Recentemente, o site do Tribunal Superior do Trabalho noticiou a suspensão do direito ao segredo de justiça em processo em que litigam portadores do vírus HIV. O Ministro João Batista Brito, relator do processo, entendeu ser desnecessária a confidencialidade do portador do vírus HIV que figura como litigante em causas que tramitem pelas Cortes Trabalhistas.
Brito Pereira afirma que "são tantos os casos que tramitam no TST sobre esse mesmo tema, que não vejo porque manter o segredo de justiça". Referido entendimento também foi seguido pelo ministro Gelson de Azevedo, quando afirmou que o movimento atual na sociedade é no sentido de acabar com a discriminação em relação à doença. Segundo ele, "as pessoas estão vindo a público, reconhecendo sua existência, razão pela qual não vejo sentido na necessidade da tramitação em segredo".
Tal entendimento foi reforçado pelo ministro Aloysio Correa da Veiga, quando afirmou que "a banalização do segredo de justiça" tem aumentado o número de processos nessas condições no TST. "A regra do art. 155 do Código de Processo Civil é específica no sentido de só admitir o segredo de justiça quando o interesse público determinar, e nos casos envolvendo direito de família", disse. "E, neste caso, me parece que o interesse público está a determinar justamente o contrário, até mesmo para evitar a discriminação".
Assim, entenderam os ministros do Tribunal Superior do Trabalho pela desnecessidade da anonimatização do nome dos litigantes portadores do HIV em processos judiciais trabalhistas. Sendo assim, cabem algumas observações a este entendimento externado por estes ínclitos julgadores.
Com esta decisão, o Brasil parece estar avesso ao pensamento que tem sido adotado por vários países da América Latina em relação à confidencialidade dos dados de pessoas portadoras do HIV, já que a proteção desses dados correspondentes a pacientes com HIV-SIDA é um denominador comum na legislação comparada, como, por exemplo, a da Argentina, Costa Rica e Uruguai. Existe, nesses países, proteção especial, principalmente na legislação que regula procedimentos médicos em relação aos portadores do HIV, aferindo restrições contundentes à divulgação de dados de pacientes portadores do HIV, que conferem total privacidade dos mesmos.
Na contramão desse pensamento, o Tribunal Superior do Trabalho propugna pela divulgação destes dados em processos judiciais, apesar de, no Brasil, existirem também normas semelhantes às das legislações alienígenas, como por exemplo, a disposta pela Resolução nº 1.665/2003 do Conselho Federal de Medicina, que aborda a questão da responsabilidade ética das instituições e profissionais médicos na prevenção, controle e tratamento dos pacientes portadores do vírus da SIDA (AIDS) e soropositivos e, em seu artigo 10º prevê que "o sigilo profissional deve ser rigorosamente respeitado em relação aos pacientes portadores do vírus da SIDA (AIDS), salvo nos casos determinados por lei, por justa causa ou por autorização expressa do paciente."
Portanto, percebemos que, na legislação latino-americana, a tendência é no sentido de proteger os dados que envolvam pacientes portadores do HIV e não a de divulgá-los, em virtude da própria carga de discriminação que esta doença comporta na sociedade. Por isso, o pensamento ventilado no Tribunal Superior do Trabalho de que os processos judiciais que envolvam portadores da HIV não devam tramitar sob a égide do segredo de justiça deve ser rapidamente revisto, no sentido de preservar o anonimato nas lides que discutam a situação dos portadores da AIDS, para evitar discriminações por parte da sociedade, advindas de informações judiciais, sob pena do próprio Estado vir a ser responsabilizado por danos morais materiais provenientes da divulgação indevida de dados que merecem confidencialidade.