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Da interpretação e abrangência da técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015:

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Agenda 14/09/2019 às 16:00

5. Ampliação do julgamento no agravo de instrumento

Diferentemente da apelação, na qual a regra do art. 942 do CPC/2015 aplica-se a qualquer resultado não unânime, no julgamento do agravo de instrumento, a regra só se aplica quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito (inciso II do § 3º do art. 942 do CPC/2015).

Dessarte, por uma opção o legislador, no julgamento do agravo de instrumento não se aplica a técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015 nas seguintes hipóteses: a) se o julgamento for unânime; b) se o agravo não for admitido, ainda que por maioria de votos; c) se o agravo for admitido e desprovido, ainda que por maioria de votos; d) se o agravo for admitido e provido para anular a decisão, ainda que por maioria de votos; e) se o agravo for admitido e provido para reformar uma decisão que não trate do mérito, ainda que por maioria de votos.

Entendemos ser pertinente esclarecer não se aplicar a técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015 quando o agravo de instrumento for interposto para tentar reformar a decisão que apreciou o pedido de tutela provisória.

Isso porque, o art. 942, §3º, II, do CPC/15 refere-se à “decisão parcial de mérito” (introduzida pelo art. 356 do CPC/2015), a qual, como leciona Daniel Amorim, "produzirá coisa julgada material ao transitar em julgado, não sendo possível o juiz posteriormente modificar a decisão ao resolver a parcela do mérito que demandou a continuidade, ainda que parcial, do processo[11]".

Já a decisão que analisa a tutela provisória, embora se incursione, a rigor, no exame do mérito, tem caráter precário, podendo, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada (art. 296 do CPC).

Por outro lado, é importante ressaltar que uma leitura apressada do art. 942, § 3º, II, do CPC/2015 pode levar também a uma interpretação restritiva inadequada.

A esse respeito, vale conferir a lição de Hermes Zaneti Jr:

Entendemos incorreta uma interpretação que limite a incidência da técnica de ampliação do julgamento colegiado apenas na hipótese do agravo previsto nos arts. 354, parágrafo único (quanto ao art. 487, II e III), e 356, § 5º, do CPC/2015 (julgamento antecipado parcial do mérito). Isto porque, substancialmente, há decisões em agravo que dizem respeito ao mérito da causa e nestas haverá incidência da nova técnica de julgamento colegiado, mesmo sem representarem o julgamento antecipado parcial do mérito. Portanto, a correta interpretação do dispositivo do art. 942, § 3º, II, exige sua aplicação em todos os casos de análise do mérito em recurso de agravo[12].

De fato, parece-nos que, analogicamente à hipótese do art. 942, § 3º, II, do CPC/2015, deve caber semelhante ampliação no julgamento do agravo de instrumento interposto contra a decisão que analise o mérito da causa.

Esse, inclusive, foi o entendimento firmado pela Terceira Turma do STJ no julgamento do REsp n.º 1797866/SP. 

De acordo com Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, “a extenção da técnica de ampliação do debate nessas hipóteses decorre da necessidade de unidade da ordem jurídica, especialmente de promover-se a sua coerência sistemática (art. 926 do CPC/2015)”[13]. 


6. Ampliação do julgamento em embargos de declaração

Para que incida a técnica de ampliação do colegiado estabelecida no art. 942 do CPC/2015 no julgamento dos embargos de declaração opostos contra o acórdão unânime proferido em sede de recurso de apelação, faz-se necessário que a decisão proferida nos aclaratórios seja não unânime e implique a alteração do julgamento anterior.

No caso do agravo de instrumento, a convocação de outros julgadores somente ocorrerá se os embargos de declaração forem acolhidos para modificar o julgamento originário e, consequentemente, alterar a decisão parcial de mérito então proferida pelo juízo de primeiro grau.

Isso porque, nesses casos, o julgamento terá se alterado, deixando de haver unanimidade e atraindo a incidência da regra prevista no art. 942 do CPC/2015.

