberal em nosso país, cuja uma das idéias seria transformar o Estado do Bem-Estar em Estado Neoliberal. [02]

Uma das pilastras do neoliberalismo é o discurso de que o Estado já cumpriu seu papel, e hoje pode permitir que o mercado seja mandante da atividades eminentemente públicas, voltadas à coletividade. O Estado seria apenas subsidiário, o qual a participação do Poder Público somente ocorreria em setores essenciais, com a diminuição em outras áreas, ou seja, a intervenção estatal na economia se daria de forma subsidiária, apenas. Marçal Justen Filho aponta que, de qualquer forma, "não é admissível abandonar as conquistas fundamentais atingidas por via do que se poderia denominar Estado Democrático de Direito Social". [03]

Germà Bel i Queralt alerta que:

"O processo de privatização, notadamente na América Latina, ao contrário do que ocorre em solo europeu, não visa uma melhor qualidade na prestação dos serviços públicos. É, fundamentalmente, o método utilizado pelos governos para fazer frente às exigências de seus credores internacionais no (re)financiamento dos programas de estabilização econômica dos anos noventa. Serve também, ao criar desemprego em massa, para debilitar os movimentos sociais adversários ao capitalismo. O que se pode notar é que os ganhos dos processos privatizantes na América Latina são altamente contestáveis e na prática, na maioria das vezes, o que se tem é um câmbio de monopólios, antes estatais, agora particulares, e, no mais das vezes, estrangeiros". [04] (Grifei.)

É nessa realidade que surgiu a idéia de serem implantadas agências reguladoras em países da Europa e América Latina, agências essas advindas do Direito Norte-Americano, e que serão o objeto de estudo desse trabalho.


2. AS AGÊNCIAS REGULADORAS.

Com a onda neoliberal que afligiu os países em desenvolvimento na década que passou (inclusive no Brasil), veio o processo de desestatização [05] pela via da privatização dos bens públicos e concessões desenfreadas de serviços públicos, [06] o Governo federal brasileiro vem criando as chamadas "agências reguladoras". Com a dita crise do Estado, a busca é pelo "Estado mínimo", fazendo-se necessária a criação dessas agências, pois, segundo a idéia até pouco tempo atrás predominante, o Estado "paternalista" e "burocrático" deve se transformar em Estado regulador. [07] Assim, o que ocorreu no Brasil, tanto no âmbito federal como nos Estados Federativos, foi "uma verdadeira febre de criação de agências reguladoras". [08]

A idéia é que, se o Estado não assume ele mesmo determinadas atividades, terá que pelo menos controlá-las, uma vez que uma auto-regulação dos setores ainda está fora de cogitação no Brasil. [08] Alerta Marçal Justen Filho que "a substituição do Estado por organizações privadas não significa o desaparecimento da supremacia do interesse público nem a intangibilidade de certas garantias essenciais". [10]

Guillermo Munõz informa que na Argentina, em determinados casos, a lei autorizava apenas a desmopolização, mas o Poder executivo "se limitou a transformar os monopólios públicos em monopólios privados, ou em monopólios de empresas estatais estrangeiras". [11] Essa política redundou na "quebra" do país, acontecimento que até hoje faz com que metade da população argentina esteja em estado de miséria.

As agências reguladoras, também chamadas de autarquias reguladoras, agências governamentais; nos Estados Unidos como independent regulatory agency ou regulatory comissions; na Europa como autoridades administrativas independentes (autorités administratives indépendantes ou administraciones independientes) ou entes de regulação, [12] são espécies de autarquias especiais [13] advindas do Direito estadunidense, entes estatais fracionários, sem relativa subordinação aos Três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), [14] pertencentes à Administração indireta, com personalidade jurídica de Direito Público, e que regulam e controlam determinadas atividades, sejam elas serviços públicos, sejam atividades eminentemente econômicas.

Segundo Carlos Ari Sundfeld, "são entidades com tarefas tipicamente de Estado: editam normas, fiscalizam, aplicam sanções, resolvem disputas entre empresas, decidem sobre reclamações de consumidores". [15]

Leila Cuéllar entende que as agências reguladoras "são pessoas jurídicas de Direito Público, com estrutura formal autárquica e competência para regulamentar, contratar, fiscalizar, aplicar sanções e atender aos reclamos dos usuários/consumidores de determinado serviços público ou atividade econômica", e que as suas atribuições a serem destacadas são: "regulação de determinado feixe de atividades, através da positivação de regras ou da aplicação de regras preexistentes; outorga do exercício de atividades a terceiros (mediante licitação e contratos); fiscalização dos contratos administrativos e da execução dos serviços cuja prestação foi outorgada a terceiros ou de atividades econômicas; exercício de papel de ouvidor de reclamação e denúncias de usuários ou consumidores, efetuando, inclusive, arbitragem de conflitos". [16]

Note-se que as normas das agências reguladoras deverão dispor apenas de questões técnicas, sem criar nada em desconformidade com as leis vigentes e Constituição. Celso Antônio Bandeira de Mello prevê que, "desgraçadamente", as Agências Reguladoras "certamente exorbitarão de seus poderes". [17] Maria Sylvia Zanella Di Pietro ainda alerta que "as normas têm que se limitar a aspectos puramente técnicos, não definidos pelo legislador e que não alterem o alcance da lei, ou têm que ter efeito exclusivamente interno". [18]

