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Ação revisional de contrato de alienação fiduciária

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Agenda 01/01/2000 às 01:00

Petição contra capitalização mensal de juros (anatocismo), cobrança de "comissão de permanência" cumulada com correção monetária; estipulação de juros acima do limite legal (com dupla incidência de juros); e cobrança de multa moratória acima do limite de 2%.

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da ª Vara Cível da Comarca desta Capital – Mato Grosso do Sul.

Distribuição por dependência,

prevenção e conexão ao processo

          (...), vem, respeitosamente, à presença de V. Exa., por intermédio de seus advogados habilitados (ut instrumento procuratório anexo - que receberão intimações de estilo em seu escritório, sito à Rua da Liberdade, 318, Vila Carvalho, nesta capital), para propor a presente AÇÃO REVISIONAL, com pedidos sucessivos (declaratórios, constitutivos/desconstitutivos e condenatórios) pelo rito ordinário, com pedido de tutela antecipada, em desfavor de...; pelos pertinentes e relevantes argumentos fáticos e jurídicos à seguir elencados.


I - OS FATOS.

Efetuou a postulante um contrato para aquisição da propriedade de um veículo pelo modo resolúvel.

A pessoa jurídica adversa, que não é instituição financeira inseriu em seu contrato de cunho adesivo, cláusulas monetárias leoninas, abusivas e ilegais, praticando usura e anatocismo, ferindo preceitos de órdem pública e onerando excessiva e unilateralmente o contrato.

O custo total do bem adquirido foi de R$ ... (...).

O prazo inicial para adimplemento das prestações obrigacionais era de ... (...) meses.

Deve-se frisar, neste ponto, que a mora é do credor, que onerou excessivamente as prestações obrigacionais e, assim, impossibilitou o adimplemento.

No transcorrer da vigência do aludido financiamento, a requerente verificou que os encargos, à cada mês, estavam se tornando excessivamente onerosos, não guardando qualquer relação de proporcionalidade com o comprometimento inicial de renda (equilíbrio prestação/renda).

Diante de tais arbitrariedades, alarmou-se ao analisar a evolução do respectivo financiamento, defrontando-se com os seguintes aspectos, assim escalonados:

          a) capitalização mensal de juros;

          b) correção monetária cumulada com comissão de permanência;

          c-) juros moratórios e remuneratórios acima do limite legal

          d-) multa de 10%.

Tais ilegalidades, são conseqüências exclusivas da conduta pérfida e abusiva dos requeridos, conforme se constata.

Outra irregularidade é quanto à sistemática utilizada pelos requeridos para amortizar o saldo devedor, certo que, em sua atualização, em vez de diminuir a dívida financiada, acaba por aumentá-la em patamares insuportáveis.

Perquire-se, ainda, quanto às taxas de seguros e demais encargos cobrados em valores bem acima das taxas de mercado, certo que, os aludidos percentuais incidem diretamente no montante da dívida financiada, onerando-a.

Todavia, infrutíferas foram as tentativas para que se efetuasse a revisão dos valores, bem como o modo pelo qual vêm majorando as prestações, sendo que tal revisão deveria ser feita desde o início do financiamento.

Das tentativas de acôrdo extra-judiciais a requerente conseguiu obter apenas respostas dúbias e evasivas da parte adversa, em nada surtindo efeito, acarretando ao mesmo uma verdadeira penalidade, visto que, atualmente, encontra-se impossibilitada de saldar a dívida caracterizando-se como inadimplente; razão única, que o levou a atrasar o pagamento do encargo mensal, cujos valores vinham desembolsando ilimitadamente.

Efetuado Laudo Pericial Extrajudicial constou a autora do presente pedido de tutela jurisdicional que os valores devidos, se revisionados consoante os parêmetros legais, perfazem a quantia de R$ ... (...). Se o veículo não for mantido na posse e junto ao patrimônio laborativo da autora imediatamente, a atividade desenvolvida, bem como a sua função social, estarão seriamente comprometidas, podendo até mesmo manifestar-se um estado de insolvência!

À vista disso, invoca-se a tutela jurisdicional, face ao perigo iminente de lesão ao seu patrimônio, que se não suprido "in oportune tempore", tornar-se-á ineficaz a prestação jurisdicional, ferindo, desse modo, o princípio da boa-fé, somando-se à mácula da nulidade absoluta do contrato.

Logo, nada mais resta à postulante, senão bater às portas do Poder Judiciário, para consignar em pagamento as prestações obrigacionais (consignatório, pelo rito especial, conexa), de forma revisionada, consoante os critérios apresentados nos autos desta Ação Revisional, respaldada em parâmetros legais, objetivando a quitação do débito e consequente decreto de extinção do vínculo obrigacional entre as partes.


II - O DIREITO

          2.1. – DOS PRECEITOS LEGAIS AUTORIZADORES DA REVISÃO JUDICIAL DO CONTRATO ORA EM EXAME(1).

Na hipótese vertente há plena incidência da regra estatuída no art. 115 do Código Civil brasileiro:

"São lícitas, em geral, todas as condições que a lei não vedar expressamente. Entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo o efeito o ato, ou o sujeitarem ao arbítrio de uma das partes".

Manifestando-se uma unilateralidade no estabelecimento dos percentuais de reajuste, não é desarrazoada a pretensão de ver incidir a norma do art. 1.125 do Código Civil:

"Nulo é o contrato ... quando se deixa ao arbítrio de uma das partes a taxação do preço".

          Logo, por tratar-se de ato ilícito, existem cláusulas contratuais nulas de pleno direito e, outras, anuláveis.

          Do cotejo das quaestio facti com as alegações jurídicas ora expendidas é que irá transparecer a ilegalidade, objeto de irresignação do postulante.

          2.1.1. DA LESÃO AO CONTRATO DE CUNHO ADESIVO

Os dois grandes princípios embasadores do CDC são os do equilíbrio entre as partes (não-igualdade) e o da boa-fé. Para a manutenção do equilíbrio temos dispositivos que vedam a existência de cláusulas abusivas, por exemplo o art. 51, IV, que veda a criação de obrigações que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. A definição de vantagem exagerada esta inserta no § 1º do artigo supramencionado.

Esta excessiva onerosidade, tratada no inc. III, diz respeito a uma verdadeira desproporção momentânea à formação do contrato, como ocorre na clássica figura da lesão, especialmente porque mencionado, no texto do CDC, a consideração às circunstâncias peculiares ao caso(2). Dentro deste parâmetro, a lesão é uma espécie da qual o gênero são as cláusulas abusivas. Espécie tão complexa que individualmente é capaz de ensejar a revisão dos contratos.

A cláusula abusiva é considerada nula, justamente por isto é que não podemos falar em sua sanação, característica da anulabilidade, devendo ser do contrato retirada. Aplica-se nesta situação o brocardo utile per inutile non vitiatur, o qual permite que se mantenha sadio o contrato em tudo aquilo que restar. A abusividade de uma cláusula pode ser decretada pelo juiz ex officio, pois trata-se de interesse de ordem pública, não sendo suscetível de prescrição.

