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Chacina dos portugueses na praia de Fortaleza:

denúncia-crime

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2. DAS NECROPSIAS REALIZADAS:

Os laudos de Exames Cadavéricos evidenciam detalhes de crueldade e tortura sofridas pelas infortunadas vítimas, que tem em comum, como causa principal da morte: "asfixia mecânica pela presença de areia na traquéia e esôfago, o que caracteriza movimentos respiratórios e de deglutinação após o soterramento do corpo...". Em face disso, correto e verberar que a vítima que teve menos lesão externa, sofreu por mais tempo, quando sepultada viva. Testificam mais, aquelas perícias médica que os cruéis "sicários" para alcançar o seu desiderato ilícito, utilizaram-se de diversos instrumentos (revólver, faca, pau, pedra, socos, pontapés, cordas, etc). Pasmem-se os céus de tamanha barbaridade!.

Destarte, certo é afirmar que todas as vítimas portuguesas foram sepultados vivas, motivo que, por si só, justifica de que todos os denunciados participaram diretamente das mortes delas, bem como da agravante de utilização de meio cruel reconhecido pelos médicos-legistas.


3. DA CO-DELINQUÊNCIA

Em torno da co-delinquência a legislação penal pátria abraçou a teoria unitária ou monística. Equipara-se, em princípio, o art. 29 todos os que intervêm no delito, quem, de qualquer modo, concorre para ele. Nesse prisma não se pode negar que a co-autoria é nada mais nada menos, em última análise, a própria autoria. Funda-se ela sobre o princípio da divisão de trabalho; cada autor colabora com sua parte no fato, a parte nos demais na totalidade do delito e, por isso, responde pelo todo. Há, na co-autoria, a decisão comum para a realização do resultado e a execução da conduta.

Acerca de concurso deliquencial, a remansosa jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, assim tem entendido:

"Na co-autoria, não há necessidade do mesmo comportamento por parte de todos, podendo haver a divisão quanto aos atos executivos"(TACRIM - SP - AC - Rel. Des. Hélio de Freitas).

"Concurso de Agentes - Agente que colabora para o êxito do fato criminoso. No concurso delinquencial não é necessário que todos os partícipes consumem atos típicos de execução; para ser alguém co-responsabilizado, basta que tenha colaborado, auxiliado ou instigado, prestigiando ou encorajando a atuação dos executores direto"(TACRIM-SP-Rel. Des. Nogueira Filho - BMJ 87/4).

"Segundo a teoria monistica adotada pelo Código Penal, tudo quanto for praticado para que o evento se produzisse é causa indivisível dele. Há na participação criminosa uma associação de causas conscientes, uma convergência de atividades que são, em seu incindível conjunto, a causa única do evento e, portanto, a cada uma das forças concorrentes deve ser atribuída, solidariamente, a responsabilidade pelo todo"(TJSP-ACRel. Des. Mendes Pereira - RJTJSP - 40/317).

Diante desse festejado entendimento legislativo, doutrinário e jurisprudencial, para o reconhecimento da solidariedade criminosa ou mera ajuda, ainda sem participação direta, basta a simples anuência a empreendimento delituoso, com vista ao sucesso da atividade delinquencial de outrem. Dessa forma, no caso sob exame, verifica-se com facilidade, que, a coisa foi mais além, vez que por parte dos denunciados não houve apenas anuência, e sim, a participação decisiva na reiterada prática deletéria, onde todos se destacaram dentro de suas respectivas atribuições delituosas, previamente estabelecidas, em forma de organização delitiva, do início até o final da nociva e sangrenta ação.

A participação de cada acusado na série de eventos criminosos, caracterizado por atividade de inequívoca colaboração material e pelo desempenho de conduta previamente ajustada entre todos por meio de associação delituosa, está satisfatoriamente identificada no bojo destes autos.

De modo que, ante a invocada Teoria monísta ou unitária eleita pelo legislador penal pátrio, "todos os que contribuem para a integração do delito cometem o mesmo crime", pois, em tal hipótese, "há unidade de crime e pluralidade de agentes" (Damásio E. DE Jesus, Código Penal Anotado, p. 108, 3ª ed., 1993, Ed. Saraiva ).

Conclui-se, portanto, que essa regra, aplica-se, também, aos meliantes integrantes de associação criminosa ou quadrilha - art. 288, do Código Penal Pátrio, em especial, quando, em concurso material, perpetram outros delitos, vez que atuam norteado pelo dolo - vontade livre e consciente de delinqüir.


4. DA MATERIALIDADE E AUTORIA

A materialidade delituosa está estampada nos fólios desta volumosa peça inquisitória, através dos Exames de Corpo de Delito (Cadavéricos) devidamente ilustrados com crocris de lesões e outros dados pessoas das vítimas, fls. 256/277, bem como pelo minucioso Laudo de Exame em local de Morte e Ocultação de Cadáver, fls.338/381. e outras provas técnicas que dormitam às fls.

