O Brasil vive um momento de boom de oportunidades econômicas e financeiras. Muitas empresas se valeram da situação peculiar do ano de 2020 para acelerar seus processos de digitalização ainda que de uma forma forçada, e isso revelou muito das oportunidades de ganhos em possuir, trabalhar, e saber manejar quantidades gigantescas de dados dos clientes.
Os princípios e pontos estratégicos já eram conhecidíssimos por companhias como Google, Facebook, Amazon, Cambridge Analitica, e algumas outras dezenas de empresas de tecnologia distribuídas pelos principais hubs do mundo, e agora se tornam ainda mais evidentes no Brasil. E o resumo desta grande lição é: quando mais se sabe sobre os seus clientes, ou potenciais clientes, mais assertivamente se pode alcançá-los e encantá-los com ofertas e produtos extremamente personalizados.
O vasto conhecimento sobre o perfil, antecipado dos dados dos clientes, ou da sua potencial base de clientes, permite causar-lhes uma impressão de encantamento pelo fato de (i) sua empresa criar uma solução para um problema que nem o próprio cliente sabia que possuía; (ii) a personalização tão elaborada que o cliente vai se sentir cuidado e com atenção dedicada por parte de sua empresa.
Essas qualidades, hoje em dia, são balizadores de pilares em diversas companhias no Brasil de 2020, contudo, elas trazem consigo outros grandes temas, que por vezes em reuniões internas aparentam ser contraditórios.
Como encantar o cliente de uma forma de criar “clientes fanáticos”, no estilo conhecido como “fan boys” da Apple ou Samsung, e ainda sim cumprir os requisitos regulatórios?
Comecemos por tentar entender se os famosos KYCs (Know Your Client), ou em português Conheça o Seu Cliente, devem se encontrar em que medida no meio termo entre serem apenas replicas simplistas de uma ficha cadastral, ou um mapa completo de rastreamento e sensação de estar sendo rastreado como os banco de dados de clientes de empresas de buscadores ou redes sociais globais?
Até onde o dever/interesse em conhecer e mapear o cliente está atrelado a responsabilidade sobre a manutenção destes dados?
A LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados - Lei nº 13.709) surge neste contexto de começar a esculpir pilares que podem nos ajudar e direcionar a responsabilização e a forma de tratamento sobre estes dados.
Ao passo que diretores comerciais em companhias buscas avidamente conhecer e deter o máximo de dados de suas bases de clientes ou de prospects, os diretores de departamentos jurídicos buscas a rigidez da lei e reduzi as informações a praticamente fichas cadastrais com informações facilmente obtidas em bureaus de créditos no país, porém agora obtidos diretamente da fonte (auto-declarados pelos clientes).
E a esta altura do campeonato estamos nos perguntando como reunir coisas aparentemente diametralmente opostas em uma solução pela empresa? Ao vendermos aos nossos clientes a ideia de que quanto maior a quantidade de informações ele voluntariamente nos ceder, e permitir o tratamento de dados, mais vamos poder conhecê-lo, oferecer os melhores, mais sofisticados, e específicos produtos e serviços, e isso vai nos permitir ter mais pessoas como ele (clientes com alto nível de satisfação), estaremos ai sim oferecendo aos nossos fanáticos o que eles precisam e receberemos em contra partida o que queremos.
O mantra não é criar companhias completamente engessadas com formulários de diversas páginas, e cada vez mais burocráticos, pelo contrario, a proposta é possuir uma abertura de relacionamento ou prestação de serviços de modo standard com as mais básicas informações, mas construir e demonstrar ao seu cliente a ideia de que quanto mais você conhecer dele mais pode encantá-lo, ou oferecer aquilo que ele precisa.
Por que avaliamos filmes em plataformas de streaming de vídeo? Pelo simples fato de que remos as recomendações que virão a partir destes algoritmos serão unicamente direcionadas ao nosso gosto, o mesmo ocorre com plataformas de música.
Quando alguma companhia sabe nosso poder aquisitivo, cor preferida, time do coração, composição familiar, preferencias financeiras, gostos musicais, endereços, formação acadêmica, histórico pessoal ou familiar, ela pode tornar-se o seu concierge digital, ofertando uma solução completamente encantadora.
Imagine receber de presente de aniversario, da empresa que você adquire um serviço contínuo, uma camiseta da sua marca, e na sua cor preferida? Ou mesmo uma camiseta do seu time do coração com o seu nome nas costas e a entrega na exata data do seu aniversário? Melhor ainda se fossem um par de ingressos! Ou se no dia das crianças esta empresa te mandasse um McLanche feliz por saber que você tem filhos?
Poderíamos discorrer parágrafos sobre ideias de ações de marketing direcionado para encantamento de clientes, mas a pergunta aqui deve ir para outro rumo. O sistema jurídico brasileiro te proíbe de deter tais informações dos teus clientes?
A maioria dos reguladores brasileiros, a depender da área de atuação do seu negócio exigira apenas a extração mínima de informações para a prestação do serviço ou venda do produto que a sua atividade econômica exige, como é o caso do BACEN com a Circular n° 3.978 de 23/1/2020, ou da CVM com a Instrução CVM 617, contudo, estas entidades reguladoras não proíbem a coleta de informações, desde que você as colete diretamente do cliente, e explicando claramente para que as quer, quais informações está coletando, com o expresso consentimento, e explicando como se dará a tratativa de tais dados.
O Know You Client / Costumer é mais do que um conceito, é por um lado a coleta de informações mínimas para atendimento regulatório de conhecimento e atribuição de perfil de risco do cliente, como por outro lado uma estratégia empresarial de coleta, tratamento e utilização de dados estratégicos para o sucesso do negócio.
O inicio da transformação dessa jornada de simples cumpridor de tarefas, para um expert em prestação de serviços altamente personalizadas, consiste em algumas perguntas iniciais, tais como: (i) quais as minhas exigências regulatórias; (ii) quais as informações mínimas para a prestação do meu serviço; (iii) quais os grupos e segmentações personalizadas posso agrupar os meus clientes (iv) para alocar os clientes nestes grupos personalizados quais informações eu preciso saber; (v) o que eu entrego de valor ao cliente se ele me entregar mais informações; (vi) todas as informações que eu já possuo estão organizadas; (vii) expandir e melhorar a assertividade na oferta de produtos ou serviços.
O que falta em muitos dos casos é estruturar o emaranhado de informações que por vezes já possuímos, porem estão completamente pulverizadas em áreas, sistemas e times diferentes dentro da empresa, elencar quais informações são essenciais, quais informações são legalmente possíveis de levantar, e traçar o plano interno de conhecimento do cliente e trabalho massivo de dados.
Já pararam para pensar que nosso maior anseio ao desativar uma rede social ou mudar de e-mail é justamente o medo de que temos de perder muitas informações que foram reunidas ali ao longo do tempo? Imagine criar este mesmo pensamento em seu cliente, aliando a isso aquele encantamento do qual falamos no começo do texto com os “clientes fanáticos”.