1. Introdução
Na concepção de Ruy Cirne Lima [01] a administração é atividade do que não é senhor absoluto. Logo, a administração constitui gestão de patrimônio alheio. No caso da Administração Púbica são geridos interesses próprios da coletividade. Em conseqüência, o órgão administrativo que representa tais interesses não tem disponibilidade sobre eles. Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello "na administração os bens e os interesses não se acham entregues à livre disposição da vontade do administrador. Antes, para este, coloca-se a obrigação, o dever de curá-los nos termos da finalidade a que estão adstritos" [02].
Como uma das conseqüências da indisponibilidade do interesse público [03], determina o art. 37, XXI, da Constituição Federal que as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações". Assim, em virtude do referido dispositivo constitucional, pode-se afirmar que no âmbito da Administração Pública há presunção absoluta de que o melhor contrato será aquele precedido de um processo licitatório.
Com efeito, licitação é um procedimento administrativo através do qual o ente público, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados que preenchem os requisitos constantes no instrumento convocatório, a oportunidade de formularem propostas, dentre as quais escolherá a mais vantajosa para a celebração do contrato [04].
Ocorre que, muitas vezes, o processo licitatório é dispensado de forma indevida ou aparece eivado de uma série de irregularidades, em face de condutas fraudulentas perpetradas. Nessas hipóteses, pode ocorrer que a conduta do agente público, ou do particular envolvido no processo, se ajuste a dos tipos legais que constituem os crimes dispostos nos artigos 89 a 99, da Lei n° 8.666/93. Pode-se, ainda, enquadrar referidas condutas aos tipos de improbidade administrativa previstos na Lei 8.429/92. De toda sorte, além de atacar o vício detectado no processo de licitação é importante que se responsabilize aquele que deu causa ao mesmo.
2. Do alcance terminológico da improbidade administrativa
Inicialmente, antes de abordar o tema de forma mais específica, tem-se que firmar uma visão precisa sobre a improbidade administrativa abordada na Lei n° 8.429/92.
Quando nos referimos à improbidade, de imediato pensamos no princípio da probidade administrativa ou, como preferem alguns, no dever de probidade contido no princípio da moralidade administrativa, razão pela qual muitos autores partem desse princípio ou dever para construção do conceito de improbidade administrativa [05]. Assim, sendo a probidade o dever de atuar com honestidade, boa-fé, lisura, associa-se a improbidade à desonestidade, à má-fé no âmbito da Administração Pública.
È inegável que a desonestidade na atuação administrativa, que tem a corrupção como uma de suas formas de manifestação, constitui improbidade administrativa. Caio Tácito afirma que o desvio ético coincide com a história da humanidade, acrescentando que "o primeiro ato de corrupção pode ser imputado à serpente seduzindo Adão com a oferta da maçã, na troca simbólica do paraíso pelos prazeres ainda inéditos da carne" [06].
A própria Bíblia contém trechos que abordam o fenômeno da corrupção [07]. No Êxodo, Capítulo XXIII, Versículo 8, em trecho referente às testemunhas, afirma-se que "também presente não tomarás: porque o presente cega os prudentes e perverte as palavras dos justos".
William Shakespeare, em passagem de sua conhecida e aplaudida comédia Mercador de Veneza, publicada pela primeira vez em 1600, já escrevia que
só o presunçoso ostenta dignidade imerecida. As posses, honrarias e funções não fossem atingidas por corruptos – se o prêmio só coubesse a quem merece – estaria coberto muito nú, e muito comandante comandado! Quanto joio seria rebaixado, que hoje passa por trigo de nobreza [08].
No Brasil, este vem sendo um tema constantemente debatido.
Em entrevista publicada nas páginas amarelas da revista VEJA, João Ubaldo Ribeiro afirma que "somos um país corrupto". Segundo o escritor "nós vivemos num ambiente de lassitude moral que se estende a todas as camadas da sociedade. Esse negócio de dizer que as elites são corruptas mas o povo é honesto é conversa fiada. Nós somos um povo de comportamento desonesto de maneira geral" [09].
Alguns tentam explicar o fenômeno da desonestidade no nosso país, reportando-se ao espírito aventureiro herdado da colonização lusitana.
O Brasil, como se sabe, foi um país colonizado por portugueses, povo do tipo aventureiro, com uma "concepção espaçosa" do mundo, que valorizava o gasto de energia e esforços somente quando dirigidos a uma recompensa imediata, ou melhor, valorizava-se a riqueza acumulada às custas do trabalho de outrem, principalmente de estranhos.
