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Regime jurídico da EIRELI no direito brasileiro

Agenda 24/12/2019 às 15:08

O presente trabalho visa analisar a EIRELI sob uma nova perspectiva, teremos uma análise do que impulsionou a construção dessa nova pessoa jurídica e quais as suas características fundamentais.

 

INTRODUÇÃO

O Estado tem a função de promover o desenvolvimento nacional e sustentável e de fornecer um tratamento jurídico diferenciado para que a atividade, do Microempresário e do Empresário de pequeno porte possa se estabelecer e seja estimulada, nesse sentido a partir do advento da Lei 12.441/2011, através da qual nasceria a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, o Estado então estaria fornecendo mecanismos de desenvolvimento de um tipo societário que atenderia os anseios do Microempreendedor e do Empresário individual.

Porém com a necessidade de um capital social mínimo de 100 (cem) salários mínimos, a EIRELI, que deveria estimular o crescimento daqueles que estão começando no ramo empresarial, fugiu em alguns aspectos da sua finalidade. Dessa forma o presente trabalho visa analisar a EIRELI tanto do ponto de vista da sua criação, bem como a sua finalidade que de certa forma não está sendo cumprida.

Dessa forma, através do auxílio do livro Ulhoa, Coelho, 2016, será sustentado o tema supramencionado. A função da limitação da responsabilidade dentro de uma sociedade, o capital social da sociedade que difere do patrimônio privado do sócio, o apoio que deve ser dado a pequena e a média empresa, a polêmica acerca da Inconstitucionalidade ou não da EIRELI, e o capital social mínimo para a sua constituição.

 1.    EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA

 

O termo “EIRELI”, Empresa individual de responsabilidade limitada, não remonta a um empresário individual. É uma denominação que foi adotada pela Lei brasileira; para trazer em nosso ordenamento jurídico; a figura da sociedade limitada unipessoal, ou seja uma sociedade limitada que é constituída por apenas um sócio (COELHO, P.22, 2016). A Lei 12.441/2011 trouxe a definição própria do referido instituto: a EIRELI é uma pessoa jurídica de direito privado com responsabilidade limitada, constituída por um único titular, destinada ao exercício de comércio, indústria, prestação de serviços ou qualquer outra atividade econômica com fins de lucro, sendo assim as dívidas contraídas pela empresa incidirão apenas na pessoa jurídica, os bens privados do titular da empresa não responderam pelas dívidas assumidas pela empresa.

O titular da EIRELI, como todos os sócios das sociedades empresárias, não é classificado como empresário, uma vez que empresário é a pessoa física ou jurídica que exerce atividade organizada em nome próprio. Sendo assim, seria a própria EIRELI o empresário o sujeito de direito e de deveres que pratica a atividade empresarial, contrata, emite ou aceita títulos de crédito, sendo parte legítima para requerer a recuperação judicial, ou para ter a sua falência requerida e decretada.

Vale ressaltar que, embora seja passível de inúmeras críticas, a disponibilização de um mecanismo limitativo de responsabilidade do exercício individual da empresa no ordenamento pátrio vigente é de notório avanço legislativo. Isso está ligado ao fato de que, na Europa e na América latina, tem-se várias legislações que preveem alguma maneira de limitar a responsabilidade do empreendedor individual. É indiscutível que a EIRELI, embora requeira um valor significativo de capital social para sua constituição, irá oferecer àquelas atividades consideradas pequenas e de médias estruturas, uma forma de organização e manutenção menos vultosa, o que influenciará de forma direta no desenvolvimento econômico brasileiro. (COELHO, 2016, p.22,).

A EIRELI pode ter natureza simples ou empresarial. Todas as atividades econômicas privadas que podem ser exploradas consideradas simples ou não empresárias; como sociedade de médicos, arquitetos ou advogados. Logo, quando se tratar de uma EIRELI empresária ela deverá ser registrada na junta comercial; se simples, no cartório de registro civil de pessoas jurídicas. O nome empresarial poderá ser firma ou denominação, devendo-se acrescentar a sigla EIRELI ao final do nome.