José Maria Pinheiro Madeira alerta que "o objetivo da delegação de poder normativo às agências reguladoras tem como causa única e exclusiva, possibilitar a edição de forma rápida normas de cunho exclusivamente técnico. A discricionariedade técnica é o fundamento de validade das normas reguladoras baixadas pelas agências". Diz ainda que "ultrapassar os limites técnicos, ao acrescentar às normas reguladoras critérios políticos-administrativos onde não deviam existir, caracterizará invasão de poder próprio à esfera das decisões do Poder Legislativo. Deve-se atentar, portanto, que a discricionariedade técnica existe apenas quando a decisão que nela se fundar poder ser motivada também tecnicamente. Esta é, quiçá, a limitação mais importante, pois afasta, ao mesmo tempo, o arbítrio, o erro, a impostura e a irrazoabilidade". [19]

Leila Cuéllar ainda argumenta que o poder normativo/regulamentar das agências reguladoras deve ser "adaptado ao sistema jurídico brasileiro, não podendo (i) inovar de forma absoluta, ab ovo, na ordem jurídica, (ii) contrariar a lei e o direito, (iii) desrespeitar o princípio da tipicidade, (iv) impor restrições à liberdade, igualdade e propriedade ou determinar alterações do estado das pessoas, (v) ter efeito retroativo (em princípio)". [20]

O entendimento é que a ANATEL e a ANP podem até ter função reguladora, ao contrário das outras agências, por serem aquelas entidades previstas na Constituição Federal.

A regulação desenvolve-se de acordo com os seguintes princípios: a) mercado regulado para a competição; b) Estado-intervencionista ou Estado-regulador; c) criação de agências setoriais de regulação, dotadas de autonomia e especialização; d) atenção aos monopólios naturais; e) ambiente de transição, cabendo ao Estado supervisionar o poder de mercado dos operadores e organizar a entrada de novos operadores, zelar pela implantação de um novo modelo organizacional, arbitrar conflitos e completar o processo de regulação normativa; e f) garantia do interesse público. [21]

Gaspar Arino Ortiz entende que a regulação do serviço público deve, com toda a evidência, não só evitar injustiças discriminatórias, mas induzir à uma mais justa distribuição da riqueza, mediante a provisão, aos mais necessitados, do mínimo vital, já que hoje, num país desenvolvido, todos possuem esse direito; porém isso deve ser feito dentro de certos limites, de tal maneira que não afete gravemente a racionalidade econômica, ao estimular eventualmente um excesso de demanda ou uma insuficiência de oferta, criadas justamente por preços excessivamente baixos. [22]

O autor ainda entende que as duas grandes vantagens das agências reguladoras são a especialização e a independência, sendo que, com relação à especialização, a maioria dos problemas que devem ser enfrentados requerem um considerável grau de especialização técnica e econômica, e se se pretende chegar a soluções racionais, há a exigência de pessoal preparado e de dedicação continuada, coisas que dificilmente se logram obter dos políticos, pois estes só tem conhecimento superficial dos problemas. Com relação à independência, necessária, uma vez que as decisões que afetam diretamente os direitos e as liberdades dos cidadãos, devem se decididas por pessoas imparciais, sem compromissos partidários. [23]

Vital Moreira aduz sobre as fases do processo de regulação:

"formulação das orientações da regulação; definição e operacionalização das regras (como leis, regulamentos, códigos de conduta); implementação e aplicação das regras (autorizações, licenças, injunções, e, no Brasil, cite-se, ainda, as concessões); controle da aplicação das regras; sancionamento dos transgressores; decisão de recursos. Tendo poderes normativos, executivos e para-judiciais, a regulação deve ficar a cargo de comissões reguladoras independentes". [24]

Sobre a regulação, Carlos Ari Sundfeld entende que não é viável supor que o legislador possa dedicar-se, ele próprio, a um verdadeiro gerenciamento normativo da realidade. Segundo ele, o Estado deverá intervir mais, editar normas seguidamente, dando-lhe conteúdos cada vez menos gerais, tratando de temas sempre mais particulares. Ainda, que esse gerenciamento se faça pela contínua edição e substituição de normas, por sua aplicação concreta por um ente administrativo, que deve também realizar atos de controle prévio, enfim, que controle tudo: que previamente examine projetos, planos; que edite atos administrativos autorizando construir, implantar, fazer, destruir, que fiscalize a execução as atividades, aplicando sanções, cassando licenças, etc. E, segundo o autor, que esses temas sejam tratados por quem entenda do assunto, do problema específico, e não apenas de Direito. [25]

José Carlos dos Santos afirma que as agências reguladoras deverão ser fortes e atentas à área sob seu controle, pois, "sem isso, surgirá o inevitável risco de que pessoas privadas pratiquem abuso de poder econômico, visando à dominação dos mercados e à eliminação da concorrência, provocando aumento arbitrário de seus lucros". [26] Esse risco sempre existirá quando empresas privadas, que visam eminentemente ao lucro, tratarem de questões relativas aos interesses coletivos.

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2.1. BREVE HISTÓRICO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NOS EUA.

