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Ação civil pública contra fotossensores

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IV. DA INCOMPETÊNCIA DO CONTRAN PARA INSTITUIR SINALIZAÇÃO
OU EQUIPAMENTO DE CONTROLE DE TRÁFEGO:

          Os fotossensores foram concebidos e instalados no Estado de Mato Grosso do Sul quando a lei de trânsito em vigor não admitia o controle do tráfego por meio de equipamento eletrônico, o que se leva a concluir que as Resoluções 741/95 e 810/95 jamais instituiu, regulamentou e aprovou tais equipamentos, posto que o Contran não poderia, através de resolução, instituir equipamento auxiliar de controle do trânsito. Só a lei pode fazer isso.

          Nessa linha de raciocínio, é coerente afirmar que o Contran sequer homologou os fotossensores. Ora, como poderia ele homologar validamente um equipamento que ele não poderia sequer ter instituído? Ademais, a homologação é ato privativo do órgão de trânsito que tem jurisdição sobre a via em que o equipamento for instalado. Tal norma é o próprio Contran quem estabeleceu.

          A ilegalidade das ditas resoluções do Contran ficou demonstrada em decisão proferida, em mandado de segurança, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no seguinte teor:

          "PROCESSO: APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA DE OFICIO APC4558197 DF

          ACÓRDÃO: 104472

          ORGÃO JULGADOR: 1ª Turma Civel DATA: 11/12/1997

          RELATOR: RIBEIRO DE SOUSA

          PUBLICAÇÃO: Diário da Justiça do DF: 06/05/1998 Pág: 39

          OBSERVAÇÃO: MS 57034/96 TJDF

          DOUTRINA: COMENTÁRIOS À CONSTITUIÇÃO DE 1988 WOLGRAN JUNQUEIRA FERREIRA

          REFERÊNCIAS LEGISLATIVAS: CÓDIGO NACIONAL DE TRÂNSITO

          RAMO DO DIREITO: DIREITO ADMINISTRATIVO

          E M E N T A

          MANDADO DE SEGURANÇA. DETRAN. EQUIPAMENTO ELETRÔNICO PARA CONTROLE DE VELOCIDADE DE VEÍCULOS. INCOMPETÊNCIA DO CONTRAN PARA INSTITUIR SINALIZAÇÃO OU EQUIPAMENTO DE CONTROLE DE TRÁFEGO. A Constituição Federal estabeleceu que compete à União legislar sobre o trânsito. O CONTRAN pode normatizar os sinais, gerenciando o trânsito, nunca criar novos tipos de sinalização ou equipamento de controle de tráfego, até porque, não pode o órgão normativo da coordenação política e do sistema nacional de trânsito, editar resolução modificando a lei.

          DECISÃO: CONHECER DO RECURSO E IMPROVER. MAIORIA. VENCIDO O E. REVISOR.

          INDEXAÇÃO: MANDADO DE SEGURANÇA, DETRAN, TRÂNSITO, EXCESSO DE VELOCIDADE, CONTRAN, INCOMPETÊNCIA, SINAL, INSTALAÇÃO. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, COMPETÊNCIA, UNIÃO FEDERAL, LEGISLAÇÃO, MODIFICAÇÃO, IMPOSSIBILIDADE.

          VOTO VENCIDO: DIREITO À PRIVACIDADE, HONRA SUBJETIVA, FOTOGRAFIA, PROVA DOCUMENTAL, EMPRESA PRIVADA, VANTAGEM PECUNIÁRIA."

          O Contran não questionou tal decisão, tanto é que, posteriormente, se dobrou a ela revogando, como se verá a seguir, as combatidas resoluções.

          Diante dessa constatação, é correto afirmar que os fotossensores são ilegais desde seu nascedouro, o que não lhe permitia estar nas ruas controlando o trânsito de maneira válida.