A legislação pátria que tratou dessa nova forma de exercício das atividades empresárias e simples, traz previsões bem específicas sobre a integralização do capital, que deverá ser feita no ato constitutivo da empresa individual de responsabilidade limitada em que valor não será inferior 100 (cem) vezes o maior salário mínimo vigente no País. Essa integralização poderá ser feita, em dinheiro ou mediante a transferência de bens móveis ou imóveis. É exigido, ainda, declaração afirmando a integralidade do capital social, sob pena de sanção, caso não seja verdadeira. Em caso de aumento do salário mínimo não há de se falar em alteração do capital social. Em todo caso, é vedada a integralização de capital sob a forma de trabalho ou serviços.

 Prevê, ainda, a lei, que cada pessoa natural poderá ter uma única EIRELI, não havendo impedimento quanto a participação da EIRELI em uma sociedade empresária.

Art. 980- A: A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.

§ 2º A pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade.

 

Dessa forma pode se concluir, que de acordo com a Lei 12.441/11, não existe nenhum impedimento legal para que uma pessoa jurídica, seja titular do capital social de uma EIRELI, sob a ótica de uma ordem jurídica liberal, conclui-se que aquilo que não está proibido ou ordenado será permitido. Com base no princípio da legalidade previsto no Art. 5, inciso II, da Constituição Federal, que estabelece que Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa se não em virtude de Lei” (SCHLOSSER, 2012).

No ramo do direito privado, onde está enquadrado o direito societário, a pessoa física, bem como a pessoa jurídica, é livre para explorar a atividade econômica, na forma em que ela ensejar, salvo quando houver previsão legal expressa em sentido contrário.

Assim sendo se não houver proibição legal, a pessoa jurídica terá os mesmos direitos da pessoa natural na constituição de sociedades ou de empresas.

Como apresentado a seguir, dentro da legislação aplicável à EIRELI, não se tem nenhuma restrição à sua constituição por outra pessoa jurídica: O caput do art. 980-A menciona que “A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social”. A expressão pessoa é ampla, não existe uma especificação ou uma restrição em relação ao seu titular ser pessoa física ou pessoa jurídica;

Segundo o Art. 980-A, § 1º “O nome empresarial deverá ser formado pela inclusão da expressão "EIRELI" após a firma ou a denominação social da empresa individual de responsabilidade limitada”. Dessa forma o Art. 1º mencionado acima traz a possibilidade de ter na denominação social a expressão “EIRELI”, que pode ser aplicada na hipótese do titular ser pessoa jurídica.

2.    A FUNÇÃO DA LIMITADAÇÃO DA RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS JURÍDICAS NO DIREITO BRASILEIRO

 

Muitos comerciantes, antes do advento da função da limitação da responsabilidade das pessoas jurídicas, se viam desmotivados para empreender, pois o eventual risco patrimonial era grande, e não havia nenhuma proteção legal àqueles que arriscassem sua riqueza em empreendimentos, então caso a atividade não obtivesse sucesso, aquele que empreendesse estaria à deriva (MOREIRA, 2016, p.13).

Mesmo nas primeiras estruturas de organização jurídica que eram dedicadas a exploração de atividades mercantis, já se buscava a limitação da responsabilidade. Tem-se informações de que na Idade Média, vários comerciantes procuravam uma forma de validação de algum meio limitativo de responsabilidade, que estivesse pronto para proteger os riscos da atividade comercial, mesmo que parcialmente, porque mesmo que tais atividades estivessem regadas de boa-fé e que houvesse um grande esforço para o seu sucesso, se ela fosse malsucedida haveria tal proteção.

O grande avanço das atividades comerciais, sua sofisticação e a crescente complexidade e a busca por mais investimentos, foram razões relevantes para que se almejasse, de maneira ainda mais incisiva, uma técnica que se permitisse conciliar a continuidade da realização das atividades comerciais, e que se fosse diminuído os riscos patrimoniais assumidos na exploração do negócio.