Ao contrário, por exemplo, da França, nos Estados Unidos da América as atividades econômicas sempre estiveram nas mãos de particulares, ou seja, nunca houve, em regra, a preocupação do Estado em ter titularidade de determinada atividade econômica, para que depois essa atividade fosse delegada aos particulares sob o regime de Direito Público.

Guillermo Munõz aduz que, "Como se sabe, os Estados Unidos não optaram pela política de nacionalizações. O que para nós é serviço público, lá são atividades prestadas por empresas privadas que normalmente dependem de uma habilitação estatal. São empresas econômicas dotadas de um regime especial. Esta singularidade situa-se nas exceções à regra geral da livre iniciativa privada". [27] O autor ainda alerta sobre a "tormentosa história das agências reguladoras durante os últimos 20 anos", sendo que "existe uma forte tendência em se examinar as agências norte-americanas no momento de seu apogeu, durante o Governo Roosevelt". [28]

Enfim, as agências norte-americanas regulam as public utilities (não são serviços públicos nos nossos moldes), atividades desenvolvidas por particulares sob fiscalização do Estado.

Com as atividades nas mãos de particulares, surgiu a necessidade de regulá-las, sendo que já é famoso o litígio Munn versus Illinois (94 US 113 – 1876), em que discutiu-se a possibilidade de ser regulada a atividade de estocagem e, conforme Odete Medauar, a Suprema Corte "admitiu a atuação do poder público na disciplina de negócios privados, como por exemplo, tabelamento de preços e fixação de tarifas". [29]

Foi criada a primeira agência norte-americana em 1887, a Interstate Commerce Commission (ICC), para dirimir conflitos entre o transporte ferroviário e os empresários rurais, com atuações como tabelamento de preços e fixação de tarifas. Pouco mais tarde foi criada a Federal Trade Comission (FTC), e assim por diante, com um crescimento na criação de agências e fortalecimento dessas devido ao New Deal, em 1930.

A partir de 1930 começam a existir as agencies, criadas pelo Poder Legislativo para implementar políticas desejadas. As atividades das agencies sobre o público é muito grande, às vezes maior do que o processo judicial.

Com a edição do Administrative Procedural Act (APA), em 1946, uma espécie de lei geral de procedimento administrativo, começou a existir uma uniformidade na forma de tomar decisões por parte das agências reguladoras.

Entre 1965 e 1985 o sistema regulatório passou por uma crise, pois as funções das agências estariam sendo desvirtuadas, com uma certa captura por parte dos agentes regulados, devido ao seu poder econômico, ficando os consumidores um pouco desamparados. Segundo Guillermo Munõz, nesse período "a captura das agências pelas empresas reguladas colocou em crise sua independência e aumentou o problema da falta de controle democrático". [30]

Discutia-se a hipertrofia do poder administrativo e a necessidade de disciplinar a atividade das agencies. Começa a ser ampliada a possibilidade de apreciação jurisdicional dos atos da Administração, assim como a preocupação com o estabelecimento de limites à discricionaridade das agencies. Diz-se que as agencies são prisioneiras das indústrias ou de interesse que deveriam controlar e disciplinar.

Kenneth Culp Davis define agência administrativa como uma autoridade pública, distinta de um Tribunal ou de um órgão legislativo, que afeta os direitos de pessoas privadas por meio de atos singulares ou disposições de caráter geral. [31]

Maria Sylvia Zanella Di Pietro aduz as circunstâncias que diminuíram consideravelmente a independência das agências estadunidenses: "a) a ampliação do controle judicial, com o exame da matéria de fato, da motivação, da razoabilidade; b) a sujeição das agências à política traçada pelo Presidente da República; c) a exigência de demonstração da relação custo-benefício; d) a aprovação prévia dos projetos pelo Executivo e pelo Congresso; e) a idéia de desregulamentação." [32]

Como já dito, as agencies existem nos Estados Unidos desde 1887, sendo que no decorrer de todos esses anos foram feitas diversas alterações no regime de controle dessas agências, ou seja, nada foi imposto de cima para baixo, além de que o regime jurídico dos países anglo-saxões é diferente daquele adotado no Brasil.

Não será com a utilização de institutos norte-americanos que a Administração Pública Brasileira ficará mais democrática e menos burocrática (no mau sentido da palavra), e sim pela abertura para a coletividade de possibilidades de um maior controle da Administração, o chamado controle popular, por meio de eleições realmente legítimas, direito de petição, audiências públicas, exame de contas públicas, assim como outros controles de forma indireta. A população ainda deve fiscalizar o controle que o Legislativo e o Judiciário podem exercer sobre toda a Administração Pública.

2.2. CARACTERÍSTICAS DAS AGÊNCIAS REGULADORAS BRASILEIRAS.

As agências reguladoras, tipo de autarquia especial, têm funções normativas, administrativas e quase-jurisdicionais, [33] e relativa independência e autonomia [34] quanto aos Três Poderes (autonomia política, financeira, normativa e de gestão). "A sua independência, contudo, deve ser entendida em termos compatíveis com o regime constitucional brasileiro." [35] Para Eloísa Carbonell, a competência do Poder Executivo sobre as agências é apenas político, no sentido de que poderá coordenar as diferentes ações públicas com a política desenvolvida pelo Governo. [36]

A independência relativa das agências reguladoras, segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto, se dá com relação a quatro aspectos:

