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Definição de um novo marco regulatório para a indústria de gás natural no Brasil

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6. Sugestões da Associação Brasileira de Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado

            Por óbvio, certos agentes do setor do gás natural não envolvidos diretamente no processo legislativo de confecção do Projeto de Lei n.º 226/2005 procuram fazer suas vozes serem escutadas pelo legislador. É o caso da ABEGÁS, Associação Brasileira de Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado, que reúne, como membros efetivos, as distribuidoras estaduais. Dentre suas mais relevantes sugestões, pode-se enumerar:

            __Ampliar o capítulo que trata da produção.

            __Permitir o acesso aberto às Unidades de Processamento de Gás Natural (UPGN).

            __Permitir que o transporte possa ser autorizado, além de concedido, para o caso de não aparecerem interessados na licitação, ou em situações especiais de emergência.

            __Permitir que as distribuidoras também exerçam a atividade de armazenamento, necessária à modulação e à confiabilidade dos seus sistemas operacionais.

            São sugestões a serem levadas em conta e analisadas, haja vista se tratar de uma associação de grande participação no mercado e de interesse coletivo, vez que abarca um grupo de forte poder econômico. Ademais, medidas como a ampliação do capítulo que trata da produção e da exploração poderia conferir maior completude ao PL, que abarcaria todos os segmentos da indústria.


7. Atualidades

            De acordo com o já exposto no corpo do presente texto, procurou-se aqui traçar os delineamentos de um novo marco regulatório para o gás natural. Assim sendo, não se poderia deixar de abordar questões atuais envolvendo o setor. Eis porque escolhemos algumas notícias bastante atuais, que enriquecem o debate. São elas [19]:

            __O Ministério de Minas e Energia realizou reunião em 28/11/2005, para discutir o Projeto de Lei do Gás Natural.

            Tal notícia, bastante recente, demonstra o empenho do MME em acelerar estabelecimento de um novo marco regulatório para o gás. Ainda que tenha tratado do seu projeto e não do PL do Senado Federal, já se encontra aí um avanço, ante a discussão formal de uma legislação tão importante do ponto de vista energético.

            __Em reunião do Conselho Nacional de Política Energética – CNPE, Ministro de Minas e Energia declara não haver previsão para envio do Projeto de Lei ao Congresso Nacional.

            Neste caso, o Ministro de Minas e Energia está se referindo ao projeto intentado pelo seu Ministério. Ora, então é de se esperar que o PL n.º 226/2005 seja aprovado antes do projeto do MME, que ainda iniciará sua tramitação pelas Casas do Congresso, enquanto que o PL do Senado está em fase muito mais adiantada.

            Poderíamos inferir que essa notícia praticamente significa que o MME abriu mão do seu PL e irá participar das discussões em torno do projeto do Senado, buscando influir nos pontos em que entender necessário.

            __Preocupação da Petrobras com o marco regulatório do gás natural.

            Nada mais natural que a maior empresa do setor, a Petrobras, demonstre preocupação com relação ao novo marco regulatório para o gás. Com efeito, a Petrobras tem lucrado bastante com o sistema atual, vez que atua em todas as frentes da indústria gasífera, sem concorrentes à altura.

            Vale lembrar que a Petrobras também se insurgiu contra alguns pontos da Lei 9.478/97, que visava flexibilizar o monopólio do setor petrolífero, e fez bastante pressão para ter suas reivindicações atendidas. A empresa conseguiu, pelo menos, duas grandes vitórias [20]:

            a) Na chamada Rodada Zero, a Petrobras teve direito de escolher os blocos que mais lhe fossem convenientes, dentre aqueles em que tivesse realizado pesquisas, ou tivesse iniciado a exploração, bem como aqueles que considerasse economicamente atraentes.

            b) Em caso de empate em uma licitação para concessão de novos blocos, a Petrobras, ou um consórcio em que ela esteja envolvida, será declarada vencedora, em detrimento de empresas menores.

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            São dois privilégios inegáveis. A vitória com relação à Rodada Zero dispensa maiores comentários, vez que é notório que o poder de escolha fortaleceu ainda mais o poder da empresa. Quanto à declaração de vitória em caso de empate em licitações, há que se afirmar, categoricamente, que essa disposição fere frontalmente o Princípio da Isonomia, consagrado na Constituição da República. A despeito de sua inconstitucionalidade, a medida continua sendo aplicada, ao arrepio da lei.