V. DA EXCLUSÃO DO FOTOSSENSOR DO CONCEITO DE BARREIRA ELETRÔNICA E DA SUA CONSEQÜENTE PROIBIÇÃO DE ESTAR OPERANDO NO TRÂNSITO COMO APARELHO ELETRÔNICO:

          Entendendo que os atos do CONTRAN são normas complementares ao CBT, deve-se ater ao fato de que as Resoluções que permitiam o uso das barreiras eletrônicas, categoria em que o fotomulta poderia ser enquadrado, foram revogadas pela Resolução CONTRAN de n° 23, de 21.05.98, já que essa unificou as disposições e exigências técnicas das Resoluções de n° 765 e de n° 801. Essa Resolução nº 23, que é posterior as outras duas mencionadas, regulamenta o § 2° do artigo 280 do CTB, que dispõe que:

          "A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente de autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN." ("§ 2° do Artigo 280 do CBT).

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          Essa mesma Resolução n° 23 que - como já dito, regulamenta o § 2° do CBT - ao definir e estabelecer os requisitos mínimos necessários para autorização e instalação dos aparelhos eletrônicos, deixou claro que não mais existe o conceito genérico de barreira eletrônica, visto que seu lugar surgiram os instrumentos eletrônicos de medição autônoma, como se passa a demonstrar:

          "Art. 1°- Definir que Instrumento de Medição de Velocidade de Operação Autônoma é aquele que registra e disponibiliza as informações de forma adequada, dispensando a presença da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito no local da infração, viabilizando a comprovação da infração.

          Art. 2° - Os requisitos básicos necessários para a instalação dos Instrumentos de Medição de Velocidade de Operação Autônoma são:

          I- estar aprovado e certificado pelo INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualificação ou entidade por ele credenciada, atendendo aos requisitos técnicos estabelecidos pelo CONTRAN e legislação metrológica em vigor;

          II- passar por verificação anual do INMETRO ou entidade por ele credenciada, ou quando for observada alguma irregularidade no seu funcionamento ou após sofrer manutenção;

          III- estar dotado de dispositivo que registre, de forma clara e inequívoca, as seguintes afirmações:

          a) identificação do equipamento;

          b) data, local e hora da infração;

          c) identificação do veículo:

          1. placa;

          2. marca/modelo.

          (....)."

          Claramente constata-se que os fotossensores não se enquadram nos aparelhos mencionados à Resolução acima transcrita, principalmente por não se constituir em Instrumento de Medição de Velocidade de Operação Autônoma, sendo portanto ilegais.

          Não possuindo base legal, não foram regulamentados pelo CONTRAN, não foram nem permitem ser aprovados, certificados e verificados pelo Inmetro, não sendo, portanto, meios lícitos nem idôneos para controlar o tráfego.


VI. A FALTA DE HABILITAÇÃO DO EQUIPAMENTO:

          Já foi demonstrado que a Resolução n° 23 do CONTRAN unificou as exigências e os requisitos técnicos para o Instrumento Eletrônico de Medição Autônoma, eliminando o termo genérico "barreiras eletrônicas" em que o "olho-vivo" poderia se enquadrar, revogando as Resoluções n° 765 e 801. Todavia, na época em foram instalados os combatidos equipamentos, estas resoluções estavam em vigor e, portanto, deveriam ter sido respeitadas. Assim é que os aparelhos fotossensores não atenderam os requisitos técnicos necessários e obrigatórios estabelecidos pelo CONTRAN para figurar como instrumento hábil ao auxílio no controle de tráfego, quais sejam, estarem certificados, homologados e aferidos, pelo que não poderiam sequer terem sido objeto de licitação.

          A certificação e o aferimento, testes exigidos para comprovação de que não ocorrerão fraudes contra os cidadãos, são exigência mínimas para que qualquer aparelho eletrônico seja instalado e colocado em funcionamento.

          Mas, afinal, o que é homologação, aferição e certificação? Para melhor esclarecer e facilitar, conceituar-se-ão os três vocábulos para que não restem dúvidas ao nobre julgador sobre o que é cada um e o porquê da luta deste "Parquet" para que sejam reconhecidas e sanadas as irregularidades.

          A certificação é o teste mais importante do equipamento, pois é ela que vai revelar se é tecnicamente adequado e utilizável. Tornou-se uma prática corrente na engenharia, e é indispensável que se realize previamente à sua aplicação, conforme estabelecem as resoluções do CONTRAN.