"1º) independência política dos gestores, investidos de mandatos e com estabilidade nos cargos durante um termo fixo; 2º) independência técnica decisional, predominando as motivações apolíticas para seus atos, preferentemente sem recursos hierárquicos impróprios; 3º) independência normativa, necessária para o exercício de competência reguladora dos setores de atividades de interesse público a seu cargo; e 4º) independência gerencial orçamentária e financeira ampliada, inclusive com a atribuição legal de fonte de recursos próprios, como, por exemplo, as impropriamente denominadas taxas de fiscalização das entidades privadas executoras de serviços públicos sob contrato". [37]

Maria Sylvia Zanella Di Pietro entende que, na verdade, não existe independência das agências reguladoras com relação aos Poderes Legislativo e Judiciário. Existe, sim, um pouco de independência quanto ao Executivo, mas mesmo assim nos limites estabelecidos por lei. [38]

A obra de Hely Lopes Meirelles, sobre o poder normativo das agências reguladoras, aduz: "Tem-se contestado o poder normativo conferido às agências, mas esse poder normativo há de se cingir aos termos de suas leis instituidoras e aos preceitos dos decretos regulamentadores expedidos pelo Executivo. Naquilo que extravasar desses parâmetros a norma expedida pela agência será inconstitucional". [39]

Ainda sobre o poder normativo, Floriano Azevedo Marques Neto assevera: "Se bem é verdade que a atividade regulatória não pode prescindir de uma forte e bem articulada base legal, certo também é a impossibilidade de que todo o arcabouço regulatório seja editado pelo Parlamento. A especialidade, a complexidade, a multiplicidade e a velocidade de surgimento das questões regulatórias determinam a necessidade de que parcela significativa da regulação estatal seja delegada ao órgão regulador". [40]

As atividades dessas agências, assim como as das agências executivas, [41] fazem parte das chamadas "atividades exclusivas do Estado", a forma de propriedade é estatal, e a forma de administração pública pretendida é a gerencial, segundo o "Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado". [42]

Existem opiniões a favor das agências reguladoras e contra elas, pois alguns doutrinadores entendem ser estas constitucionais, outros inconstitucionais, e outros parcialmente constitucionais. Diogo de Figueiredo Moreira Neto, um dos defensores da aplicação do modelo norte-americano das agências reguladoras no Brasil, citando Ney Prado, com o intuito de justificar as alterações constitucionais ocorridas, no sentido de demonstrar que nossa Constituição é retrógrada, aduz que no:

"fim da década de oitenta, em momento em que outros países desvencilhavam-se ou já se haviam despojado de seus antiquados aparelhos estatais hipertrofiados, centralizadores, burocratizados, ineficientes e, sobretudo, insuportavelmente dispendiosos, o Brasil enveredava, guiado pelos constituintes de 1988, pela contramão da História, levado por uma Carta Política ditada de utopismo bem intencionado mas delirante; pela demagogia, dos que queriam ostentar uma imagem ‘populista’ e ‘progressista’; pelo corporativismo, dos grupos que logravam melhor se organizar e manipular recursos; pelo socialismo, dos que criam piamente ser possível fazer justiça social sem liberdade econômica; pelo estatismo, dos que ainda acreditavam que a sociedade não poderia prescindir de tutela; pelo paternalismo, dos que esperavam que o governo tudo lhes desse sem necessidade de competir; pelo assistencialismo, dos que imaginavam que a palavra escrita converte-se automaticamente em benefícios; pelo fiscalismo, dos que se despreocupavam das conseqüências desmotivadoras e recessivas das sobrecargas tributárias e, por fim, da xenofobia, dos que viam o País como alvo de um imenso complô internacional concebido para entravar um romântico projeto de progresso autonômico". [43]

Maria Sylvia Zanella Di Pietro aduz ainda que "é curioso que as mesmas venham a servir de modelo exatamente em um momento em que, no país de origem, elas perderam grande parte de prestígio e passaram a inspirar grande dose de desconfiança, seja por parte dos órgãos de governo, seja por parte dos cidadãos". Diz também que cresce a desconfiança em relação às agências reguladoras nos EUA pelo fato de que estas, tradicionalmente, atendem a interesses e pressões de grupos determinados. [44] Entretanto, Paulo Roberto Ferreira Motta alerta que isso ocorreu principalmente a partir do Governo Ronald Reagan (Republicano) nos EUA, quando este editou atos que reduziram o papel das agencies, mas com o Governo Bill Clinton (Democrata), a partir de 1993, as agencies voltaram a ter força. [45] Com o Governo de George W. Bush, do Partido Republicano, a tendência é de novo pelo enfraquecimento das agencies.

Com relação à autonomia das agências reguladoras, Pedro Henrique Poli de Figueiredo entende que, "embora tendo grau de soberania necessário para a realização de suas atividades, os órgãos da administração direta se mostram inadequados para o funcionamento como agências de regulação". Segundo o autor, isso se dá pela ausência de personalidade jurídica dos órgãos da Administração direta e pelo grande risco de captura governamental. [46]

Um dos pilares da autonomia das agências reguladoras é a estabilidade de seus dirigentes, que são escolhidos pelo Presidente da República, sabatinados e aprovados pelo Senado Federal, não podendo ser exonerados de seus cargos apenas por decisão política do Presidente (pois estes dirigentes têm mandato fixo), mas apenas se cometerem falta grave apurada em processo administrativo ou judicial (assegurado o contraditório e ampla defesa), ou renúncia (art. 9º da Lei nº 9.986/2000 [47]).

