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Análise das teorias keynesianas com ênfase no seu direcionamento para o atual contexto sócio-econômico e jurídico mundial

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Muito do proposto por Keynes não se concretizou. Nem a natureza humana é tão vil e tosca, — e esta a nossa minha opinião — como pressupunha Keynes como fundamento velado de suas teorias e das falhas que encontrou no sistema neoclássico; nem o capitalismo é o único meio, ou talvez nem mesmo o mais eficaz para satisfazer os anseios humanos. O capitalismo, contrariando a temeridade de Keynes, parece cercear a liberdade tanto quanto, ou mais que, os regimes totalitários. A diferença é que, no capitalismo, a escravidão se dá em relação ao dinheiro, ao capital, e às vontades que — sub-repticiamente — o movem. Keynes possui muitas idéias opostas às do sistema, é fato. Apesar disso, não prescinde dele em sua teoria, não se sabe dizer se por convicção (medo de um regime totalitário – tão marcada foi a sua época por tais) ou mesmo se por conveniência, ou ainda movido por um meio termo entre as duas razões — e é o que cremos, já que afirmar categoricamente, ainda que nos firmando em suas obras, e em face de sua ausência, seria nos arvoramos à condição do mais severo (e injusto) juiz. Ora, é perfeitamente possível, dentro do que se inferiu até então da obra e da vida do autor, que Keynes tenha tido receio, conscientemente ou não, de que suas idéias fossem desconsideradas, se revelassem uma mínima ligação com o pensamento marxista. Não fosse isso, que outra justificativa encontra o esforço lingüístico em sedimentar sua obra em bases academicamente aceitáveis, senão um esforço óbvio no sentido da aceitação de suas idéias — ainda que a tanto custo?! Aliás, de qualquer forma, e a par de seu esforço, foi muito difícil a acolhida de seus preceitos, em grande parte, devido ao conservadorismo e ao assentamento das idéias postas. Todavia, Keynes parece aproximar-se de forma sutil, e quase imperceptível, das idéias marxistas. Ele era, ousamos repetir, um espírito social-comunista numa roupagem capitalista. Isso decorre, em parte, de sua influência Marshalliana, e por outro lado, de seu receio de que suas idéias não fossem aceitas, aplicadas e, principalmente, que não atingissem o fim almejado por ele — um mundo em que o econômico não fosse tão relevante quanto é hoje, ou não afetassem tão incisivamente a vida do indivíduo, por isso talvez preconizou análises macroeconômicas. Não fossem alguns empecilhos como os já citados, entendemos, se tería visto o maior corifeu (depois de Marx, é claro) do socialismo-comunismo com a vantagem de ter um extremo conhecimento do mundo econômico.

            O sincretismo das idéias trazidas pela onda neoliberal, entre elas o pressuposto do Estado-Mínimo, demonstra haver assimilação de pensamentos keynesianos. O Estado abandona sua posição de Estado de Providência, sem deixar de lado sua influência e controle econômico, atendo-se à esfera analisável, conforme pressupunha a caleido-estática de Keynes. É um Estado liberal que intervém na economia com políticas econômicas arrojadas aos moldes de Keynes. Isso pode ser constatado com o próprio Brasil. O governo tem tomado posições favoráveis às privatizações e à retenção de gastos, sem, entretanto, deixar de intervir fortemente na economia. O Keynesianismo "ainda vive", não porém nos padrões propostos por Keynes, mas aplicado às mudanças e às inovações processadas na realidade atual.

            Ora, como vimos no Capítulo V desta nossa incursão, onde analisamos o diapasão Keynes-Atualidade, a reforma do Estado não seria um fim em si mesmo, mas um instrumento a proporcionar o desenvolvimento da sociedade como um todo e, portanto, também caminhando no sentido de uma Gestão Pública Empreendedora, a coadunar os interesses em conflito.

            A reforma que se vê necessária é bem mais profunda que aquela principiada a nível global e o Keynesianismo poderia ser uma sólida base e um prudente ponto de partida para isso. Limitar a discussão à mera contabilidade fiscal (donde predomina claramente o interesse dos países credores) empobrece o sentido da transformação que urge e reduz as possibilidades de que os Estados e os governos liderem, efetivamente, o processo de mudança. Tal predominância já nos permite antever que os contornos das mudanças até então propiciadas parecem ser encabeçados pelos (e para os) Mercados e não pelos Estados — talvez até pelos Governos, já comprometidos com os interesses internacionais, mas nunca pelos Estados.

            Ora, dizer que o Estado deve deixar de ser executor para se tornar regulador (melhor proposta que a da privatização, entendemos), dizer que deve abdicar de sua esfera de atuação para o setor privado, é adotar modelo que já se demonstrou totalmente obsoleto em países do centro do sistema, como é o caso dos EUA, cujas experiências neste sentido já resultaram infrutíferas. O que se vê são meras imposições ideológicas do modelo gestor adotado nos países "centristas", mas que (quase sempre) não se adequam à realidade dos países periféricos.