Mediante isso, foi reconhecido a possibilidade de limitar os riscos da atividade negocial através da atribuição do benefício aos empresários coletivamente organizados, de maneira que, com o surgimento das formas societárias, tem-se a limitação da responsabilidade dos empresários que se encontrassem agrupados, trazendo assim, o princípio da responsabilidade patrimonial ilimitada.

Juntamente com a criação da personalidade jurídica nasceu a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, ou seja os bens particulares dos sócios das sociedades não poderão ser executados por dívidas assumidas pelas mesmas, somente após a execução de todos os bens sociais, conforme previsão no art. 1024, do Código Civil. Dessa forma a autonomia patrimonial é a base para limitar a responsabilidade dos sócios.

A função de tal limitação visa proteger o sócio, e fazer com que os bens da sociedade não se confundam com os bens da empresa, além de dar uma maior proteção para o sócio enquanto pessoa física, ajuda nas relações jurídicas existentes entre as sociedades.

3. O CAPITAL SOCIAL E A SEPRAÇÃO PATRIMONIAL SÓCIO X SOCIEDADE

 

O capital social, quer de uma EIRELI quer das sociedades personificadas, trata-se do patrimônio da sociedade no ponto inicial de suas atividades. Um valor em dinheiro ou em bens com o qual o empresário irá iniciar o exercício da atividade que caracteriza o objeto do empreendimento. Esse patrimônio no momento zero da atividade empresarial ou simples irá, por óbvio, se alterar positiva ou negativamente no decurso do tempo. Contudo, o valor integralizado ou não a título de capital social permanecerá como valor histórico para fins de eventual responsabilização dos sócios ou titular de uma EIRELI. (COELHO, 2016, p.79).

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A função do capital social está intimamente ligada à separação patrimonial entre sócios e sociedade.

Os credores da sociedade ou da EIRELI, em regra, só poderão exigir seus débitos desses sujeitos, não dos sócios ou titular da empresa individual de responsabilidade limitada. É por meio desse artifício jurídico que os interessados em investir capitais em atividades simples ou empresárias poderão diluir seus riscos, impedindo que dívidas de suas atividades profissionais consumam seus patrimônios pessoais. Lado outro, essa separação patrimonial permite aos credores que, caso haja mau uso da pessoa jurídica criada pelos sócios ou titular da EIRELI ou confusão patrimonial entre esses sujeitos, à medida em que pode, nesses casos, relativizar a personalidade jurídica das sociedades ou EIRELI’s e responsabilizar sócios ou gestores da pessoa jurídica.

Outra função do capital social é fixar a responsabilidade dos sócios até a integralização do capital social. Caso uma sociedade anônima venha ter sua falência decretada antes da integralização do capital social, cada sócio que subscreveu, mas não integralizou o capital, torna-se responsável pelo valor subscrito. No caso das sociedades de pessoas, cada sócio é obrigado solidariamente pelo total do capital subscrito e não integralizado.

Com relação às EIRELI’S, a lei previu a necessidade de que todo o capital social fosse integralizado no ato de sua constituição (art.980-A, do Código Civil). Não bastasse isso, determinou, ainda, o legislador, que essa integralização não poderia ser inferior ao importe de cem salários mínimos. Eis o exato teor da norma:

Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.” (Código Civil Brasileiro, dispositivo incluído pela Lei nº 12.441, de 2011).

Com base no artigo acima supramencionado, fica claro que é obrigatório ter um capital mínimo para que uma EIRELI”seja constituída, (Santos, 2017).