A disposição do art. 51 do CDC não deixa dúvidas quando à cominação de nulidade (de pleno direito), às cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; (...).

Na mesma linha segue o escólio do sempre preciso PONTES DE MIRANDA:

          "No sistema jurídico do CPC/73, tal como antes, há distinção que está à base da teoria das nulidades: nulidades cominadas, isto é nulidades derivadas da incidência de regra jurídica em que se disse, explicitamente, que, ocorrendo a infração da regra jurídica processual, a sanção seria a nulidade (...)(3).

          Nulidade cominada, pois, vem a ser aquela decorrente de infração à regra, onde, expressamente foi prevista como conseqüência(4).

A abusividade de uma cláusula é detectada pela análise do conteúdo contratual, à luz da boa-fé, sob o ponto de vista objetivo. Vale transcrever os ensinamentos de CLÁUDIA LIMA MARQUES: "Na visão tradicional, a força obrigatória do contrato teria seu fundamento na vontade das partes...A nova concepção de contrato destaca, ao contrário, o papel da lei. ... Aos juízes é agora permitido um controle do conteúdo do contrato".(...) Assim também a vontade das partes não é mais a única fonte de interpretação que possuem os juízes para interpretar um instrumento contratual. A evolução doutrinária do direito dos contratos já pleiteava uma interpretação teleológica do contrato, um respeito maior pelos interesses sociais envolvidos, pelas expectativas legítimas das partes, especialmente das partes que só tiveram a liberdade de aderir ou não aos termos pré-elaborados" (5).

A atuação do juiz nesta situação deve seguir o disposto no art. 51, § 2º, do CDC, ou seja, ele deverá procurar utilizar-se de uma interpretação integradora da parte saudável do contrato. Tal exegese será norteada pelo princípio da boa-fé como norma de conduta. Aqui não existe uma vinculação, ou uma busca, da vontade das partes, e, sim, objetivamente, procura-se aquilo que se pode esperar como ideal dentro de um ajuste similar(6).

          2.1.2. O EQUILÍBRIO CONTRATUAL, QUE DEVERÁ SER ASSEGURADO ATRAVÉS DO PRESENTE PEDIDO DE TUTELA JURISDICIONAL (REVISÃO).

A concepção de contrato, modernamente, é uma concepção social, em que avultam em importância os efeitos do contrato na sociedade e onde são levados em consideração mais a condição social e econômica das pessoas nele envolvidas do que o momento da manifestação de vontades.

À procura do equilíbrio contratual, a vontade manifestada pelos contratantes perde sua condição de elemento fundamental do ajuste para dar lugar a um elemento estranho às partes, mas básico para a sociedade como um todo: o interesse social(7).

Merece destaque a reflexão feita pelo Exmo. Sr. Min. MARCO AURÉLIO, do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ao relatar a AOE 13-0-DF, publicada na ADV JUR 1993, p. 290:

          "Como julgador, a primeira coisa que faço, ao defrontar-me com uma controvérsia, é idealizar a solução mais justa de acordo com a minha formação humanística, para o caso concreto. Somente após recorro à legislação, à ordem jurídica, objetivando encontrar o indispensável apoio".

Como já asseverado amplamente na exordial, trata-se de contrato de adesão com cláusulas leoninas, mais a caracterização de usura e anatocismo.

Logo, para o restabelecimento do equilíbrio contratual, deve sofrer o pacto a revisão judicial, inclusive, para que se tenha certeza jurídica, quanto às efetivas prestações obrigacionais(8), se é que existentes e diga-se mais, se é que o suposto débito não é inverso.

          2.1.3. - A COMUTATIVIDADE DO CONTRATO DEVERÁ SER ASSEGURADA ATRAVÉS DO PRESENTE PEDIDO DE TUTELA JURISDICIONAL.

Dentro da categoria dos contratos bilaterais e onerosos estabelece-se uma outra divisão, opondo-se os contratos comutativos aos aleatórios. Comutativo é o contrato bilateral e oneroso, no qual a estimativa da prestação a ser recebida por qualquer das partes pode ser efetuada no ato mesmo em que o contrato se aperfeiçoa.

Na idéia de comutatividade(9) se insere, de um certo modo, a de equivalência das prestações. Porque é normal que, nas convenções de intuito lucrativo, cada parte só consinta num sacrifício, se aquilo que obtém em troca lhe for equivalente. Aliás, é essa a antiga concepção que o CC Francês, inspirado em POTHIER, fornece. Diz o art. 1.104 daquele Código:

"Art. 1.104 (O contrato) é comutativo quando cada uma das partes se obriga a dar ou fazer uma coisa que é encarada como equivalente daquilo que se lhe dá, ou daquilo que a ela se faz".

Logo, como se trata de contrato de cunho adesivo, com a inserção unilateral de cláusulas leoninas, temos que, de início, a parte adversa já feriu o princípio da comutatividade dos contratos.

Por conseguinte, deve a interação do Judiciário restabelecer, tanto o equilíbrio, quanto a comutatividade do contrato, garantindo à autora, entretanto, a efetividade do procedimento jurisdicional.

          2.1.4. A MORA É DO CREDOR.

A mora é do devedor ou do credor(10)?

Entendemos que quando há abusos e situações de irregularidades na hipótese de atraso de pagamento com uma oneração excessiva, através de pesados encargos, taxas e multas, além de uma exigência superior aos limites legais, assim considerados tanto normativos como éticos, a mora deixa de ser do devedor e passa a ser do credor.

Quando o adimplemento torna-se impossível por força da excessiva onerosidade imposta, que exige da outra parte gasto absurdo, que o sacrifica inteiramente, sujeitando-o a perda material intolerável, não ocorre mora por parte do devedor. O art. 955 do CC pátrio nos traz o conceito legal da mora, a qual seria o inadimplemento de obrigação de pagamento no prazo, tempo, forma e lugar estipulados, tanto para o devedor como para o credor. A princípio poder-se-ia imaginar que somente inadimplida a obrigação nos termos do mencionado artigo estaria configurada a mora. Ledo engano. Isto não quer dizer que não devamos investigar a incidência de culpa na mora.

Como diz o mestre civilista J. M. CARVALHO DOS SANTOS:

"Em qualquer das hipóteses (mora do devedor e do credor), a culpa é elemento essencial da mora, pois se verifica, com a mora, a violação de um dever preexistente" (in CCB Interpretado, vol. XII).

Em alguns contratos bancários não ocorre a mora face à ausência de culpa do mutuário no eventual atraso nas prestações, posto que esta se dá ante a oneração excessiva do contratado, com lucros absurdos e cobranças abusivas por parte da instituição financeira, fatos que fogem a possibilidade não somente do devedor mas de qualquer outro contratante.

E considere-se que as condições verificadas em certos contratos não podiam ser antevistas quando da realização de tais pactos, eis que mascaradas através de fórmulas ininteligíveis inclusive para quem seja um expert.

Por óbvio que em alguns contratos existe cobrança de juros extorsivos, ilegais e embutidos em certas operações, cumulados com cobranças de correção monetária e comissão de permanência, esta, com a devida vênia de entendimentos contrários, é ilegal quando cobrada juntamente com a correção monetária.