          A homologação é um ato administrativo e legal, prévio à instalação de equipamentos auxiliares do controle de tráfego, que deve ser realizado, no mínimo, de posse do registro de INPI e do relatório de CERTIFICAÇÃO elaborados de acordo com as resoluções do CONTRAN e aprovados pelo órgão interessado.

          A aferição é uma etapa indispensável, que objetiva adaptar o equipamento ao semáforo (cruzamento) correspondente, conferindo-lhe credibilidade. Deve-se realizar antes de sua entrada em serviço, é prática normal da engenharia, é exigido pelas resoluções do CONTRAN e deverá ser reexecutada toda vez que houver dúvida no seu funcionamento, quando sofrer manutenção e anualmente. (vide as Resoluções do CONTRAN de n°765/95 e 801/95 e perícia CREA/MS acostada às f. 780 a 784 do IC n°11/98).

          A certificação, homologação e aferimento são importantes porque, com eles, se detectaria todas as irregularidades presentes no equipamento, dando condição à Administração Púbica de exigir suas correções antes de admitir sua colocação no trânsito.

          O fato de o Inmetro não ter como aferir o equipamento demonstra, por si só, que ele não é confiável nem se enquadra na definição legal de aparelho eletrônico (§ 2° do artigo 280 do CTB).

          Pelo princípio da legalidade, pelo qual a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite, os fotossensores nunca deveriam ter sido instalados.

          Com efeito dispõe a Resolução do CONTRAN n° 795/95 que regulamentava as antigas barreiras eletrônicas:

          "Art. 2°- A autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via disporá sobre a homologação, localização, instalação, sinalização, operação e fiscalização das Barreiras Eletrônicas.

          Art. 3°- Para a instalação de Barreiras Eletrônicas será necessária a prévia homologação, atendidas, no mínimo, as seguintes exigências:

          I- registro do equipamento no Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI; e

          II- certificação pelo Instituto Nacional de Metrologia - INMETRO ou entidade por ele credenciada, anualmente ou quando notada alguma irregularidade no seu funcionamento ou, ainda, após sofrer manutenção.

          Art. 4 - A Barreira Eletrônica, após instalada, será aferida pelo INMETRO ou entidade por ele credenciada, anualmente ou quando notada alguma irregularidade no seu funcionamento ou, ainda, após sofrer manutenção."

          Por sua vez, a Resolução n° 801/95, do CONTRAN estabelece, in verbis:

          "RESOLUÇÃO CONTRAN 801 DE 27/06/1995

          Requisitos Técnicos Necessários à uma Barreira Eletrônica.

          (artigos 1 a 4)

          (....).

          Art. 2 - A Barreira Eletrônica deve permitir a aferição e calibração no local onde estiver instalada."

          As duas Resoluções eram claras ao preverem que as barreiras eletrônicas (categoria em que diziam estar inserta o fotossensor) deveriam ser, antes de instaladas, certificadas pelo Inmetro e homologadas pelo Detran. E, depois de instaladas, deveria permitir a aferição, que deveria ser levada a efeito também pelo Inmetro ou por outra entidade por ele credenciada. Se isso não era possível, os fotossensores não deveriam sequer ter sido instalados. Mesmo que tivessem sido instalados não poderiam ter sido colocados em funcionamento, posto que não permitiam a aferição e a calibração no local onde estivessem sido instalados.

          Em resposta a ofício n° 480/PJDC/98, o DETRAN/MS manifestou-se dizendo ser da competência do CONTRAN a homologação dos fotossensores. A .............. apresentou o mesmo entendimento, afirmando que o equipamento já estava homologado pelo CONTRAN, conforme resposta ao ofício N° 396/PJDC/98. Basta uma simples leitura nas Resoluções supratranscritas para notar que é a autoridade de trânsito que tem jurisdição sobre a via que tem a incumbência de homologar o aparelho, ou seja, o DETRAN/MS. Logo, o aparelho ainda não foi homologado.

