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Tutela constitucional da terceira idade:

o resgate da dignidade humana da pessoa idosa

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4. Da tutela infraconstitucional da pessoa idosa

Com vistas assegurar a afirmação dos direitos fundamentais da pessoa idosa e tutelar em diplomas legislativos próprios e específicos os direitos peculiares a esta parcela da população, o legislador pátrio, em intervalo de tempo inferior a uma década, trouxe a lume dois textos legislativos que, de forma pioneira entre nós, avançou na proteção destas pessoas, atribuindo a guarda da integridade destas à família, à sociedade e ao Estado.

Tais diplomas são a Política Nacional do Idoso – Lei 8.842 de 4 de janeiro de 1994, e o Estatuto do Idoso – Lei 10.741 de 01 de outubro de 2003, que inclusive prevê tipos penais específicos para crimes cometidos contra idosos. Vejamo-las leis separadamente.

4.1 Da Política Nacional do Idoso

Após a promulgação do texto constitucional em 1988, o legislador infraconstitucional, objetivando assegurar proteção legal aos idosos, lançou, por intermédio da Lei Federal 8.842/94 a Política Nacional do Idoso, regulamentada pelo Decreto 1948/96, com o propósito de assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.

Embora o texto magno não tenha fixado o momento em que se atinge a terceira idade, limitando-se a enunciar que os maiores de sessenta e cinco anos têm direito à gratuidade dos transportes coletivos urbanos (art.230, §2º), a Lei 8.842/94, avançando neste sentido, adotou o critério cronológico para se determinar quem pode ser considerado idoso, firmando que idoso é a pessoa maior de sessenta anos.

A referida lei trouxe ainda em seu texto normativo uma série de princípios assecuratórios da dignidade humana na terceira idade. Encontram-se eles elencados nos incisos do art. 3º da lei 8.842/94, a saber:

I - a família, a sociedade e o estado têm o dever de assegurar ao idoso todos os direitos da cidadania, garantindo sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade, bem-estar e o direito à vida;

II - o processo de envelhecimento diz respeito à sociedade em geral, devendo ser objeto de conhecimento e informação para todos;

III - o idoso não deve sofrer discriminação de qualquer natureza;

IV - o idoso deve ser o principal agente e o destinatário das transformações a serem efetivadas através desta política;

V - as diferenças econômicas, sociais, regionais e, particularmente, as contradições entre o meio rural e o urbano do Brasil deverão ser observadas pelos poderes públicos e pela sociedade em geral, na aplicação desta lei.

Tais princípios não se afiguram em rol taxativo, sendo, evidentemente, exemplificativos por não excluírem outros, inclusive aqueles previstos em tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (CF, art.5º, §2º), bem como aqueles constantes de tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos aprovados pelo Congresso Nacional, nos termos do art.5º, §3º da Constituição Federal.

4.2 Do Estatuto do Idoso

A promulgação da Lei 10.741/2003 vem consagrar a proteção jurídica da terceira idade em nosso Estado Democrático de Direito. Em suas linhas, reitera a obrigação da família, da sociedade e do Poder Público, em assegurar ao idoso, solidariamente, com absoluta prioridade a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, ao respeito e à dignidade, usufruídas preferencialmente em âmago familiar.

O Estatuto do Idoso traz em seu Título II um extenso, porém não exaustivo, rol de direitos fundamentais da pessoa idosa, em atendimento aos preceitos constitucionais de respeito à cidadania e dignidade da pessoa humana, com roupagem peculiar, destinada a este contingente populacional.

Dispõe a Lei 10.741/2003 que o envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social (art. 8º), além de estatuir ser obrigação do Estado garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade (art. 9º). Aduz, ainda, que o idoso tem direito a educação, cultura, esporte, lazer, diversões, espetáculos, produtos e serviços que respeitem sua peculiar condição de idade.

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Referido diploma legislativo, consoante MORAES (2004, p. 709),

Ao garantir atendimento preferencial, imediato e individualizado junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços da população, viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convivo do idoso com as demais gerações, capacitação e reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia e na prestação de serviços aos idosos, estabelecimento de mecanismo a que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento e garantia de acesso à rede de serviços de saúde e de assistência social locais, entre outras formas de prioridade à terceira idade, a nova legislação brasileira reconheceu, como se faz nos países europeus, o envelhecimento como um direito social, a ser devida e especificamente protegido.

Estas, pois, as linhas gerais do esforço constitucional e legislativo em prol da efetiva proteção e garantia assecuratória dos direitos fundamentais da melhor idade.