Assim é que em determinados casos, ao contrário do que seria de se esperar, a mora é do próprio credor, e não do devedor ou mutuário. Somente para ilustrar, traz-se à colação o questionamento e lição conferida pelo insigne mestre J. M. CARVALHO DOS SANTOS, a tratar sobre a mora e as obrigações assumidas pelo credor:

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"Como não? cabe indagar. Então o credor não assumiu obrigação alguma? Pode não assumir uma obrigação explícita, mas implícita sempre assumirá, qual a de cooperar e facilitar o que depender de si, para que o devedor execute normalmente a sua obrigação. Nem se conceberia que o credor a isso não se obrigasse, embora sem cláusula expressa, por isso que a lealdade e boa-fé que devem inspirar e regular o modo de cumprir exatamente os contratos criam essa obrigação implícita, que uma vez violada estabelece uma presunção de culpa" (op. cit.).

Daí por que, como é a lição de ORLANDO GOMES (Obrigações, Forense, 8ª ed., pág. 175), não se pode falar em mora ou inadimplemento, vez que se tornou inexigível a obrigação, decorrente de agravação imoderada da prestação que se leva em conta para incluir a situação no conceito jurídico de impossibilidade.

Sem querer generalizar, mas a inadimplência observada hoje no Brasil é fruto da excessiva valorização do lucro, que provoca um desequilíbrio nas relações de crédito, tudo na ânsia de maiores ganhos.

No presente caso concreto, conforme já asseverado na exordial, está mais do que verossímil a existência de oneração excessiva, o que caracteriza a mora como sendo do credor, nos exatos termos do art. 955, do Código Civil brasileiro.

Por todas estas razões é que deseja consignar em pagamento todas as prestações obrigacionais, até que se manifeste a extinção do vínculo obrigacional entre as partes.

          2.2. DO LIMITE DA TAXA DE JUROS.

...Taxa...

          2.2.1. Conceito de juros.

Importa compreender que o instituto dos juros poderá ser observado sob prismas econômicos, políticos e jurídicos(11).

Nesse compasso, a economia conceitua juros como sendo a remuneração paga pelo tomador de um empréstimo junto ao detentor do capital emprestado. A evolução dos juros acompanharia o culturalismo de seu tempo.

          KARL MARX, por sua vez, conformou a cobrança de juros à taxa de lucro, associando como "participação financeira no lucro (forma de expressão da mais-valia) do capitalista produtivo, e afirma que a taxa de juros deve ser inferior à taxa média de lucro, resultante da produção capitalista"(12).

Entretanto, JOHN MAYNARD KEYNES foi quem conferiu completude ao conceito econômico do juro, apresentando-o com critérios objetivos e subjetivos que, respectivamente, consistiam na escassez de capital e renúncia à liquidez monetária, aliada à oferta e procura da moeda em investimentos. A partir dessa concepção keynesiana, os juros passaram a ser instrumento de políticas de desenvolvimento econômico com manipulação da oferta monetária disponível. Essa, aliás, a compreensão política que deixa impregnado o instituto(13).

A ciência jurídica, por outro lado, aproveita-se das conceituações econômicas e acresce o elemento imperativo-normativo, para qualificar os juros como sendo "o preço do uso do capital. Vale dizer, é fruto produzido pelo dinheiro, pois é como fruto civil que a doutrina o define. Ele a um tempo remunera o credor por ficar privado de seu capital e paga-lhe o risco em que incorre de o não receber de volta"(14). Lançam-se os elementos da acessoriedade; privação do capital mediante posterior remuneração; pagamento do risco assumido na concessão do crédito através do mútuo de transmissão da coisa fungível (capital).

          2.2.2. Usura(15).

A Lei 1.521/51 (combinada com o decreto 22.626/33), que tratou dos crimes contra a economia popular, limitou a margem de lucro dos Bancos a 20%, ao prescrever como conduta criminosa caracterizadora do tipo usura pecuniária ou real:

"obter ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessidade, inexperiência ou leviandade de outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida".

Sendo circunstância agravante do crime o fato de "ser cometido em época de grave crise econômica", devendo a autoridade judiciária, depois de decretar a nulidade da "estipulação de juros ou lucros usuários", "ajustá-los à média legal, ou, caso já tenha sido cumprida, ordenar a restituição da quantia paga em excesso, com os juros legais a contar da data do pagamento indevido" (art. 4º, caput, alínea "b" e parágrafo 2º, caput, inciso I e parágrafo 3º).

Seguindo-se o diapasão retro-elencado, a Lei 1521, de 26.12.51, que trata dos crimes contra a economia popular, prevê:

"Art 4 - Constitui crime da mesma natureza a usura pecuniária ou real, assim se considerando:

a) - cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre dívidas em dinheiro, superiores à taxa permitida por lei; cobrar ágio superior à taxa oficial de câmbio sobre garantia permutada por moeda estrangeira, ou, ainda, emprestar sob penhor que seja privativo de instituição oficial de crédito" (grifamos).

Logo, não se pode considerar válido, na esfera cível, um ato que, tendo a mesma raíz, é considerado crime na esfera penal. Portanto, é fato notório que o autor foi tolhido e impedido de efetuar o pagamento da dívida, por que ninguém é obrigado a pagar mais do que a Lei determina.

Isso tudo equivale a dizer que são nulos os dispositivos contratuais relativos à cobrança de encargos superiores a 20% da taxa de captação paga pela instituição financeira, o que deverá ser apurado em perícia a ser realizada na contabilidade da parte adversa.

Referida perícia contábil certamente comprovará que o lucro da parte adversa nas operações financeiras realizadas com o autor supera, em muito, o limite de 20%, prevista na lei retro transcrita (que não foi revogada pela lei 4.595/64, tendo sido recepcionada pela vigente Constituição Federal, bem como do Decreto 22.626/33).

Além da modificação das cláusulas contratuais acima citadas e do recalculo dos valores pagos pelo autor à parte adversa, importa a presente demanda na pretensão condenatória desta em restituir tudo quanto recebeu à maior, decorrente da diferença de cálculo entre os encargos cobrados abusivamente e os parâmetros legais, bem como o expurgo da taxa de juros superior ao que é permitido, única forma de não ser admitido o enriquecimento sem justa causa.

          2.2.3. Supremacia da Constituição.

O princípio da supremacia da Constituição é o próprio princípio da sumpremacia da lei, princípio que – adequadamente definido e entendido – se tem como metafisicamente verdadeiro, em vista da falibilidade humana: "omnes hominesn debent esse legi subjecti", tanto que "quantum ad vim directivam legis, princeps subditur legis"

Ë neste princípio que se assenta

          2.2.4. Enunciado sofístico.

"O direito positivo brasileiro não fixa limite para a cobrança de juros pelas instituições financeiras, salvo eventuais restrições oriundas das autoridades monetárias porque:

I – O teto previsto no parágrafo 3º do art. 192 da Constituição Federal depende, para vigorar, da Lei Complementar prevista para regulamentar o Sistema Financeiro Nacional, e para elucidar o conceito de ‘juros reais’;

II – até que venha a ser promulgada a referida Lei Complementar, prevalece a legislação anterior, que submete os níveis dos juros aos critérios do Conselho Monetário Nacional, desde que está parcialmente derrogada a Lei de Usura;

III – ademais, é facultado ao Poder Executivo alterar as taxas de juros como instrumento da política econômica;

IV – de resto, inexistem outros obstáculos constitucionais ou infraconstitucionais, tendentes a coibir a livre cobrança de juros, quaisquer que sejam as taxas".

