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Dispensa, inexigibilidade e contratação irregular em face da Lei de Improbidade Administrativa

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Agenda 04/09/2006 às 00:00

7. Conclusão

Sem dúvida a Lei de Improbidade Administrativa veio também como um instrumento capaz de coibir e punir irregularidades ocorridas durante a tramitação de processos licitatórios, bem como aquelas ocorridas durante a execução de contratos firmados com o ente público. No entanto, a existência de leis dotadas de certa carga de eficácia não é suficiente para banir o alto índice de corrupção que ronda os negócios públicos. Necessário se faz a modificação do comportamento das pessoas envolvidas nesses processos. Os licitantes têm que ter certeza do comportamento dos futuros contratantes. Têm que ter a certeza de que serão tratados com justiça, pois a discriminação leva à corrupção. Se na qualidade de licitante sei que alguém foi beneficiado em um processo licitatório, na próxima licitação farei de tudo para obter aquela vantagem.

Por outro lado é de extrema importância a fiscalização dos contratos firmados no âmbito da Administração Pública. De nada adianta um processo licitatório correto com falhas na execução do contrato dele decorrente. Assim não interessa um sistema normativo sofisticado, sem um sistema de controle eficiente. É preciso atenção às pessoas envolvidas nesses processos administrativos. Steven L. Schooner [66], em palestra proferida no IV Fórum Global de Combate à Corrupção, afirmou que são características essenciais às pessoas envolvidas no processo licitatório a educação, a experiência e a independência. Abordou, ainda a importância de serem conferidos incentivos, levando sempre em consideração que aqueles que participam da licitação em nome da Administração Pública na maioria das vezes tem o controle de capital em muito superior à remuneração percebida no órgão público. Daí a necessidade do estímulo ao crescimento dentro do órgão, que tem que ser conferido aos bons profissionais que atuam nessa área. O referido professor trouxe, ainda, o exemplo prático da China, que após a implementação da Lei de Licitações em 1988, passou a treinar 10.000 (dez mil) pessoas por ano especialmente para atuar em processos licitatórios.

Desta forma, apesar do controle jurisdicional que pode ser exercido nas licitações e contratos através da ação de improbidade administrativa, faz-se necessário que a Administração Pública se utilize dos sistemas internos de controle no sentido de garantir a legalidade e a eficiência de tais procedimentos.

É preciso que o Poder Público rompa de uma vez por todas com as relações espúrias mantidas com o setor empresarial e direcione a sua atuação à satisfação do interesse público, cujos contornos vem sendo gradativamente desvirtuado, dando lugar ao atendimento dos interesses das classes dominantes. E o povo. Bom, esse assiste aos escândalos diários ocorridos no âmbito da Administração Pública, regando a única semente que lhe resta: a esperança.


Notas

01 Lima, Ruy Cirne. Princípios de Direito Administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p.21.

02 Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 46.

03 "Pedra de toque" do regime jurídico-administrativo, juntamente com o princípio da supremacia do interesse público.

04 Dromi, José Roberto. La Licitación Pública. Buenos Aires: Astrea, 1975, p. 92.

05Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Cf. Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2005.), José Afonso da Silva (Cf. Silva, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.) e Adilson Abreu Dallari (Cf. Dallari, Adilson Abreu. Limitações à Atuação do Ministério Público na Ação Civil Pública. In: Bueno, Cassio Scarpinella, Porto Filho, Pedro Paulo de Rezende (Coord.). Improbidade Administrativa: Questões Polêmicas e Atuais. São Paulo: Malheiros, 2001.) são alguns dos autores que ao abordar o tema improbidade administrativa partem da conceituação da probidade como espécie do gênero moralidade administrativa.

06 Tácito, Caio. A Moralidade Administrativa e a Nova Lei do Tribunal de Contas da União. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Renovar e Fundação Getúlio Vargas, n. 190, p. 45, 1992.

07 Garcia, Emerson, Alves, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Lumens Júris, 2002. p. 131.

08 Shakespeare, William. O Mercador de Veneza. Tradução de Barbara Heliodora. Rio de Janeiro: Lacerda Editores, 1999. p. 71.