Nesse sentido, é o entendimento de Travassos (2015):

Ao lado da unipessoalidade permanente, a exigência de capital mínimo de 100 (cem) salários mínimos devidamente integralizado no ato de constituição (originária ou superveniente) da EIRELI apresenta-se como característica essencial distintiva entre Empresa Individual de Responsabilidade Limitada e os demais tipos societários previstos no Código Civil e nas leis especiais. São, inclusive, estas características que justificam a inclusão da EIRELI em Título próprio (Título I-A) e em inciso destacado no corpo do artigo 44 do Código Civil (inciso VI). (TRAVASSOS, 2015, p. 204).

Segundo Abraão (ano):

O legislador buscou três vertentes que conseguisse amparar a atividade empresarial individual. A primeira diz respeito ao exemplo de pequeno empreendedor para que ocorra a regularização da sua atividade, a segunda fala a respeito da constituição do capital social, objetivando 100 salários mínimos para o teto base, e não obstante a última aduz a respeito da responsabilidade ser vinculada ao valor empregado.

Nesse sentido, existe a posição legislativa e doutrinária para contextualizar a exigência do capital social mínimo para a constituição da EIRELI.

4.    O TRATAMENTO ISONÔMICO ENTRE OS AGENTES ECOÔMICOS E O APOIO A PEQUENA E MÉDIA EMPRESA

 

Segundo os artigos 3, inciso II; Art. 146, incisos II, III, alínea D e parágrafo único; 170, VI e IX; 174, § 1º; e 179, todos da Constituição Federal de 1988, deverá ao Estado promover o desenvolvimento nacional e sustentável, fornecendo um tratamento jurídico diferenciado e favorecido às microempresas e as empresas de pequeno porte.

Prevê o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de pequeno Porte (Lei complementar nº 123, criada em 14 de dezembro de 2006), com a finalidade, de promover o desenvolvimento nacional e de ampliar a atuação dos pequenos negócios nas compras realizadas pelo governo. E dessa forma aduz em seu Art. 47, que a Administração Pública, (direta e indireta), deverá realizar licitações atribuindo benefícios às microempresas e empresas de pequeno porte, para dessa forma haver uma isonomia entre tais institutos em relação as demais formas societárias, (BARBOSA, 2017).

O Decreto nº 8.538/2015, dispõe sobre os artigos 42 a 45, 47 a 49 da LC 123/2006, (revogando assim o Decreto nº 6.204/200), ampliando o leque de possibilidades de utilização de benefícios, por parte de licitantes, com a finalidade de promover o desenvolvimento econômico e social, na esfera local e regional, e assim ampliar a eficiência das políticas públicas incentivando a inovação da tecnologia.

É obrigatório o tratamento diferenciado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte, e nesse sentido tem se manifestado o TCU: Acerca da obrigatoriedade no tratamento diferenciado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte, tem se manifestado reiteradamente o TCU:

Os privilégios concedidos às microempresas e empresas de pequeno porte por força dos arts. 42 e 43 da Lei Complementar nº 123/2006 independem da existência de previsão editalícia, sendo de observância obrigatória pela Administração, quando se deparar com situação fática que se subsume aos comandos normativos em destaque (Acórdão 2505/2009 Plenário).

 

O grau de eficácia dessas políticas públicas de tratamento diferenciado e tratamento favorecido e simplificado para microempresas e empresas de pequeno porte, ou seja o estímulo aos negócios pequenos, como forma de desenvolvimento nacional e sustentável é previsto em números, por instituições tais como o SEBREAE, o IBGE, e o próprio Governo Federal, dentre outros, no entanto os dados constantes são escassos, não existe uma reunião desses valores e índices.

Um ponto que tem gerado certa discussão, inclusive havendo a manifestação de Cortes Superiores, é em relação ao possível conflito existente entre o tratamento favorecido dispensado às ME e EPP, e o consagrado princípio da isonomia. No entanto a posição majoritária, é de que não há afronto a tal princípio, uma vez que não haveria paridade material na relação inicial. Ao contrário, é através do tratamento favorecido as microempresas e empresas de pequeno porte, que tem se almejado a possibilidade de estas concorrerem de forma equitativa com as grandes empresas. Segundo Jair Eduardo Santana e Edgar Guimarães:

Deverá haver certos limites para o tratamento diferenciado, o tratamento diferenciado não deverá ir além daquele que for devidamente necessário para sanar as diferenças entre as pequenas e grandes empresas, sob pena de ir em desacordo com o princípio da isonomia.