Por solicitação da Federação Nacional dos Bancos e da Federação Brasileira das Associações de Bancos, diversos juristas brasileiros forneceram pareceres contrários, unilaterais e tendenciosos, contrários à aplicação imediata do parágrafo 3º do art. 192 da Constituição Federal, o gerou uma série de sofismas e argumentos falseáveis.

          2.2.5. Do não condicionamento da vigência do limite à Lei Complementar.

O dispositivo normativo do § 3º do art. 192 tem sido objeto de amplas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, principalmente em relação à sua auto-aplicabilidade.

As chamadas normas constitucionais de eficácia principiológica programática, também conhecidas por não auto-executáveis ou de eficácia limitada, conceito pacificado na doutrina, são normas integrantes da unidade constitucional(16) e que carecem de regulamentação específica de seu conteúdo, de forma a alcançar ampla aplicabilidade concretizada. Fixam, outrossim, mais do que comandos-regras, também comandos-valores subsumidos em princípios vinculadores do legislador e até mesmo dos particulares adstritos a suas proposições limitadas(17).

Deve-se frisar, antes de mais, que o grande debate está nos efeitos possuídos por essa espécie de norma constitucional e a dimensão exegética sem a necessária regulamentação. Apesar de ser da essência de sua eficácia contida a regulamentação por norma infra-constitucional, o dispositivo programático traça limites de ordem pública que deverão ser obedecidos pelas bases sociais, necessariamente, mesmo que não exeqüível a norma por si mesma(18). "Precisamente por isso, e marcando uma decidida ruptura em relação à doutrina clássica, pode e deve dizer-se que hoje não há mais normas constitucionais programáticas. Existem, é certo, normas-fim, normas tarefa, normas programa que impõem uma atividade (...) Às normas programáticas é reconhecido hoje um valor jurídico constitucionalmente idêntico ao dos restantes preceitos da Constituição"(19).

Afirmamos com JOSÉ AFONSO DA SILVA: "Em conclusão, as normas programáticas têm eficácia jurídica imediata, direta e vinculante nos casos seguintes:

          I - estabelecem um dever para o legislador ordinário;

II - condicionam a legislação futura, com a conseqüência de serem inconstitucionais as leis ou atos que as ferirem;

III - informam a concepção do Estado e da sociedade e inspiram sua ordenação jurídica, mediante a atribuição de fins sociais, proteção dos valores da justiça social e revelação dos componentes do bem comum;

IV - constituem um sentido teleológico para a interpretação e aplicação das normas jurídicas;

V - condicionam a atividade discricionária da Administração e do Judiciário;

VI - criam situações jurídicas subjetivas, de vantagem ou desvantagem"(20).

Com efeito, lançados esses pressupostos, é fundamental compreender que a norma do art. 192, § 3º comporta a seguinte análise:

  1. o dispositivo é auto-aplicável, bastando-se por si na qualidade de diretiva material permanente, e regulamentação prescinde a segunda parte do dispositivo, no sentido de tipificar a conduta criminosa da usura;
  2. admitindo-se, para argumento, a necessidade de regulamentação, deve-se obtemperar que a Constituição delimitou clara e explicitamente o percentual de 12% anuais, vinculando o legislador, julgador e os particulares nesses limites(21);
  3. também ad argumento, ainda que programático, o dispositivo tem conteúdo limitativo e eventual lei complementar regulamentadora não poderia ultrapassar a taxa estipulada, sob a pena de declaração de inconstitucionalidade. Nesse sentido foi o posicionamento dos Ministros MARCO AURÉLIO(22) e CARLOS VELLOSO nos julgamentos da ADIN 4-7/DF e do MI nº 362-0-RJ (RT 732/143) aos quais nos reportamos.

Trago, pois, importante lição do Ministro Sálvio de Figueiredo, através de voto proferido pelo mesmo no Resp n- 5-MT, RSTJ4/1 465:

"A estipulação e a percepção de juros não são contra a moral, nem contra o direito natural ou justo (cf. Chr. Fr. Schott, Dissertationes lures Naturalis, diss. De moralitate usurarum, II, 53 S); todavia, são contra a própria organização social os juros excessivos. Por outro lado, se a permissão de juros há de ser a regra, nem por isso há o Estado permitir os juros extorsivos que levam à exploração do trabalho humano para a ganância dos usuários" (23).

Ademais, incontestável a mora do Congresso Nacional em regulamentar a matéria, uma vez que já passados quase dez anos da promulgação da Carta Magna, embora diversos Mandados de Injunção tenham sido impetrados com o objetivo de ver efetivada a regra contida no art. 192, 3-, da Constituição, como se vê nos MI n. 323-8-DF, in JSTF 196/96, MI n.329-7-SP, in JSTF 194/93, MI n. 361-1-RJ, in JSTF 190/135, mi n. 362-0-RJ, in JSTF 212/120, dentre outros. Esse fato comprova o grande comprometimento do Congresso com os interesses dos grupos financeiros nacionais e internacionais, estes, aliás, cada vez mais interessados em investir no país frente o horizonte de agigantados lucros que o sistema propicia a esse tipo de atividade.

Outrossim, no tocante à real limitação dos juros constitucionais, há de se afirmar que ao seu redor bailam eminentes interesses dos poderosos grupos financeiros, intentando barrar, por entrelinhas, o estímulo aos setores produtivos e a conseqüente geração de emprego e riqueza, até porque se sabe que a especulação gerada com a intermediação de suas atividades já atingiu o patamar de ¼ do Produto interno Bruto do país.

De se ponderar: as cláusulas estipuladas fora dos limites são nulas, anuláveis ou importam em redução imediata e ex officio? Por sua desconformidade com o ordenamento jurídico, essas cláusulas são fulminadas pela nulidade absoluta, importando sua redução aos patamares admissíveis, quando discutidas em processo judicial. É possível separar o percentual admissível da abusividade repudiada (art. 153 do CC), contudo, o excesso é ilícito, ficando assegurado ao devedor a repetição do que houver pago a mais.

2.2.6. Sobrevida da legislação anterior.

          2.2.6.1. Vício de delegação.

          2.2.6.2. Facilitação da usura.

          2.2.6.3. Violação da isonomia.

          Plena vigência da Lei de Usura: insubsistência do verbete 596 da Súmula do STF.

A Constituição Federal de 1988 fixou a competência do Congresso Nacional para dispor sobre matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e suas operações (CF, art. 48, XIII).