Essa previsão de mandato que se estenda para além do mandato do próprio Governante do Executivo é inconstitucional, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, pois retira o poder do povo, nas eleições, de escolherem seus dirigentes. [48] O autor entende que os mandatos dos diretores das agências não podem extrapolar o período governamental, pois isso engessaria a liberdade administrativa do futuro Governo, e "é da essência da República a temporariedade dos mandatos, para que o povo, se o desejar, possa eleger novos governantes com orientações políticas e administrativas diversas do Governo precedente (...) Em última instância, seria uma fraude contra o próprio povo (...) Com isto, mesmo derrotados no pleito eleitoral, persistiriam gerindo o Estado segundo os critérios rejeitados pelos eleitores e obstando à atuação de quem os sucedesse, em antítese absoluta com a idéia de Democracia e de República (...) o novo Governo poderá sempre expelir livremente os que os vinham exercendo." [49] Concordando com o autor, entendemos que neste caso, é retirado do Chefe do Executivo, vencedor de eleição democrática, o poder de interferir nos assuntos relacionados às agências reguladoras.

Leila Cuéllar concorda com o autor supra e, ainda, informa que o STF, sob a égide da Constituição de 1945, entendeu pela possibilidade do Presidente da República exonerar membros do Conselho Administrativo do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários, apesar de a nomeação para exercício de tal cargo ser por prazo fixo, caso contrário a área de ação do novo Presidente seria invadida, impedindo-o de descortinar o seu programa administrativo. [50]

Sobre o tema, Marcos Juruena Villela Souto diz que existem "questionamentos ao mandato com prazo fixo, pois, se não há concurso, o cargo seria de confiança, e, por isto, demissível a qualquer momento". Entretanto, defende a constitucionalidade da norma, citando o art. 37, inc. I, da CF, que prevê a acessibilidade aos cargos públicos daqueles que preencham os requisitos previstos em lei, "se o requisito é a aprovação política de profissional de reputação ilibada e notória especialização no setor regulado, não pode haver perda do cargo senão nas hipóteses autorizadas na lei". Conclui, ainda, que "o concurso público e os cargos de livre nomeação são critérios para provimento de cargos reservados aos agentes administrativos, mas não necessariamente aos agentes políticos, que se submetem aos critérios definidos em lei, limitando, assim, a liberdade do administrador na sua exoneração". [51]

Segundo Friedrich Müller, "o termo ‘democracia’ não deriva apenas etimologicamente de ‘povo’. Estados democráticos chamam-se governos ‘do povo’ [‘Volks’ herrschaften]; eles se justificam afirmando que em última instância o povo estaria ‘governando’ [‘herrscht’]". [52] Caso o receio seja que questões técnicas não possam ser interferidas por questões político-eleitoreiras dos governantes, que seja aprimorado o sistema eleitoral, a educação da população, a estruturação dos órgãos e entidades representativas da sociedades (Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil, Organizações Não Governamentais), com o intuito de transformar nosso país numa verdadeira Democracia, onde, nos termos do autor citado, o povo governe, e que não seja retirado da população o poder de decidir por determinada política que devem seguir as agências cujos dirigentes tenham mandato.

Note-se que já existiam autarquias com dirigentes com mandato fixo, como as Universidades Federais. Entretanto, além dos Reitores serem escolhidos diretamente pela comunidade acadêmica (professores, funcionários e estudantes), ainda existe a previsão constitucional da autonomia universitária (art. 207 da CF).

Assim, com relação ao mandato fixo dos dirigentes das agências reguladoras, entendemos que sua instituição é um verdadeiro golpe no povo brasileiro. O que se tentou no Governo Federal passado, talvez por já existirem dúvidas se a política seria mantida na atual gestão, e o Parlamentarismo ainda não será implantado tão cedo, tentou-se ao máximo retirar poderes do atual Presidente do Brasil, eleito democraticamente. [53]

Em descordância ao acima explicitado, Gesner Oliveira entende que "independentemente de quem vencer as eleições presidenciais, o Brasil sairia ganhando se as agências reguladoras de um modo geral e o Banco do Brasil em particular tivessem maior autonomia em relação ao Executivo" e que "a independência de um regulador não impede a implementação de determinados programas aprovados pelo voto popular. Nas sociedades democráticas coexistem os órgãos de Estado e os de Governo". [54]

Outra tentativa de efetivação da autonomia das agências reguladoras é a instituição da chamada "quarentena", período em que dirigentes das agências estariam impedidos de atuarem na iniciativa privada após deixarem seus cargos, com o intuito de impedir o repasse de informações importantes.