Na análise de Sérgio Buarque de Holanda
essa pouca disposição para o trabalho, ao menos para o trabalho sem compensação próxima, essa indolência, como diz o deão Inge, não sendo evidentemente um estímulo às ações aventurosas, não deixa de construir, com notável freqüência, o aspecto negativo do ânimo que gera as grandes empresas. Como explicar, sem isso, que os povos ibéricos mostrassem tanta aptidão para a caça aos bens materiais em outros continentes?...E essa ânsia de prosperidade sem custo, de títulos honoríficos, de posições e riquezas fáceis, tão notoriamente característica da gente de nossa terra, não é bem uma das manifestações mais cruas do espírito de aventura? [10].
Tal "concepção espaçosa" do mundo vem acompanhando o povo brasileiro, refletindo-se, conseqüentemente, na esfera da Administração Pública.
O nosso passado administrativo revela, desde a colonização do Brasil, a carência de formação especializada e ausência de instrumentos de fiscalização. Os serviços administrativos são exercidos, em geral, por pessoas despreparadas e sem afinidade com o interesse coletivo, recebendo péssimos salários. Serviços estes voltados, na maioria das vezes, aos interesses de grupos econômicos localizados [11].
O malbaratamento da coisa pública foi, durante muito tempo, aceito pela sociedade, criando adágios populares como, por exemplo, o "rouba, mas faz".
Porém, mesmo associando-se a improbidade administrativa à desonestidade, deve-se ressaltar que a Lei 8.429, de 03 de junho de 1992, ao regulamentar o art. 37, parágrafo 4°, da Constituição Federal, estabeleceu uma abrangência bem maior à improbidade. Nesse sentido, Maria Sylvia Zanella Di Pietro aduz que "quando tratada como infração, a improbidade é mais ampla do que a imoralidade, porque a lesão ao princípio da moralidade constitui uma das hipóteses de atos de improbidade definidos em lei" [12].
Assim, a improbidade administrativa nem sempre estará associada a uma conduta desonesta. Esta afirmação se comprova com a leitura do art. 10, da Lei n° 8.429/92, segundo o qual "constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1° desta lei". Ora, quando o agente público causa prejuízo ao erário na modalidade culposa, ou seja, em decorrência de conduta negligente ou imprudente, certamente não estaremos diante de uma atuação desonesta, no entanto, ter-se-á o ato de improbidade administrativa enquadrado no art. 10. Também o art. 11 da lei, quando aborda a improbidade por violação de princípios, permite a caracterização de ato de improbidade sem o elemento desonestidade. Assim, a violação do princípio da impessoalidade e razoabilidade, por exemplo, pode constituir ato de improbidade administrativa, sem necessidade da comprovação da má-fé do agente público.
3. Do agente ativo da improbidade nas licitações e contratos administrativos
Sabe-se que agente público é toda pessoa física que presta serviço ao Estado ou às pessoas jurídicas da administração indireta [13]. São dois os requisitos considerados para caracterização do agente público. O primeiro, de ordem objetiva, refere-se à natureza estatal da atividade desempenhada; o segundo, de ordem subjetiva, seria a investidura na atividade [14].
Segundo Celso Antônio, "quem quer que desempenhe funções estatais, enquanto as exercita, é um agente público" [15]. De acordo com o referido autor, esta é a expressão mais genérica capaz de designar os sujeitos que servem ao Poder Público, ainda quando o façam apenas ocasionalmente. Com efeito, seriam agentes públicos [16]: os agentes políticos [17], os servidores estatais [18], abrangendo servidores públicos [19] e servidores das pessoas governamentais de Direito Privado [20], e os particulares em colaboração com o poder público [21].
Acertadamente, a Lei nº 8.429/92 abrangeu toda pessoa que se envolva com a Administração Pública. Deste modo, estão sujeitos às sanções previstas na Lei de Improbidade, todos aqueles que possuem vínculo com a Administração Pública, inclusive os que, dela não fazendo parte, beneficiem-se da ação ímproba.
Observa-se que a lei procurou definir o sujeito ativo em razão do sujeito passivo. Com efeito, segundo o art. 2º da Lei de Improbidade, agente público é
todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente e sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego, ou função nas entidades mencionadas no artigo 1º e parágrafo único da Lei nº 8.429/92.
Segundo Antônio José de Mattos Neto [22], a Lei de Improbidade deve ser interpretada em harmonia com o art. 70 da Constituição Federal, resultando que qualquer pessoa física, jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens, e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária, estarão alcançadas pelo império da Lei de Improbidade.
O conceito de sujeito ativo da improbidade [23] foi expresso da forma mais ampla possível, superando a visão dilatada do conceito de funcionário público contido no artigo 327 do Código Penal [24]. Intentou-se, com essa abrangência, afastar todo tipo de conduta ímproba que possa refletir no âmbito da Administração Pública.
São muitos os agentes públicos envolvidos nos processos licitatórios e nos contratos administrativos.