Nesse ponto, quando do julgamento do IAC nº 495116-8, o Órgão Especial do TJPE, por maioria de votos, fixou as seguintes teses jurídicas, as quais restaram numeradas como a oitava e nona:

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Amplia-se o colegiado quando, por maioria de votos, a decisão dos embargos de declaração alterar o resultado unânime da apelação.

Não incidirá o artigo 942 do CPC, quando o provimento majoritário dos embargos de declaração, em nada alterar o conteúdo do ato judicial embargado.

Na ocasião, prevaleceu o voto proferido pelo Des. Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima, que assim se posicionou sobre a ampliação do julgamento nos embargos de declaração:

Em regra, os embargos de declaração têm caráter integrativo ou aclaratório, porquanto buscam, objetivamente, apenas a clareza da decisão. A sua função processual é de esclarecimento, de interpretação do decisum. Excepcionalmente, podem modificar o pronunciamento judicial embargado. Não raramente, diante do esclarecimento da obscuridade, da resolução da contradição ou do suprimento da omissão haverá uma alteração da decisão anterior. Para além disso, a jurisprudência firmou entendimento no sentido de admitir a força modificativa e infringente dos embargos declaratórios em casos de erro material manifesto ou de erro de fato. Nestes casos, os embargos têm caráter substitutivo, de modo que se o recurso que deu origem aos embargos de declaração estava subordinado a técnica do artigo 942 do CPC/15, eventual acolhimento dos embargos de declaração por maioria de votos faz incidir a aplicação da nova técnica de julgamento.

Pontue-se que no caso de acolhimento dos embargados de declaração com alteração substancial do resultado do julgamento embargado, mesmo quando o acórdão embargado tenha decorrido de decisão unânime, deverá haver a instauração do incidente a que alude o artigo 942 do CPC/15. É que, nestas circunstâncias, o acórdão dos embargos de declaração tem efeito substitutivo.

O Relator do IAC nº 495116-8, Des. Frederico Ricardo de Almeida Neves, defendeu uma interpretação mais ampla para a incidência da técnica de complementação de julgamento não unânime no julgamento dos embargos de declaração, nos seguintes termos:

O julgamento unânime da apelação não autoriza a incidência do artigo 942 do CPC. Sabe-se que a não unanimidade no julgamento do apelo – na conformidade do que ficou decidido por este Órgão Especial - é o único pressuposto exigido para a adoção da nova técnica de julgamento estendido. Todavia, contra o acórdão unânime proferido no julgamento de apelação, pode a parte interessada aviar embargos de declaração. Estes, como é cediço, têm natureza constitutivo-integrativa. É dizer, a decisão proferida em sede de embargos de declaração, passa, como se fosse um amálgama, a fazer parte integrante do ato judicial embargado.

Assim, podem os aclaratórios mudar a decisão do apelo ou transformar o que era unânime em não unânime, chamando a intervir a regra do artigo 942 do CPC. Deste modo, sendo os embargos de declaração acolhidos, por maioria de votos, para modificar o julgamento unânime da apelação, deverá ser suspenso o julgamento com a convocação de dois julgadores para o prosseguimento dos trabalhos. Mas, ainda que os embargos sejam desprovidos, por maioria, o voto vencido pode retirar a unanimidade do Acórdão embargado, fazendo incidir a regra do artigo 942 do CPC.

Pense-se na hipótese seguinte: contra o Acórdão unânime que nega provimento ao recurso de apelação, foram interpostos embargos de declaração com efeitos modificativos. Enquanto dois votos rejeitam os aclaratórios, um voto dá-lhe provimento para prover o apelo e reformar a sentença. Ora, neste caso, o voto vencido proferido no julgamento dos embargos, pela sua natureza integrativa, ao tempo em que faz desaparecer a unanimidade do julgamento da apelação, autoriza a incidência da nova técnica de julgamento ampliado.

Pensamos estar correta a tese defendida pelo Relator do IAC nº 495116-8, Des. Frederico Ricardo de Almeida Neves, no sentido de que incidirá a regra prevista no art. 942 do CPC/2015 mesmo na hipótese de os embargos de declaração serem rejeitados por maioria de votos.