            O mais interessante é que, mesmo com todo o esperneio da Petrobras com relação à Lei do Petróleo, a empresa segue batendo recordes de lucro e produtividade, o que certamente continuará ocorrendo posteriormente à aprovação dão Projeto de Lei do Gás. A Petrobras, como maior empresa brasileira, tem todo direito de defender seus interesses, mas, no caso específico do gás natural, sua gana de querer crescer sem deixar que outros agentes a acompanhem parece ser exacerbada, ainda que empresa seja responsável por inúmeros avanços tecnológicos observados no setor.


8. Conclusão

            Diante do exposto, podemos inferir que, sem sombra de dúvida, o arcabouço vigente ressente-se de disposições que contemplem as especificidades da indústria do gás natural, fato este que muito vem contribuindo para que o setor não alcance o desempenho almejado.

            Questões importantes, como o transporte através de gasodutos, bem como os mecanismos legais que autorizam sua operação deverão ser prioritariamente revistos, no sentido de se estabelecer um ambiente seguro às inversões necessárias ao incremento da malha de transportes nacional.

            Outro fator de extrema importância para o desenvolvimento do setor e que merece destaque é a questão do livre acesso, que, segundo os especialistas, consiste em item de premente importância no que diz respeito à inserção de novos agentes nos segmentos de produção e comercialização do gás natural. Teoricamente, com o implemento do livre acesso, dois serviços distintos seriam viabilizados: gás natural para os consumidores finais, bem como transporte para grandes consumidores finais e outros participantes da indústria que adquirirem gás natural de forma independente no mercado atacadista, promovendo, indubitavelmente, um incremento da participação do gás na nossa matriz energética.

            A questão dos critérios para o cálculo de tarifas para a utilização dos gasodutos também constitui item de valorosa importância para o desenvolvimento desta infante indústria, no sentido, principalmente, de diminuir o poder de mercado da Petrobrás neste segmento. Através destes valores, a estatal pode inibir a presença de outros agentes, bem como discriminar preços para o consumidor.

            O papel do órgão regulador forte e isento, neste sentido, é de fundamental importância, uma vez que, através de mecanismos de regulação tarifária e minimização das assimetrias de informação, promovendo um ambiente onde a transparência das relações, bem como a clareza dos institutos inerentes às atividades se constituir em regra para o setor, certamente estaríamos diante de um cenário altamente favorável ao crescimento desta indústria.

            Destaque-se ainda que, neste cenário futuro, serão de extrema importância a troca de informações entre as agências reguladoras federais (leia-se: ANP e ANEEL), assim como entre estas e as agência estaduais, uma vez que o setor gasífero sofre a influência de duas esferas de competência concomitantemente, em razão dos dispositivos constitucionais previstos nos arts. 25 e 177 da Constituição Federal.

            Cumpre salientar que, a despeito deste ou daquele Projeto de Lei que vier a ser adotado para o setor gasífero, o fato é que resta sobejamente provado que, com a implantação de um novo marco regulador, obteríamos ganhos de eficiência e produtividade que certamente reverter-se-iam em benefícios a toda a coletividade.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

            Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL (www.aneel.gov.br)

            Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP (www.anp.gov.br)

            BRASIL. Constituição Federal de 05 de outubro de 1988.

            BRASIL. Lei Federal 9.478, de 06 de agosto de 1997

            BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei n.º 226/2005.

            CAMACHO, Fernando Tavares. Regulação da industria do gás natural no Brasil. Rio De Janeiro: Interciência, 2005.

            MANEZELLO, Maria D’Assunção Costa. Comentários à Lei do Petróleo. São Paulo: Atlas, 2000.

            MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001.

            MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13 ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

            MME – Ministério de Minas e Energia. Portaria n.º 432/03

            A UM passo da auto-suficiência. Anuário Exame 2005-2006, São Paulo, n. 01, p.102-103, 01 nov. 2005. Semanal.