Conforme o Recurso Extraordinário 627.543- Rio Grande do Sul:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. MICRO EMPRESA E EMPRESA DE PEQUENO PORTE. TRATAMENTO DIFERENCIADO. SIMPLES NACIONAL. ADESÃO. DÉBITOS FISCAIS PENDENTES. LEI COMPLEMENTAR Nº 123/06. CONSTITUCIONALIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.

A LC 123/2006, em consonância com as diretrizes traçadas pelos arts. 146, III, d e parágrafo único; 170, IX; e 179 da CF, visa à simplificação e à redução das obrigações dessas empresas, conferindo a elas um tratamento jurídico diferenciado, o qual guarda, ainda, perfeita consonância com os princípios da capacidade contributiva e da isonomia. Ausência de afronta ao princípio da isonomia tributária. (RE 627.543, rel. min. Dias Toffoli, j. 30-10-2013, P, DJE de 29-10-2014).

Sendo assim, não há ofensa ao princípio da isonomia tributária se a lei, por motivos extrafiscais, imprime tratamento desigual a microempresas e empresas de pequeno porte de capacidade contributiva distinta (...) [ADI 1.643, rel. min. Maurício Corrêa, j. 5-12-2003, P, DJ de 14-3-2003].

No mesmo aspecto, o fomento da microempresa e da pequena empresa foi elevado à condição de princípio constitucional, de modo a orientar todos os entes federados a conferir tratamento favorecido aos empreendedores que contam com menos recursos para fazer frente à concorrência. [ADI 4.033, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 15-9-2010, P, DJE de 7-2-2011].

5.    DISCUSSÃO

 

A EIRELI veio para suprir a necessidade do pequeno e médio empresário, que até então não tinha um modelo societário que cumpria com suas necessidades, busca uma vertente para que a atividade empresarial possa ser exercida por uma única pessoa, que detenha responsabilidade limitada, sem que o seu patrimônio pessoal seja dilapidado em virtude de dívidas da pessoa jurídica, (CENSI, Gilmara Reis; TOMAZ, Roberto Epifânio, 2012).

O risco sempre fará parte da atividade empresarial, por isso que a EIRELI veio para poder dar uma maior oportunidade aos pequenos empreendedores, mas tem-se aqui uma questão bastante relevante que é tema de discussão na doutrina e na jurisprudência, é em relação ao capital social mínimo que deverá ser integralizado para que ocorra a constituição da EIRELI, dessa forma, devemos analisar a Lei 12.444/11, a luz da Constituição.

Segundo o Princípio da livre iniciativa previsto no Art. 1º, IV, da CRF/88: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”. Outrossim, o art. 170, Parágrafo único, da CRF/88 traz o seguinte texto: “É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”.

Dessa forma, a Lei 12.441/11, foi objeto de Ação direta de inconstitucionalidade antes mesmo de entrar em vigor, sob o escopo de violar o Princípio da livre iniciativa, uma vez que é vedado constitucionalmente a associação do salário mínimo a qualquer fim que seja. A Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 463729 - foi proposta pelo partido popular Socialista (PPS) perante o Supremo Tribunal Federal em 12 de agosto de 2011 e, atualmente, encontra-se para julgamento no órgão. A ADI retromencionada questiona o caput do artigo 980-A do Código Civil, parte final, o qual dispõe que “o capital social não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País”. Nesse sentido argumenta-se que o salário mínimo não pode ser critério de definição para determinar o valor do capital mínimo necessário para a constituição das empresas individuais de responsabilidade limitada.

Segundo o partido político popular socialista, tal exigência encontra-se vedada na vinculação do salário mínimo, para qualquer fim, previsto no (Art, 7, IV, da CRF/88):

São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.