Como é de conhecimento geral, a decisão que julga os embargos de declaração possui a mesma natureza do ato judicial embargado, notadamente em razão do efeito integrativo, próprio dos aclaratórios, que objetivam complementar e aperfeiçoar a decisão impugnada, exaurindo a prestação jurisdicional que se encontra inacabada.

Por conseguinte, o voto vencido proferido no julgamento dos embargos de declaração integra o acórdão da apelação ou do agravo de instrumento, e, estando preenchidas as demais regras de incidência da técnica de ampliação do colegiado prevista no art. 942 do CPC/2015, deve-se reconhecer a possibilidade de aplicação da regra do mencionado dispositivo legal, mesmo na hipótese de os aclaratórios serem rejeitados por maioria de votos.

Mutatis mutandis, esse foi o entendimento firmado pela Segunda Seção do STJ no julgamento do EREsp nº 1290283/GO, senão vejamos:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES (ART. 530 DO CPC/1973). DIVERGÊNCIA MANIFESTADA NO ACÓRDÃO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS AO ACÓRDÃO UNÂNIME DA APELAÇÃO. CABIMENTO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS.

1. A decisão dos embargos de declaração possui a mesma natureza do ato judicial embargado, em razão do efeito integrativo, próprio dos aclaratórios, que objetivam complementar e aperfeiçoar a decisão impugnada, exaurindo a prestação jurisdicional que se encontra inacabada, configurando-se, portanto, o julgamento indireto da apelação.

2. São cabíveis embargos infringentes quando a divergência qualificada desponta nos embargos de declaração opostos ao acórdão unânime da apelação que reformou a sentença.

3. Embargos de divergência providos.

(EREsp 1290283/GO, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 11/04/2018, DJe 22/05/2018)

Naquela oportunidade, prevaleceu o voto do Relator, Ministro Marco Aurélio Bellizze, ao qual nos reportamos por tê-lo como irrepreensível e perfeitamente aplicável à matéria em debate:

Assim, no caso em apreço, a sentença de primeiro grau havia julgado procedente o pleito inicial para condenar a instituição financeira ao pagamento de danos morais, os quais foram arbitrados em R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais). Contudo, o Tribunal de origem, por unanimidade, deu provimento à apelação interposta pela casa bancária, a fim de julgar improcedente o pedido.

Opostos embargos de declaração, o órgão colegiado, por maioria, rejeitou os aclaratórios, devendo-se ter em mente que o voto vencido mantinha a sentença de primeiro grau quanto ao mérito, porém reduzia a verba indenizatória para R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Desse modo, constata-se que houve o julgamento indireto da apelação por meio dos embargos de declaração, momento em que se exauriu o julgamento do apelo e tornou acabada a prestação jurisdicional, o que, consequentemente, torna viável a oposição dos embargos infringentes.

Portanto, entendemos ter o Órgão Especial do TJPE, quando do julgamento do IAC nº 495116-8, equivocado-se ao restringir a incidência da regra prevista no art. 942 do CPC/2015 apenas à hipótese de os embargos de declaração serem acolhidos por maioria.

Defendemos, portanto, que a técnica de complementação de julgamento não unânime incidirá sempre que o julgamento dos embargos de declaração for não unânime e implicar a alteração do resultado anterior.

Por outro lado, pensamos não ser aplicável a técnica de ampliação do colegiado na hipótese de o órgão julgador decidir, por maioria de votos, sobre a admissibilidade dos embargos de declaração ou se o órgão julgador rejeitar ou acolher apenas para esclarecer uma obscuridade, suprir uma omissão, eliminar uma contradição ou corrigir um erro material, sem alterar o resultado anterior, ainda que por maioria de votos.

Sobre o autor
Carlos Eduardo Jar e Silva

Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP. Assessor Técnico Judiciário do Tribunal de Justiça de Pernambuco - TJPE. Assessor do Des. Eduardo Sertório Canto.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Carlos Eduardo Jar. Da interpretação e abrangência da técnica de julgamento prevista no art. 942 do CPC/2015:: uma análise sobre as teses fixadas pelo TJPE em sede de IAC e os primeiros posicionamentos do STJ acerca do referido dispositivo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5918, 14 set. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74338. Acesso em: 27 dez. 2024.

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