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No que tange à autoria, esta, nos delitos em exame, é o que se nos afigura como demais certa, já que os próprios acusados, à exceção de Raimundo Martins da Silva Filho, principal sicário, são réus confesso, confissões estas coroadas pelas demais provas carreadas ao autos. Todavia, impera-se ressaltar que, a pálida e inconsistente negativa de autoria, por parte do predito meco, discrepa demasiadamente do conjunto probatório. Trata-se de versão isolada e despida de qualquer consistência, porquanto, fadada ao insucesso.


5. DO CONCURSO MATERIAL DE CRIMES:

À vista do que quedou apurado, chega-se à conclusão de que os acusados, de forma consciente e deliberada mediante associação criminosa ou quadrilha (art. 288,CP), em autêntico concurso material (art. 69, CP), cometeram os crimes de roubo qualificado pelo resultado morte - art. 157, § 3º, parte final, e ocultação de cadáver - art. 211, todos do Código Penal Brasileiro, c/c art. 1º, inc. II, da Lei nº 8.072/90, com as agravantes decorrente de terem agido mediante dissimulação, meio cruel e recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa da vítima - art. 61, inciso II, "c" e "d", do mesmo Codex.

Relativamente a matéria em deslinde, é por demais oportuno trazer à baila a orientação pretoriana pátria, "veribs":

QUADRILHA E CONCURSO MATERIAL COM OUTROS DELITOS:

"O crime de quadrilha se tipifica e se consuma pelo só consenso criminoso entre os quadrilheiros, dando-se o concurso material com os delitos de furtos e outros que venham a ser praticados"(TJRJ - AC 3.640 - Rel. Cavalcanti de Gusmão).

"A adesão de grupo marginal, ainda que ocasional, mas tendo cada um de seus membros papel definido, constitui prova da prática de crime de quadrilha ou bando, de cujo conteúdo não se pode abstrair a figura de co-autoria ou ainda da relação causalidade"(TJMS- AC- 391/82 - Rel. Des. Pereira Rosa).

"Bando ou Quadrilha - Caracterização - Falta de habitualidade - Irrelevância ante a preparação estável no propósito criminoso"(TJSP- AC - Rel. Prestes Barra - RJTJSP 68/380).

"Havendo mais de uma vítima, com ofensa a bens personalíssimos, caracteriza-se concurso material de tantos crimes quanto forem os ofendidos"(TACRIM-SP-AC- Rel. Denser de Sá - JUTACRIM-59/259).

"Inexiste continuidade delitiva nos crimes de roubo, quando diversas vítimas atingidas, devendo o meliante responder por delitos em concurso material"(TACRIM-SP-Rwec. - Rel. Geraldo Pinheiro - JUTACRIM 46/132).

Por último, é bom que se diga, que o acusado Luis Miguel Melitão Guerreiro, é uma pessoa experimentada no cometimento de crime contra o patrimônio, vez que já foi condenado pela Justiça Lusitana, por prática de delito de furto.


6. DO PEDIDO:

EX POSITIS, estando os delatados aludidos, incursos nas tenazes do arts. 157, § 3º, parte final (art. 1º, inc. II, da Lei nº 8.072/90), 211, caput e 288, caput e 61, inciso II, alíneas "c" e "d", c/c o art. 69, todos do Código Penal Brasileiro, exoram estes Promotores de Justiça que Vossa Excelência, se digne de recepcionar a presente delactio criminis em todos os seus termos, adotando todas as providências legais e necessária para a persecução penal, determinando a CITAÇÃO dos acusados em epígrafe, através de Requisição (Art.360, CPP) - eis que se encontram presos na Superintendência da Polícia Federal -, à comparecerem neste respeitável Juízo para serem interrogados e acompanharem a ação penal, em todos os seus termos, sob as penas da lei, ouvindo-se as testemunhas arroladas no rol adiante e, finalmente, reconhecida a procedência desta denúncia-crime, sejam os mesmos condenados nos exatos termos da imputação legal indicada na peça vestibular acusatória, por ser a medida legal reclamada.

Requer-se, ainda, que sejam carreadas para estes autos as Certidões Criminais dos denunciados em epígrafe.

Reserva-se, de logo, o direito de aditar a denúncia, se no decorrer da instrução, surgirem motivos para tal.

Termos em que,

Pede Deferimento.

Fortaleza, 21 de setembro de 2001.