Nesse diapasão, levantando a questão da violação do princípio da livre iniciativa, pois houve uma limitação a possibilidade de aberturas de empresas individuais de responsabilidade limitada por pequenos empreendedores que detenham capital social abaixo de 100 salários mínimos. Sobre o tema, existem diversos entendimentos doutrinários acerca da inconstitucionalidade da EIRELI, para OLIVEIRA A limitação tem por objetivo garantir a recuperação mínima de crédito para operações existentes entre credores e as futuras EIRELIS, na intenção de diminuir o risco da inadimplência”. (OLIVEIRA, 2012).

Neste mesmo sentido PINHEIRO (2012) ensina que:

A fixação do capital inicial mínimo também visou dificultar que a EIRELI fosse utilizada para fraudar a legislação trabalhista, tal como vem sendo utilizado o regime jurídico do microempreendedor individual (MEI), previsto no art. 68 da Lei Complementar 123/2006. É que, na prática, muitos empregadores, buscando diminuir custos com mão de obra, têm demitido seus empregados e, logo, em seguida, os têm recontratado, fraudulentamente, na condição de microempreendedores individuais. Com a fixação do piso inicial de 100 (cem) salários mínimos, espera-se que a EIRELI seja desestimulada a servir de ferramenta para fraudes trabalhista. (PINHEIRO, 2012).

Já para PESSOA (2012):

Deve se estabelecer um valor mais razoável, que deverá ser igualado do disposto pelo Juizado Especial Federal Cível, o qual tem competência para processar e julgar causas de até 60 salários mínimos, uma vez que a fixação de 100 salários mínimos, não abarcaria a capacidade econômico-financeira dos interessados nesta modalidade societária. (PESSOA, 2012).

 

Da mesma maneira tem-se FORTES (2012):

 

Segundo ele a fixação de um capital social mínimo de 100 salários mínimos, violaria o princípio da razoabilidade, podendo dessa forma trazer um retrocesso que impossibilita a celebração para àqueles que não detêm tal quantia. (FORTES, 2012).

 

Já no que tange a Inconstitucionalidade da EIRELI por violar o dispositivo previsto na Constituição Federal, em relação a vinculação do capital social mínimo para se constituir uma EIRELI, ao salário mínimo, para FORTES “Esta vinculação ao salário mínimo não irá ferir a constituição, pois trata-se de uma proibição relativa, tendo em vista as hipóteses em que a própria Constituição nos permite vincular ao salário mínimo”.

Nesse sentido tem-se TOMAZETTE (2012) preleciona que:

 

Não existe inconstitucionalidade na limitação de um capital social de 100 salários mínimos para se constituir uma EIRELI, visto que deve se proteger os credores, e o princípio da livre iniciativa tem uma função social, ou seja não representa uma liberdade econômica de forma absoluta, devendo o mesmo se adequar a outros princípios constitucionais, inclusive os princípios da função social, da propriedade e o da livre concorrência, para que dessa forma o Estado possa limitar a liberdade empresarial, sendo ponderado os valores da livre iniciativa e da livre concorrência, a vedação da vinculação ao salário mínimo, deve se voltada de forma específica para salários e vencimentos, porque se não fosse assim, os limites de competência dos juizados especiais seriam inconstitucionais também. (TOMAZETTE, 2012)

 

Desta forma, vale ressaltar que o Supremo Tribunal Federal já se pronunciou, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3934, em que figurava como Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, no Tribunal Pleno, que foi julgado no dia 27 de Maio de 2009, em que segundo a CRF/88, é vedada a vinculação ao salário mínimo, como parâmetro de prestações periódicas, e não como critério de indenização ou de condenações.

Vale ressaltar, portanto, que os entendimentos acerca do tema são divergentes, de um lado existe quem defenda que limitação de um capital social mínimo, para que se possa constituir uma empresa individual de responsabilidade limitada, visto que oferece uma segurança maior aos credores, em seus negócios jurídicos, este modelo de pessoa jurídica. Já por outro lado existe aqueles que sustentam que a limitação do capital social neste valor, estaria restringindo as microempresas e empresas de pequeno porte, que não possuem capacidade econômica para tal capital.