09 Ribeiro, João Ubaldo. "Somos um País Corrupto" in Veja. Editora Abril: de 18 de maio de 2005, n° 1905, p. 11-15.

10 Holanda, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 46.

11 Pazzaglini Filho, Marino, Rosa, Márcio Fernando Elias, Fazzio Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa: Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público. São Paulo: Atlas, 1998. p. 15.

12 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2005, p. 712.

13Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2000. p. 416.

14 Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 220.

15Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 220.

16 Esta divisão é apresentada por Celso Antônio Bandeira de Mello (Cf. Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 222) e reproduzida por Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Cf. Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2000. p. 416).

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17 São os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, ocupando o esquema fundamental do Poder, sendo os formadores da vontade superior do Estado (Cf. Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 222).

18 A expressão abrange todas as pessoas físicas que prestam serviços ao Estado e às entidades da Administração indireta (Cf. Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2000. p. 416).

19 São aqueles que mantêm vínculos de trabalho profissional com as entidades governamentais, integrados em cargos ou empregos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios (Cf. Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 224).

20 São os empregados de empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações privadas, os quais estão submetidos ao regime trabalhista (Cf. Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 225).

21 São pessoas físicas que prestam serviços ao Estado, sem vínculo empregatício, com ou sem remuneração (Cf. Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2000. p. 416).

22 Mattos Neto, Antônio José de. Responsabilidade Civil por Improbidade Administrativa. Revista dos Tribunais, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 752, p. 34, jun. 1998.

23Observe-se que na concepção de Wallace Paiva Martins Júnior melhor seria apontar como sujeito passivo aqueles que tivessem o dever de probidade administrativa e como sujeito ativo o titular do direito público subjetivo a uma administração honesta. Assim, neste prisma, o agente público como titular do dever de probidade seria o sujeito passivo da relação derivada com o sujeito ativo (o Estado). (Cf. Martins Júnior, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 242).

24 Fábio Medina Osório entende que o conceito de agente público apresentado no Código Penal é mais amplo porque abrange os particulares exercentes de atividades delegadas ou concedidas pelo Poder Público, que não seriam alcançados pela Lei de Improbidade (Cf. Osório, Fábio Medina. Improbidade Administrativa: Observações Sobre a Lei 8.429/92. Porto Alegre: Editora Síntese, 1998. p. 101). Não concordamos com tal posicionamento, uma vez que, em contrapartida, a noção de agente público, contida no Código Penal, não alcança particulares que recebem injeção de dinheiro público.

25 Justen Filho. Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 306.

26 Justen Filho. Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2000. p. 109.

27 Sabe-se que neste caso poderá ocorrer a contratação direta do profissional, com base no art. 25, II, da Lei n° 8.666/93.

28 Fazzio Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeito. São Paulo: Atlas, 2000. p. 62.

29 Neste caso, a vantagem será recebida pelo próprio agente público, sem intermediários.

30 Nesta hipótese, a vantagem é recebida por terceiro e revertida, posteriormente, para o agente público, destinatário real da vantagem. Cumpre esclarecer que a experiência tem demonstrado que, normalmente, a vantagem é incorporada ao patrimônio do agente público de forma indireta.

31 Baracho, José Alfredo de Oliveira. O Enriquecimento Ilícito como Princípio Geral do Direito Administrativo. Revista Forense, Rio de Janeiro: Revista Forense, n. 347, p. 170, jul./set. 1999.

32 Art. 9º, I, II, III, V, VI,VIII, IX e X

33 Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Constituição e Governabilidade. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 109.

34Pazzaglini Filho, Marino, Rosa, Márcio Fernando Elias, Fazzio Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa: Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público. São Paulo: Atlas, 1998. p. 73.

35Martins Júnior, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 205.

36 Fazzio Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeito. São Paulo: Atlas, 2000. p. 115.

37 Neste ponto, vale esclarecer que as noções de dolo e culpa não são exclusivas do direito penal. Assim, no nosso sistema jurídico estão constitucionalizadas as expressões dolo e culpa e superam os limites penais, na medida em que o agente público que causa dano à Administração Pública pode ser responsabilizado, desde que agindo pelo menos com culpa (art. 37, § 6º, da Constituição Federal).

38 Franco, Alberto Silva et al. Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 103.

39 Miranda, Pontes. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Editor Bosoi, 1954. p. 249. tomo II.

40Miranda, Pontes. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Editor Bosoi, 1954. p. 250. tomo II.