Sobre o tema, Floriano Azevedo Antunes Marques Neto argumenta:

"No nosso entendimento a melhor forma de efetivar tais mecanismos é com o estabelecimento da proibição de que o dirigente ou detentor de cargo relevante no órgão regulador represente qualquer interesse da regulada por um período mínimo de 12 meses após deixar seu cargo. Neste período cumpre ao Estado pagar pelo seu sustento o valor correspondente ao que ganhava no cargo. Em que pese às críticas a tal mecanismo, afirmando que isto caracterizaria pagamento de salário sem contrapartida, delas discordo. A natureza destes pagamentos é indenizatória, voltada a reparar a restrição ao direito do indivíduo de trabalhar. De todo o modo, a pior solução parece aquela oferecida pela Lei federal 9.427, de 1996, que determina que dirigentes da ANEEL, após deixarem o cargo, permanecerão por um ano prestando serviços para aquela Agência e sendo-lhes defeso atuar para os regulados. Nesta regra o dirigente permanece vinculado ao órgão, obtendo informações e participando da atividade regulatória. a quarentena de nada servirá." [55]

O autor ainda entende que é "absolutamente relevante que a atividade do órgão regulador se desenvolva com independência frente às vicissitudes do poder político", "sob pena de se converterem em mera longa manus o núcleo estratégico estatal", devendo "o órgão regulador deter suficiente independência (apoiada pelos instrumentos legais adequados) para se opor ao interesse de um governante que, numa jogada eleitoral, intente reduzir à metade as tarifas praticadas para um determinado serviço essencial. A independência, aqui, deve servir para que o órgão regulador seja um instrumento de política governamental, e não um instrumento de política de um governo". [56]

Uma das justificativas para a criação das agência reguladoras na Europa, com total independência com relação ao Estado, é que esse não poderia, proprietário de empresa estatal concorrente com a iniciativa privada, regular essas atividades, pois poderia dar preferências à empresa estatal, acabando assim com a concorrência. Entretanto, via de regra, na Europa ocorreu, nos últimos tempos, uma quebra do monopólio público, mas sem a desestatização das empresa estatais.

Entretanto, nos países da parte de baixo do globo, supervenientes aos mandos do FMI, Banco Mundial e Consenso de Washington, ocorreu a quebra do monopólio com a desestatização das empresas estatais. Vide no Brasil, a quebra do monopólio da Embratel e sua venda, assim como da maioria das empresas de energia, assim como, a tentativa, até o final do Governo FHC, da venda dos Correios (com a quebra do monopólio) e também a alienação da Petrobrás (cujo monopólio já foi quebrado).

Portanto, aqui não existiria a concorrência entre empresas públicas e privadas, sendo esse mais um motivo para a inexistência em nosso país de agências independentes ao Estado.

Por enquanto, no âmbito federal, já foram criadas nove agências reguladoras, por lei, [57] com os respectivos decretos regulamentadores para a maioria delas. Não existe uma lei específica disciplinando a matéria, mas elas seguem mais ou menos o mesmo padrão (ou o mesmo molde).

Em alguns estados da Federação também estão sendo criadas agências reguladoras, cuja maioria são as chamadas "agências multisetoriais", que não têm especialização (ao contrário das agências criadas pela União). São exemplos:

a) a Agência Reguladora de Serviços Públicos (ASEP) no Estado do Rio de Janeiro [58],

b) a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará (ARCE) [59],

c) a Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (ACERGS) [60],

d) a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Rio Grande do Norte (ARSEP), [61]

e) a Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia (AGERBA), [62] e

f) a Agência Estadual de Regulação e Controle de Serviços Públicos (ARCON), no Pará, [63]

g) a Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Minas Gerais (ARSEMG). [64]

No Estado de São Paulo existe duas agências setoriais: Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE) e Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transportes do Estado de São Paulo (ARTESP). [65]

No Estado do Paraná há projeto de lei para criação de uma agência multisetorial (Agência Estadual de Controle e Regulação das Atividades Concedidas), com mandato fixo dos seus dirigentes, que pode vir a ser a lei considerada inconstitucional se aprovada, uma vez que foi de iniciativa do legislativo e a competência para propor o projeto seria do Executivo, em conformidade à Constituição Estadual. [66]

Até uma agência reguladora municipal já foi criada, setorial, a Agência Municipal de Regulação dos Serviços de Saneamento de Cachoeiro do Itapemirim (AGERSA), no Estado do Espírito Santo. [67]

Sobre a proliferação das agências reguladoras setoriais "como cogumelos", Gesner Oliveira entende ser necessária a indagação "se existem justificativas sólidas para a sua existência". Segundo o autor, é necessário verificar se existe (a) falha no mercado a ser regulado, como a existência de monopólio natural, externalidades (custos ou benefícios de uma atividade que não são devidamente internalizados pelas empresas), e existência de bens públicos, como a segurança nacional; (b) se o Estado tem condições de resolver o problema, pois, em determinados casos, a regulação do Estado é tão onerosa que é melhor conviver com a falha de mercado; e (c) verificar se em circunstâncias nas quais há de fato uma falha de mercado e nas quais a regulação não provoca falhas de Estado ainda mais custosas do que as de mercado. O autor conclui que "poucos segmentos da economia justificam a existência de uma agência específica. Uma legislação adequada ou uma burocracia mais enxuta resolveriam o problema sem necessidade de criação de uma nova agência reguladora". [68]

Lembre-se ainda que já existiam no Brasil outras espécies de agências reguladoras, como por exemplo o Banco Central do Brasil (BACEN) e Conselho Monetário Nacional (CMN), [69] a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), [70] e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) [71].