            Tais conceitos apequenam a função pública, porque o Estado deve fazer mais do que simplesmente regular as relações de mercado. Entendemos seja o Estado apenas um modelo organizacional atualmente adotado pelas sociedades ocidentais e por grande parte do globo, e — ainda assim — o mais eficaz até então. Sua função, portanto, seria garantir o bem-estar social, manter a paz, trabalhar pela proteção do cidadão, e não atuar como mero joguete dos interesses mercadológicos. Eis o que deve ser primado pela verdadeira Gestão Pública Empreendedora tão em voga e tão amplamente alardeada, mas bem melhor visualizada à luz do pensamento de Keynes.


BIBLIOGRAFIA

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            _________________; WONNACOTT, Ronald. Introdução à Economia. São Paulo: Ed. Makron Books, 1985.


NOTAS

            01

Eis o literal modo com que se expressa Adam Smith, principal corifeu desta idéia, em seu A Riqueza das Nações: "Portanto, já que cada indivíduo procura, na medida do possível, empregar seu capital em fomentar a atividade nacional e dirigir de tal maneira essa atividade que seu produto tenha o máximo valor possível, cada indivíduo necessariamente se esforça por aumentar ao máximo possível a renda anual da sociedade. Geralmente, na realidade, ele não tenciona promover o interesse público nem sabe até que ponto o está promovendo. Ao preferir fomentar a atividade do país e não de outros países ele tem em vista apenas sua própria segurança; e orientando sua atividade de tal maneira que sua produção possa ser de maior valor, visa apenas a seu próprio ganho e, neste, como em muitos outros casos, é levado como que por mão invisível a promover um objetivo que não fazia parte de suas intenções. Aliás, nem sempre é pior para a sociedade que esse objetivo não faça parte das intenções do indivíduo. Ao perseguir seus próprios interesses, o indivíduo muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais eficazmente do que quando tenciona realmente promovê-lo. Nunca ouvi dizer que tenham realizado grandes coisas para o país aqueles que simulam exercer o comércio visando ao bem público. Efetivamente, é um artifício não muito comum entre os comerciantes, e não são necessárias muitas palavras para dissuadi-los disso." In: SMITH, Adam. A Riqueza das Nações. Tradução de Luiz João Baraúna São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda. Vol. I, ISBN 85-351-0827-0, p. 438.

            02

Cf. ARAÚJO, Carlos Alberto Vieira. História do Pensamento Econômico: uma abordagem introdutória. p. 110.

            03

ROBINSON, Joan. O que Aconteceu à Revolução Keynesiana. p. 102.

            04

Idem. Ibidem.

            05

Idem. p.103.

            06

Idem. Ibidem.

            07

Cf. ARAÚJO, Carlos Alberto Vieira. Op. Cit. p. 113.

            08

ROBINSON, Joan. Op. Cit. p. 103.

            09

Idem.

            10

Cf. ARAÚJO, Carlos Alberto Vieira. Op. Cit.

            11

GALBRAITH, John Kenneth. Como Keynes Veio à América. In: Ensaios coligidos por Andrea D. Williams; tradução de Carlos Nayfeld. Economia, Paz e Humor. Ed. Artenova S.A., [s.l.], 1972. P. 52.

            12

POPPER, Sir Karl Raimund. Em Busca de Um Mundo Melhor. p. 98.

            13

ROBINSON, Joan. Op. Cit. p. 108.

            14

Idem. p. 103.

            15

SHACKLE, G. L. S. Um Esquema de Teoria Econômica. Apud. KEYNES, John Maynard. "The General Theory of Employment", Quartely Journal of Economics, fev. de 1937. Reimpresso in Collected Writtings, vol. XIV. passim.

            16

ARAÚJO, Carlos Alberto Vieira. Op. Cit. p. 111.

            17

GALBRAITH, John Kenneth. Op. Cit. p. 42.

            18

DIAS, José Fernandes. Teoria Geral de Keynes: algumas notas críticas. In: KEYNES, Milo (coord.). Ensaios sobre John Maynard Keynes. p. 13.

            19

SHACKLE, G. L. S. Op. Cit.. p. 55.

            20

SHACKLE, G. L. S. Op. cit. p. 55.

            21

Ver a opinião de Marshall sobre a crise, cap. I, p. 5, nota 3.

            22

SHACKLE, G. L. S. Cit.. Apud. KEYNES, John Maynard. "The General Theory of Employment", In: Quartely Journal of Economics, fev. de 1937, p. 57.

            23

SHACKLE, G. L. S. Op. cit. p. 57.

            24

Cf. SINGER, Paul. Curso de Introdução à Economia Política, passim.

            25

Idem.

            26

Devemos ter em mente aqui a pouca influência da tecnologia sobre a produção, à época, de tal modo que era mínimo "o desemprego tecnológico".

            27

Idem. passim.

            28

KEYNES, John Maynard. Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. p. 284.