No entanto no que tange a discussão a vinculação de um capital social mínimo para a constituição da EIRELI ao salário mínimo ferir preceito constitucional, tem-se o inverso do que foi fundamentado na Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta, os entendimentos acerca do tema, são pela sua constitucionalidade, ou seja que a vinculação de um capital social mínimo ao salário mínimo para se constituir uma EIRELI não fere a Constituição.

Mas, todavia, não podemos deixar de observar que há um cerceamento de possibilidades para aqueles que não possuem tal capital social, o que dificulta a possibilidade de existirem empresas individuais de responsabilidade limitada. Dessa maneira isso entra em confronto com o apoio oferecido pela própria carta magna a micro empresa e a empresa de pequeno porte, visto que seu objetivo é estimular o desenvolvimento econômico dando capacidade para aqueles que querem empreender, mas não possuem uma capacidade econômica vultuosa.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O desenvolvimento do tema apresentado buscou analisar de forma sucinta a empresa individual de responsabilidade limitada, abordando a discussão acerca da constitucionalidade da Lei nº 12.441/11, tendo em vista ser exigido para sua formalização um capital mínimo que esteja vinculado ao maior salário mínimo vigente no País.

No primeiro momento tem-se uma análise da EIRELI, quanto a sua definição e denominação, bem como a sua forma de constituição. A empresa individual de responsabilidade limitada é uma nova modalidade empresária, que contém algumas peculiaridades do empresário individual e da sociedade limitada, como já foi supramencionado.

A responsabilidade na EIRELI se assemelha aquela prevista na sociedade limitada, sendo que as obrigações referentes ao titular da empresa, estão limitadas ao patrimônio que foi constituído, e sendo o caso excepcional a responsabilidade se estenderá ao seu patrimônio pessoal.

No segundo momento é feita uma breve análise histórica da função da limitação da responsabilidade das pessoas jurídicas no direito brasileiro, como foi esboçado a questão já era levantada, nas primeiras estruturas de organização jurídica que visava a exploração da atividade mercantil. Dessa forma, com o passar dos anos e com a evolução da atividade comercial, bem como da sociedade, o Estado assume a posição de regular a atividade comercial, criando um limite em relação a responsabilidade das pessoas jurídicas no ordenamento jurídico pátrio. Nascendo assim a personalidade jurídica das sociedades empresarias, e a autonomia patrimonial, por conseguinte a limitação da responsabilidade das pessoas jurídicas.

No terceiro momento, é analisado a função do capital social dentro da “EIRELI” o patrimônio da sociedade significa a economia da sociedade, sendo um conjunto de bens (matérias e imateriais), compreendidos não apenas por seu capital social, mas também por tudo aquilo que a sociedade venha a adquirir durante a sua existência, abarcando inclusive todas as suas dívidas. O capital social, pode ser constituído em dinheiro ou em bens, porém é vedado a sua forma de contribuição através de serviço “trabalho”, o que é permitido na sociedade simples, e tal vedação encontra-se no art. 1.055, Caput e Parágrafo 2º do Código Civil de 2002, como já foi tratado em tópico especial para tal tema acima.

No quarto momento é tratado do apoio a pequena e a média empresa no Brasil, tal tema está previsto Constitucionalmente artigo 3º, inciso II; art. 146, incisos II e III, alínea D e parágrafo único; artigo 170, VI e IX; artigo 174, parágrafo 1º e artigo 179, todos da Constituição Federal de 1988;  dessa maneira o Estado visa estimular pequenos empreendedores a praticar a atividade empresarial, o Estado deve promover o desenvolvimento nacional e sustentável, dando um tratamento jurídico distinto e favorecido às microempresas e as empresas de pequeno porte.