Marçal Justen Filho alerta que em grande período do Século XX o Estado Brasileiro preocupou-se com o social, deixando de lado o regulação de atividades exercidas pelos particulares, e que a regulação era vista como uma manifestação assessória do Estado. Diz que no afã de se regular atividades, o Governo brasileiro está criando entes nos moldes das agências norte-americanas. Lembra o autor que quase tudo nos EUA são agências independentes, e que é difícil dizer o que é uma agência, mas, no casos daquele país, apenas sabe-se o que não são agências: a Presidência da República não é, o Congresso também não é agência, assim como os Estados, etc. Algumas dessas agências têm certas peculiaridades, sendo desvinculadas dos três poderes, que são as agências reguladoras objeto desse estudo. Por fim, entende que essas agências são uma imposição do Estado Regulador Brasileiro, um modelo que está sendo questionado no seu próprio país de origem (EUA). O autor diz que o governo das agências seria o "Governo dos Sábios", afastado das pressões políticas, o que, segundo o autor, seria uma ingenuidade ou má-fé, daqueles que entendem que esse modelo irá resolver os problemas brasileiros (o federalismo, importado dos EUA, já não funciona). Finaliza o autor no sentido que provavelmente as agências reguladoras brasileiras serão uma frustração de esforços e recursos, sendo que o problema do país não é regulatório, e sim democrático. [72]

Com relação ao fracasso ou não das agências reguladoras, Paulo Roberto Ferreira Motta alerta que "caso as agências funcionem, viveremos uma era de eficiência e materialização dos direitos sociais; caso fracassem, teremos mais uma vez a frustração de estarmos, como povo e nacionalidade, distantes das mais importantes conquistas da humanidade". [73]

Gesner Oliveira entende ainda que "é tempo de aplicar alguns princípios básicos para evitar um desatre no sistema regulatório brasileiro", e que "o desenho ideal de uma agência reguladora deveria conter seis elementos", a independência, que "não impede a implementação de políticas setoriais por parte dos governos eleitos", sendo, no seu entender, uma vantagem os mandatos fixos dos direigentes das agências, não coincidentes com os titulares máximos do Poder Executivo, a máxima transparência, com mecanismos como as audiências públicas e recursos disponíveis pela internet, a prestação de contas à sociedade, "essencial para o controle democrático desses organismos", os limites de sua competência, pois a "propensão a legislar em vez de regular nos termos da lei causa insegurança ao investidor", a autonomia financeira e gerencial, e a excelência técnica dos quadros reguladores. [74]

Sem a pretensão de ser por demasiado pessimista, entendemos que a frustração é mais possível que o sucesso e, mais uma vez, estaremos distantes das conquistas da humanidade "primeiro-mundista". [75]

Norberto Bobbio, sobre o pessimismo/otimismo, aduz que "o pessimismo como filosofia é uma resposta alternativa àquela pergunta do otimista: ‘Para onde vai o mundo?’ E quem sabe a resposta? Talvez ambos tenham razão, o pessimista e o otimista. Talvez nenhum dos dois, porque não faz sentido levantar questões para as quais não é possível encontrar resposta". [76]

2.3. AS AGÊNCIAS REGULADORAS FEDERAIS

A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) é autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia, veio a substituir o Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), tem por finalidade regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, foi criada pela Lei nº 9.427, de 26.12.96 (alterada pela Lei nº 9.648, de 27.5.98), e regulamentada pelo Decreto nº 2.335, de 06.10.97. [77] Essa agência perdeu parcela de suas funções ao ser criada a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica (CGE), pela MP nº 2.198-5/2001, chamada de "Ministério do Apagão", em face à crise da energia elétrica de 2001, com possibilidade até de existirem grandes apagões.

A Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) é autarquia vinculada ao Ministério das Comunicações, com função de entidade reguladora das telecomunicações, tem previsão constitucional, com as alterações do art. 21, inc. XI, implementadas pela EC nº 08/95, [78] foi criada pela Lei Geral de Telecomunicações (LGT), de nº 9.472, de 16.7.97, e regulamentada pelo Decreto nº 2.338, de 07.10.97. [79] A ANATEL desempenhará basicamente quatro funções, a de regular o setor de telecomunicações, outorgar concessões, permissões e autorizações, fiscalizar as atividades do setor desempenhadas em regime de direito público e privado e, por fim, dirimir, no campo administrativo, os conflitos existentes entre operadores de serviços e entre operadores e seus usuários.

A Agência Nacional do Petróleo (ANP) é autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia, é ente regulador da indústria do petróleo, tem previsão constitucional, após a EC nº 09/95, que alterou o art. 177, § 2°, inc. III, [80] foi criada pela Lei nº 9.478, de 06.8.97 (alterada pela Lei nº 10.202, de 20.02.2001), e regulamentada pelo Decreto nº 2.455, de 14.01.98 (alterado pelo Decreto nº 3.388, de 21.3.2000).

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) é autarquia vinculada ao Ministério da Saúde, exerce atividades de regulação, normatização, controle e fiscalização na área de vigilância sanitária, protegendo a saúde da população por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, dispor sobre critérios de importação e autorizar o funcionamento de empresas, foi criada pela Lei nº 9.782, de 26.01.99 (com dispositivos alterados pela atual MP nº 2.190-34, de 23.8.2001), e regulamentada pelo Decreto nº 3.029, de 16.4.99 (alterado pelo Decreto nº 3.571, de 21.8.2000). [81]

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), [82] que tem como funções a regulação, a normatização, o controle e a fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde, é autarquia vinculada ao Ministério da Saúde, foi criada pela Lei nº 9.961, de 28.01.2000 (alterada pela MP nº 2.177-44, de 24.8.2001), e regulamentada pelo Decreto nº 3.327, de 05.01.2000.