            PEREIRA NETO, Caio Mario da Silva. Gás Natural: Regulação e Defesa da Concorrência. Disponível em: . Acesso em: 29 nov. 2005

            ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO ABEGÁS. Presidente da Abegás comenta pontos do projeto de lei para o gás natural. Disponível em: . Acesso em: 29 nov. 2005.

            LUDMER, Paulo. Gás requer mercado secundário regulado. Disponível em: . Acesso em: 29 nov. 2005.

            PIRES, Adriano; CAMPOS FILHO, Leonardo. A importância de uma lei para o gás natural. Disponível em: . Acesso em: 29 nov. 2005

            ALVEAL, Carmem; ALMEIDA, Edmar de. Livre acesso e investimento na rede de transporte da indústria brasileira de gás natural: questões (im)pertinentes. Rio De Janeiro: Instituto De Economia-UFRJ, 2002.

            Website Canal Energia. http://www.canalenergia.com.br/zpublisher/materias.asp?id=50280&secao=Noticiario http://www.canalenergia.com.br/zpublisher/materias.asp?id=50309&secao=Noticiario


Notas

            01

É fato que poucas mudanças se operaram neste cenário até o presente momento, mas a questão reside, sobretudo, como pretendemos demonstrar, na ausência de instrumentos que viabilizem as políticas públicas estabelecidas para o setor.

            02

ALVEAL, Carmen, OLIVEIRA, Edmar de. Livre Acesso e Investimento na Rede de Transporte da Indústria Brasileira de Gás Natural: questões (im)pertinentes. Instituto de Economia, UFRJ.

            03

CAMACHO, Fernando Tavares. Regulação da Indústria do Gás Natural no Brasil. Rio de Janeiro: Interciência, 2005.

            04

idem

            05

idem.

            06

PEREIRA NETO, Caio Mário da Silva. Gás Natural: regulação e defesa da concorrência. www.gasnet.com.br

            07

CECCHI, José Cesário, ANP.

            08

CECCHI, José Cesário, ANP.

            09

LUDMER, Paulo, Gás requer mercado secundário regulado. www.canalenergia.com.br

            10

Incertezas sobre fornecimento de gás limitam a expansão da geração térmica, diz CNI. www.canalenergia.com.br

            11

http://www.canalenergia.com.br/zpublisher/materias.asp?id=50280&secao=Noticiario

            12

Cumpre ressaltar que a Lei 9.478/97 foi parcialmente alterada pela Lei 11.097/05, que, dentre outras coisas, incluiu os biocombustíveis no âmbito da primeira.

            13

Tendo em vista a boa técnica jurídico-legislativa, o Projeto de Lei n.º 226/2005 não teria, à primeira vista, a necessidade de esgotar toda a matéria referente ao ONGÁS, o que poderá ficar a cargo de uma outra norma, que esmiuçará a organização desse órgão, bastando apenas fazer alusão à legislação já existente. Entende-se, assim, que o capítulo IV do PL pode não ser a última palavra em termos do ONGÁS, embora tenha extrema relevância e se revista do caráter de pedra fundamental.

            14

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Malheiros Editores. São Paulo, 2001.

            15

CAMACHO, Fernando Tavares. Regulação da Indústria de Gás Natural no Brasil. Interciência. Rio de Janeiro, 2005.

            16

Idem.

            17

Idem.

            18

MANEZELLO, Maria D’Assunção Costa. Comentários à Lei do Petróleo. Atlas. São Paulo, 2000.

            19

WebSite Canal Energia http://www.canalenergia.com.br/zpublisher/mate rias.asp?id=50309& secao= Noticiario

            20

MANEZELLO, Maria D’Assunção Costa. Comentários à Lei do Petróleo. Atlas. São Paulo, 2000.
Sobre os autores
Gustavo Vilas Bôas

advogado, bolsista da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), mestrando em Regulação da Indústria de Energia, da Universidade Salvador (UNIFACS)

Patrícia Crichigno Távora

advogada, bolsista da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), mestranda em Regulação da Indústria de Energia, da Universidade Salvador (UNIFACS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BÔAS, Gustavo Vilas; TÁVORA, Patrícia Crichigno. Definição de um novo marco regulatório para a indústria de gás natural no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 930, 19 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7860. Acesso em: 18 nov. 2024.

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