          No que tange à certificação e aferição, as Resoluções estabelecem ser do encargo do INMETRO ou outra entidade por ele credenciada. O INMETRO, autarquia de reconhecida idoneidade, neutralidade e capacidade, alega que o aparelho fotossensor não pode ser certificado nem aferido pois não é um instrumento de medir da área metrológica. Se realmente escapa à atribuição do INMETRO certificar e aferir o equipamento, não poderia o Detran utilizar esse fato como desculpa para não certificá-lo e aferi-lo, pois há no Brasil e, mesmo em Mato Grosso do Sul, instituições plenamente capazes de realizar o serviço. Como exemplo, cita-se a UNICAMP, o ITA, o IPT, a UFMS e a UNIDERP.

          A CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) que passou por processo licitatório semelhante determinou que a certificação dos equipamentos seria realizada pelo IPT.

          A certificação é fundamental para a garantia da Administração Pública séria e para os próprios administrados, dado que sem a certificação não se tem como saber se o aparelho é realmente hábil para registrar os fatos e, assim, dar confiabilidade nas fotos ou nas informações prestadas. Os simples fato de os fotossensores não terem passado por qualquer teste exigido deita por terra qualquer provável "boa intenção" que se possa alegar em favor dos réus.

          O Detran, os seus representantes legais e a ............., parceiros da ilegalidade e do abuso, passam por cima de tudo e de todos no anseio imoral e usurário de se enriquecerem ilicitamente, locupletando-se com o dinheiro alheio sem ao menos tentar mascarar a indecência, tamanha é a ganância.

          Diante da afirmativa de que as Resoluções 741/95 e 810/95 foram revogadas pela Resolução 23/98, há de se perguntar qual é a situação jurídica dos fotossensores hoje. A resposta é no sentido de que eles continuam irregulares, posto que a recentíssima Resolução CONTRAN n° 23, de 21.05.98, que, como já dito, revogou as duas anteriores, fazem as mesmas exigências, como se vê pelo disposto nos incisos do artigo 2º, "in verbis":

          "Art. 2° - Os requisitos básicos necessários para a instalação dos Instrumentos de Medição de Velocidade de Operação Autônoma são:

          I- estar aprovado e certificado pelo INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualificação ou entidade por ele credenciada, atendendo aos requisitos técnicos estabelecidos pelo CONTRAN e legislação metrológica em vigor;

          II- passar por verificação anual do INMETRO ou entidade por ele credenciada, ou quando for observada alguma irregularidade no seu funcionamento ou após sofrer manutenção".

          Ora, se a APROVAÇÃO, CERTIFICAÇÃO E A VERIFICAÇÃO PRÉVIA pelo Inmetro são "requisitos básicos necessários para a instalação dos instrumentos" eletrônicos, não sendo possível realizar tais determinações do órgão normatizador em relação aos fotossensores, eles devem ser tidos como equipamento impróprios para continuar regendo o trânsito. Pelo que se conclui que todos os atos posteriores (contratação, instalação, funcionamento e geração de multas) são ilegais e, portanto, nulos, não gerando qualquer efeito jurídico, a não ser contra os réus.

          Para concluir este tópico, há que se deixar claro que o Inmetro, apesar de ter reconhecido que o equipamento não possibilita o aferimento, não se mostrou concorde com a idéia de que o aparelho, por essa razão, possa estar no trânsito controlando-o. Ao se manifestar sobre o caso - através de seu representante em Mato Grosso do Sul, o DPM/MS – afirmou:

          "Parece-nos um tanto precipitada a atuação do CONTRAN e dos órgãos Estaduais de trânsito quando fazem instalar "sensores semafóricos" generalizando a responsabilidade do INMETRO na emissão de Certificados de Verificação. A ausência de mecanismos para este procedimento coloca em dúvida a transparência e credibilidade dos atos administrativos" (Contestação do Inmetro a ação civil pública nº 97.34248-4 proposta pelo Ministério Público em face dele e do Detran, presente à f. 830 do PA 14/97).

                    Afirmou, ainda, à f. 833 do mesmo PA, que:

          "O DPM não pode ser responsabilizado por atitudes precipitadas de uma autarquia independente que decide implantar sistemas e aparelhos, sequer passíveis de aferição, como os fotossensores."

Sobre os autores
Amilton Plácido da Rosa

Procurador de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido; ALMEIDA, Luiz Antônio Freitas. Ação civil pública contra fotossensores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 36, 1 nov. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16210. Acesso em: 22 nov. 2024.

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