A Agência Nacional de Águas (ANA) é autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, estabelece regras para a atuação, estrutura administrativa e fontes de recursos do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, foi criada pela Lei nº 9.984, de 17.7.2000 (já tinha sido citada pela Lei nº 9.433, de 08.01.97), e regulamentada pelo Decreto nº 3.692, de 19.12.2000. Ana Amelia Menna Barreto de Castro Ferreira entende que "a nova agência denominada ANA, veio somente aumentar o peso da máquina administrativa governamental, introduzindo mecanismos que em nada contribuem para aperfeiçoamento e descentralização da gestão dos recursos hídricos no país". [83]

A Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT) é autarquia vinculada ao Ministério dos Transportes, implementar políticas, regular e supervisionar, o transporte ferroviário, rodoviário e multimodal, foi criada pela Lei nº 10.233, de 05.6.2001, e regulamentada pelo Decreto nº 4.130/2002.

A Agência Nacional dos Transportes Aquaviários (ANTAq) é autarquia vinculada ao Ministério dos Transportes, estabelece regras para implementar políticas, regular e supervisionar, a navegação fluvial, lacustre, entre outras, os portos e demais terminais portuários, foi criada pela Lei nº 10.233, de 05.6.2001, e regulamentada pelo Decreto nº 4.122/2002.

A Agência Nacional do Cinema (ANCINE) é autarquia vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, e é entidade de fomento, regulação e fiscalização da indústria cinematográfica e videofonográfica, foi criada pela MP nº 2.219, de 04.9.2001 [84], e regulamentada pelo Decreto nº 4.121/2002. A ANCINE, além de Agência Reguladora, tem características de Agência Executiva, pois terá funções de fomento e promoção na área de cinema e vídeo.

Ainda podem ser criadas por lei a Agência Nacional de Serviços Postais (ANAPOST), a Agência Nacional da Aviação Civil (ANAC), a Agência Nacional de Defesa do Consumidor e da Concorrência (ANC) [85], e a Agência Nacional de Resseguros (ANR).

Entretanto, o que está a gerar maiores discussões é a tentativa de implantação de mandatos fixos aos dirigentes do Banco Central do Brasil, instituição que, se já tinha várias características das agências reguladoras (por realizar regulação), vai adquirir, na verdade, um prerrogativa que o deixará com autonomia igual a das agências reguladoras já criadas. Já foi tratado aqui sobre o autoritário mandato fixo dos diretores das agências para além do Governo atual. No caso do BACEN, por ser sua atividade algo essencial para o futuro da política econômica implantada, o problema é mais grave. Com a existência de mandatos fixos para os dirigentes do banco, o Presidente que sucede o antecessor, se for da oposição, por exemplo, terá sérias dificuldades em implementar seu plano econômico vencedor da eleição. [86]

Fizemos um quadro comparativo relativo às agências reguladoras federais já existentes:

Nome da Agência

Sigla

Previsão na CF

Lei

Decreto

Regulamento de licitações

Área regulatória

Ministério a quem é vinculada

Agência Nacional de Energia Elétrica

ANEEL

Não

9.427/96

2.335/97

Não

Serviços públicos

De Minas e Energia

Agência Nacional de Telecomunicações

ANATEL

Art. 21, XI

9.472/97 (LGT)

2.338/97

Resolução nº 005/98

Serviços públicos

Das Comunicações

Agência Nacional do Petróleo

ANP

Art. 177, § 2°, III

9.478/97

2.455/98

Portaria nº 223/2000

Atividade econômica em sentido estrito

De Minas e Energia

Agência Nacional de Vigilância Sanitária

ANVISA

Não

9.782/99

3.029/99

Não

Poder de Polícia

Da Saúde

Agência Nacional de Saúde Suplementar

ANS

Não

9.961/00

3.327/00

Resolução nº 09/2000

Poder de Polícia

Da Saúde

Agência Nacional de Águas

ANA

Não

9.984/00

3.692/00

Não

Bens Públicos

Do Meio Ambiente

Agência Nacional de Transportes Terrestres

ANTT

Não

10.233/01

4.130/02

Não

Serviços Públicos

Dos Transportes

Agência Nacional de Transportes Aquaviários

ANTAQ

Não

10.233/01

4.122/02

Não

Serviços Públicos

Dos Transportes

Agência Nacional do Cinema

ANCINE

Não

MP 2.228-1/2001

4.121/02

Não

Atividade econômica em sentido estrito

Do Desenv., Indústria e Comércio Exterior

Sobre o autor
Tarso Cabral Violin

advogado, assessor jurídico da Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social do Paraná (SETP), professor de Direito Administrativo do Centro Universitário Positivo (UnicenP), ex-integrante da Consultoria Zênite, pós-graduado no Curso de Especialização em Direito Administrativo pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos (IBEJ), mestrando em Direito do Estado na UFPR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIOLIN, Tarso Cabral. Aspectos gerais das agências reguladoras no direito brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 844, 25 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7423. Acesso em: 15 nov. 2024.

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