5. Considerações finais

Acompanhando a evolução internacional da tutela de direitos humanos fundamentais, a Constituição Federal consagrou verdadeiro avanço no tocante à proteção jurídica das pessoas idosas, reconhecendo-lhes direitos peculiares, atinentes às necessidades desta parcela especial da população, que, como vimos, crescerá em número significativo nas próximas décadas.

Atendendo à vontade constituinte, o legislador infraconstitucional tratou de elaborar diplomas específicos para o trato da matéria, o que o fez nas duas leis supra referidas. Este esforço legislativo coloca o ordenamento jurídico brasileiro em posição de vanguarda frente a ordenamentos estrangeiros, inclusive situando-nos em posição de vantagem frente a países desenvolvidos.

Há de se reconhecer, todavia, que, apesar do esforço do texto constitucional em assegurar a dignidade da pessoa humana, a materialização destes direitos assegurados não advém de disposições normativas. Não é a lei capaz de alterar a realidade social ipso facto. Seria ingenuidade – para não dizer hipocrisia – crer que a solução virá através de textos normativos. O problema em nosso país não são as leis – por sinal, neste aspecto temos pecado inclusive pelo excesso. O problema em nosso país é social. E para este tipo de problema, não se encontra remédio na farmacologia jurídica.

Somente a atuação conjunta da família da sociedade e do Estado, repartindo-se entre estes a obrigação de proteção e resguardo da pessoa idosa, conforme preceitua o princípio constitucional da solidariedade, é que, através de ações afirmativas, poderemos dar concretude aos direitos fundamentais da pessoa idosa. As disposições constitucionais e aquelas contidas nas leis 8.842/94 e 10.741/2003 são apenas os primeiros passos de uma caminhada que se tem por iniciada no dia 05 de outubro de 1988. Sigamos adiante e colhamos os frutos de nossos esforços, ou a miséria de nosso descaso.


Referências

DALLARI, Dalmo de Abreu. Deficiente e Idoso: o direito de ser pessoa. IN: Pessoa Idosa e Pessoa Portadora de Deficiência: da Dignidade Necessária. Coleção Do Avesso ao Direito. Tomo I Vitória: CEAF, 2003.

IBGE, Perfil dos Idosos responsáveis pelo domicílio no Brasil 2000, Rio de Janeiro, 2002.

MORAES, Alexandre. Direito Constitucional 16 ed. São Paulo: Atlas, 2004.

RAMOS, Paulo Roberto Barbosa. Direito à velhice: a proteção constitucional da pessoa idosa. IN: Pessoa Idosa e Pessoa Portadora de Deficiência: da Dignidade Necessária. Coleção Do Avesso ao Direito. Tomo I Vitória: CEAF, 2003.

SERPA, Maria do Carmo A. Varella. Pessoa idosa e pessoa portadora de deficiência: retrospectiva histórica, avanços e desafios. IN: Pessoa Idosa e Pessoa Portadora de Deficiência: da Dignidade Necessária. Coleção Do Avesso ao Direito. Tomo I Vitória: CEAF, 2003.


Notas

01 Segundo o IBGE, expectativa de vida, esperança de vida ou vida média em uma idade x qualquer é o número médio de anos que um indivíduo de idade x esperaria viver a partir desta idade. Particularmente, se x = 0, tem-se a expectativa de vida ao nascimento.

02 Fonte: IBGE, Perfil dos Idosos responsáveis pelo domicílio no Brasil 2000, Rio de Janeiro, 2002.

03 Segundo SERPA (2003, p.72), uma das formas mundialmente adotadas para se verificar o grau de envelhecimento populacional reside na comparação entre o crescimento do percentual de idosos em relação ao de crianças e jovens, como também este percentual em relação ao crescimento da população como um todo.

04Dados obtidos in www.ibge.gov.br, acessado em 02 de dezembro de 2005.

05Neste sentido: RAMOS, 2003, p. 223.

06Neste sentido: DALLARI, 2003, p. 31.

Sobre os autores
Paulo Eduardo de Figueiredo Chacon

advogado em Natal (RN), pós-graduando em Direito Constitucional pela UFRN

Eduardo Cunha Alves de Sena

cirurgião-dentista, bacharelando em Direito pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHACON, Paulo Eduardo Figueiredo; SENA, Eduardo Cunha Alves. Tutela constitucional da terceira idade:: o resgate da dignidade humana da pessoa idosa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 957, 15 fev. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7970. Acesso em: 23 dez. 2024.

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