ÀS VEZES O DIVÓRCIO acontece antes mesmo de terem acabado (e estarem quitadas) as prestações do financiamento imobiliário do casal. E agora? Como fica a partilha deste bem, que na verdade, nem mesmo integraliza o PATRIMÔNIO DO CASAL (já que na maioria das vezes o financiamento é garantido por ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA, cf. Lei 9.514/97)?
No contexto do casal que se separa/divorcia deixando pendente financiamento imobiliário, o que se deve partilhar (e sempre à luz do REGIME DE BENS DO CASAMENTO) não é o IMÓVEL propriamente dito, já que este não integra mesmo o patrimônio do casal, se garantida a aquisição financiada por alienação fiduciária. Nesses casos o que tem o casal, até a quitação do financiamento é a POSSE DIRETA, transferida que foi a propriedade resolúvel ao credor, como explica AFRANIO CARLOS CAMARGO DANTZGER (Alienação Fiduciária de Bens Imóveis - Lei 9.514/97 - Aplicação Prática e suas Consequências. 2021):
"(...) A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA é o instituto contratual pelo qual o devedor de uma obrigação principal, que na maioria esmagadora das vezes é um CONTTO DE MÚTUO, como garantia de que efetivamente irá honrar sua obrigação e quitar sua dívida, transfere ao credor a propriedade de um determinado bem, sob CONDIÇÃO RESOLÚVEL EXPRESSA - ou seja, uma vez quitada a dívida perante o credor, fiduciário, resolvida estará também a propriedade que lhe foi transferida em garantia do cumprimento da obrigação e, então, o devedor, fiduciante, terá novamente agregado ao seu patrimônio a propriedade plena da coisa outrora alienada fiduciariamente e, consequentemente, recobrará de igual modo a posse indireta do bem, que até o efetivo cumprimento da obrigação permanecia em poder do fiduciário".
O casal tem a obrigação de pagar o financiamento que foi garantida pela alienação, como se viu. Deve, portanto, como reconhece doutrina e jurisprudência resolver em sede de divórcio a PARTILHA dos valores pagos durante a constância do casamento, dando igualmente solução à dívida original, sendo válido ali mesmo acordar sobre como será feito o pagamento da dívida remanescente e a destinação futura do bem.
A ilustre e sempre lembrada Desembargadora Aposentada, hoje Advogada, Dra. MARIA BERENICE DIAS (Manual do Direito das Famílias. 2020) esclarece:
"Adquirido bem mediante FINANCIAMENTO é preciso identificar o número de prestações quitadas durante a vigência da união. É esta a fração do bem a ser partilhado. Não se leva em conta o montante desembolsado, mas a PERCENTAGEM DO BEM ADQUIRIDO. Ficando um com o bem, o outro deve perceber o valor correspondente à METADE da fração que foi paga durante o período de convivência, proporcionalmente ao número de parcelas pagas. O cálculo deve tomar por base o valor à data da SEPARAÇÃO DE FATO".
A jurisprudência do TJGO é clara:
"DUPLA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO LITIGIOSO C/C ALIMENTOS. PARTILHA DE BENS IMÓVEIS. COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. PARTILHA. IMÓVEL FINANCIADO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. MEAÇÃO DAS PARCELAS PAGAS DURANTE A UNIÃO. ACORDO EM RELAÇÃO AO PAGAMENTO DA DÍVIDA REMANESCENTE E A DESTINAÇÃO FUTURA DO BEM. POSSIBILIDADE. A aquisição de bem imóvel mediante contratação de financiamento pelo casal, quando não quitado na constância do casamento, autoriza a PARTILHA tão somente dos valores correspondentes às prestações pagas até a separação de fato, não havendo qualquer óbice, também, em acordar acerca do pagamento das prestações remanescentes e da futura destinação do bem, notadamente quando se tratam de pessoas maiores e capazes, e não se verifica mácula que possa ensejar prejuízo a terceiros. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PROVIDA". (TJGO. 01738795120188090051. J. em: 22/03/2019)