Costuma-se dividir o processo licitatório em duas fases: interna e externa. A etapa interna visa promover o levantamento das informações necessárias e a modelar a solução contratual cabível. Cumpridas todas as exigências desta etapa, a Administração Pública poderá concluir pela necessidade de uma licitação ou pelo cabimento de uma contratação direta [25]. A fase ou etapa externa, que se inicia com a publicação do edital ou com a expedição das cartas-convite, é aquela em que irrompe a oportunidade de relacionamento entre a Administração e os que se propõem afluir ao certame.
O art. 7°, da Lei n° 8.666/93 traz como um dos pressupostos da fase interna da licitação o projeto básico e executivo, para a execução de obras e para a prestação de serviços. Segundo Marçal Justen Filho [26] tais projetos estão relacionados exclusivamente com obras e serviços de engenharia. Pode ser que a Administração Pública não dispondo de agente público habilitado para realização de tais projetos, realize a contratação para tal fim [27]. Neste caso, o contratado se enquadra na noção de agente público para fins da Lei de Improbidade. Leve-se, ainda, em consideração que o projeto básico e executivo será aprovado por ato formal e motivado da autoridade competente, a qual deverá avaliá-lo verificando sua adequação às exigências legais e ao interesse público. Desta forma, a autoridade ao aprovar o projeto responsabiliza-se pelo juízo de legalidade e de conveniência adotado. Com efeito, conclui-se que irregularidades ocorridas na realização de projetos que venham a constituir ato de improbidade administrativa poderão ser de responsabilidade daquele contratado, bem como da autoridade competente para a sua aprovação. Lembrando que será competente para aprovar o projeto a autoridade competente para determinar a contratação da obra ou do serviço a qual o contrato se reporta.
Ocorrerá, também na etapa interna, a estimativa de custo do contrato. Os responsáveis por esta atribuição poderão também ser incluídos no conceito de agente público para fins de improbidade administrativa, caso atuem com dolo ou culpa, estabelecendo um valor superestimado para o contrato, capaz de gerar danos ao erário.
Na fase externa da licitação temos a participação da comissão de licitação, integrada por três membros no mínimo, sendo pelo menos dois deles servidores qualificados pertencentes aos quadros permanentes dos órgãos da Administração responsáveis pela licitação. Assim, como regra, os membros da comissão de licitação deverão ser agentes públicos, porém excepcionalmente poderão ser convidados terceiros para integrar a comissão. Neste caso, o terceiro também será considerado agente público para os fins da Lei n° 8.429/92. Em virtude da responsabilidade solidária da comissão de licitação, sempre que um dos membros discordar da conduta de seus pares, deverá manifestar expressamente sua posição, como forma de tentar excluir a sua responsabilidade pela decisão da maioria.
Nesse diapasão, cumpre acrescentar que a autoridade que dispõe de competência jurídica para representar o ente público licitante, também se enquadra no conceito de agente público para os fins da Lei n° 8.429/92, podendo ser responsabilizada por improbidade administrativa, em virtude de irregularidades perpetradas na tramitação do processo licitatório. Sabe-se que após o julgamento e classificação das propostas, etapas realizadas pela Comissão de Licitação, o processo será encaminhado àquela autoridade para a sua homologação. Nesta fase, será feito um exame quanto à legalidade e conveniência da licitação. Caso reconheça a existência de vício de legalidade, referida autoridade anulará o processo, passando a efetivar juízo de conveniência. Entendendo que o interesse público poderia ser melhor satisfeito por outra via, revogará a licitação. Assim, quando a autoridade competente homologa um processo licitatório que deveria ser anulado, por vicio de legalidade, ou o revoga de forma imotivada ou com falsidade de motivos, poderá ser responsabilizada por improbidade administrativa.
No que concerne aos licitantes e contratados estes também poderão estar sujeitos às sanções previstas na Lei de Improbidade, na qualidade de terceiro beneficiário. Conforme determina o artigo 3º, da Lei nº 8.429/92, "as disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta". Tal dispositivo legal constitui mais um avanço trazido pela Lei de Improbidade. São comuns as vastas relações travadas entre administradores públicos e empresários, facilitando negócios nem sempre em sintonia com o interesse público, aliás, na maioria das vezes voltados ao atendimento de finalidades privadas [28].
4. Da improbidade administrativa por enriquecimento ilícito nas licitações e contratos administrativos
A Lei n° 8.429/92 trata de três tipos de atos de improbidade administrativa: aqueles que geram enriquecimento ilícito (art. 9°), os que causam prejuízo ao erário (art. 10) e os que violam princípios administrativos (art. 11).
O artigo 9º da lei nº 8.429/92 aborda os atos de improbidade administrativa que importam em enriquecimento ilícito. No caput do artigo está o núcleo central do tipo, qual seja, a obtenção "de qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida no exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º".