No quinto momento tem-se o levantamento da discussão sobre a EIRELI, e o capital social mínimo para sua integralização. Se a EIRELI tem o dever de estimular o pequeno e o médio empresário, porque um capital social tão elevado, dessa forma nasce um desentendimento acerca da EIRELI e da implementação da sua Lei no Brasil, sob o ponto de vista do estimulo a atividade empresarial e sob a ótica da Constituição.

A atividade empresarial, sempre será pautada no risco, e isto está dentro até mesmo do conceito de empresário, visto que é ele quem assume o risco da atividade empresarial. A empresa individual de responsabilidade limitada tem o condão de ofertar uma maior oportunidade aos pequenos empreendedores, a crítica está no capital social mínimo que deve ser integralizado de acordo com os moldes da Lei 12.444/11, se tal modalidade empresaria é para aqueles que detém uma renda menor, tal capital social não está em conformidade com quem tem o desejo explorar a atividade. Nesse sentido tal limitação viola o princípio da razoabilidade e o da livre iniciativa, conforme prevê o artigo 1º, IV, da CRF/88: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” e segundo o artigo 170, Parágrafo único, da CRF/88: “É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”.

Em relação a Constitucionalidade da Lei como já foi mencionado acima, ainda é tema de discussão dentro da Doutrina e da Jurisprudência, o partido político popular socialista, foi quem interpôs a ADI nº 463729- perante o Supremo Tribunal Federal, no dia 12 de agosto de 2011 e, atualmente, ainda encontra-se para julgamento em tal órgão. Segundo o partido político popular socialista, a exigência é vedada, pois veda-se a vinculação do salário mínimo, a qualquer fim, conforme o artigo 7, IV, da CRF/88:

São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender as suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.

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A ADI nº 463729, faz uma crítica ao caput do artigo 980-A do Código Civil de 2002, parte final, o qual dispõe que “o capital social não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País”. É sustentado com base no artigo 7, IV, da CRF/88, supramencionado, que o salário mínimo não poderá ser critério para definir o valor do capital social mínimo necessário, para que ocorra a constituição das empresas individuais de responsabilidade limitada.

Tem-se um pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, em relação a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3934, é vedado a vinculação ao salário mínimo, como parâmetro de prestações periódicas, e não como critério de indenização ou de condenações, segundo o Relator Ministro Ricardo Lewandowski, no Tribunal Pleno, 27 de Maio de 2009.

Chega-se à conclusão de que a discussão abrange inúmeras vertentes, embora a Constituição Federal de 1988, veda a vinculação do salário mínimo para qualquer outro fim, por outro lado o Supremo Tribunal Federal se manifestou contrário, enunciando que a referida vedação diz respeito apenas a vinculação em prestações periódicas, ou seja, vencimentos e salários. Dessa forma, vários doutrinadores e estudiosos entendem que não há inconstitucionalidade em relação a limitação de 100 salários mínimos para constituição do capital social da EIRELI, e entende que não há violação ao princípio da livre iniciativa, porém caberá ao Supremo Tribunal Federal julgar de forma imprescindível todos os apontamentos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 463729, a fim de colocar um fim nesse dilema jurídico.

O Estado pode interferir na atividade empresarial, mas temos que analisar até que ponto essa interferência é positiva, os temas aqui levantados causam uma reflexão em relação a EIRELI e a sua função, uma vez que o Estado além de impulsionar a atividade empresarial, ele deve colaborar com a efetivação e o pleno desenvolvimento jurídico, social e econômico desta modalidade empresarial.

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Sobre a autora
Ianca da Silva Ventura

Advogada inscrita na OAB/MG 202.202. Pós-Graduada em Direito Tributário pela Damásio Educacional. Possui vasta atuação na área Cível, Consumidor e Tributário. Com publicaçãos em grandes Revistas Jurídicas, como Âmbito Jurídico. Vejamos algumas publicações: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-tributario/incidente-de-desconsideracao-da-personalidade-juridica/

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