Como regra de transição, a mesma Carta Política estabeleceu o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a partir da sua promulgação, para que todos os dispositivos legais que atribuíssem ou delegassem a órgão do Poder Executivo competência pôr ela assinalada ao Congresso Nacional fossem extirpados do mundo jurídico, com imediata perda de vigência (ADCT, art. 25) [24].

Esse prazo, contudo, poderia ser prorrogado pôr lei, com autorização do próprio artigo 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

A omissão do Congresso em cumprir o seu mister, no particular, levou o Executivo Federal a editar a Medida Provisória n. 45, de 31.03.89 (DOU de 03.04.89), prorrogando até 30 de abril de 1990 a vigência dos dispositivos legais que houvessem atribuído ou delegado ao Conselho Monetário Nacional, ao Conselho Nacional do Comércio Exterior, ao Conselho Nacional de seguros Privados e ao Conselho Interministerial de Preços, as competências assinaladas pela Constituição, ao Congresso Nacional.

A Medida Provisória n. 45, de 31.03.89, perdeu a eficácia, desde a sua edição, no dia 02.05.89, porquanto não convertida em Lei (CF, art. 62, parágrafo único) ou reeditada (construção pretoriana).

Os efeitos imediatos desse fato jurídico foram os transcurso do prazo de 180 (cento e oitenta) dias previsto no artigo 25 do ADCT e a revogação de todos os dispositivos legais que atribuíssem ou delegassem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional.

Dentre as grandes e diversas conseqüências jurídicas da revogação dos dispositivos de que trata o artigo 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, duas pertinem ao tema e merecem relevo em face da sua atuação sobre a sociedade civil:

  1. O Conselho Monetário Nacional, desde o dia 04.04.89, não possui legitimidade para limitar, fixar ou dizer sobre taxas de juros; e,
  2. As instituições financeiras, desde o dia 04.04.89, submetem-se ao regime normativo geral dos juros, porquanto derrogado expressamente o dispositivo de lei especial que lhes permitia praticar as taxas fixadas pelo Conselho Monetário Nacional.

Em quaisquer contratos, pois, segundo a ordem jurídica vigente, é vedada a estipulação de taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (6% ao ano).

É possível que esse cenário se altere com a edição da Lei Complementar de que trata o artigo 192 da Magna Carta, cujo escopo será estruturar o sistema financeiro nacional, de molde a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade.

Enquanto não for editada essa Lei, prevalecerá o regramento infra-constitucional da espécie, independentemente da sua posição hierárquica no processo legislativo. Isto o Direito permite.

Na esteira dessa permissão, os tribunais pátrios têm manejado a Lei Ordinária n. 4.595/64 para deslindarem controvérsias relativas a contratos bancários e ao sistema financeiro nacional.

O que não poderiam, nem podem (não deveriam, nem devem), data maxima venia, é conferir validade a atos do Conselho Monetário Nacional (especialmente a fixação de taxas de juros) editados com base em dispositivos legais já expressamente revogados pela Constituição Federal desde 04.04.89, pôr consubstanciar flagrante negativa de vigência ao parágrafo único do artigo 62 da Carta Magna e ao artigo 25 do ADCT(25).

Admite-se que a taxa de juros possa ser regulada pelo mercado, porquanto, primariamente, mera remuneração do capital. Nada obstante, o Estado Democrático de Direito, como se pretende a República Federativa do Brasil. É um Estado constitucional que "pressupõe a existência de uma constituição que sirva – valendo e vigorando - de ordem jurídico-normativo fundamental vinculativa de todos os poderes públicos" (26).

Foi o que asseverou, em recente pronunciamento à imprensa, o eminente Ministro MARCO AURÉLIO, do Supremo Tribunal Federal, em defesa do justo e legítimo pleito de aumento salarial dos Órgãos do Judiciário:

"Paga-se um preço para se viver numa democracia e o preço é o respeito ao arcabouço jurídico em vigor" (27).

E o arcabouço jurídico em vigor, relativamente ao tema, veda a estipulação de juros superiores ao dobro da taxa legal (6% ao ano), em quaisquer contratos, e não admite a limitação ou fixação de taxas de juros pelo Conselho Monetário Nacional, Porquanto expressamente revogados os dispositivos legais que lhe delegam tal atribuição.

Vale lembrar, finalmente, que a Súmula 596 do C. Supremo Tribunal Federal não mais se presta como paradigma para os litígios que envolvam operações realizadas pôr instituições públicas ou privadas que integram o sistema financeiro nacional, sujeitas, hoje, à regra geral dos juros(28).

Resulta incontendível, destarte, que o ordenamento jurídico vigente não permite a cobrança de juros superiores ao dobro da taxa legal (6% ao ano), em contratos de qualquer natureza, desde 04.04.89. Quem os pagou pode pleitear a sua restituição; os que estão vinculados a contratos que estipulem juros superiores a 12% (doze pôr cento) ao ano podem buscar adequá-los aos limites de lei.

          2.2.7. As Constituições de 67-69.

          2.2.8. Cassação dos poderes do Conselho Monetário Nacional.

          2.2.9. Sobre a hegemonia da Política Econômica.

          2.2.10. Sobre a inexistência de óbices à plena Liberdade de Mercado.

          Capitalização mensal de juros – USURA E ANATOCISMO

A capitalização dos juros consiste na operação matemática de contagem de juros, dos juros já contados.

Trata-se, na prática, de método que faz aumentar o valor do capital tomado, acrescendo-lhe valores que somente podem ser obtidos pela aplicação composta dos juros. Vê-se, por um primeiro ponto de análise, a exorbitação da característica principal dos juros, a asseguração do risco assumido pelo credor, sobrevalorizando a remuneração do credor através dos juros e possibilitando a caracterização da usura.

Culturalmente, essa extrapolação da liquidez monetária passou até por condenações da igreja(29) à chamada prática de usura do crédito, e no direito brasileiro foi objeto de apreciação do art. 253 do Código Comercial e o tema mereceu a anotação de repúdio do comercialista TULLIO ASCARELLI, comentando as vendas e pagamentos feitos em prestações, sendo que "justamente nas vendas em prestações que se escondem hoje, às vezes, juros e práticas usurárias, contra os quais as leis começam a dispor na justa luta contra a usura" (30).

Entretanto, é no campo jurídico que deverá ser cuidadosamente observada essa espécie de lucratividade. Mister dividir em ordinário e especial, para melhor didática, o âmbito de incidência dos juros.

O regime ordinário de incidência tem aplicação a todos os atos jurídicos civis e comerciais praticados por sujeitos de direito que não se configurem como instituições financeiras. Sua normatividade implica afirmar que a taxa aplicável é aquela arrolada pelos arts. 1.062 e 1.063 do CC, nos limites legais de 6% a.a. ou convencional até o dobro (12%, conforme o disposto no Decreto nº 22.626/33 e incidentemente § 3º do Art. 192 da CF/88), incidindo sempre na modalidade de cálculo simples. A capitalização, nesses casos comuns, é terminantemente vedada, com incidência do art. 4º do Decreto 22.626/33 e dos arts. 39 e 51 do CDC para a anulação das cláusulas contratuais extorsivas e, na esfera penal, a abusividade nos juros tipifica o delito de usura (art. 13 da Lei nº 1.521/51).