41 Noronha, E. Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1984. p. 150. v. 1.

42Osório, Fábio Medina. Improbidade Administrativa: Observações sobre a Lei 8.429/92. Porto Alegre: Síntese, 1998. p. 135.

43 Apesar do parágrafo único do art. 12 se referir apenas à extensão do dano e o proveito patrimonial para a fixação da pena, pensamos que o aspecto psicológico da conduta deve também ser considerado.

44Este é o posicionamento exposto por Wallace Paiva Martins Júnior (Cf. Martins Júnior, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 206.), Emerson Garcia (Cf. Garcia, Emerson, Alves, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 204) e Hugo Nigro Mazzilli (Cf. Mazzili, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo: Meio Ambiente, Consumidor e Outros Interesses Difusos e Coletivos. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 166-172.).

45 Licitação dispensável ocorre quando a instauração de processo licitatório é inconveniente à satisfação do interesse público, ou seja, na equação custo-benefício a licitação poderá ter um custo superior aos benefícios dela decorrentes. O legislador no art. 24 estabeleceu taxativamente os casos de dispensa de licitação.

46 Na licitação inexigível há a inviabilidade de competição. Neste caso, diante da impossibilidade de se levar a termo o processo licitatório, a lei permitiu a contratação direta. Como a inexigibilidade decorre da realidade extra-normativa., as hipóteses do art. 25, da Lei n° 8.666/93, são exemplificativas.

47 Gordillo, Agustín. Tratado de Derecho Administrativo. Buenos Aires: Fundación de Derecho Administrativo, 1998, p. 37-V, tomo I.

48 Ferraz, Sérgio, Dallari, Adilson Abreu. Processo Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 45.

49 Miranda, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra Editora, 2000. p. 225. tomo II.

50 Osório, Fábio Medina. Improbidade Administrativa: Observações Sobre a Lei 8.429/92. Porto Alegre: Síntese, 1998. p. 119.

51 Ihering, Rudolf Von. A Luta pelo Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001.p. 27

52Pazzaglini Filho, Marino, Rosa, Márcio Fernando Elias, Fazzio Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa: Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público. São Paulo: Atlas, 1998. p. 120.

53Franco, Alberto Silva et al. Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 109.

54Miranda, Pontes. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Editor Bosoi, 1954. p. 252. tomo II.

55 Freitas, Juarez. Do Princípio da Probidade Administrativa e de sua Máxima Efetivação. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Renovar e Fundação Getúlio Vargas, n. 204, p. 78, abr./jun. 1996.

56 Garcia, Emerson, Pacheco Alves, Rogério. Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Lúmen Júris. 2004. p. 288.

57 Fazzio Júnior, Waldo. Improbidade Administrativa e Crimes de Prefeito. São Paulo: Atlas 2000. p. 177.

58 Osório, Fábio Medina. Improbidade Administrativa: observações sobre a lei n° 8.429/92. Porto Alegre: Síntese, 1998. p. 133.

59 Osório, Fábio Medina. Improbidade Administrativa: observações sobre a lei n° 8.429/92. Porto Alegre: Síntese, 1998. p. 133.

60 "Art.24. É dispensável a licitação:...IV- nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos".

61 Pereira Júnior, Jessé Torres. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. Renovar: Rio de Janeiro, 2002. p. 265.

62 Justen Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2000. p. 238.

63 Ferreira, Pinto. Comentários à Constituição Brasileira. São Paulo: Saraiva, 1992, v. 5. p. 43.

64 Barros, Márcio dos Santos. Comentários sobre Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: NDJ, 2005. p. 125.

65 Justen Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2000. p. 287.

66 Professor Associado e Co-Diretor do Programa Jurídico de Licitações Públicas da Universidade de George Washington – EUA.

Sobre a autora
Rita Andréa Rehem Almeida Tourinho

promotora de Justiça na Bahia, mestranda em Direito Público pela UFPE/UCSAL

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOURINHO, Rita Andréa Rehem Almeida. Dispensa, inexigibilidade e contratação irregular em face da Lei de Improbidade Administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1160, 4 set. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8896. Acesso em: 5 nov. 2024.

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