            29

Cf. ARAÚJO, Carlos Alberto Vieira. Op. cit. p. 115.

            30

Idem. p. 116 e 117.

            31

Idem. passim.

            32

ARAÚJO, Carlos Alberto Vieira. Op. cit. p. 123.

            33

GALBRAITH, John Kenneth. Op. cit. p. 54.

            34

SINGER, Paul. Op. Cit. P. 41.

            35

Idem. p. 112.

            36

Cf. Idem. p. 112 e 113.

            37

Idem. p. 115.

            38

Cf. Idem. p. 116.

            39

GALBRAITH, John Kenneth. Op. Cit. p. 51.

            40

KEYNES, John Maynard. Op. Cit. p. 285.

            41

Idem. p. 288.

            42

Idem. p. 290.

            43

Cf. AGUILLAR, Fernando Herren. Direito Econômico e Globalização. In: SUNDFELD, Carlos Ari e VIEIRA, Oscar Vilhena. DIREITO GLOBAL.passim.

            44

Thomas S. Kuhn define paradigmas como: "as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência." In: A Estrutura das Revoluções Científicas. p. 13.

            45

Falamos aqui do neo-liberalismo.

            46

Cf. BOYER, Robert e DRACHE, Daniel. Estados contra Mercados: os limites da globalização, passim, e GRAU, Eros Roberto. O Discurso Neoliberal e a Teoria da Regulação. In: DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ORDEM CONSTITUCIONAL – estudos em homenagem ao professor Washington Peloso Albino de Sousa. passim..

            47

Cf. GRAU, Eros Roberto. Cit. passim.

            48

Gestão Pública Empreendedora. Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Brasília, julho de 2000.

            49

Vide nota 1.

            50

Cf. Gestão Pública Empreendedora. Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Brasília, julho de 2000.

            51

Idem.

            52

Sobre o estudo da complexidade e dos fenômenos complexos ver: La Epistemología de La Complejidad..artigo publicado na: Gazeta de Antropología, N.º 20, 2004 - http://www.ugr.es/~pwlac/G20_02Edgar_Morin.html

            53

Gestão Pública Empreendedora. Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Brasília, julho de 2000.

            54

Neste sentido ver: LUHMANN, Niklas. A Nova Teoria dos Sistemas. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, Goethe-Institut./ICBA, 1997. e LUHMANN, Niklas. The Autopoiesis of Social Systems, in: F. Geyer and J. van der Zouwen. (eds.), Sociocybernetic Paradoxes, Sage, London, 1986, 172ff.

            55

MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. p. 22.

            56

Gestão Pública Empreendedora. Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Brasília, julho de 2000.

            57

"O termo ‘dialética’ e, mais apropriadamente, a expressão ‘arte dialética’, esteve em estreita ligação com a palavra ‘diálogo’: ‘arte dialética’ pode definir-se primariamente como ‘arte do diálogo’. Como no diálogo há pelo menos dois logoi que se contrapõem entre si, também na dialética há dois logoi, duas ‘razões’ ou ‘posições’ entre as quais se estabelece precisamente um diálogo, ou seja, um confronto no qual se verifica uma espécie de acordo na discordância – sem o que não haveria diálogo – mas também uma espécie de sucessivas mudanças de posições, induzidas pelas posições ‘contrárias’." In: MORA, José Ferrater; (tradução de Roberto Leal Ferreira e Álvaro Cabral). Dicionário de Filosofia. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes. 1998. ISBN 85-336-0846-2. pp. 182 a 187.

            58

Cf. Gestão Pública Empreendedora. Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Brasília, julho de 2000.
Sobre os autores
Francisco de Sousa Vieira Filho

Advogado, militando sobretudo na área trabalhista, em Teresina-PI, Especialista em Direito Constitucional pelo LFG e Mestre em Direito pela Universidade Antônoma de Lisboa. Professor nas faculdades AESPI e FAPI, e professor substituto na UESPI (Campus Clóvis Moura). Autor dos livros: Lira Antiga Bardo Triste (2009); Lira Nova Bardo Tardo (2010) e Codex Popul-Vuh - ramo de folhas (2013).

Teresinha de Jesus Moura Borges Campos

promotora de Justiça, mestranda em Direito Constitucional pela Universidade Autônoma de Lisboa

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA FILHO, Francisco Sousa; CAMPOS, Teresinha Jesus Moura Borges. Análise das teorias keynesianas com ênfase no seu direcionamento para o atual contexto sócio-econômico e jurídico mundial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1281, 3 jan. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9355. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Trabalho apresentado ao FORUM/APROCEFEP e à Universidade Autônoma de Lisboa (UAL), com vistas à avaliação da disciplina Ciências Jurídico Econômicas, sob a orientação da professora Doutora Maria Luiza, constituindo, em termos imediatos, requisito parcial para a obtenção do título de especialista, e mediatamente, do grau de Mestre, no curso de Mestrado em Direito Constitucional.

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