Com efeito, outro enfoque, afirmando com a autoridade merecida pelo enunciado 121 da Súmula do STF, é a vedação do anatocismo consubstanciado na capitalização dos juros, ainda que expressamente convencionado. Assim julgou o Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

          "CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - É vedada, inclusive para instituições bancárias, salvo nas hipóteses expressas em lei. Recurso especial conhecido e provido, em parte" (31).

          2.2.12. Conclusões.

Após a sintética discriminação dos contornos atuais dos juros, e em sede conclusiva, resta apresentar a importância de uma correta aplicação do instituto, máxime em se tratando de uma economia potencialmente em estabilização.

Admitir que sejam utilizadas as elevadas taxas que as instituições financeiras estão fazendo incidir sobre os contratos de financiamento, além de ilegal (face aos preceitos analisados) e anulável, é servir de conduta geradora de ilícito perfeitamente reparável e com fundamento no art. 1.531 do Código Civil e o CDC (arts. 39 e 51).

Está autorizada, até mesmo, a revisão das cláusulas pactuadas abusivamente, conformando-as à realidade pelo desaparecimento das circunstâncias objetivas que conferiam suporte à relação jurídica de equivalência (teoria da imprevisão)(32). Assim é que o Judiciário deve aplicar as regras jurídica corretamente interpretadas em sua teleologia e no contexto social inserido, alheio aos azares do Poder Executivo e aos temores de uma sociedade viciada na ciranda financeira de usura.

As empresas, ao contrário do que entende o Prof. FÁBIO KONDER COMPARATO(33), têm uma função social a cumprir, aliada à produção e seus consectários de projeção na sociedade.

Contudo, a especulação disfarçada obliquamente nos juros, defendida por muitos doutrinadores e julgadores, é o perfeito reconhecimento de conversão do capital produtivo em capital exclusivamente especulativo, causando a quebra da atividade produtiva.

          O NOMINALISMO MONETÁRIO, A DESINDEXAÇÃO DA ECONOMIA NACIONAL E O CRITÉRIO ADEQUADO, SEGUNDO CONSTRUÇÃO PRETORIANA, PARA A CORREÇÃO MONETÁRIA.

Como não poderia e não pode a requerida corrigir o débito fazendo incidir para tanto no saldo devedor a Taxa Referencial, AMBID, TJLP, ou quaisquer outros indexadores praticados pelo mercado financeiro, deve a mesma vir a ser substituída pelo indexador nominado IGPM-IBGE ou IGP-M-FGV, entendimento este, inclusive, amplamente corroborado pelo egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul(34).

O Brasil adota, mediante institucionalização no Código Civil, o nominalismo monetário, razão por que a moeda conserva sempre o seu valor liberatório fixado pelos arts. 947 e 1.061, para se processarem, respectivamente, nas dívidas de dinheiro(35), o fiel adimplemento do principal e a reparação, em caso de mora, das perdas e danos.

Conseqüentemente, "para que a dívida `X´ seja saldada, apesar da variação do poder aquisitivo da moeda, basta a entrega da moeda de valor nominal `X´. E somente lei, reservada ao âmbito da União, pode alterar esse princípio´´ (RTJ 79/515, no voto condutor do acórdão alusivo ao RE 79.663-SP, TP, prolatado pelo saudoso Ministro RODRIGUES ALCKMIN).

O douto Ministro MARCO AURÉLIO, assim decidiu, litteris:

"A atuação do STF não pode ser uma atuação revolucionária, não pode transformar o Brasil no paraíso dos devedores. A atuação do STF não pode fulminar o próprio Judiciário e fico a imaginar os milhões de pedidos que serão endereçados ao Judiciário, objetivando a devolução de importâncias pagas indevidamente, isto caso venha a Corte a concluir que a TR não é fator de indexação monetária´´ (ADIn 493, fl. 369).

Por outro lado, releva assinalar que, no mesmo julgamento, a Suprema Corte enfrentou questões suscitadas sobre inevitáveis enriquecimentos ilícitos e ônus que adviriam das inconstitucionalidades inquinadas, deixando esclarecido e sinalizado que:

a) Ao Judiciário cabe aplicar as normas legais, sem avaliar suas conseqüências de ordem econômica;

b) O fato econômico tem que seguir o constitucional;

c) O Judiciário não pode negar aos devedores os favores que a lei lhes assegura;

d) Os credores terão direito a ressarcimento, pelo Tesouro Nacional, dos prejuízos sofridos em razão dos atos legislativos viciados;

e) O Judiciário não dispõe de poderes para criar índices corretivos legais;

f) A economia ficará desindexada até que se institua, por lei, novo índice corretivo que reflita a variação do poder aquisitivo da moeda, a teor do que preceituam o § 1º do art. 1º e o § 1º do art. 7º, ambos da Lei 4.357/64;

g) Aquele que recebe o que não lhe é devido fica sujeito à restituição do indébito.

Em razão de tudo isso, o abordado vazio legislativo passou a impossibilitar, juridicamente, a teor dos arts. 116 e 145, II e V, do Código Civil, que variada gama de dívidas de dinheiro.

Em razão desses fatos, promulgou-se a Lei 8.383/91, criando a UFIR como medida de valor e parâmetro de atualização monetária de tributos e de valores expressos em cruzeiros na legislação tributária federal, de multas e penalidades de qualquer natureza. Entrementes, com vistas a livrar o Tesouro Nacional de milhares de ações judiciais, alvitradas na alínea g do tópico 9 acima, autorizou-se, por intermédio dos arts. 80/85 da mesma lei, a compensação dos valores pagos ou recebidos com base em cálculos processados nos parâmetros da TRD.

Posteriormente, adveio a Lei 8.660, de 28.05.93, estabelecendo novos critérios para fixação da TR, extinguindo a TRD e qualificando, jurídica e explicitamente, a TR como encargo remuneratório que, assim, ficou sujeita ao tabelamento do D. 22.626/33 e ao parâmetro estatuído pelo § 3º do art. 192 da CF.

Restringe-se, ainda, que o próprio STJ, no acórdão pertinente ao REsp. 31.024-0-GO (DJ de 20.09.93), decidiu, in litteris:

" II - A partir de fevereiro de 1991 deve ser adotado, para esse efeito, o IPC, isso em razão da orientação firmada pelo STF, quando do julgamento da ADIn 493, no sentido de que `a taxa referencial (TR) não é índice de correção monetária´.´´

Em razão de todo o exposto, é de se concluir que as questões relacionadas com natureza jurídica da TR e com o abordado vazio legislativo constituem matérias já placitadas pelo STF e que não podem nem devem ser objeto de alheamento por parte do Poder Judiciário, já que todos os Órgãos da Administração Pública, ex vi do inciso II do art. 5º e do caput do art. 37 da CF, estão sob o império da supremacia da lei que os submete ao regime normatizado, impondo tanto a exigência da aplicação da lei (dimensão positiva), quanto a proibição de desrespeito ou de violação da lei (dimensão negativa) (36).