JOSÉ VALDO SILVA

Promotor de Justiça

Titular

TEODORO SILVA SANTOS

Promotor de Justiça

Aux. 4ª Promotoria Criminal

ROL DE TESTEMUNHAS:

1. Jorge Alberto Pinheiro, Agente da Polícia Federal, lotado na Superintendência no Estado do Ceará;

2. Antonio Carlos Lima, qualificado às fls. 220;

3. Maria Francileuda de Oliveira, qualificada às fls. 300;

4. Antonio Francisco da Silva Costa, qualificado às fls. 150;

5. Luiz Carlos de Lima, qualificado às fls. 161; e,

6. Marcos Nascimento de Alcântara, qualificado às fls. 159.

7. Jean César Pinheiro, Agente da Polícia Federal, Matrícula nº 6992, lotado na Superintendência no Estado do Ceará;

INFORMANTES:

1. Maria Leandro Cavalcante(mulher do primeiro denunciado), qualificada às fls. 144.

Data supra,

JOSÉ VALDO SILVA

Promotor de Justiça

TEODORO SILVA SANTOS

Promotor de Justiça

REPRESENTAÇÃO DE CUSTÓDIA PREVENTIVA

EMÉRITA MAGISTRADA,

No relatório final do fascículo policial em análise, a diligente e zelosa autoridade policial federal, considerando a periculosidade dos acusados, a tentativa de fuga frustrada, bem como a natureza da hedionda ação delituosa, amparado no art. 311da Legislação Processual Penal Pátria, representou pela decretação da custódia preventiva de todos.

É cediço que toda e qualquer prisão que antecede a um decreto condenatório com trânsito em julgado é medida odiosa, porque somente a sentença é a legítima fonte para restringir a liberdade a liberdade individual a título e pena. Sem embargo disso, a preventiva se justifica como necessidade para assegurar o império da lei penal, sobretudo no que tange a prática dos mais graves crimes hediondos, sequenciados pela tentativa de fuga do distrito da culpa a busca da impunidade, ameaça a futura instrução criminal, e garantia da ordem pública, principais motivos delineados no art. 312, do Código de Processo Penal Pátrio.

No vertente caso, é público e notório o ocorrência concreta de três motivos que autorizam a decretação da medida de exceção, a exemplos, à fuga dos acusados do distrito da culpa, logo após a prática dos delitos. Aliás, mesmo depois de presos e recolhidos as celas da Superintendência da Polícia Federal em Fortaleza, aqueles periculosos quadrilheiros, em pleno desafio aquela instituição de segurança, tentaram fuga.

Somem-se esses sérios fatos, a gravidade dos delitos perpetrados, a crueldade e falta de sensibilidade dos delinqüentes, o que motivou notável repercussão internacional causada.

De maneira que, a decretação da prisão preventiva dos pervertidos denunciados é medida que se impõe, para garantia da ordem pública deveras abalada por imensurável barbaridade e frieza, para a conveniência da futura instrução criminal e, por fim, para garantia da aplicação da lei penal, nos exatos termos dos arts. 311 e seguintes do Código de Processo Penal.

Destarte, o Ministério Público, por seus representantes legais, além de concordar com a lúcida e acertada iniciativa da autoridade policial federal, na condição de parte na ação penal, requer que seja a custódia temporada que ora mantém os indigitados presos, substituída pela decretação da prisão preventiva dos acuados em epígrafe.

Espera natural deferimento.

Fortaleza, 21 de setembro de 2001.

JOSÉ VALDO SILVA

Promotor de Justiça

TEODORO SILVA SANTOS

Promotor de Justiça

DILIGÊNCIAS REQUERIDAS:

EMINENTE MAGISTRADA,

É cediço que a fase inquisitória encerrou-se com remessa do Inquérito Policial a esse Juízo, norteado pelo êxito, eis que estão definidas de forma abundante e irrefutável a materialidade e autoria delituosa, que ensejou na apresentação da peça vestibular acusatória em referência, independente de qualquer outro resultado oriundo de algumas perícias realizadas em outros Estados da Federação.

Ademais, os indigitados ora denunciados se encontram presos na carceragem da Superintendência da Polícia Federal no Ceará, à disposição desse Juízo.

Com efeito, entendemos que por questão de segurança, aqueles delinqüentes devem permanecer naquela repartição federal, durante o transcorrer da instrução criminal, mesmo porque, a qualquer momento, poderá ser necessário a realização da prática de ato processual que exija a presença dos mesmos ou de algum, no que torna mais fácil a operação da condução para esse Juízo.

Destarte, o Ministério Público, por seus representantes legais, requer a Vossa Excelência, o seguinte:

a) Que seja dirigido expediente ao Sr. Superintendência da Polícia Federal, no sentido de que os acusados aludidos, ali permaneçam presos até à conclusão da instrução criminal; e

b) Que a realização de eventuais diligências em torno do presente fatos, sejam determinada a Polícias Judiciária Federal, vez que a mesma já conhece o assunto.

É o que, no momento requer.

Fortaleza(CE), 21 de setembro de 2001.

JOSÉ VALDO SILVA

Promotor de Justiça

TEODORO SILVA SANTOS

Promotor de Justiça

Sobre os autores
Teodoro Silva Santos

Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Ceará. Coordenador do Centro de Combate aos Crimes Contra a Ordem Tributária. Professor de Processo Penal II da UNIFOR, Pós-graduado em Processo Penal. Pós-graduado em Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Teodoro Silva; SILVA, José Valdo. Chacina dos portugueses na praia de Fortaleza:: denúncia-crime. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16446. Acesso em: 23 dez. 2024.

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