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Análise da evolução das facções e de sua constituição em organizações criminosas

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4 INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS E ELEMENTOS DE PROVA PARA IMPUTAÇÃO.

A investigação de organizações criminosas é complexa e demorada. Seja em sede de Inquérito Policial, pelas polícias judiciárias, ou em sede de Procedimento de Investigação Criminal, por parte do Ministério Público, a investigação envolve diversos operadores, já que se investigam núcleos operacionais diversos. Não há um único padrão de investigação. No geral, as antigas técnicas de investigação, ainda em curso em casos simples (oitiva de testemunhas, interrogatório do investigado e indiciamento) não são eficientes em se tratando de Organizações Criminosas.

Ao investigar ORCRIMs, especialmente organizações criminosas violentas, como facções e milícias, o coordenador-investigador deve ter em mente a necessidade de limitar informações, com base no princípio da "necessidade de conhecer". Mário Pestana (Os princípios no tratamento de dados na LGPD, disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/artigo-marcio-pestana-lgpd.pdf ) define o princípio da necessidade como a "limitação da realização do tratamento ao mínimo necessário para a realização de suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados.

Por exemplo: imagine que haja uma investigação sobre um braço regional de uma facção criminosa. Essa atua em núcleos (centrais, torres, sintonias etc), que, apesar se seguirem ordens superiores, não tem necessariamente contato uns com os outros, como células de uma organização criminosa. Funcionam assim pelo simples motivo de que, ao cair uma célula (núcleo), as informações do corpo (organização) estarão preservadas. A investigação deve seguir tal lógica, para evitar vazamentos de informações por eventuais corrupção de agentes investigadores. Então deve-se fatiar a investigação por núcleos operacionais, fechando-se a cadeia de funcionamento da ORCRIM. No caso de facções, um dos grandes erros da estrutura do estado é ainda separar delegacias por especialidade (delegacia de entorpecentes e delegacia de homicídios, por exemplo). Tais delegacias investigam de forma autônoma e acabam sendo totalmente ineficaz no enfrentamento de facções criminosas, que, de um lado, tanto dominam o tráfico de droga, e do outro, são responsáveis pela maioria absoluta dos homicídios.

O objeto desse artigo não é trazer técnicas de investigação que, de toda forma, são variáveis, dependendo de grande capacidade de organização dos operadores-investigadores, e do apoio dos gestores, já que demandam tempo e recursos (humanos e materiais). O importante é frisar que a imputação a agentes faccionados, seja em relatórios de indiciamento, seja em denúncias ou em eventuais sentenças condenatórias, é um ato complexo, que necessita de duas fases: na primeira, comprova-se a existência da Organização Criminosa (facção), e na outra se prova a participação do agente (réu).

O operador deve indicar, de forma concreta, elementos que comprovem que existe uma organização criminosa (facção) ou um braço dela, em efetivo funcionamento, com os requisitos básicos previstos em Lei (art 1°, da Lei n° 12.850/13), respectivamente: concurso de quatro ou mais agentes, relação estruturada com divisão de tarefas (núcleos), objetivo de vantagem e prática de infrações penais graves. No caso de facções, deve-se apresentar o organograma da ORCRIM, indicando o papel de cada um dos denunciados e os crimes que praticam (em regra, roubos, tráfico e homicídios).

Após comprovar a existência da ORCRIM, passa-se à imputação individualizada, sendo a regra a imputação prevista no artigo 2º da Lei de regência, com as causas de aumento e agravantes previstas nos seus parágrafos. Vide os tipos:

Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas.

§ 2º As penas aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo;

§ 3º A pena é agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da organização criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução.

Ainda há a discussão sobre o concurso de crimes, já que, em regra, a investigação pelo crime de PARTICIPAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA atrairia, por conexão, os demais crimes praticados (tráfico, homicídios, roubos, lavagem de dinheiro, dentre outros). Pela complexidade e autonomia do tema e por depender de análise de regras específicas do processo criminal, não trataremos do assunto nesse artigo.

De todo modo, por ser autônomo, a imputação do crime previsto no artigo 2º da Lei 12.850/2013 não depende da comprovação de outros crimes, bastando-se comprovar, como dito, que existe uma ORCRIM (facção) e que o agente investigado (denunciado) tem ou teve papel dentro dessa organização.


5 CONCLUSÃO

Da intrínseca relação entre as mais diversas formas de delito, é inquestionável que interesse transversal em quase toda a matéria relacionada ao crime é a vantagem indevida, seja ela de cunho patrimonial ou não. É assim na essência dos crimes patrimoniais, violentos ou não, no comércio ilegal de armas de fogo, no tráfico de drogas, na corrupção, e também há a busca de alguma vantagem, até mesmo em relação, muitas vezes, aos crimes que atingem o bem jurídico vida, integridade física ou psicológica.

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É que as facções para atingirem seus objetivos, inúmeras vezes, têm que lançar mão da prática de outros delitos, seja por exemplo, corrompendo um agente público, ou exterminando a vida de um desafeto ou concorrente da atividade comercial criminosa, desta feita, não obstante a necessária separação em tipos penais para fins de didáticos para definição das atribuições dos órgãos investigativos ou competência para os órgãos julgadores, o fato é que deve haver uma visão ampla da atividade criminosa, com o sentimento de que não se isolam, os crimes, em regra, em compartimentos estanques, mas que se comunicam a todo instante, isto inevitavelmente e principalmente quando se diz respeito às facções criminosas que se traduzem em verdadeiras ORCRIMs.

O sucesso na repressão desse fenômeno criminoso, necessariamente perpassa pela interlocução permanente dos mais diversos estamentos que reprimem os crimes nas mais diversas modalidades, por exemplo, o investigador que trata de crimes fiscais, junto com o que trata da lavagem de dinheiro e escamoteamento de capitais, com os que tem como atribuição o combate ao tráfico de drogas e ao homicídio. Nesse diapasão, por exemplo, já foi cunhada uma expressão nova na linguagem jurídico criminal na labuta diária, o traficídio, ou seja, as mortes decorrentes da briga pelo espaço e hegemonia da venda de drogas, crimes estes, que sem serem investigados conjuntamente, dificilmente haverá êxito no desvendamento das infrações criminais.

Nesta toada, lançar mão de novas técnicas de investigação, concatenados as novas tecnologias, estas entendidas como fonte rica de meios de prova, é imprescindível para um combate eficiente e eficaz a estes grandes criminosos.


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______. Lei nº 12.850 de 2 de agosto 2013. Define a organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal. Diário Oficial da União, Brasília, 2 de agosto de 2013;

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Sobre os autores
José William Pereira Luz

Promotor de Justiça do Estado do Piauí

Rômulo Paulo Cordão

Promotor de Justiça do Estado do Piauí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LUZ, José William Pereira; CORDÃO, Rômulo Paulo. Análise da evolução das facções e de sua constituição em organizações criminosas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6845, 29 mar. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/96766. Acesso em: 23 dez. 2024.

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