          2.4. - ILEGALIDADE DA COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – CUMULADA COM CORREÇÃO MONETÁRIA – MATÉRIA SUMULADA.

A comissão de permanência não é devida, uma vez que a mora é do tipo creditoris, ou seja, causada pelo credor da suposta dívida.

Seguindo esta linha de raciocínio, para corroborar o entendimeto sumulado acima transcrito, é mister que se traga à colação acórdão do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, a saber:

"... não se acumulam a correção monetária com os juros remuneratórios, identificados como comissão de permanência (Súmulas 05 e 30/STJ)" (37).

          2.5. LIMITE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, QUANTO À CLÁUSULA PENAL.

O Código de Defesa do Consumidor assevera que são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que estipularem vantagens excessivas(38).

A jurisprudência, hoje, é pacífica, no sentido de que a cláusula penal somente poderia ser estipulada em 2% (dois por cento) à incidir sobre o valor do débito corrigido(39).

          2.6. DA PREMENTE NECESSIDADE DE ANTECIPAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL.

Quais os efeitos do presente pedido de tutela jurisdicional que pretende a autora seja objeto de antecipação parcial?

São justamente aqueles inerentes à REESTABELECIMENTO DE POSSE DO VEÍCULO objeto do contrato ora revisionado.

É que a parte adversa ingressou com ação específica, obtendo liminar no sentido da reintegração de posse ou busca e apreensão do veículo (periculum in mora, ou perigo de superveniência de danos de dificílima ou impossível reparação).

É sempre bom lembrar a insuperável lição de CALAMANDREI de que todos provimentos jurisdicionais existem como "instrumento do direito material, que por intermédio deles atua". Nos provimentos cautelares, porém, "verifica-se uma instrumentalidade qualificada, ou seja, elevada, por assim dizer, ao quadrado: eles são, de fato, inquestionavelmente, um meio predisposto para a melhor eficácia do provimento definitivo, que a sua vez é um meio para a atuação do direito; isto é, são eles, em relação à finalidade última da função jurisdicional, instrumento do instrumento". Vale dizer: os provimentos cautelares nunca são um fim em si mesmos, e surgem sempre "da existência de um perigo de dano jurídico, derivado do atraso de um provimento jurisdicional definitivo (periculum in mora)" (40).

A verossimilhança do direito invocado, ou fumus boni juris da Teoria Geral das Cautelares, pode ser encontrada no conjunto das alegações efetuadas pela autora para a revisão do pacto, sobretudo no que pertine à existência de cláusulas abusivas, leoninas e inconstitucionais.

O fumus boni iuris, são afirmações feitas pelas partes que possuam fundamentos jurídicos que levam a acreditar serem verdadeiros e, neste caso, decorre dos argumentos expendidos na inicial em conjugando-os com os fundamentos esposados acima e, em especial, a aplicação dos preceitos contidos no Código de Defesa do Consumidor, de caráter público, possibilidade do hipossufíciente / consumidor discutir revisão do contrato, prevenção de danos, facilitação de defesa e a salutar regra ínsita no art. 83 do CDC e ainda mais o disposto no art. 5º, XXV, da CF/88 – "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito."

          CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, cuja autoridade como maior cientista do direito processual civil brasileiro ninguém pode colocar em dúvida, preleciona que:

" convencer-se da verossimilhança (fumus boni juris), não poderia significar mais do que imbuir-se do sentimento de que a realidade fática pode ser como a descreve o autor" (41).

A doutrina hoje é pacífica, não sendo mais cambaleante sobre o tema, já deixou externado que "analisa-se situação do autor e exclusivamente ela, para, em razão dos fatores objetivos, se concluir pela necessidade ou não da antecipação e essa necessidade só se verificará quando houver o fundado receio de que os danos ocorrerão" (42).

Veja, Exa., que inexiste perigo de irreversibilidade da medida, posto que poderá a autora ficar como fiel depositária do bem.

O perigo de irreversibilidade do provimento, impeditivo da tutela antecipada, é contestado por MARINONI: É necessário que se perceba, porém, que é incorreto se falar em irreversibilidade do provimento, já que esta não se pode dar no plano jurídico; a irreversibilidade é a dos efeitos fáticos do provimento. Entretanto, o perigo de irreversibilidade dos efeitos fáticos do provimento não pode constituir impedimento ao deferimento da tutela urgente(43).

Tratando-se de tutela antecipatória urgente, deve ser possível o sacrifício, ainda que de forma irreversível, de um direito que pareça improvável em benefício de outro que pareça provável. Do contrário, o direito que tem maior probabilidade de ser definitivamente reconhecido poderá ser irreversivelmente prejudicado. Em resumo, se não há outro modo para evitar um prejuízo irreparável a um direito que se apresenta como provável, deve-se admitir que o juiz possa provocar um prejuízo irreparável ao direito que lhe parece improvável. Nestes casos deve ocorrer a ponderação dos bens jurídicos em jogo, aplicando-se o princípio da proporcionalidade, pois quanto maior for o valor jurídico do bem a ser sacrificado, tanto maior deverá ser a probabilidade da existência do direito que justificará o seu sacrifício.

O juiz poderá, a qualquer tempo, revogar ou modificar, em decisão fundamentada, a tutela antecipada.

De qualquer modo, haja ou não liminar, prosseguirá o feito até final julgamento.

          2.7. DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DA MANUTENÇÃO DE POSSE DO VEÍCULO OBJETO DO CONTRATO ORA REVISIONADO.

É sabido que, uma vez quitado o preço do contrato a propriedade do bem dado em garantia no contrato consolida-se nas mãos da autora.

Como já visto, há sério dissenso entre autora e requerida quanto ao valor do contrato, sendo certo que a autora pretende que se declare que já pagou bem mais do que a requerida quer reconhecer.

Assim se resume a lide com base nos ambates verbais entre os representantes de ambas as partes no período que antecedeu ao ajuizamento desta demanda.

Ocorre que demonstração maior de que a ré não vai aceder à pretensão da autora está na correpondência que endereçou a esta, exigindo o imediato pagamento das parcelas do contrato sob a ameça de serem ajuizadas medidas cabíveis.

De modo que pretende a autora seja antecipada parcialente a tutela jurisdicional para assegurar em suas mãos e reestabelecer a posse dos bens arrendados até que se declare já tenha ela quitado integralmente o preço dos mesmos, considerando o FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO, consubstanciado na efetiva possibilidade de ver-se o autor privado da posse dos bens, bem como em razão da RELEVÂNCIA DO FUNDAMENTO DE DIREITO, ora deduzido, consistente na alegação comprovada por Laudo Pericial de que, observados os limites legais, a autora já quitou quase que integralmente o preço dos referidos bens.