Dentro das regras capitalistas que vivemos é normal a busca de bons negócios e resultados financeiros positivos. Todos querem aumentar seu patrimônio, seja para obter bens necessários à sobrevivência, seja para adquirir supérfluos garantidores de status social.
Tais bens, quando adquiridos honestamente, transportam a discussão para o aspecto ético-social da prioridade de valores, não havendo maiores conseqüências no núcleo social. Porém, quando o patrimônio é adquirido mediante manobras ilícitas são violados os mandamentos ético-jurídicos, necessitando de uma resposta por parte do Estado.
A situação se agrava quando este aumento patrimonial, alcançado mediante artimanhas reprováveis sob o ponto de vista ético e moral, é auferido no âmbito da Administração Pública, ou pior, colhido por aqueles a quem cabe o dever- poder de velar pelo interesse público.
Não são raros os casos daqueles que ingressaram no âmbito da Administração Pública em precária situação financeira e, após pouco tempo, já possuem um considerável acervo patrimonial. Não se quer com isso que os administradores públicos estejam predestinados ao empobrecimento em razão do exercício de função pública, afinal, nada impede que, como qualquer outra pessoa, conheça acréscimo patrimonial com lucros em seus negócios Porém, ao agente público, no exercício de suas funções, somente é permitido auferir as vantagens previstas em lei. Não pode beneficiar-se de vantagem patrimonial imerecida derivada do exercício do seu cargo.
Considera-se "vantagem patrimonial indevida" a obtenção, o recebimento, direta [29] ou indiretamente [30], de qualquer "interesse" que afronte o padrão jurídico de probidade administrativa, como suficiente para incidência do referido dispositivo.
A vantagem indevida é fruto da utilização imprópria da função pública, voltada para busca de benefícios privados, que se constituem em valor, presente ou futuro, monetário ou não [31]. Assim, todo o enriquecimento que esteja relacionado ao exercício da atividade pública e que não corresponda à contraprestação paga ao agente por determinação legal, constitui vantagem indevida. Note-se, inclusive, que, na maioria dos casos previstos no art. 9º, a vantagem patrimonial conferida ao agente público não provem dos cofres públicos, mas sim de terceiros [32].
Necessário se faz que o aspecto econômico da vantagem obtida esteja vinculado a sua impropriedade, quer dizer, que a mesma seja indevida. Valoriza-se, assim, o aspecto moral da obtenção da vantagem. Logo, o enriquecimento ilícito pode perfeitamente se verificar no campo da legalidade. Assim, caso um agente público receba R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) do representante de determinada empresa, para que agilize a liberação de pagamento devido pela Administração Pública, estará praticando ato de improbidade administrativa por enriquecimento ilícito.
Muitos identificam o enriquecimento ilícito do agente público com a corrupção. Manoel Gonçalves Ferreira Filho entende a corrupção como um dos fatores da crise de governabilidade, definindo-a como conduta do agente público que utiliza o Poder de modo indevido, buscando a satisfação de um interesse privado, normalmente em troca de uma retribuição de ordem material [33].
Pode, no entanto, ocorrer a improbidade na modalidade enriquecimento ilícito, sem que seja praticado qualquer ato no processo licitatório. Pense no caso do representante legal de uma empresa que oferece R$ 100.000,00 (cem mil reais) a um dos agentes públicos, envolvido na elaboração do edital, para que o mesmo inclua determinada exigência na proposta técnica, em uma licitação do tipo técnica e preço. Aceita a proposta, referido agente público recebe a quantia prometida, porém não faz qualquer inclusão no edital, deixando o mesmo no seu estado original. Ora, neste caso apesar de não ter sido praticado o ato que provavelmente beneficiaria aquela empresa, persiste a improbidade por enriquecimento ilícito, uma vez que o tipo é centrado na conduta do agente, independentemente da existência ou não de prejuízo, seja ao patrimônio público ou a terceiros.
Em contrapartida, caso o representante de determinada empresa prometa aos membros da Comissão de Licitação uma certa quantia em dinheiro para inabilitar todos os demais licitantes e a comissão aceite tal promessa, chegando realmente a atender o pleito, somente se concretizará o enriquecimento ilícito com o efetivo recebimento da vantagem. Assim, caso a empresa não cumpra a sua promessa de pagamento, estaremos diante de outra modalidade de ato de improbidade administrativa que não o enriquecimento ilícito.
A grande dificuldade na ocorrência das hipóteses de enriquecimento ilícito diz respeito à prova. O administrador púbico desonesto, corrupto normalmente se utiliza de terceira pessoa e raramente deixa vestígio que possa ser facilmente seguido. Não são raros os casos que se detecta a formalização de contratos superfaturados sem que se consiga provar o recebimento de vantagem indevida por aqueles agentes públicos envolvidos no processo.