Será reconhecida por todos como decisão justa e altamente razoável, aquela que permita que o autor permaneça na posse dos bens alienados até que seja definitivamente julgada a presente ação desconstitutiva, com a efetiva ocorrência da coisa julgada material, pois não é correto imaginar que a parte que tem a sua pretensão em andamento no judiciário possa sofrer enorme prejuízo antes do deslinde final da demanda. Garantia constitucional como a da amplo acesso ao Judiciário, não pode ser vilipendiada de forma tão violenta.

Nem se diga que entendimento jaez seria prejucdicial à parte adversa, pois é sabido que a mesma trabalha com DINHEIRO e, não, com automóveis. Os ajuizamentos de demandas possessórias por parte da ré, conforme é de todo sabido, serve, unica e exclusivamente, para pressionar indevidamente o suposto devedor, por que é evidente que o bem propriamente dito não interessa à ré, que está atrás, isto sim, de receber aquilo que ilicitamente faz parte de seus cálculos (OBSERVE-SE QUE A DEMANDA AJUIZADA NÃO REVELA, OBVIAMENTE, SITUAÇÃO DE PURA NEGATIVA DO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS). Cuida-se, isto sim, de procurar proteção jurisdicional à uma situação de estremada injustiça e evidente lesão, que não pode ser omitida da apreciação do Poder Judiciário.

Ao pretender proteção judicial para assegurar-se na posse dos bens arrendados até o julgamento final da demanda, não deseja o autor, nem seria lícito querer que a ré ficasse impedida de deduzir em Juízo qualquer pretensão que porventura tenha com referência aos aludidos contratos. A TUTELA ANTECIPADA QUE SE REQUER É APENAS PARA GARANTIR QUE O "STATUS QUO ANTE" SERÁ MANTIDO ATÉ O JULGAMENTO FINAL DA DEMANDA, sob pena de resultado prático de uma eventual sentença de procedência ser inalcansável no futuro.

Eminente membro da Magistratura Estadual, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível desta Capital, o Dr. DORIVAL RENATO PAVAN, já asseverou (autos de busca e apreensão 922/96), apoiado pelo Egrégio Tribunal de Justiça à posteriori, em sede de Agravo de Instrumento, ser possível que, se houver pedido do devedor, possa haver, em certas hipóteses, sua nomeação para o cargo de depositário. Se tal ocorrer, aquela característica inicial do depósito, que existia em razão do contrato de alienação fiduciária (ou leasing), passa a receber um plus, que transforma a sua condição para a de depositário judicial.

Os Tribunais Superiores vêm flexibilizando o rigor de normas como a insculpida no Decreto-lei 911/69, ao decidir, por exemplo, que se o bem está a serviço da profissão do devedor fiduciário, é possível que sejam mantidas com o produtor as máquinas objeto da alienação.

O Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, já salientou que não é ilegal a decisão que permite permaneçam no trabalho da lavoura, enquanto tramita a ação de busca e apreensão, as máquinas alienadas fiduciariamente (Recurso Especial 89.588/RS).

Apenas para demonstrar a pacificidade do entendimento, a 4ª Turma Cível do mesmo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no RMS 5038/PR, DJ 27.03.95, traz-nos o entendimento no sentido de que:

"Alienação Fiduciária. Apreensão de bens. Permanência com a devedora, em caráter excepcional, eis que a remoção importaria em dano de difícil ou incerta reparação".(Agravo Regimental 89.825/PR, Rel. Min. NILSON NAVES, julgado em 28.05.96).

Segundo ampla jurisprudência de entendimento já sedimentado em nosso Estado, o Juiz, aqui, deve levar sempre em consideração que "a melhor interpretação da lei é a que se preocupa com a solução justa, não podendo o seu aplicador esquecer que o rigorismo na exegese dos textos legais pode levar à injustiças"(44).

A solução justa, no caso, é o exame do periculum in mora inverso. Se ao devedor é possibilitada, como antes explanado, a mais ampla defesa, posto que assim o dispõe a Constituição Federal, e se o equipamento objeto da alienação fiduciária é utilizado (sine qua non) para o exercício da profissão, afigura-se plausível que justo mesmo será que o bem seja mantido em mãos do devedor, até que, ao final, com o trânsito em julgado - coisa julgada material -, seja decidido a quem caberá, em razão das discussões que poderão advir com a contestação a ser formulada.

Os requisitos das cautelares em geral, no caso especial sub exame, não podem ser dispensados, devendo temperar o magistrado o rigor dos termos do Decreto-lei 911/69 com a flexibilidade constante das normas que insculpiram no direito brasileiro as medidas liminares em geral (CPC, art. 798), para concluir que, em existindo motivos que impendem no ocasionamento do periculum in mora inverso, passa a ser possível que a liminar, embora deferida, o seja apenas e tão-somente pra que o devedor fiduciário seja agora mantido na posse do bem como fiel depositário.

No mesmo sentido, relaciona GALENO LACERDA, tratando do poder cautelar geral e afirmando a prudência que deverá agir o juiz´z, no que tange à observação do requisito periculum in mora inverso: "as exigências contrastantes das partes com o interesse da administração da justiça, sempre ínsito nas providências cautelares, eis que se encontra em jogo o bom nome e até a seriedade da justiça" (Comentários ao CPC, Forense, VIII, t. I, n. 28).

De forma ainda mais contundente, EGAS MONIZ DE ARAGÃO assevera que "há certas liminares que trazem resultados piores que aqueles que visavam evitar (Revista de Direito da Procuradoria Geral do Rio de Janeiro, 42/38-39).

A não-produção do denominado periculum in mora inverso, necessariamente implícito no próprio bom senso do julgador, portanto, desponta inegavelmente como um pressuposto inafastável para a decisão final pela concessão da medida liminar - a ser sempre obrigatoriamente observado, de forma compulsória -, uma vez que, em nenhuma hipótese, poderia ser entendido como um procedimento lícito a modificação de uma situação de fato perigosa para uma parte - mas tranqüila para a outra - por uma nova que apenas invertesse a equação original, salvaguardando os interesses de uma das partes em detrimento da outra e ao elevado custo da imposição de gravames (até então inexistentes e por vezes até mesmo insuportáveis) (45).

No caso presente, à exemplo do que consta na doutrina retro-citada, a execução da medida, certamente que causará a imposição de um gravame, quiçá insuportável, para o suplicado, diante da natureza específica e excepcional do bem alienado fiduciariamente.Em casos tais, é plausível que a situação nova criada pelo deferimento da liminar (que implica em remoção do bem para as mãos da autora), invertendo a equação original, pode colocar em risco a atividade profissional do suplicante, o que deve ser a todo custo evitado.

Por conseguinte, o deferimento da liminar, obtemperado com o acolhimento da pretensão do réu de manter-se na posse do bem, não havendo prevalecimento de um em face de outro, até que a solução final seja emprestada ao feito - coisa julgada material - por decisão de mérito, é medida pertinente ao Ordenamento Jurídico Positivado e amplamente ensejadora de JUSTIÇA.

Sobre o autor
Rogério Mayer

mestrando, advogado e professor universitário em Campo Grande (MS)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAYER, Rogério. Ação revisional de contrato de alienação fiduciária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 38, 1 jan. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16062. Acesso em: 23 dez. 2024.

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